As ciências contábeis perdem Antônio Lopes de Sá, sua maior estrela no país e talvez em todo o mundo. Aos 83 anos, Lopes de Sá faleceu subitamente de um infarto, surpreendendo a todos. Considerado o maior especialista em contabilidade do Brasil, Lopes de Sá era um incansável produtor de conhecimento e consultor respeitado, que escreveu 158 livros e palestrou em todo o país. Sua morte representa uma grande perda para a contabilidade brasileira.
Palestra Contador 2.0: Estratégias inovadoras para vencer a crise
Cartilha da Revista Encontro sobre SPED e NF-e
1. Edição exclusiva Mastermaq
3 de setembro de 2010 | Edição II www.revistaencontro.com.br
nota fiscal eletrônica
O Sistema Público
de Escrituração
Digital, Sped,
promete acabar
com a sonegação.
Saiba como
ele impacta
a economia,
as empresas
e a sua vida
SORRIA,VOCÊESTÁSENDO
FISCALIZADO
TPERFIL: O LEGADO DE ANTÔNIO TSOFTWARES: PROGRAMAS T PASSO A PASSO: TODO
LOPES DE SÁ, O MAIOR QUE AJUDAM A EVITAR FALHAS O CUIDADO É POUCO NA HORA
CONTABILISTA DO BRASIL NA CONTABILIDADE DE IMPLANTAR A NF-ELETRÔNICA
4. Fotos: Cláudio Cunha
26
Encontro
nota fiscal eletrônica
6 Perfil 22 Softwares
Antônio Lopes de Sá: uma vida a Programas que evitam
serviço da contabilidade brasileira problemas na emissão da NF-e
8 Entrevista 25 Artigo
O Sped e a Nota Fiscal Eletrônica Bomba tributária
vistos por Antônio Lopes de Sá de efeito retardado
13 Tecnologia
26 Empresas
Escritórios contábeis e empresas
ficam mais integrados Usiminas: pioneira na
adoção da nota eletrônica
14 Capa
Conheça o novo Sistema Público
de Escrituração Digital, o Sped
27 Artigo
Comprei mercadoria com
NF-e denegada. E agora?
18 Passo a passo
28 Tira-dúvidas
Na hora de implantar a NF-e,
todo cuidado é pouco Perguntas e respostas sobre
a Nota Fiscal Eletrônica
30 Artigo
Alexandre Atheniense
e os riscos da fiscalização
4 |Encontro
5. carta do editor
Encontro
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do projeto Deca Furtado redacao@revistaencontro.com.br
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O silêncio que fala
Editor de Arte Edmundo Serra
Uma das qualidades do bom jornalista é saber traduzir em linguagem comum
Equipe de Arte Antônio de Pádua termos técnicos e muitas vezes incompreensíveis para a maioria dos leitores. En-
Bruno Schmitz contro decidiu fazer um suplemento sobre Nota Fiscal Eletrônica por entender que
Luciano Garbazza
Reinaldo Soares
o assunto pode mudar a vida das empresas e, por consequência, das pessoas e da so-
ciedade.
Editor de Fotografia Cláudio Cunha Mas o que significa Nota Fiscal Eletrônica? Como vai afetar nosso cotidiano? Exa-
Fotógrafos Eugênio Gurgel
tamente para responder a questões como essas é que nos propusemos decifrar o
Geraldo Goulart
tema. A maioria de nossos leitores, seguramente, cresceu ouvindo dizer que o Brasil
Colaboradora Barbara Dutra
é um país de elevada carga tributária. Ou seja, uma nação cujos impostos que recaem
Operações Nicole Fischer
sobre a sociedade e suas empresas são muito maiores do que a média mundial e do
Manuella Drumond
que seria razóavel supor. Isso asfixia os negócios e muitas vezes exige que empresas
Revisão P. S. Lozar
e pessoas físicas busquem na sonegação um instrumento para fugir das garras do
Departamento Agata Utsch
Comercial Andreza Braga Leão. O Brasil, todos sabem, é também um país de elevada sonegação fiscal. O novo
Beatriz Anastasia modelo de escrituração contábil proposto pelo governo, denominado Sped, quer aca-
Cecília Dias bar com isso. Será possível? Vai implicar aumento nos custos das indústrias e co-
Jamile Lage
Laila Soares mércio e, consequentemente, maior valor para os produtos consumidos? Isso o
Myrta Lobato tempo vai nos dizer. Fato é: muita coisa pode mudar com o novo sistema.
Norma Catão Para a tarefa de tradução convocamos o jornalista Deca Furtado, experiente pro-
Sônia Gomes
fissional que durante anos trabalhou na revista Exame, das mais respeitadas publi-
Gerente de Circulação Luiza Guerra
cações de economia e negócios do país. Coube a Deca, por um capricho da natureza,
Assistente de Nayara Fagundes
Circulação o desafio de ter sido o último jornalista a entrevistar o professor Lopes de Sá, consi-
Projeto Gráfico BravaDesign derado o papa da contabilidade no Brasil, que veio a falecer, subitamente, alguns dias
Para anunciar (31) 2126-8000 depois. “Foi uma conversa maravilhosa”, disse Deca. “Ele era um homem encantador
comercial@revistaencontro.com.br
e nada dizia que a morte o rondava”.
Atendimento ao leitor (31) 2126-8000
A simpatia entre o professor e o jornalista foi imediata e, por alguns momentos,
Deca esqueceu a formalidade, deixou o gravador de lado e se envolveu numa pales-
leitor@revistaencontro.com.br tra leve, tenra e bem-humorada. “Demos muitas risadas”, disse. “Falamos de vinhos,
Assinaturas (31) 2126-8770 música e viagens”. O resultado desse agradável momento pode ser conferido em duas
Impressão Ibep
Distribuição VIP
matérias deste suplemento. Numa delas, um perfil, que pelas circunstâncias impla-
cáveis e incompreensíveis da vida se transformou numa homenagem póstuma que
TIRAGEM Deca fez sobre Lopes de Sá, num texto absolutamente primoroso e de arrepiar. Na
60.000 Exemplares outra, uma entrevista para discutir tecnicamente a questão em pauta: o novo modelo
Tiragem e distribuição auditadas pela fiscal proposto pelo governo.
A revista Encontro pensou também numa maneira de externar seu sentimento
pela perda do professor Lopes de Sá. Assim como fazem habitualmente os veículos
de televisão, concluímos que a forma mais adequada seria o silêncio, suprimindo as
conforme relatório em nosso poder.
últimas linhas deste editorial. Fique em paz, professor.
Encontro é uma publicação mensal
da Encontro Importante Editora Ltda.
Belo Horizonte
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30320-140, Belo Horizonte - MG
Fone (31) 2126-8000
Até a próxima, caro leitor.
Empresa filiada à
Encontro | 5
6. perfil
Deca Furtado Cláudio Cunha
As ciências contábeis
perdem Antônio Lopes
de Sá, sua maior
estrela no país e talvez
em todo o mundo
Aos 83 anos de idade, completados
em abril, Antônio Lopes de Sá, a maior
autoridade em contabilidade no Brasil,
quiçá no mundo, foi-se no dia 7 de ju-
nho, surpreendido por um infarto.
Completamente lúcido, e no auge do
poder de gerar conhecimento, ele mor-
reu ainda encantado pela vida, que
amava tanto quanto a esposa Édila, os
três filhos, a contabilidade, os vinhos, os
queijos, os autores clássicos, como
Dante Alighieri, a ópera – La Traviata
era a sua predileta – e Portugal, país que
pelo qual foi distinguido com o título
de cidadania.
Doze dias antes, nada dizia que a
morte rondava o professor, como Lopes
de Sá era mais conhecido. Ele dera então
à revista Encontro sua última entrevista,
reproduzida logo adiante e, para come-
morá-la, regou o pós-bate-papo com um
bom vinho do Douro, acompanhado por
delicioso camembert.
Alegre, divertido (tinha uma gostosa
e às vezes irônica risada), contador de
piadas, ele não precisava de mais do que
alguns minutos para cativar quem quer
que fosse, ou por ser culto e pela arte de
esgrimir as palavras sem parecer pe-
dante, ou pelo lado pessoal, pois parecia
ter nascido gentleman.
6 |Encontro
7. Um fabricante de
conhecimento
Lopes de Sá, belo-horizontino de nas-
cimento – sua família habitava o Curral
Sá, que são tão imorredouros quanto a
lei das Partidas Dobradas, pedra filosofal
demandas judiciais, inclusive uma de
800 milhões de reais, a maior do país no
del-Rei antes mesmo da fundação da ci- da contabilidade. momento, a envolver a Gerdau e a Sul
dade –, também era cidadão do mundo. Esse lado, de gerador de conheci- América Seguros, numa disputa causada
Duas, três e até mais vezes por ano ele ia mento contábil, é destacado por todos os pela explosão em um alto-forno da
à Europa atrás das óperas, gosto que de- que com ele conviveram. “Ele dizia que usina de Barão de Cocais. “Meu cliente
senvolveu ainda na juventude, quando o contador precisa compreender os pon- vai ganhar por causa também do meu
também se apaixonou pela química. “Fiz tos filosóficos e científicos da contabili- conhecimento acumulado”, profetizou.
o primeiro ano de engenharia química”, dade, porque ela tem três finalidades: No pouco tempo que sobrava, Lo-
revelou na entrevista. atender o empresário, o mercado de ca- pes de Sá palestrava em Minas Gerais e
Mas, como a família era pobre, ele se pitais e o fisco. No Brasil, o viés fiscal pre- país adentro – nos últimos tempos par-
viu obrigado a trancar a matrícula. Tra- ponderou e levou o contador a uma pos- ticipou de várias reuniões onde se dis-
balhava então na extinta Mesbla e era o tura tecnicista. Ora, para auxiliar o cutia a implantação do Sped, tema
responsável pela contabilidade de custos empresário na tomada de decisão, a desta edição, e também para dar suas
da oficina. O gerente lhe abriu os olhos. questão filosófica é mais importante do opiniões sempre bem embasadas. Ele
“Ele me disse: ‘Você já trabalha na área. que a técnica. Ele queria que o contador ainda se desdobrava para escrever arti-
Ora, por que não faz ciências contábeis? pensasse mais”, diz Roberto Dias Duarte, gos para sua página na internet. Ali,
A faculdade é mais barata do que a de autor do livro Big Brother Fiscal – O Bra- mesmo sem falar de sexo, futebol e ou-
química’. No mesmo dia me matriculei sil na Era do Conhecimento. tros assuntos menos áridos que a con-
na Faculdade Brasileira de Comércio”, A sapiência e a produtividade vi- tabilidade, já acumulara mais de 3,5 mi-
contou Lopes de Sá. Isso foi em 1943. nham mais da transpiração do que da lhões de acessos registrados, um
Depois disso, o professor trabalhou, inspiração. Às 4h da madrugada ele se recorde. Cerca de 60 sites de todo o
durante muitos anos, para o moinho de levantava para ler, na internet, jornais mundo o honraram com convites, acei-
Felício Brandi, ex-presidente do Cruzei- americanos e europeus. A jornada de tos, para escrever como colunista. Mas
ro, time da sua paixão. Mas, desde crian- trabalho ia até as 23h e era quebrada ape- ele nunca abandonou sua coluna se-
ça, o mestre não dedicou muito tempo nas às 14h30 pelo almoço, sempre re- manal, publicada desde 1950, no Diário
ao futebol. Ele preferiu dar bola para o gado a um bom vinho e um bate-papo do Comércio, de Belo Horizonte.
aprendizado de línguas – aos 9 anos de com a mulher, com quem conversava Durante a maior parte de sua vida, o
idade, garantiu à Encontro, escrevera um olhando, da varanda da casa de quatro professor pertenceu à irmandade ma-
pequeno dicionário de grego. Por isso andares, o belo panorama que se des- çônica – o edifício-sede da maçonaria
não teve maiores problemas para se tor- cortina Serra do Rola-Moça abaixo. Ao al- em Belo Horizonte foi construído
nar fluente nesta língua e em inglês, moço se seguia uma sesta, que ninguém tendo-o como Grão-Mestre, o que
francês, italiano, latim e alemão. é de ferro. “Não fosse assim eu não daria muito o orgulhava. Por causa também
Tampouco para escrever 158 livros – conta”, disse Lopes de Sá, sem se queixar. dessa atividade, Lopes de Sá, que nunca
seu Dicionário de Contabilidade, de 1950, É que ele era consultor do Ministério foi de se omitir em nada, andou metido
é um best seller: vendeu, segundo ele, da Defesa, para quem verificava, com ri- em política. “Nos idos de 1964, as pri-
50 mil exemplares no país e foi tradu- gor ímpar, as contas das Oscips ligadas meiras reuniões de oficiais generais e
zido para vários outros, além de merecer ao ministério. Vale, Gerdau, Bradesco, civis, que acabaram resultando na dita-
citações de inúmeros autores de todo o Visa, Shell e uma penca de outras gran- dura militar e nos anos de chumbo, fo-
mundo. Por isso, até hoje qualquer es- des empresas o mantinham ocupado ram feitas em minha casa. Eu me arre-
tudante de contabilidade se forma nos como perito contábil. Por isso, pelas pendi amargamente de ter participado
clássicos contábeis escritos por Lopes de mãos de Lopes de Sá passavam grossas disso”, penitenciava-se. Amém. T
Encontro | 7
8. entrevista Antônio Lopes de Sá
Fotos: Cláudio Cunha
Deca Furtado
“O Estado invadiu
o domicílio”
Considerado a maior autoridade em contabilidade do país,
professor Lopes de Sá critica ânsia fiscalista do governo
e a adoção de normas “americanas” de auditoria
8 |Encontro
9. P
ouco antes de mor-
rer, Antônio Lopes de Sá con-
cedeu esta entrevista em Com as normas
que aplaude a criação da americanas de auditoria,
Nota Fiscal Eletrônica (NF-e),
as empresas vão se
rejeita o Sped, Sistema Pú-
blico de Escrituração Digital e as nor- valorizar artificialmente
mas internacionais de auditoria, clama na bolsa”
por reforma tributária, prevê maus dias
para os escritórios contábeis e critica o
ensino de contabilidade. Leia os princi- na década de 1970 pelo Senado ameri-
pais trechos. cano, que abriu um inquérito graças às
revelações de um livro escrito pelo pro-
ENCONTRO – O que o senhor tem contra as nor- fessor Abraham Briloff, da Universi-
mas americanas de auditoria? dade de Nova Iorque. O inquérito
LOPES DE SÁ – Não tendo empresa de au- rendeu mais de 1.700 páginas. Chegou-
ditoria, meu interesse é indireto. Mas se à conclusão de que o instituto ame-
veja, sou brasileiro e líder intelectual. ricano dos contadores, o Fasb,
Legiões de contabilistas se formaram dominado pelas forças das transnacio-
nos meus livros, reeditados já há 50 ENCONTRO – Com todo o aparato tecnológico hoje nais de auditoria, estas por sua vez do-
anos. Não existia, por exemplo, livro existente, como se explica isso? minadas pelas forças econômicas,
brasileiro sobre auditoria. Eu escrevi o LOPES DE SÁ – Graças aos auditores ame- faziam as normas ao jeito delas.
primeiro. Eu poderia, com a idade e ricanos. Eles são coniventes. Veja o
com a situação econômica que tenho, fundo Madoff, a maior corrente da ENCONTRO – E então?
ficar quietinho. Que é que eu tenho (in)felicidade do mundo, pois causou LOPES DE SÁ – As oito maiores auditorias
com isso? Mas estou botando a boca no prejuízos de incontáveis bilhões de dó- da época, hoje reduzidas a quatro, as
trombone mesmo sabendo que remo lares. Ele era auditado! E muitos de seus big four (NR: KPMG, PriceWaterhouse-
contra a maré. Ela é poderosa, pois in- fundos, que eram seus acionistas, tam- Coopers, Deloitte Touche Tohmatsu e
clui os bancos. Eu não tenho por que bém. Quando arguidas na justiça, as Ernst Young), fizeram novas normas e
ter medo disso. Então, estou denun- auditorias disseram: “Seguimos as nor- continuam usando o Fasb para atender
ciando, porque meio século com prefe- mas”. Ora, quem fez as normas, a partir aos seus particulares interesses. O jogo
rência do mercado quer dizer alguma de 1929, foram elas. A finalidade era da mentira seguiu acobertado pela im-
coisa, penso eu. É um atestado de lide- tornar os balanços iguais, padronizados prensa americana. Ela mente. Mente
rança. Ela me dá responsabilidades éti- e seguidores de determinados princí- poderosamente, dizendo que é uma
cas e eu morreria intranquilo caso não pios. Até aí, tudo bem. Acontece que as maravilha, porque o dinheiro corre
denunciasse estas normas. forças econômicas presentes nas bolsas atrás disso. E o nosso governo, que tem
têm seus interesses. São os bancos e elementos das transnacionais entre os
ENCONTRO – O que há de errado com elas? seus fundos de investimentos. Eles são seus quadros, cuida da adoção dessa
LOPES DE SÁ – Elas favorecem o engodo acionistas das empresas; reservam o patifaria entre nós.
contábil. Porém, é preciso explicar que filé para si e o osso ao pequeno acio-
há uma guerra pelo mercado mundial nista. ENCONTRO – Mas as normas são as mesmíssimas?
de auditoria. Algumas poucas e pode- LOPES DE SÁ – Os interessados dizem que
rosas auditorias americanas querem ENCONTRO – É por isso que, nas comemorações dos as normas são da inglesa Iasb ( Interna-
dominá-lo em nível mundial, por meio balanços, eles sempre erguem um brinde “aos nos- tional Account Standards Board). A Iasb
da formação de um oligopólio. As nor- sos acionistas”? é o próprio Fasb, uma vez que na es-
mas servem de armas. Vale lembrar LOPES DE SÁ – (Rindo). Claro. Como a in- sência suas normas são as mesmas. “Eu
que, no crash de 1929, houve um calote formação é muito importante, era pre- estou brigando com você”, dizem pelos
das empresas com ações listadas na ciso produzir informações que davam jornais. Só pra inglês ver: as normas são
bolsa de Nova Iorque. Elas enganaram grandes lucros ou grandes perdas, por- as mesmas, a convivência é perfeita.
os aplicadores apresentando balanços que na grande perda os bancos com- Quem preside a Iasb é um dos sócios da
favoráveis quando, na verdade, esta- pravam, mas já sabendo que havia um KPMG, uma das big four. Meu Deus, é
vam rotas. Era tudo uma miragem, os lucro embutido. No outro ano havia tudo tão evidente!
balanços estavam maquiados. E, não grande lucro? Todos corriam para com-
podemos esquecer, a crise econômica prar. Eles vendiam e assim, entre 1929 e ENCONTRO – Que perigos corremos com a adoção?
mundial de agora é semelhante àquela. 1970, nunca perderam. LOPES DE SÁ – Aqui poderá ser pior, pois
Só que, em 2008, bancos e fundos de os fundos de pensão das estatais estão
pensão é que mais fajutaram suas de- ENCONTRO – E isso continua? na bolsa e serão contaminados. As em-
monstrações contábeis. LOPES DE SÁ – Esse conluio foi estourado presas já mostram lucros fantasiosos
Encontro | 9
10. entrevista
porque, pelas normas americanas, se uma crise produzida por nós mesmos. pra, a que preço, como vende. Então,
hipervaloriza o intangível, o fundo de Enfim, não há vantagem na adoção das isso é grave, pois acaba com os segre-
comércio. Há uma maneira técnica de normas. “A vantagem é a economia glo- dos. A Coca-Cola, por exemplo. A fór-
calculá-lo, como demonstro em meu balizada”, dizem. Mas nós não temos mula do refrigerante é um segredo
livro Fundo de Comércio. Porém, depois quase nada no mercado internacional! industrial. Ora, sabendo as quantida-
de dizerem, em 27 páginas, pode isso, des, pode-se deduzir a fórmula.
não pode aquilo, as normas que estão ENCONTRO – Mas, porque o mercado aceita, se
impondo dizem: “Salvo se não houver isso é uma coisa de futuro? ENCONTRO – Mas o Leão não tem computado-
outro critério eleito pela empresa”. É ri- LOPES DE SÁ – Esta é a pergunta e eu até res supervigiados?
sível, pois os valores a serem lançados escrevi, recentemente, um artigo cujo LOPES DE SÁ – A despeito de toda a segu-
no balanço passam a ser os de mercado. título é: “O balanço é de futuro ou de rança oferecida pela Receita Federal,
Na prática, os que a empresa quiser. presente”? O balanço não é uma foto- quem pode garantir o não vazamento
Geralmente, elas lançam valores pelo grafia do presente? Ou quando eu poso em 100%?
que se poderia vender. para uma fotografia você está me foto-
grafando aos 98 anos? Isso é tão irra- ENCONTRO – O Sped fornece muitas informa-
ENCONTRO – Mas isso não é só uma probabili- cional que chega a ser risível. O pior é ções. Elas não podem ser usadas para melhorar
dade? que a CVM, o Banco Central, o Conselho a gestão?
LOPES DE SÁ – Não. Na crise americana, o Federal de Contrabilidade, nos obrigam LOPES DE SÁ – O Sped como um todo, não.
sujeito comprava uma casa de 2 mi- a seguir uma patifaria dessas. Que hou- A nota eletrônica, sim. Tanto o Sped
lhões de dólares, com 40 anos de prazo. vesse normas. Eu não sou contra isso. quanto as normas não servem para ad-
E o banco financiador nem queria Mas facultativas. Do tipo “eu te aconse- ministrar. A contabilidade gerencial é
saber de verificar a capacidade de pa- lho a fazer isso”. Mas não obrigatórias. E muito específica. É a própria empresa
gamento. Ele se embriagava com os a consciência profissional? A ética? que vai determinar realmente o que in-
juros, que elevavam o total a 5 milhões. teressa, porque cada uma é um uni-
O banco então emitia um título, rela- ENCONTRO – O que o senhor diz da Nota Fiscal verso. O Sped é mais um custo Brasil,
tivo à probabilidade do lucro – chama- Eletrônica, a NF-e? um complicador a aumentar a buro-
se derivativo. Ou seja, em cima do LOPES DE SÁ – Boa ideia. Ela poupa mi- cracia. Para piorar isso, o Sped introduz
poderia. A seguir, o comprador do tí- lhares de árvores e evita aquele pro- nova exigência, o livro de controle da
tulo lançava no balanço como futuro cesso enorme que travava tudo, o de produção. Nele se declara tudo: com-
de lucro, mais valorizado ainda. E ven- obter talão para emitir nota fiscal, pois pras, produção, vendas, estoque... No
dia a outro. Essa corrente da felicidade pedida a autorização, está dada. Isso mundo existe paralelo para a NF-e.
estourou porque veio a crise e o com- melhorou muito, muito mesmo. Para o Sped, não. Ele é pior do que o re-
prador do imóvel se tornou inadim- gime de Stalin.
plente. No Brasil poderá ocorrer o ENCONTRO – E do Sped?
mesmo. As empresas vão se valorizar LOPES DE SÁ – Como todo sistema, tem ENCONTRO – O senhor vê alguma alternativa?
artificialmente e levantarão dinheiro prós e contras. Se a intenção era acabar LOPES DE SÁ – Há como escapar a ele:
nas bolsas. Espertalhões se aproveita- com a sonegação, a NF-e bastava. Eu basta constituir uma nova firma e nela
rão para fazer dinheiro às custas de po- vejo no Sped um grave demérito: o optar pelo lucro arbitrado. Neste re-
bres otários. Mais adiante, teremos princípio constitucional da privacidade gime não há escrita, o Sped é só para
garante o sigilo fiscal e contábil das aquelas empresas que declaram pelo
pessoas. E empresas são pessoas jurídi- lucro real. Em troca, a empresa se sujei-
cas. Com o Sped, o Estado armou um tará a uma taxação maior.
Big Brother fiscal e invadiu o domicílio.
Imagine uma indústria qualquer. Uma ENCONTRO – Mas o Governo quer o Sped para
concorrente, por vazamento, pode ficar todas as empresas...
sabendo onde ela compra, o que com- LOPES DE SÁ – É o caso de entrar no Judi-
ciário. Nenhuma empresa entrou;
todas têm medo do aparato da re-
pressão fiscal. A Receita Federal fez
acordo com a Previdência e com ou-
Dá para escapar tros ministérios para cruzar as infor-
mações. Fez até com a Agência
do Sped. Basta abrir uma Brasileira de Informações, a Abin.
nova empresa e optar pelo Virou policialesca. Mas é preciso en-
regime do lucro arbitrado. trar, sim.
Só que a taxação é maior” ENCONTRO – Com o Sped, como vão ficar as nor-
mas de auditoria?
10 |Encontro
11. ENCONTRO – Tendo em vista o Sped, o que o se-
Golbery previu nhor aconselha aos donos dos escritórios de con-
que o Brasil ia cair tabilidade?
LOPES DE SÁ – Eles vão ter de arrumar
nas mãos de grupos. um bom sistema, um bom apoio de
Acertou em cheio” eletrônica, e treinar o pessoal para
saber utilizar o Sped, pois o sistema
pode gerar prejuízos, já que basta di-
para a CVM, acionistas, Receita Federal gitar errado para gerar uma multa.
e secretarias da fazenda dos estados. Não é à toa que, nos encontros seto-
Agora terá de fazer também para o riais, ou nos congressos de contabilis-
Sped federal e o estadual. tas, vejo estandes das companhias de
seguro. Elas já descobriram mais um
ENCONTRO – A diminuição do número de im- filão lucrativo. Pensando bem, devem
postos não aliviaria a carga dos escritórios con- mesmo constituir um seguro de res-
tábeis? ponsabilidade civil, porque com o
LOPES DE SÁ – Com certeza. O grosso da Sped aumentará a probabilidade de
receita do país é produzido por um erros e omissões e o governo está pe-
LOPES DE SÁ – Piora para todo mundo. As número bem pequeno de empresas. dindo mais do que os escritórios
normas levam ao mascaramento da São as indústrias, o grande atacado, o podem dar. Agora, eu estou vendo
realidade e atingem tanto o investidor grande varejo e as grandes prestado- pouca gente se mexendo. Muitos es-
quanto o governo. Vai haver problema ras de serviços. Se o fisco as controla, critórios estão ignorando o sistema. É
tanto na área fazendária como na bolsa. pode muito bem deixar de lado o um grave erro: ele veio para ficar.
A Receita poderia fazer o Sped de dois resto. Como não fazem assim, tiram a
jeitos, com ou sem normas. Mas, se capacidade de iniciativa de todo o ENCONTRO – Os contadores estão muito aco-
fizer pelas normas, a empresa pode mundo. Uma vez, na década de 1950, modados diante ao Sped?
apresentar um prejuízo que não teve. fui contratado pela prefeitura do Re- LOPES DE SÁ – Receio que muitos dos
Então, não pagará imposto. Caberá à cife para simplificar seus impostos. mais de 60 mil escritórios de contabi-
Receita descobrir a manipulação. Havia dezenas. Um deles não cobria o lidade brasileiros venham a quebrar.
custo de arrecadação. Reduzi-os a A tendência daqui pra frente, caso
ENCONTRO – E como reverter tudo isso? menos de 10 e a arrecadação subiu. estas exigências não sejam afrouxa-
LOPES DE SÁ – Só com outro Estado. O Por isso posso dizer de cátedra que das, é da sobrevivência apenas dos
nosso é totalitário; a democracia é apa- seria muito interessante para todos grandes escritórios. Haverá concen-
rente. Depois dos militares, quem caso o governo instituísse poucos im- tração e os pequenos terão de se fun-
tomou conta do poder foram grupos. postos. Uns três ou quatro seriam su- dir sob pena de seus donos terem de
Golbery [NR: o general Golbery do ficientes. Isso simplificaria muito o se empregar. Estou muito admirado
Couto e Silva, todo-poderoso ministro sistema e baixaria o custo. Mas alega- com o silêncio dos órgãos de classe,
do Governo Geisel e criador do SNI-Ser- se que a variedade dos impostos como os conselhos regionais de con-
viço Nacional de Informações, por ele ajuda a fazer a política econômica. tabilidade e os sindicatos, que têm
mesmo reconhecido como “um mons- Com mais impostos, o governo pode verbas enormes das contribuições
tro”] previu isso. Ele tinha seus defeitos, incentivar isso, desincentivar aquilo, obrigatórias e nada fazem.
mas via longe; por isso acertou na pre- etc. Acho completamente desnecessá-
visão. Desde Sarney é assim. ‘Eu te dou rio. ENCONTRO – O que o senhor acha do atual en-
esse ministério e você vota isso pra sino da contabilidade?
mim’. É o “dando que se recebe”, feito ENCONTRO – Não deveríamos nos espelhar em LOPES DE SÁ – Para mim comete-se um
para preservar o poder. algum outro país? Ou sermos criativos e instituir crime de lesa-pátria contra os estudan-
o imposto único, uma nova CPMF com alíquota tes ao se supervalorizar a parte instru-
ENCONTRO – O que o senhor diz da nossa legis- maior? mental e fiscal em detrimento da
lação fiscal? LOPES DE SÁ – Não há país que adote um filosófica. Contabilidade, hoje, é uma
LOPES DE SÁ – Outro problema que se único imposto. Mas os Estados Unidos, ciência e não apenas o levantamento
soma aos demais. Temos uma legis- por exemplo, têm o income tax. Por ele, da informação. Ela estuda as relações
morragia, pois há duas modificações quando compra gasolina, o consumi- do movimento da riqueza. Do jeito que
tributárias por hora no Brasil. Isso en- dor paga todos os impostos, cabendo à vai, vamos produzir apenas apertado-
doidece qualquer contador e não é à União tirar a sua parte e repassar a dos res de parafusos para os escritórios
toa que sua carga de trabalho só au- estados e municípios. Quer dizer, se tri- contábeis, pois as faculdades não estão
menta. Ele já tinha de preparar de- butar na fonte, principalmente na in- ensinando a pensar, só a ler. Delas só
monstrações contábeis diferenciadas dústria, o problema estará resolvido. saem robôs. Esse é o crime. T
Encontro | 11
12. artigo
Professor Roberto Dias Duarte
Seus tesouros
estão protegidos?
Passados mais de 10 anos da histeria causada pelo ‘Bug do software pirata era apenas para empresas grandes, mas agora
Milênio’, quando praticamente nada aconteceu com o fun- o assunto vale para milhões organizações menores espalhadas
cionamento dos sistemas, agora nossas empresas enfrentam pelo país.
processo mais grave. Assim, a legalização de softwares é fundamental para evi-
A implantação do Sistema Público de Escrituração Digital tar que dados sigilosos sejam enviados para outros locais,
(Sped) e da Nota Fiscal Eletrônica (NF-e) pode não ter o mesmo caindo até mesmo nas redes sociais. O uso de programas pi-
efeito psicológico do Bug, mas causará enorme impacto na eco- ratas torna as empresas extremamente vulneráveis.
nomia. E é aí que mora o perigo. Todos precisam pensar, mais do que nunca, em um modelo
É isso mesmo, pois além do atraso nessa nova etapa, de gestão confiável para as informações que trafegam. Hoje,
com milhares de empresas obrigadas a emitir a NF-e ainda muitos já utilizam sistemas hospedados em datacenter para
ausentes do sistema e com isso atuando ilegalmente , mui- prover serviços tecnológicos e contábeis. É um outsourcing
tos ainda desconhecem vários aspectos delicados dessa ques- completo. Mas isso não basta.
tão. Trata-se, sem dúvida, de uma bomba de efeito retar- A preocupação número um deve ser o software para auxi-
dado, que explodirá num futuro bem próximo. O Bug do liar na gestão da empresa que tenha também a capacidade de
Milênio perto desse problema tecnológico não passa de um compartilhar conhecimento armazenado na NF-e a seus clien-
estalinho de criança, acredite. tes, fornecedores, contadores, transportadores e fisco.
O Sped e a NF-e estão obrigando o mercado a rever alguns Esse é o grande desafio das empresas que entraram no sé-
conceitos sobre segurança da informação. Na verdade, é a culo XXI, em sua grande maioria, ainda com a mentalidade de
maior transformação empresarial – nunca vista antes neste Era Industrial, embora estejamos todos-querendo ou não; sa-
país -, na qual até as micros, pequenas e médias empresas te- bendo ou ignorando – participando intensamente da Era do
rão de aderir a padrões de gestão e tecnologia tão eficientes Conhecimento.
quanto as de grandes corporações. Há muito se fala em alinhamento estratégico da tec-
Esse, certamente, é um dos maiores desafios: integrar a nologia. Mas são raras e honrosas as exceções que conse-
cadeia produtiva tecnologicamente, de tal modo que a trans- guem entender o caráter inovador e humano disso tudo.
missão, a recepção pelo cliente e a guarda do documento ele- Chegou a hora de massificar o uso da tecnologia a favor
trônico não sofram danos de qualquer espécie. dos negócios e saber que são as pessoas que a fazem de fato
Para se ter uma ideia, existe atualmente um comércio clan- funcionar. Isto dá um enorme trabalho, porque implica sair
destino de notas fiscais em papel, no qual se chega a pagar 50 da zona de conforto, uma vez que atender esse mercado tão
reais por folha. E com a NF-e, quanto vai custar um CD de da- grande e diferente do usual não é uma tarefa nada fácil,
dos circulando de forma marginal no mercado? convenhamos. Mas, como diz o ditado: “Sucesso só vem an-
Há pouco tempo, falar de segurança da informação ou de tes do trabalho no dicionário”. Não é?
Professor Roberto Dias Duarte, diretor da Mastermaq e coordenador acadêmico da ENC
Escola de Negócios Contábeis, de São Paulo (SP)
Blog: www.robertodiasduarte.com.br
12 |Encontro
13. tecnologia
Jean Michel Freire e Marilia Sodatelli Britto
Sócia-diretora da Assecont, Arlete
Rodrigues: Buscamos inovalções
constantes através da tecnologia
A contabilidade
no contexto da
era digital
Uso das novas tecnologias facilita comunicação
entre a prestação da contabilidade e os clientes
A contabilidade está se digitalizando, das notas, cadastro completo de clien-
e quem não está acompanhando este tes e serviços e o recebimento automá-
ritmo, seja por resistência ou descrença, tico dos dados de confirmação da nota
está ficando para trás. Conversando com por e-mail”. Outra grande vantagem ci-
a contabilista e sócia-diretora da Asse- tada é a integração que o NFS-e Web
cont Assessoria Contábil, Arlete Ferreira proporciona, realizando a importação
Rodrigues, este novo cenário se torna de dados da nota emitida diretamente
claro. para o NGFiscal/MasterFiscal e conse-
Para ela, as novas formas digitais de quentemente para o NGContábil/Mas-
fiscalização reforçam a necessidade de terContábil. Este processo de importa-
aperfeiçoamento das rotinas contábeis e ção e conferência de dados é muito
estreitamento no relacionamento com o mais rápido e seguro nos sistemas da
cliente, que está ficando cada vez mais Mastermaq do que no público, em que
virtual através da troca de arquivos digi- as notas devem ser digitadas uma a
tais. uma, conclui Arlete.
Arlete encontrou vantagens nos soft- A Assecont oferece diferenciais a seus
wares da Mastermaq que facilitam o re- clientes, buscando inovações constantes
lacionamento com seus clientes e o através da tecnologia. Em seu site (www.as-
atendimento às novas obrigatoriedades secont.cnt.br), o escritório promove infor-
da legislação, como a nota fiscal eletrô- mações relevantes com envio de informa-
nica mercantil (NF-e) e a de serviços tivos periódicos, além de muitos outros
(NFS-e). recursos, tais como remessa de relatórios e
Dentre as vantagens de se utilizar o folhas de pagamento, otimizando os ser-
NFS-e Web, solução da Mastermaq para viços prestados aos clientes. A Assecont
NFS-e, ao invés do software público, a aderiu à tecnologia e essa escolha fez com
contabilista destaca o “menor volume que se tornasse uma empresa consolidada
de erro, maior segurança na retenção no mercado. T
14. capa
Deca Furtado
Big Brother Se você não sabe o que significa Sped, é bom
Fiscal ir se acostumando. O novo sistema de controle
fiscal e contábil do governo pode mudar a vida
de sua empresa – e a sua também
Há anos a sociedade brasileira so-
nha com a eliminação de um cancro
Lemos de Avellar Machado, superin-
tendente da Receita Federal em Mi-
que corrói a economia, a sonegação nas.
de impostos, estimada em um terço Desenvolvido de modo integrado
do PIB. Com o Sistema Público de Es- pela Receita Federal, estados, entes re-
crituração Digital, o Sped, baseado na guladores, e, principalmente, os pró-
Nota Fiscal Eletrônica, a NF-e, a utopia prios contribuintes (como ressalta a
ficou mais próxima. “O Sped dificul- Receita Federal), o Sped, que obriga as
tará muito a sonegação”, diz Hermano empresas a enviar suas demonstra-
14 |Encontro
15. ções contábeis e fiscais mensalmente butária. O fisco pegará isso on line,
para o fisco, por meios eletrônicos, pelo CPF do prestador de serviços. A
permitindo assim um controle muito saída é este cidadão se tornar micro-
mais efetivo, abre ótimas perspecti- empreendedor individual, o que será
vas: o número de sanguessugas da na- bom para a Previdência. Por sinal, já
ção vai diminuir e a arrecadação su- tem indústria pagando a contribuição
birá nos níveis federal, estadual e mensal para o vidraceiro e colocando
municipal. seu contador à disposição dele.
“O Sped induzirá à concorrência O sistema é ainda um suporte para
justa e promoverá, de uma forma que acabar com a guerra fiscal interesta-
o fisco não poderá controlar, a desbu- dual e fazer as reformas fiscal e tribu-
rocratização tributária, além de redu- tária. “Isso também é Custo Brasil, pois
zir o custo da arrecadação”, prevê Luiz é o contribuinte quem paga”, diz Pe-
Alberto Noronha, gerente de planeja- dro Meneguetti, secretário-adjunto de
mento tributário da Usiminas, pio- Fazenda de Minas Gerais. “Logo
neira na emissão de NF-e no país. adiante o governo poderá devolver à
É verdade, o Sped traz benefícios. população os ganhos que obtiver
Haverá ganhos ecológicos por causa agora”, acrescenta. Talvez, quem sabe,
da economia com papel. Outro: a dis- isso virá na forma de redução de im-
pensa dos livros fiscais em papel e em postos. Bom, muito bom mesmo!
breve de arquivos eletrônicos hoje já Contudo, além de aumentar os pre-
exigidos. Outros mais: o Sped traz ços – a sonegação os mantêm artifi-
simplificação, racionalização e padro- cialmente mais baixos –, para empre-
nização das informações. sários, contabilistas e tributaristas o
Adicionalmente, a informalidade Sped é um Big Brother Fiscal desne-
diminuirá. Era comum, por exemplo, cessário, já que a NF-e daria conta de
Secretário-adjunto de Fazenda
a indústria vender diretamente ao vi- acabar com a sonegação. “Nada foi Pedro Meneguetti: “Governo
draceiro, um crime contra a ordem tri- feito de supetão. Preparamos os con- devolverá ganhos”
tribuintes bem antes”, rebate Osvaldo
Scavazza, gerente do projeto de NF-e Geraldo Goulart
da Secretaria de Fazenda de Minas, a mais modernas ferramentas para su-
Sefaz-MG. Meneguetti acrescenta: “As portar a inteligência fiscal. “Há muitos
empresas que querem crescer têm de anos profissionais extremamente
agir de maneira legal”. competentes vêm planejando a inser-
O problema é o grande apetite, a ção das entidades fiscais no contexto
incontrolável sede do fisco por con- da Sociedade do Conhecimento, com
trole – leia-se poder (veja o quadro). A objetivo de aumentar absurdamente a
fim de devassar tudo, o Estado brasi- eficiência fiscalizatória em nosso país.
leiro quer ser onisciente e onipre- A fórmula mágica: muito investi-
sente. E está a um clique da meta, pois mento em hardware, software e na
as autoridades estão utilizando as capacitação de pessoas”, afirma Ro-
O SPED JÁ PEGOU
NF-e autorizadas e valor (acumulado até a data)
Maio de 2010
Quantidade: 1.034.298.374
Total em R$: 38.933.803.953.162,54
Setembro de 2009
Quantidade: 351.297.709
R$: 5.461.590.988.601,82
Julho de 2009
Quantidade: 265.672.732
R$: 4.853.105.827.601,24
Abril de 2009
Quantidade: 145.630.826
R$: 2.174.877.500.079,14
Encontro | 15
16. capa
berto Dias Duarte, especialista em im- instituir um Sped mineiro. Trata-se do roubos de cargas e veículos. Quando o
plantação de NF-e. livro eletrônico de inventário. O deta- Brasil ID estiver operacional, para fe-
O Leão já tem hardware, software, lhe é que ele agora é contabilizado não char de vez as porteiras da sonegação
gente. O que ele ainda não tem – mas mais pelo valor final, mas pela quanti- já estará funcionando o CET-Conheci-
terá em breve – é banco de dados. “Po- dade física. Verificar se o estoque bate mento Eletrônico de Transporte, a NF-
dendo comparar uma empresa com com as compras e vendas vai virar e do setor.
outra, e ela consigo mesma ao longo brincadeira de criança. Por sua vez, o CET encontrará várias
do tempo, ele terá a média. Tendo mé- Em nível federal, o Leão prepara novidades já em desenvolvimento em
dias, terá tudo”, diz Roberto. dois complementos para breve. Um é Minas. “Nossa tecnologia vinha desde
Para ele, o Big Brother levará as empre- o projeto Brasil ID. Com ele, nenhuma a década de 1980, quando tínhamos
sas a adotar a mesma fórmula mágica. As transação escapará dos olhos do muitos postos de fronteira e um anel
organizações terão de encarar os valores e Grande Irmão: as mercadorias serão em volta de Belo Horizonte, todos fi-
os princípios da Era do Conhecimento ou rastreadas, via satélite e por tags de ra- xos. Acabamos com estes”, diz Gilberto
fechar as portas.“Faça a sua escolha ou o Big diofrequência, da emissão da NF-e até Silva Ramos, superintendente da Se-
Brother escolherá por você”, aconselha o destinatário. faz-MG.
o especialísta. O objetivo do programa é liberar ra- Eles deram lugar a postos volantes
Neste sentido, em Minas, a Sefaz já pidamente as cargas nos postos fiscais equipados com leitores ópticos e ou-
deu mais uma volta no parafuso ao e, ainda, combater fraudes, bem como tros sistemas que leem a NF-e de
forma dinâmica. O CET vai agilizar isso,
pois os dados serão jogados num sis-
tema de controle de carga em trânsito.
Ele conterá o cadastro do contribuinte.
O MÉDICO E O MONSTRO, DOIS LADOS DO NOVO SISTEMA Se o histórico for ruim, o destinatário
sofrerá fiscalização desde que a NF-e
O Sped tem um lado Dr. Jekyll, mar um cafezinho o consumidor terá for emitida. “Todo o processo será apri-
criação de Robert Louis Stevenson de apresentar o CPF; todos os docu- morado”, revela Ramos.
em O estranho caso do Dr. Jekyll e do mentos (passaporte, CPF, carteiras de Os novos sistemas exigirão menos
Sr. Hyde, popularizada como O Mé- identidade e de habilitação) foram uni- investimentos que o Sped (64 servido-
dico e o Monstro. É o dos benefícios ficados num único; as movimentações res são empregados pelo Leão federal.
à sociedade, como o ecológico – o dos contribuintes já são informadas A capacidade de armazenamento gira
não uso das notas fiscais vai preser- ao Leão por empregadores, bancos, em torno de 150 terabytes de disco rá-
var milhares de árvores. Mas Mr. cartões de crédito, Detran e cartórios. pido e 120 TB de conteúdo fixo). Na
Hyde também está presente. O “Em 2011, se quiser, a Receita fará a sua sua implantação, os fiscos federal, es-
Sped é o Big Brother total, tal como declaração de IR e a enviará para a sua tadual e municipal investiram cente-
previsto por Orwell no romance conferência e assinatura”, diz Vieira. nas de milhões de dólares em hard-
1984. “Atrás do Sped tem coisa”, ad- De acordo ainda com Vieira, poucos ware, software e capacitação – só na
verte o advogado Geraldo Vieira, perceberam a ação orquestrada do Es- Receita Federal terão sido 157 milhões
presidente do grupo GV, de Belo Ho- tado, que aprimorou a legislação. O fis- de reais até o final de 2010. O investi-
rizonte. cal da prefeitura, por convênio, pode mento em grande escala só vai parar
Para ele, o Estado brasileiro dourou atuar como um posto avançado do go- em 2012, pois até lá mais de 1 milhão
a pílula do Sped. Os indícios: em São verno federal, que assim multiplicou de empresas vai migrar para as NF-e,
Paulo, a partir de janeiro, até para to- sua força-tarefa. O Ministério Público uma inestimável contribuição do
virou cobrador de impostos. Agora, se Chile, que a inventou, a todo o mundo.
o sonegador não paga, o dinheiro pode Foi graças à brilhante concepção da
ser sacado da sua conta. “E não pagar NF-e que o fisco centuplicou a capaci-
Geraldo Vieira: impostos dá cadeia. O empresário dade de fiscalizar, já que, entre outras
”Atrás do Sped deve temer, pois se fornecer sem nota, coisas o comprador é forçado a vigiar
tem coisa” o governo o junta ao comprador. De- o fornecedor. “O sonegador – por erro
pois, ele pega dois consumidores e ou má-fé –, se torna um exportador
acusa a todos de formação de quadri- de vírus fiscal”, diz Roberto. “O vírus
lha, um agravante que aumenta a infecta a escrita fiscal e contábil de
pena”. Deu mais de cinco anos? É re- quem compra, pois a NF-e permeia to-
clusão, sem direito a liberdade vigiada. dos os processos. Resultado: empresas
“Acabar com o Estado-vigia será muito com experiência já compram somente
difícil; só com representantes com- de quem emite de forma correta”.
prometidos com uma mudança que Duas medições dizem que a NF-e já
preserve os interesses da sociedade deu certo. Uma é o número de empre-
e os do governo”. sas emitentes. A outra é o número de
Eugênio Gurgel
17. COM O BRASIL ID, O GRANDE IRMÃO VIGIARÁ TUDO
Conectados a satélites de GPS, carga e caminhão
estarão seguros. Mas desde a saída da fábrica
até a entrega estarão também sob os olhos
vigilantes do Grande Irmão
Tags (chips de radiofrequência)
colocados nos produtos e em outros
locais serão embarcados nos
caminhões. Nos postos fiscais, a
conferência será quase como o sem
parar dos pedágios
NF-e emitidas (veja o gráfico). Mas a
melhor prova, talvez, é a arrecadação.
Enquanto o PIB brasileiro cresceu 9% O CERCO AO SONEGADOR
no primeiro trimestre, a arrecadação
federal subiu 15% mesmo com IPI re- Por causa do Sped, em cinco anos ras. Ele pegava uma nota com alí-
duzido para veículos e outros produ- o Brasil estará na liderança do com- quota errada a cada milhão emitido.
tos. Em Minas, onde 45% da arrecada- bate à sonegação na América Latina. E sempre se podia alegar erro. “Com a
ção já é feita em cima da NF-e (a Em 10 anos, estará pari passu com os NF-E, não. O Leão pode fiscalizar to-
previsão é de 92% em 2011), o cresci- países desenvolvidos no combate à das. E ele é mais esperto do que todos
mento foi parecido. “Ainda não esta- sonegação. No sistema, o cerco à so- os contribuintes juntos, além de ter
mos autuando por meio do Sped, uma negação começa antes mesmo da mais aparato”, adverte Roberto Dias
vez que só o primeiro módulo dele emissão da NF-e, pois a venda tem Duarte, guru da NF-e.
está pronto”, revela Ramos. de ser autorizada, via internet, pela A fiscalização na NF-e é só a pri-
Por enquanto, entre os mais de 10 Secretaria de Fazenda. Ou seja, a mer- meira instância. Se ela estiver ok, vem
milhões de empresas do país, só estão cadoria nem circulou e o fisco já sabe a segunda, via Sped fiscal e contábil.
obrigadas a emitir NF-e e enviar os da- da transação. Cruzando as informações fiscais e
dos as que declaram pelo regime de Ademais, na NF-e errar é proibido; contábeis com os dados da NF-e, o
lucro real. O governo escolheu as pri- basta digitar errado e lá vem multa. governo tem como saber tudo sobre
meiras levas a dedo: indústrias, ataca- Fora isso, 0 NCM, um código comum as empresas. E ele vai “bater o caixa”.
distas-distribuidores e grandes vare- ao Mercosul (cada mercadoria tem o Para tanto, irá verificar a exatidão de
jistas – até o final de 2010, todas elas seu) dedura o sonegador. Cruzando todos os itens das declarações, bem
estarão obrigadas (veja, no site da Se- as informações de compra e venda como sua consistência. Ou seja, o es-
faz-MG, se a sua empresa já deveria es- fornecidas pelo NCM com as de esto- toque terá de estar em conformidade
tar emitindo NF-e. O desconhecimento que e outras, o fisco desmascara a com as compras e as vendas.
custará multa elevada). maioria das falcatruas. Assim, quem
Porém, a partir de dezembro, toda comprar um boi e vender dois cora- Roberto Dias Duarte:
empresa que vender fora do estado de ções do mesmo animal pagará o pato. “O Leão é mais esperto
O fisco ainda lavrou mais um do que todos os
origem, ou vender ao governo por
contribuintes juntos”
meio de licitação, passa também a es- tento porque daqui em diante o peso
tar sujeita. Com isso, na prática, apenas da legislação se fará sentir por inteiro.
o pequeno comércio estará livre do Aspectos antes ignorados, como res-
Grande Irmão. Mas não da fiscaliza- ponsabilidade solidária em qualquer
ção: segundo José Eduardo França problema fiscal ou tributário, vão ga- Cláudio Cunha
Neto, da Sefaz-MG, as vendas delas por nhar nova tonalidade. Ninguém se
cartão de crédito, que antes passavam preocupava com isso porque o
batidas, agora também estão sendo Leão não tinha como fiscali-
monitoradas pelo radar do fisco. Con- zar o universo de
clusão: ninguém escapa. T empresas brasilei-
18. passo a passo
Deca Furtado
O administrador Roberto Dias Duarte: “Antes de passar à NF-e as empresas devem seguir um passo a passo para evitar problemas mais adiante” Fotos: Cláudio Cunha
Na hora de implantar,
todo cuidado é pouco
Processo exige paciência, mas especialista garante: vale a pena investir
A Nota Fiscal Eletrônica, a NF-e, vai O processo de implantação é mais rista diz: ‘Epa, quando eu entregar a
acabar com a nota fiscal em papel dos chato do que o fundo de uma chata. Há mercadoria, vai acontecer isto ou
tipos 1 e 1A, usadas em transações entre minúcias em demasia e por isso ele de- aquilo’. Assim, cada problema levan-
empresas. Até 2012, todas as firmas de mora, em geral, de 1 a 3 meses (veja o tado encontra uma solução”.
algum porte terão de emitir NF-e. Com gráfico). Depende, por exemplo, da “Uma grande marcha se começa
isso, a empresa que baseia seu negócio quantidade de produtos que a empresa pelo primeiro passo”, disse Mao Tsé
em sonegação vai desaparecer. vende. Quanto maior o rol, mais de- Tung. No caso, é a assinatura digital,
De acordo com Roberto Dias Duarte, morado. Se a empresa for muito pe- nada mais do que um algoritmo. Ela é
autor do livro Big Brother Fiscal – O Bra- quena, em poucos dias tudo se resolve. necessária porque a NF-e é um arquivo,
sil na Era do Conhecimento, já na sua Segundo Roberto, a NF-e não diz res- do tipo XML (arquivo-texto), que vira
terceira edição, diante do inevitável peito a uma parte isolada e sim à em- documento após ser assinado e passa a
você deve adotar o quanto antes a NF-e, presa inteira. Ele tem rodado o país a ter validade depois de receber a assina-
pois ela abre uma oportunidade de me- fim de ajudar a implantá-la, mas sem- tura criptografada do presidente da
lhoria da gestão e de corte de custos. pre impõe uma condição: juntar o empresa ou de prepostos.
Há empresas que conseguem o retorno dono da firma e todos os funcionários, Para conseguir essa firma digital re-
em até 15 dias. “Porém, antes de adotar por até 6 horas, para explicar que o pro- conhecida, você, o dono – não pode ser
a NF-e, as empresas devem seguir um cesso permeia a empresa toda e nivelar outra pessoa – não vai a nenhum car-
passo a passo, o que evitará problemas o conhecimento de uma só vez. “Eu co- tório, mas à autoridade certificadora
mais adiante”. meço a explicar e de repente o moto- (Caixa Econômica Federal, Certisign,
18 |Encontro
19. Correios, Prodemge, Serasa/Associação contribuinte, mas não os mínimos de-
Comercial de Minas e Sindicato dos talhes).
Contadores) com documentos pessoais Por isso, escreveu e não leu? Seu ór-
e da empresa. gão mais sensível, o bolso, vai gemer de
Existem três tipos de assinatura di- dor. “Nota preenchida erradamente
gital: a A1 (válida por um ano. É insta- atrairá multas, uma vez que no mundo
lada no computador), a A3 (válida por virtual os erros e acertos se propagam
três anos, pode ser instalada num to- na velocidade do pensamento e não na
kem ou smart card) e a Hsm (destinada do papel. Em milissegundos um fiscal
a grandes empresas). Antes de obter a poderá perceber e multar”, diz Roberto.
assinatura digital, é bom ver –- para Para piorar, o regime fiscal brasileiro
não jogar dinheiro pela janela – qual parece ter copiado o jogo do bicho: nele,
é aceita pelo software da sua empresa. se você não acerta o primeiro prêmio,
“É importantíssimo conversar com o pode ser premiado do primeiro ao
fabricante de software”, aconselha Ro- quinto. Já o fisco tem cinco anos para te
berto. Quando você for ver isso, apro- pegar. Ou seja, em 2015, ela poderá te
veite para definir também questões da multar por um erro cometido em 2010.
política de TI da empresa, do tipo se a Mas, com o sistema configurado,
emissão vai ser hospedada ou se vai ser tudo certinho, você pode começar a
local. Pode-se alugar um data center ou brincar de soltar NF-e. É isso mesmo:
criar ou aproveitar uma estrutura pró- em ambiente de teste, chamado de am-
pria, por exemplo. Por acordo com a Serasa, biente de homologação, a nota é emi-
Bem, você assina em Belo Horizonte na Associação Comercial de Minas tida sem validade jurídica.
se pode obter certificação digital
e tem a validade da assinatura reco- Testado, aprovado, pode-se, enfim,
nhecida, em segundos, no país inteiro. emitir a NF-e? Bingo. Só que, uma vez o
Beleza de tecnologia, né? Pois aí mora para gerar a nota – existem mais de mil documento assinado, ele ainda não é
um perigo. A assinatura eletrônica pode deles, mas poucos são realmente com- uma nota e sim um arquivo que assi-
trazer um monte mais um punhado de pletos (há um software, gratuito, dispo- nado virou documento. Ou seja, ele tem
aporrinhações. nibilizado no site da Receita Federal. a validade jurídica mas não a fiscal. Para
Uma delas: entregue-a, com a senha, Contudo, ele é bem limitado). Outra é ir ser válido, tem-se que, via internet, en-
a um funcionário qualquer e você terá à Secretaria de Estado de Fazenda, a Se- viar para a Sefaz. Ela analisa mais de
dado a ele, salvo se resguardado em pro- faz, e credenciar a empresa a emitir 400 campos e coloca um selo eletrô-
curação, um cheque em branco. “Se o nota fiscal, o que é bem rápido. nico com data, hora, minuto e segundo,
funcionário tem uma procuração ir- Feito o credenciamento, escolhido o nota a nota. Leva apenas alguns segun-
restrita e a senha, ele pode vender a tua software, calma lá, pois ainda restam dos para a Sefaz devolver.
empresa, te casar, te descasar. Pode algumas coisas a fazer antes de expedir Depois disso, a nota é transmitida
tudo”, afirma Roberto. NF-e. Ajustar o cadastro do cliente é pela Sefaz ao Portal Nacional da Nota
É preciso também se precaver contra uma. O CNPJ, a inscrição estadual, o en- Fiscal Eletrônica, da Receita Federal, à
o mercado-negro de notas fiscais. Ele dereço, tudo tem de estar certinho. Sefaz do estado de destino da merca-
existe porque, como você, seu concor- O cadastro de produtos é ainda mais doria e, quando for o caso, para a Su-
rente adora saber preços pagos e prati- importante. Cada um deve ter a alí- frama-Superintendência da Zona
cados pelos rivais, ainda mais se a in- quota, a base de cálculo, enfim, todos os Franca de Manaus, Susepe-Superinten-
formação custa uma merreca -- uns 50 parâmetros contábeis e fiscais corretos. dência de Seguros Privados e o Detran.
reais por documento xerocado. “Com a Configurá-los antes da emissão da nota Ou seja, o Grande Irmão tem ao menos
NF-e, o perigo aumenta”, lembra Ro- é a boa; sem isso será um deus nos 6 pares de olhos bem grandes focados
berto. acuda. “E é o que mais acontece: o fatu- em você – sem contar os incontáveis
Na verdade, mais do que duplica, ramento errado”, afirma Roberto. subolhos dos postos de fiscalização nas
pois segundo pesquisas já realizadas, Assim, errar está proibido. Antes da estradas e os das patrulhas volantes.
em 85% das fraudes eletrônicas quem internet, isso passava batido. A cada mi- Não fique caolho por conta disso. A
tem culpa no cartório são os funcioná- lhão de notas, a Sefaz pegava uma, tal- fila tem de andar: mande transportar
rios. Se aquela moça que parece tão ino- vez duas. Depois da internet, não. A Se- a mercadoria. Porém, a nota é virtual.
fensiva pegar um pen drive e copiar to- faz não deixará de aprovar a emissão Como o transportador vai provar à fis-
dos os arquivos, aquele sigilo mais caso algum desses parâmetros não es- calização que a mercadoria em seu po-
recôndito, que você guardava a sete teja nos conformes; não cabe a ela evi- der está acobertada por documento
chaves, já era. tar erros (a autorização só não será dada fiscal?
As duas providências a seguir são em caso de tentativa de fraude, já que Para resolver esta questão, foi inven-
mais simples e vão ocupar menos a sua os computadores da Sefaz verificam os tado o Danfe-Documento Auxiliar da
atenção. Uma é comprar um software aspectos legais, caso do cadastro do Nota Fiscal Eletrônica, que não tem
Encontro | 19
20. passo a passo
ROTA PERCORRIDA PELA NF-E ATÉ A ENTREGA DA MERCADORIA
Após obter a assinatura digital, credenciar-se na Secretaria de Estado de Fazenda (Sefaz),
escolher o software, cadastrar produtos e clientes, o fornecedor gera a NF-e e a envia para a
Sefaz, que lhe devolve um selo eletrônico de autorização. Fornecedor então emite o Danfe,
documento impresso que acompanha a mercadoria e despacha a carga
validade jurídica, só fiscal. “O Danfe é aceita. Consequentemente, também
uma cópia da NF-e impressa em papel não aceita a emissão de nota em papel
normal, passível de falsificação”, diz no lugar da NF-e. Para resolver o pro-
Roberto. Cabe ao destinatário da mer- blema, foram criados três mecanis-
cadoria digitar o número do Danfe no mos de contingenciamento. A Sefaz
Portal Nacional da NF-e – de imediato colocou seus computadores em ma-
ele mostrará a imagem da nota—e nutenção; a empresa vai deixar de fa-
conferir tudo. turar por causa disso? Não. Ela avisa ao
Um doce para quem imaginou que contribuinte e a autorização para a
mais de 60% das empresas não estão emissão de nota é dada pelo Scan-Sis-
conferindo e correm o risco de com- tema de Contingenciamento de Âm-
prar mercadoria, na prática, sem nota. bito Nacional, sediado em Brasília, e
Ou com dados incorretos. Pela legisla- continua tudo como antes.
ção, quem recebe é solidário. Por isso, é Outra forma de resolver a contin-
muito importante conferir o Danfe,
pois o fisco não manda flores nem
aceita desculpas.
Segundo ainda Roberto, as empre-
sas devem encarar a NF-e como um
projeto empresarial, de gestão. Todos
eles, para darem certo, têm objetivos a
cumprir. No da nota eletrônica, o
maior é o calendário fiscal. Os demais
são subalternos, mas é a partir deles
que se chega ao objetivo maior. “Defi-
nidos os objetivos, tem-se um crono-
grama e um orçamento”. Se a empresa
deseja ter 100% das NF-e emitidas em
até 30 segundos, haverá implicações
seriíssimas, pois ela vai precisar ter
tudo redundante: links de internet,
computadores, softwares e centros de
emissão. Isso porque, se a empresa
emite 3 mil notas fiscais por dia, como
Antes de a mercadoria passar
fará se cair a energia num deles?
pelo posto fiscal, a Sefaz terá
Esta é uma falha que o fisco não
enviado cópia da nota para a
Receita Federal e, se for o caso,
para outras autoridades, como
a Sefaz do estado de destino
dos produtos e o Detran.
20 |Encontro
21. Tal como as notas fiscais em papel, as eletrônicas precisam ser armazenadas O destinatário recebe
por fornecedores e clientes por pelo menos 5 anos. O custo do armazenamento as mercadorias, o Danfe
digital é bem menor do que o de papel. Para as empresas, esta é uma das e o confere no Portal
grandes vantagens do sistema criado a partir da NF-e Nacional da NF-e. A nota
eletrônica terá chegado
bem antes, via internet,
e não precisará ser
impressa. Em grandes
gência é o uso de formulário especial Em 2010, surgiu um novo proto-
empresas, como as
de segurança para o Danfe. Ele é com- colo que mudou a forma de enqua-
montadoras, que recebem
prado sob autorização da Sefaz e deve dramento. Agora não é mais pela ati-
milhares de peças e
ser adquirido em pequena quanti- vidade e sim pelo Cnae-Código
componentes todos os
dade, pois custa caro – de 700 a 1.700 Nacional de Atividade Econômica, que
dias, isso permite planejar
reais o milheiro. O Danfe em formu- conste ou deva constar do cadastro no
melhor o recebimento
lário de segurança é impresso em duas fisco. E empresas que venderam –
das cargas e também
vias. Uma seguirá com a mercadoria e basta uma vez – para fora do estado de
o fluxo de produção
a outra ficará com o emissor, que tem origem, ou a qualquer órgão de go-
prazo de até sete dias após a emissão verno (federal, estadual ou municipal)
da autorização para retransmitir a NF- por meio de licitação, também foram
e. enquadradas.
O prazo é um alerta para quem re- Muitos espertinhos pensam em
cebeu a mercadoria por Danfe em for- mudar o Cnae para ficarem fora da
mulário de segurança. Ele tem de con- obrigatoriedade. É bobagem; o fisco é
sultar se a nota existe, pois o Danfe é mais esperto do que eles. Um exem-
uma nota com prazo de validade. “Se plo muito claro é o da empresa de Ro-
não consultar e o emitente se esque- berto, uma consultoria. Ela vende li-
cer de regularizar, o comprador jogará vro. Em julho de 2010, todas as
na contabilidade um documento ini- empresas que distribuírem livros es-
dôneo e vai vender mercadorias que, tarão obrigadas a fornecer NF-e. “Só
na prática, comprou sem nota fiscal. A pelo fato do Cnae ser diferente ela não
multa é muito grande”, avisa Roberto. estará desobrigada”, diz Roberto. T
O terceiro modo de resolver as con-
tingências é um dispositivo tecnoló-
gico chamado Dpec-Declaração Prévia
de Emissão em Contingência. Ele só é
usado por quem emite muitas notas. Tempo gasto pelas empresas
“Há casos de empresas que nunca usa- para implantar a NF-e 31%
ram Dpec nem formulário de segu- Até 1 mês
rança, só planejamento”, diz Roberto.
São as que têm redundância para
tudo. “Sai mais barato do que entrar
nos formulários de segurança”. 48%
De 1 a 3
Por fim, o guru recomenda prestar meses
atenção à questão da obrigatoriedade
da emissão. Há duas normas, super-
postas, que a regulam. A primeira esta-
beleceu a obrigatoriedade por atividade
econômica efetivamente executada. 17%
Um atacadista de refrigerante e chás, De 4 a 6
meses
por exemplo. O chá pode não estar o-
brigado, mas o refrigerante sim. Se ele
0,5% 3,5%
De 7 meses
vendeu refrigerantes nos últimos 12 Mais de a 1 ano
meses, fica obrigado a emitir NF-e para 1 ano
todos os produtos.
No futuro, com um novo programa, o Brasil ID, que deve estrear em até 3 anos,
o fisco vai aprimorar os controles nos postos fiscais de modo a liberar a carga
mais rapidamente, combater os furtos – isso envolverá satélites e GPS – e
aprimorar os controles a fim de fechar possíveis brechas para a sonegação. Encontro | 21
22. softwares Eugênio Gurgel
Deca Furtado
Carlos Alberto Tamm,
presidente da
Mastermaq: “Vamos
crescer 20% em 2010
porque sempre
cumprimos o
compromisso de
melhorar a
produtividade nos
escritórios contábeis”
Faça a coisa certa
Novos softwares garantem a emissão segura da NF-e e são importantes
aliados para empresas de todos os tamanhos na hora de prestar contas
O Sped – Sistema Público de Escritu- de todo o país uma boa oportunidade dulo do seu ERP (software de gestão)
ração Digital, denominado de Big Bro- de novos negócios. Em Minas Gerais, que incorpora o da NF-e. A Sankhya,
ther Fiscal, ao que tudo indica veio para quem saiu na frente foram a Master- que deve faturar 30 milhões de reais
ficar. Como a Nota Fiscal Eletrônica, a maq, de Belo Horizonte, e a Sankhya, neste ano, por sua vez comercializou
NF-e, é a base do Sped, todas as empre- de Uberlândia. 800 cópias.
sas têm de se aparelhar para expedi-las A Mastermaq já vendeu mais de 2 Não é pouco. As mais de 170 mil em-
sem erros, o que requer programas para mil cópias do NF-Express, seu pro- presas que emitem NF-e em todo o país
a sua confecção, transmissão e integra- grama para emissão de notas lançado podem escolher entre mais de 1.400
ção aos bancos de dados. em novembro de 2008, cerca de um softwares, mas boa parte delas usa
Isso trouxe para as software houses ano após a Sankhya ter lançado um mó- mesmo é o programa gratuito do fisco.
22 |Encontro
23. Porém, um bom software deve mos- programa é confiável para que as ven-
trar se uma nota foi ou não atualizada, das se tornassem boas.
se há nota em formulário de segurança Mesmo assim o software ainda re-
e as pendências junto à Secretaria de Es- presenta muito pouco do faturamento
tado da Fazenda, a Sefaz. Deve conter da Mastermaq, previsto para 60 mi-
ainda um mecanismo que não deixe lhões de reais em 2010. Só que, isolada-
emitir-se a nota sem que haja o pro- mente, ele é o produto com potencial
duto no estoque e cadastre os produtos para ter o maior número de clientes.
e os clientes a fim de evitar nova digi- “Nós o vendemos pontualmente. Mas
tação a cada nota emitida. em mais da metade dos casos vai um
Memória para os códigos também é ERP junto. Ele é o aríete que está
imprescindível. Se preenchido errado, o abrindo muitas novas portas para a
CFOP, o Código Fiscal de Operação, por Mastermaq e nos permitindo atuar em
exemplo, dá problema: há um de venda um segmento onde não estávamos pre-
para fora do estado e outro para dentro. sentes, o de empresas que estão na
Trocar um por outro dá multa. Enfim, o fronteira entre pequenas e médias”, diz
software deve permitir ao emitente da Tamm.
nota eletrônica que ele faça a coisa certa Em pelo menos um aspecto o NF-
logo de início. Express cumpre um compromisso da
“No nosso módulo é mostrada qual Mastermaq que tem lhe trazido ex-
a margem de lucro no total da nota e pansão de vendas: o de proporcionar
também nos produtos”, diz Roberto aumento de produvitidade: se o cliente
Sanzio Moreira Campos, diretor execu- do escritório estiver usando o sistema,
tivo da Sankhya em Belo Horizonte. “Ele o contador vai eliminar a digitação de
também garante agilidade na trans- todas as notas deste cliente.
missão da NF-e para a Sefaz e no re- Na contabilidade dos que vendem
torno desta para a empresa”. mercadorias e não serviços, isso é uma
O programa da Mastermaq foi pen- mão na roda. Há empresas que emitem
sado para empresas de porte pequeno 30 mil notas fiscais/mês, cada uma
e médio e que já contem com uma boa com inúmeros campos de preenchi-
base de clientes e produtos cadastra- mento, sem que o contador digite ne-
dos. Por isso todos os requisitos cita- nhuma. De um lado, isso significa me-
dos acima estão presentes. Já o do fisco nos trabalho. De outro, possibilidade
é bem limitado: não permite dar baixa de prestação de serviço de melhor qua-
no estoque, contabilizar, etc. “O soft- lidade, pois há mais informação a ana-
ware gratuito também não oferece su- lisar para o cliente.
porte”, diz Carlos Alberto Tamm, presi- Contador que sabe tirar proveito dos
dente da Mastermaq, empresa criada softwares até reinventa o negócio. É o
há 18 anos. caso da Gescon-Gestão de Consultoria
Apesar de ter todos estes bons atri- Empresarial, de Belo Horizonte, fun-
butos, a Mastermaq não partiu para dada por Gilson Vieira e Renato Nery.
ações maciças de vendas. Pelo contrário, Meses atrás, ela era só mais um escritó-
a empresa cerca pelos lados. O motivo rio de contabilidade. A Gescon se dife-
é que seu público-alvo são os escritórios renciou oferecendo novos serviços.
de contabilidade, não as firmas. É por “Agora somos uma butique de contabi-
indicação deles que, na maioria das ve- lidade. Fornecemos informações de
zes, a empresa realiza as vendas. “A apoio à gestão”, diz Gilson. “Nosso ne-
preocupação do contador é ter um soft- gócio passou a ser mais um suporte ao
ware de confiança no cliente, pois não planejamento estratégico e seus pro-
pode haver erro na origem”, diz Tamm. cessos do que o operacional, o serviço
Com o Sped, isso se tornou ainda braçal”.
mais importante, já que se sair alguma A Gescon tem não mais do que 80
coisa errada, o fisco vai pegar on line. clientes. Desses, aproximadamente 40
Como a Mastermaq tem um relaciona- já emitem, por eles mesmos, a nota fis-
mento de longa data com os escritó- cal eletrônica. Mas, para a Ideia, a em-
rios de contabilidade, em especial com presa de consultoria de Roberto Dias
os de Belo Horizonte, onde detém 80% Duarte, o guru da NF-e, a Gescon vai
do mercado, bastou demonstrar que o além. “A sede da Ideia, fiscal e física, fica