O documento discute o papel da Internet nas eleições presidenciais brasileiras de 2014, argumentando que ela serviu como um arquivo e suporte para a memória política ao facilitar o acesso a informações e materiais do passado que foram usados pelas campanhas de Dilma e Aécio para comparar seus governos e históricos. A polarização entre PT e PSDB, que já disputaram a presidência várias vezes, gerou muitos conteúdos online que puderam ser recuperados e usados strategicamente na campanha.
Ambientes de Interação na Internet como Esferas Públicas: um Estudo dos Come...
A eleição do amadurecimento? A Internet como suporte para a memória
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ELEIÇÕES 2014
Publicada em 23/10/2014 às 11h12. Atualizada em 23/10/2014 às 11h29
Artigo: A eleição do
amadurecimento? A Internet
como suporte para a memória
Especialista analisa o papel das redes sociais nas
Eleições de 2014
Por Samuel Barros*
O que tem de específico as eleições presidenciais de 2014? Como ela será lembrada? Qual foi o papel da
Internet? Agora mesmo, durante o segundo turno, enquanto Dilma e Aécio ainda trocam acusações de corrupção
da coisa pública e promessas de uma vida melhor, quem gosta de política diz que o pleito deste ano é um dos
mais emocionantes desde que voltamos à democracia.
A julgar pelos números das pesquisas eleitorais e pelas timelines da vida, o segundo turno foi a demonstração,
em termos brasileiros, do conceito de polarização. Na reta final, chegaram um homem e uma mulher, com perfis
biográficos e de performance acentuadamente diferentes. Mas não é só isso. Enfrentamse
neste segundo turno
dois partidos que disputam a presidência desde as eleições de 1994.
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Alguns veem na polarização entre PT e PSDB um fenômeno político que fortalece o sistema político brasileiro
(com partidos demais para o gosto de alguns). Enquanto outros acham essa polarização é a causa de muitos dos
males que nos assolam. E que uma ruptura dessa lógica pode ser abrupta e, quem sabe, nem mesmo
democrática.
Mas para além do julgamento deste bipartidarismo presidencial, meu argumento é que as repetidas experiências
de embates eleitorais e de governo dos dois partidos (PSDB duas e PT três gestões) acumularam um volume
enorme de argumentos e conteúdos midiáticos que são recuperados e estrategicamente usados no embate
eleitoral.
Neste processo de recuperação e gestão das memórias, a Internet serve como instrumento e ambiente. Tanto as
campanhas oficiais têm seu trabalho facilitado por encontrar online muito dos materiais que precisa para a
construção de seus conteúdos, quanto os apoiadores de cada lado fazem farto uso de arquivos de jornais,
vídeos, publicações em blogs e sites de redes sociais que foram coletados e armazenados.
Veja também: Artigo: Os perfis de liderança de Aécio Neves e Dilma Rousseff
Na minha opinião, algumas variáveis potencializaram o uso da Internet como arquivo vivo, memória fresca, de
modo especial nestas eleições:
1. Ambos os candidatos têm vida pública pregressa bem documentada em vídeos, matérias jornalísticas e
documentos administrativos. Dilma, apesar de não ter uma carreira política com muita visibilidade até que Lula a
escolheu para sucedêlo,
é a atual presidente. Aécio, foi governador de Minas Gerais, é atualmente Senador pelo
mesmo estado e, além do jornalismo político, é de longa data coberto pelo jornalismo de celebridade.
2. PSDB e PT, os partidos que se enfrentam, já governaram o país. Portanto, há farto material sobre as ações e
omissões dos governos de ambos. O PT apresenta seus feitos de transformação da sociedade brasileira em
gráficos, documentos oficiais e declarações. O PSDB, apesar de receoso, corre atrás de provas de que resolveu
o problema da inflação e implantou o Real. Petistas apresentam notícias sobre as denúncias de compra de votos
para emenda da reeleição que possibilitou o segundo governo de FHC, o inesquecível apagão, entre outros, para
refrescar a memória dos tucanos. Estes respondem com links para matérias que nos lembram da compra de
apoio no Congresso Nacional e denúncias sobre desvios na Petrobras, para citar só os dois casos emblemáticos.
No meio disso tudo, o vazamento de uma delação premiada leva para os jornais a memória dos escândalos de
corrupção. Primeiro, apenas sobre o PT, mas na sequência acabou por atingir também o PSDB.
3. As estratégias das campanhas de Dilma e Aécio também contribuíram para o emprego da Internet como
recurso para a memória. Dilma, desde o primeiro momento, adotou como estratégia comparar os governos
petistas e tucanos (A morte trágica de Eduardo Campos e a inesperada Marina suspendeu essa abordagem por
um tempo). Aécio, por sua vez, começou a campanha falando do seu governo em Minas.
4. O esforço de digitalização de conteúdos analógicos tem aumentado constantemente o acervo digital de jornais
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3. 29/10/2014 iBahia Artigo:
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e TV’s disponível online. Pessoas interessadas em saber quais foram as capas dos principais jornais brasileiros
durante o ano de 1995, por exemplo, conseguem com relativa facilidade e a preços acessíveis, quando não
gratuitos. O mesmo pode ser dito para reportagens de telejornais. Ao mesmo tempo, boa parte do que se
produziu, ao longo das últimas duas décadas, já em formatos digitais para a distribuição online permanece
disponível. Claro, que é preciso paciência e disposição para achar conteúdos soterrados pelos algoritmos dos
buscadores, mas tá quase tudo lá e eventualmente volta como arma discursiva na disputa política. Vide o post de
Juca Kfouri, publicado em 2009, acusando Aécio de dar um tapa em uma “acompanhante”, que ressurgiu para a
visibilidade pública durante as eleições.
5. A organização da comunicação em rede permite a formação de comunidades especializadas em determinados
temas e questões. Por exemplo, nesta última eleição, comunidades de jornalistas estiveram especialmente
interessados em saber mais sobre as denúncias contra Aécio de que ele tenta silenciar jornalistas através de
processos jurídicos e pressão econômica. E com esse propósito muito entulho foi revirado até que se achou
notas e um documentário. Enquanto comunidades de médicos, embora não a totalidade da categoria,
demonstraram disposição para criticar as políticas de Dilma para a saúde, especialmente o programa Mais
Médicos. Enfim, cada comunidade fez uma busca ativa por notícias e conteúdos atuais e históricos que
atendessem aos interesses comuns. Na minha opinião, justamente pela capacidade de formar comunidades e
disseminar conteúdos, o Whatsapp parece ter tido um papel de destaque nestas eleições.
A boa notícia, na minha opinião, é que as características sóciotécnicas
da Internet trazem um incremento para a
nossa memória sobre os acontecimentos e atores que são importantes para tomarmos decisões políticas. Por
hora, assumo a hipótese de que os conteúdos estocados na Internet e usados pelas campanhas servem de
insumo para que os eleitores tomem suas decisões.
Possivelmente, está dando muito mais trabalho para quem se aventura a considerar os argumentos de um lado e
outro, mas há aqui, aposto, um potencial ganho de reflexão na decisão do voto. Essa é uma leitura generosa e
possivelmente ingênua, mas é o que tem enquanto ainda não apuramos o que vivemos nos últimos meses.
*Samuel Barros é doutorando em Comunicação e Cultura Contemporâneas pela Universidade Federal
da Bahia (PósComUFBA)
com bolsa do CNPq. Atualmente, faz estágio doutoral no MIT Center for Civic
Media. Membro do Centro de Estudos Avançados em Democracia Digital (CEADD) e do grupo de
pesquisa Comunicação, Internet e Democracia (CID). Email:
samuel.barros77@gmail.com Lattes:
http://lattes.cnpq.br/1685038857613373
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