O documento descreve o estilo de cinema marginal que surgiu no Brasil após o golpe militar de 1964 como uma forma de catarse à ditadura. Apresentava figuras de anti-heróis e personagens desajustados da sociedade em busca de uma nova linguagem cinematográfica experimental e subversiva. O cinema marginal quebrou regras da linguagem cinematográfica tradicional e serviu como expressão de movimentos estudantis e desencanto com revoluções da época.
2. • Reflexo da ditadura
• Quebrar as regras do
bom comportamento da
linguagem cinematográfico
Estilo de cinema que surgiu no Brasil nova linguagem, de uma nova • Vivência dos movimentos
logo depois do golpe militar e serviu maneira, até subentendida, de estudantil
como uma espécie de catarse quanto se contar uma história.
à ditadura. • Desencanto com as
É o artesanato do desespero, revoluções
A figura do anti-herói, os tipos de- sem grandes verbas ou pre-
sajustados, sempre a margem da so- tensões, mas sim para dar • Filhos da censura
ciedade, bandidos, loucos, cafetões, continuidade à produção na-
prostitutas, idéias libertárias sob uma cional. É o cinema de autor, • Mas atenta ao cinema que
ótica nua e crua. que não se importa em utili- estava fazendo
zar clichês, metáforas, frases
O termo cinema marginal traduz um feitas, e até o deboche maso- • Subversão pela
pouco das várias vertentes de cine- quista. transgressão
ma de autor. O underground, pessoal
e anti intelectualizado. • Personagens desajustado
Com o Cinema Udigrudi, parte-se • Busca da antiestética
para a “esculhambação”, não a es-
culhambação no sentido pejorativo, • Se espelhar no pior
mas como experimentação de uma
• Postura nitidamente
política e ideológica de
uma geração
3. O Cinematropicalista,absorve
a influência
Marginal
da
Música popular, de Mário Reis
à Tropicália, passando por Jimi
colagem, da “pop art” e do Hendrix e o teatro de José
Kitsch, ou seja, toda a indús- Celso Martinez Correa.
tria cultural que estava em Câmera na mão e descon-
efervescência no momento. tinuidade se alia a uma textura
E toda a crítica irônica do mais áspera do preto-e-branco
bombardeamento da socie- que expulsa a higiene industrial
dade pelos objetos de con- da imagem e gera desconforto.
sumo e os signos estéticos
massificados da publicidade. Os marginais assumem um
papel profanador no espaço da
Estes autores subverteram a cultura e recusam o discurso
prática cinematográfica re- da esquerda, optando pela
alizada no Brasil, ao utilizar agressão visual: sexo, luxúria,
em seus filmes, narrativas violência e pobreza.
fragmentadas e uma estética
pouco refinada, influenciados
por filmes do diretor Jean-Luc
Godard, os neoexpressionis-
tas americanos do cinema B
e o deboche da Chanchada.
4. Os cineastas “malditos” produziam A função é chocar, acordar as mas-
seus filmes em resposta ao ano de sas, a burguesia, um compromisso
64, marcado por conturbado período sócio-político e cultural.
de repressão político militar. Portanto,
muitos filmes eram censurados an- As atitudes dos personagens são ex-
tes mesmo de irem para as salas de tremamente exageradas, deformadas
exibição. e caricatas.
É o universo das baixarias que consti- A representação em seu limite da
tui a narrativa Marginal. As cenas de origem a estilos marcantes e carac-
sofrimento corporal nos remetam ao terísticos como a bicha, a madame,o
clima político, de torturas, época dos machão, a prostituta, o burguês, que
anos e chumbo. são personagens típicos, de atitudes
excessivas, movimentos rebuscados,
A representação do horror está rela- figurino cafona, ditos populares emui-
cionada às torturas praticadas por tas vezes em rima.
militares neste momento de ditadura
no Brasil.
5. A fragmentação narrativa seria o con- A intenção do Cinema Marginal não
trário do que seria evolução da narrativa era de contar uma ação elaborada em
clássica. A fragmentação das diferen- história, não há preocupação espacial
tes histórias que compõem o enredo do ou temporal, há a verticalização da ima-
filme. gem.
Um questionamento a representação :: Conclusão
clássica. Onde se reconhece a influên- O Cinema Marginal aponta para o es-
cia do Cinema Novo no Cinema Mar- tado de espírito de uma geração que
ginal. decidiu fazer cinema. Propôs o choque,
a ruptura perante a presença aterrori-
No Cinema Novo existia a necessi- zante do inimigo prepotente e autoritário
dade de representar o universo social que ameaçava a integridade física e
brasileiro. No Cinema Margnal, a narra- intelectual.
tiva mergulha no universo ficcional fan-
tasista.
6. Super-8 (ou Super 8 mm) é O formato Super-8 ainda
um formato cinematográfico reserva uma área, no lado
desenvolvido nos anos 1960 oposto ao das perfurações,
e lançado no mercado em onde uma pista magnética Após o surgimento do
1965 pela Kodak, como um permite a gravação videocassete e de outras
aperfeiçoamento do antigo sincronizada do som. tecnologias de filmagem,
formato 8 mm, mantendo a o super-oito passou a ser
mesma bitola. O cinema marginal e uma técnica ultrapassada.
as câmeras super-oito Nos anos 70, porém,
O filme tem 8 milímetros surgem nesse momento de seu uso democrático e
de largura, exatamente impasses. inventivo foi fundamental
o mesmo que o antigo para a ampliação da
padrão 8 mm, e também A nova câmera simbolizou o prática cinematográfica
tem perfurações de apenas grito de independência dos e para a manutenção do
um lado, mas as suas diretores sem recursos. experimentalismo no cinema
perfurações são menores, brasileiro.
permitindo um aumento
na área de exposição da
película, e portanto mais
qualidade de imagem.
7. Os filmes do cinema marginal não alcançaram o sucesso
conquistado pela chanchada. A maioria deles nem chegou
a ser exibida comercialmente, alguns só foram vistos em
sessões clandestinas.
O Brasil vivia sob o regime militar e tanto a imprensa
como as artes eram censuradas.
Como os censores não entendiam absolutamente nada
do que os filmes do “cinema marginal” estavam falando,
e para evitar que eles influenciassem o público, preferiam
proibi-los.
A carreira dos filmes estava pré-destinada ao circuito alter-
nativo ou aos festivais internacionais. Os filmes do cinema
marginal tornaram-se cult, estudados pelos pesquisadores
brasileiros e admirados pelos jovens universitários.
Para seus autores, as conseqüências dependiam do tipo
de filme produzido. Alguns buscaram a via do exílio volun-
tário, como Rogério Sganzerla, outros foram presos, como
Olney São Paulo, autor de Manhã cinzenta, que sofreu
torturas na prisão e um inquérito absurdo, justamente por
ter realizado uma obra política.
8. O cruel e sádico agente Sem poupar esforços, Zé padrões atuais, “À Meia-Noite...” foi
funerário Zé do Caixão é do Caixão então espalha a polêmico não apenas em desafiar os
temido e odiado pelos ha- morte, a covardia e a desg- dogmas cristãos. A violência explícita e
bitantes da cidadezinha raça por onde passa, sem- a falta de caráter do anti-herói protago-
onde mora. Numa ação de pre em busca da perpetu- nista eram características inéditas no
afronta aos religiosos, faz ação de sua linhagem. cinema nacional, até então.
questão de comer carne
numa Sexta-feira Santa e Quanto à concepção vi- Graças às seqüências em que Zé do
passear pelo cemitério du- sual do Zé do Caixão, Caixão devora um enorme pedaço de
rante a noite dos Mortos. fica evidente a inspiração carneiro numa Sexta-Feira Santa, o di-
do personagem clássico retor atraiu a fúria dos grupos católicos
Zé é ainda obcecado em Drácula. Entretanto, Mojica brasileiros, que tentaram de toda forma
conseguir gerar o filho per- acrescentou características impedir que o filme fosse lançado.
feito que possa dar continu- brasileiras. Inpirado também
idade ao seu sangue. nos quadrinhos clássicos de Além do prêmio pela originalidade rece-
Mas sua mulher não pode horror, como nos “Contos bido pela revista francesa L’Ecran Fan-
engravidar e o coveiro vê da Cripta”. tastique, o longa foi vencedor da Pre-
na noiva de seu único ami- miação Especial no Festival de Cinema
go a mulher ideal que tanto Embora possa ser con- Fantástico e de Terror de Sitges.
procura. siderado até sutil para os
9. Poucos filmes brasileiros são desconstruindo os tiroteios,
alvo de um culto tão apaixo- perseguições de carro e a
nado entre os cinéfilos como figura do bem versus mal.
Bang bang. Uma obra conce-
bida sob o signo da irreverên- Série de seqüências fecha-
cia e da liberdade das em si próprias, sem liga-
ção aparente com o que vem
Andrea Tonacci implode a a seguir e freqüentemente
narrativa clássica em Bang repetidas com leves alter-
bang, construindo seu filme ações.
através de longos planos-
seqüência, que encantam pelo Bang bang é um tiro mortal
insólito das situações, pelo no coração dos acomodados
humor e pelo rigor da con- e sem imaginação. Sua in-
strução. A trama, ou fiapo de venção não tem limites, pro-
trama, acompanha um homem vocando momentos da mais
perseguido por três bandidos alta diversão.
pelas ruas de Belo Horizonte.
A abordagem do filme é muito
A presença da câmera várias mais urbana - mostra-se a
vezes é revelada ao espe- classe média com ironias,
ctador, seja através do re- sátiras, sem abandonar as
flexo em um espelho ou de questões sociais e culturais,
um personagem chocando-se mas ignorando a ética do
contra a lente. cinema novo para retratar a
realidade de forma tosca e
Brinca e satiriza os elementos debochada…
do filme americano, espe-
cialmente os filmes policiais,
10. Jorge, um assaltante de Tecnicamente falando, o filme é
casas de luxo em São apresentado por meio de diferen-
Paulo, apelidado pela im- tes enquadramentos e angulações
prensa sensacionalista de de câmera, planos rápidos e tril-
“Bandido da Luz Vermelha”, has sonoras constantes.
desconcerta a polícia com
seu comportamento fora do O protagonista não é mais um
comum. personagem sertanejo e sim um
homem urbano, aliás um homem
Além de usar uma lanterna que vivia no submundo de São
vermelha, ele possui as Paulo, um marginal.
vítimas, conversa com elas
e faz fugas ousadas para Os filmes marginais saem da
depois gastar o dinheiro temática rural e vão começar a
roubado de maneira extrav- falar da vida na cidade e toda a
agante. cultura de massa influenciada pela
tv que era febre neste
Com sua linguagem visual momento no
revolucionária, O Bandido Brasil.
da Luz Vermelha pode ser
visto como o ponto de tran-
sição entre a estética do
Cinema Novo e a ruptura
do Cinema Marginal.
11. Não hesita em se apropriar O filme oferece um retrato da
das referências da indústria juventude brasileira que pro-
cultural para satirizá-las e cura descobrir como agir (ou
construir uma obra critica e não agir) em plena linha dura
inovadora. do regime militar.
Lula, protagonista de Me- A ausência de sentido é o
teorango Kid, é um jovem de próprio tema do filme. André
família de classe média alta Luis Oliveira realiza um filme
que vaga sem causa alguma de libertação total e contesta-
pelas ruas de Salvador. ção a tudo, até mesmo à
possibilidade de contestação.
Nessa trajetória ele cruzará
com várias figuras contes- Também em diálogo com o
tatórias que desafiam as tropicalismo e com a arte pop,
normas do sistema. Fantasia o filme não hesita em antrop-
e realidade se misturam sem ofagizar o “cinemão” america-
hierarquia e sem que o pú- no e é recheado de citações
blico possa definir claramente a heróis como Batman, Robin
onde começa uma e termina e Tarzan.
a outra.
12. A idéia que se tinha de
atores marginais é de que Helena Ignez
bastava pegar qualquer um Falar do Cinema Marginal sem falar de
para atuar. Falsa impressão, Helena Ignez seria o mesmo que ignorar
contestada à simples visão a importância de Rogério Sganzerla ou
dos maiores atores dos Júlio Bressane no movimento. Helena
filmes udigrudi. Ignez é um ícone do Cinema Marginal tão
importante quanto os demais pioneiros
A se ver Helena Ignez, a se do movimento.
ver Paulo Villaça, Paulo César
Pereio, Hugo Carvana ou Helena Ignez criou um novo estilo de
Maria Gladys: é um domínio atuar: debochado, extravagante, a violên-
completo de movimentos, cia feminina. Antes de A mulher de todos,
seja pensados seja reflexos, possivelmente, não havia um outro filme
que impressiona pela expres- que apresentasse com uma força tão
sividade. E pela pregnância. grande a presença da mulher.
13. • No Zoom, o cineasta Carlos
Reichen bach fala sobre o Cinema
Marginal
• Video promocional de lançamento
da coleção de DVD sobre o Cinema
Marginal Brasileiro.
14. O Cinema Marginal não se define por
uma coesão interna e tampouco seus
membros se reconheciam como grupo.
As origens dos diretores do ciclo mar-
ginal são bem diferentes. Estes autores
subverteram a prática cinematográfica
realizada no Brasil, ao utilizar em seus
filmes, narrativas fragmentadas e uma
estética pouco refinada.
Alguns dos Principais
Diretores:
• Andrea Tonacci • José Mojica Marins
• André Luiz Oliveira • Júlio Bressane
• Carlos Reichenbach • Ozualdo Candeias
• Elyseu Visconti • Rogério Sganzerla
• Jairo Ferreira • João Batista de Andrade
• João Silvério Trevisan • Luiz Rosemberg