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À espera

     - Quero corrigir meus erros. - Disse ele ajoelhado no confessionário.
     - Quais são seus erros meu filho? – indagou Padre Inácio.
     - Quero redimir-me a Deus por amar alguém, por amá-la de uma forma
carnal, pecaminosa aos olhos da Igreja. Peço a absolvição Padre Inácio.
Arrependo-me profundamente pelo que fiz, pequei contra Deus, a Igreja e o
Sacerdócio. – Lacrimejava.
     Padre Inácio absorveu o silêncio como se tragasse uma xícara de café.
Deixou que o silêncio tomasse por completo o ambiente.
     - Diga-me Padre Eduardo, o que me contas foi consumado?
     - Não irmão! – apressou-se. – Mas pequei desejando-a, pequei
imaginando promiscuidades. Cheguei a pensar em abandonar nosso
sacramento para viver este amor!
     - Acalma-te filho. Decidiste muito cedo pelo Sacerdócio, ainda não
possuía discernimento necessário para encaminhar tua vida de forma
aparentemente correta. Quantos anos tu tens?
     - Vinte e cinco. Sei que não sou dotado de sua experiência, de sua
vivência e sabedoria, mas escolhi o Sacerdócio acreditando piamente no amor
e piedade de Deus, acredi...
     Padre Inácio o interrompeu:
     - Jovem, não se martirize por amar. Confesse-me toda história, desde os
primórdios. Entendo tua dor, porém, não encontrei o real motivo.
      Aceitou a idéia proposta pelo Padre que há muitos anos lhe prestava
ajuda e solidariedade. Padre Eduardo começou a relatar o que acontecera de
fato em sua vida:
      - Há pouco mais de um ano, recebi a grande honra de ser pároco da
Igreja de Nossa Senhora de Fátima. De bom grado e demasiada felicidade,
cheguei à pequena cidade interiorana. Encantei-me com a hospitalidade e o
modo de vida da população local.
       O calendário marcava o décimo terceiro dia de Março, o que significava
ser a data de minha primeira celebração oficial. Olhei-me no espelho e percebi
o quando mudei. Antes Eduardo, aquele moleque franzino da cidade grande,
agora Padre Eduardo, o jovem que assumira a responsabilidade pela paróquia
local.
      Enviavam-me diariamente vasilhames com as mais diversas iguarias da
culinária local. Pratos adornados, vistosos e sempre acompanhados de bilhetes
contendo lindas mensagens de apoio. Clara Castelo Branco, Julliana Castro,
Gilberto Resende, família Donato, família Nunes, Maria Julieta...
Maria Julieta. Este é o nome.
      Comparecia a todas as celebrações dominicais, sempre ao lado dos pais
e do sobrinho órfão. Rezavam a missa na intenção do filho, irmão e pai
falecido. Mensalmente como bons e fiéis católicos confessavam-se, até o
pequeno e imaculado guri não fugia a esta regra.
      Rezei quase trinta missas até que a família Nunes decidisse, enfim,
redimir-se de seus pecados. Júlio, o chefe da família, pedira perdão por ter se
amargurado após a morte de seu primogênito, por ser um péssimo pai e
marido. Dona Laura, a matriarca, encorajou-se para contar-me sobre sua
traição ao marido. O pequeno Lucas, contou-me sobre suas peripécias infantis
e pediu-me que fizesse orações para que seu pai e mãe voltassem.
     Mas onde estava ela?
      Bem a minha frente, se ajoelhando, trazendo consigo um belíssimo
vestido verde combinando com o tom branco de sua pele.
     - Com licença, venho confessar-me e buscar o perdão de Deus. –
sussurrou ela.
     - Conte-me seus pecados, minha filha, elevá-los-ei ao nosso Pai Celeste
para que Ele lhe confira o perdão através de minhas palavras e seu
arrependimento.
     Após alguns minutos Maria Julieta começara sua lista pecaminosa:
     - Padre Eduardo, eu pequei contra a Igreja. Mas o pior de tudo é que não
tenho arrependimentos.
     - Então, minha filha, de nada valerá sua confissão – falei paciente.
     - Tu não sabes, mas precisas saber. Há pouco mais de um mês, um novo
pároco assumiu esta Igreja. E como estamos no interior, as notícias correm,
procurei notícias sobre ele. Descobri seu nome, onde morava anteriormente e
também que possuía um ano a mais que eu. Tornei-me um ser pecaminoso ao
desejá-lo Eduardo, mas eu não me arrependo. Ainda alimento a esperança de
tomar-lhe para mim. –falava rapidamente, engolindo soluços para não cair no
choro.
     - Senhorita, por favor, controle-se. Agarre-se em sua fé e esqueça suas
esperanças, sou um homem de Deus, servirei minha convicção até o último de
meus dias. Vá e reze ao Senhor para que tu me esqueças e lhe confira o
perdão. – pedi. – Tu também me atormentas e me agarro à fé para esquecê-la.
– Confessei.
     - Tu assumes que lhe provoco algo?
     - Reze o ato de contrição Julieta, há mais pessoas querendo se
confessar.
     - Não me respondeste.
- Mexes comigo, agora vá. E pare de atormentar meus dias, esconda-se
novamente em teu anonimato. E me esqueças logo, por favor. Que Deus lhe
acompanhe. –disse engasgado.
     - Aproxime-se desta tela que nos separa, se o fizer logo voltarei ao meu
anonimato.
     Receoso, aproximei-me daquele pequeno pano falso que nos separava.
     - Aproxime-se mais, me olhe nos olhos. –sussurrou.
      Olhei-a nos olhos, encontrei uma imensidão verde borrada por ondas de
lágrimas. Senti sua pele gélida tocando minha testa com leveza inigualável.
     - Desculpe-me, -disse ela - mas amor é algo que geralmente não se
controla. Perdoe-me por trazer algum descontrole, eu não queria, mas...
      - Vá Julieta, não quero pecar ainda mais contra minhas convicções. Vá e
seja feliz com alguém que possa lhe fazer o que eu não o faria. –pousei meu
indicador sobre os lábios dela.
     - Estou te amando Eduardo, e sei que tu me amas também. – Sustentou
por mais alguns segundos o olhar.
    Preferi não me pronunciar sobre o que ela acabara de declarar, fiz
menção de levantar-me e pedir que outro fiel viesse até mim e a tirasse de lá.
Porém, continuei a olhá-la.
     - Julieta, eu a amo. Mas não posso viver isto, não posso lhe oferecer o
que tu mereces.
     Assustei-me quando ela selou nossos lábios em breve beijo. Pecado, mas
estávamos felizes e separados por uma tela, mas unidos por um forte
sentimento.
     - Eu também o amo. – Julieta saiu do confessionário e me deixou só.
    Naquela sexta-feira cancelei as confissões, afirmando mal estar. Estava
demasiadamente aturdido com tudo o que acabara de acontecer.
     - Inácio, foi o momento mais feliz de minha vida. Nunca havia
experimentado um beijo. Vivi muitos anos em função de um propósito e
esqueci que poderia viver de outro modo. Tu não conheces a felicidade que me
invadiu naquela noite. E também não conheces a tristeza de ter corrido de uma
conduta que preguei a mim. Pequei Padre!
     - Mas é passado jovem. Continue sua história, o que houve após o
acontecido?
     Eduardo pausou e reorganizou suas lembranças.
    - Após isto, os domingos amontoavam-se e as imagens dela também. Dia
comparecia de cor de rosa, ora com um amarelo tênue. Chegava, fazia a
genuflexão e assentava-se no quarto banco da fila à direita. Ficava sempre à
esquerda do pai. Sempre estivera ali, linda. Sua beleza aguçava meus
sentidos.
     Os olhos do jovem padre brilhavam ao descrever a pequena.
     - Dai então meu velho amigo, - continuou, - passamos a nos encontrar no
confessionário sempre no mesmo horário. Às cinco da tarde ela chegava e
conversávamos até o horário da missa. As sete ela assistia à missa
atentamente. Quando a celebração acabava, voltávamos a conversar no
confessionário. As nove eu a levava de volta para casa, batia uma prosa com o
Senhor Nunes, elogiava-o pela filha e neto de ouro, enquanto ele se afogava
em vinho.
     Lucas ia para a igreja comigo. Ajudava-me a contar o dinheiro do dízimo
enquanto eu o ajudava com os deveres da escola. Dona Laura chegou a dizer
que eu havia sido um desperdício da vida, que poderia ser um ótimo partido
para a filha do casal.
     Tocara no meu ponto mais fraco. Sorri timidamente e abreviei a conversa,
logo me despedi e voltei a minha clausura de culpa.
     Lentamente os meses se passaram e burburinhos surgiram na cidade de
que a filha dos Nunes andava de namorico com o novo pároco da cidade.
Imagine só Inácio, a desgraça que era para uma família tais comentários?
     O resultado meu amigo?
     Seus pais a proibiram de ir à missa e também não deixavam que o neto
fosse ate a igreja para alegrar meus dias com a sua inocência e sorrisos. Caí
em desgosto, meus dias já não eram iguais, sofria de forma descomunal e
ninguém podia me ouvir.
     Neste ponto eu já não queria mais o Sacerdócio, queria uma vida normal
e passar a viver outro sacramento que não este. Queria viver o Matrimônio com
Maria Julieta.
      Enviei uma carta a João Paulo II pedindo que me aconselhasse neste
caso, queria ouvir a opinião de alguém que não me condenasse. Minha carta
foi respondida, por linhas desenhadas, dizia para que eu vivesse diante de
minha razão, que não me deixasse levar pelas tentações do Demônio. Eu
decidi que o faria.
     Mas naquele dia também recebi outra carta.
     - De quem era a carta? – perguntou Padre Inácio.
      - Era dela Padre, ela me mandara uma carta. Em suma, seu conteúdo me
dizia estar partindo para a cidade grande, iria estudar e tornar-se uma jovem
culta, cansara de viver presa às ordens e costumes dos pais. Pediu-me apoio e
que eu nunca a esquecesse. Completou dizendo que voltaria logo mais, que
voltaria para mim, mais cedo do que eu imaginava.
    De fato, ela voltou. Na mesma noite, fechei a igreja e retornei para os
meus aposentos, enquanto fazia minhas orações ouvi batidas na porta.
Levante-me e fui atender, acreditei que fosse algum fiel, que veio à procura de
conselhos ou de alguma extrema unção, Doutor Mário Castelo Branco estava
nas últimas. Doce ilusão.
     Abri a porta e deparei-me com Maria Julieta em minha porta. Trajava um
grande casaco preto, seus cabelos estavam bem presos e peculiarmente,
naquela noite, seus olhos estavam mais escuros que o de costume, feito
grandes esmeraldas lapidadas com todo o cuidado em suas pupilas.
     - No que posso ajudá-la?
     - Posso entrar? – perguntou-me fria.
     - Claro. – assenti confuso.
     Ela entrou, seu perfume invadiu meus sentidos.
     - O que queres Julieta? – indaguei.
      - Fuja comigo, vamos viver esse amor Eduardo. Eu sei que é arriscado,
que não é certo. Mas vamos, vamos viver em outra cidade, outra vida, vamos
ser felizes, viver o que não podemos viver aqui! – disse agarrando-se a mim.
     Não a respondi, apenas deixei que ela se aconchegasse ao meu abraço.
Pouco tempo depois, não obtendo resposta, olhou-me confusa, encontrou meu
olhar vazio, inexpressivo.
     - O que houve?
     Sentei-a em minha cama e encarei seus olhos.
    - Bom, é meio confuso, mas desculpe-me. Eu não irei com você. Preciso
cumprir meu compromisso com a Igreja.
     - Mas não é o que você quer, não é. Eu sei que não.
      - É o que eu quero. É o que farei. Vá e que sejas muito feliz, que Deus a
acompanhe e que tu encontres alguém que não a magoe, que lhe seja
possível. Mande-me notícias contando tudo o que viver na cidade grande. –
Acariciei seu rosto, limpei a lágrima que estava prestes a cair, simulei um
sorriso na face dela. – Sorria Julieta, seu sorriso é sempre minha melhor
lembrança de tudo o que vivemos e podíamos ter vivido. – Beijei sua testa e a
encaminhei até a porta, caprichei no abraço e ela partiu ainda chorando, mas
tentando esboçar seu melhor sorriso.
      Minha vida acabou ali Padre Inácio, tudo se tornou uma verdadeira
monotonia. Eu não a via mais sentada no quarto banco da fila à direita sentada
ao lado esquerdo pai, Matheus me visitava com freqüência depois que a tia
viajara em busca de seu sonho.
     - E isso faz quanto tempo? – perguntou Padre Inácio.
     - Já se passaram cinco meses desde a sua partida, e a partir de então eu
não consigo retirar a imagem daquele sorriso e aqueles olhos fitando as
profundezas de minha alma. Ainda a amo, e admito que por diversas vezes
pensei em ir até ela. Mas logo desisto, ignoro e relevo tal loucura. Sinto-me
infeliz Padre sempre que me falam sobre ela.
     - Eu entendo sua dor meu filho. Nunca vivi algo parecido, mas agora
entendo tudo o que se passar neste teu pequeno coração aturdido. Porém,
algo ainda lhe aflige o que há?
      - Há uma semana ela me mandou uma carta contando-me sobre o que
fizera. Os seminários que participara, sobre as novidades e a parte mais triste
daquelas belas letras desenhadas. Casar-se-á em seis semanas, com um
sujeito chamado Renato e quer que eu realize o casamento.
     - E você o fará?
      - Claro Padre. Mesmo sendo um pecador em nenhum momento renunciei
o Sacerdócio. E essa será minha última celebração, renunciarei meu posto a
partir daí.
     - Mas como assim Eduardo?
     - Na carta também me fazia um pedido e eu o aceitei. – Padre Eduardo
continuou a encarar Inácio.
     - O que tu aceitaste filho?
    - É a minha despedida Padre, fugiremos antes da cerimônia. Resolvi
desenhar meu final feliz. Obrigado por estar comigo durante todo o tempo.
     Saiu sorrindo do confessionário, abandonara a batina em qualquer canto
e abraçou a felicidade. Descobrira que se tivesse acontecido antes, não teria o
mesmo gosto, casar-se-ia em cinco semanas com a mulher de sua vida.


                                                          (Thaís – 24/11/2011)

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  • 1. À espera - Quero corrigir meus erros. - Disse ele ajoelhado no confessionário. - Quais são seus erros meu filho? – indagou Padre Inácio. - Quero redimir-me a Deus por amar alguém, por amá-la de uma forma carnal, pecaminosa aos olhos da Igreja. Peço a absolvição Padre Inácio. Arrependo-me profundamente pelo que fiz, pequei contra Deus, a Igreja e o Sacerdócio. – Lacrimejava. Padre Inácio absorveu o silêncio como se tragasse uma xícara de café. Deixou que o silêncio tomasse por completo o ambiente. - Diga-me Padre Eduardo, o que me contas foi consumado? - Não irmão! – apressou-se. – Mas pequei desejando-a, pequei imaginando promiscuidades. Cheguei a pensar em abandonar nosso sacramento para viver este amor! - Acalma-te filho. Decidiste muito cedo pelo Sacerdócio, ainda não possuía discernimento necessário para encaminhar tua vida de forma aparentemente correta. Quantos anos tu tens? - Vinte e cinco. Sei que não sou dotado de sua experiência, de sua vivência e sabedoria, mas escolhi o Sacerdócio acreditando piamente no amor e piedade de Deus, acredi... Padre Inácio o interrompeu: - Jovem, não se martirize por amar. Confesse-me toda história, desde os primórdios. Entendo tua dor, porém, não encontrei o real motivo. Aceitou a idéia proposta pelo Padre que há muitos anos lhe prestava ajuda e solidariedade. Padre Eduardo começou a relatar o que acontecera de fato em sua vida: - Há pouco mais de um ano, recebi a grande honra de ser pároco da Igreja de Nossa Senhora de Fátima. De bom grado e demasiada felicidade, cheguei à pequena cidade interiorana. Encantei-me com a hospitalidade e o modo de vida da população local. O calendário marcava o décimo terceiro dia de Março, o que significava ser a data de minha primeira celebração oficial. Olhei-me no espelho e percebi o quando mudei. Antes Eduardo, aquele moleque franzino da cidade grande, agora Padre Eduardo, o jovem que assumira a responsabilidade pela paróquia local. Enviavam-me diariamente vasilhames com as mais diversas iguarias da culinária local. Pratos adornados, vistosos e sempre acompanhados de bilhetes contendo lindas mensagens de apoio. Clara Castelo Branco, Julliana Castro, Gilberto Resende, família Donato, família Nunes, Maria Julieta...
  • 2. Maria Julieta. Este é o nome. Comparecia a todas as celebrações dominicais, sempre ao lado dos pais e do sobrinho órfão. Rezavam a missa na intenção do filho, irmão e pai falecido. Mensalmente como bons e fiéis católicos confessavam-se, até o pequeno e imaculado guri não fugia a esta regra. Rezei quase trinta missas até que a família Nunes decidisse, enfim, redimir-se de seus pecados. Júlio, o chefe da família, pedira perdão por ter se amargurado após a morte de seu primogênito, por ser um péssimo pai e marido. Dona Laura, a matriarca, encorajou-se para contar-me sobre sua traição ao marido. O pequeno Lucas, contou-me sobre suas peripécias infantis e pediu-me que fizesse orações para que seu pai e mãe voltassem. Mas onde estava ela? Bem a minha frente, se ajoelhando, trazendo consigo um belíssimo vestido verde combinando com o tom branco de sua pele. - Com licença, venho confessar-me e buscar o perdão de Deus. – sussurrou ela. - Conte-me seus pecados, minha filha, elevá-los-ei ao nosso Pai Celeste para que Ele lhe confira o perdão através de minhas palavras e seu arrependimento. Após alguns minutos Maria Julieta começara sua lista pecaminosa: - Padre Eduardo, eu pequei contra a Igreja. Mas o pior de tudo é que não tenho arrependimentos. - Então, minha filha, de nada valerá sua confissão – falei paciente. - Tu não sabes, mas precisas saber. Há pouco mais de um mês, um novo pároco assumiu esta Igreja. E como estamos no interior, as notícias correm, procurei notícias sobre ele. Descobri seu nome, onde morava anteriormente e também que possuía um ano a mais que eu. Tornei-me um ser pecaminoso ao desejá-lo Eduardo, mas eu não me arrependo. Ainda alimento a esperança de tomar-lhe para mim. –falava rapidamente, engolindo soluços para não cair no choro. - Senhorita, por favor, controle-se. Agarre-se em sua fé e esqueça suas esperanças, sou um homem de Deus, servirei minha convicção até o último de meus dias. Vá e reze ao Senhor para que tu me esqueças e lhe confira o perdão. – pedi. – Tu também me atormentas e me agarro à fé para esquecê-la. – Confessei. - Tu assumes que lhe provoco algo? - Reze o ato de contrição Julieta, há mais pessoas querendo se confessar. - Não me respondeste.
  • 3. - Mexes comigo, agora vá. E pare de atormentar meus dias, esconda-se novamente em teu anonimato. E me esqueças logo, por favor. Que Deus lhe acompanhe. –disse engasgado. - Aproxime-se desta tela que nos separa, se o fizer logo voltarei ao meu anonimato. Receoso, aproximei-me daquele pequeno pano falso que nos separava. - Aproxime-se mais, me olhe nos olhos. –sussurrou. Olhei-a nos olhos, encontrei uma imensidão verde borrada por ondas de lágrimas. Senti sua pele gélida tocando minha testa com leveza inigualável. - Desculpe-me, -disse ela - mas amor é algo que geralmente não se controla. Perdoe-me por trazer algum descontrole, eu não queria, mas... - Vá Julieta, não quero pecar ainda mais contra minhas convicções. Vá e seja feliz com alguém que possa lhe fazer o que eu não o faria. –pousei meu indicador sobre os lábios dela. - Estou te amando Eduardo, e sei que tu me amas também. – Sustentou por mais alguns segundos o olhar. Preferi não me pronunciar sobre o que ela acabara de declarar, fiz menção de levantar-me e pedir que outro fiel viesse até mim e a tirasse de lá. Porém, continuei a olhá-la. - Julieta, eu a amo. Mas não posso viver isto, não posso lhe oferecer o que tu mereces. Assustei-me quando ela selou nossos lábios em breve beijo. Pecado, mas estávamos felizes e separados por uma tela, mas unidos por um forte sentimento. - Eu também o amo. – Julieta saiu do confessionário e me deixou só. Naquela sexta-feira cancelei as confissões, afirmando mal estar. Estava demasiadamente aturdido com tudo o que acabara de acontecer. - Inácio, foi o momento mais feliz de minha vida. Nunca havia experimentado um beijo. Vivi muitos anos em função de um propósito e esqueci que poderia viver de outro modo. Tu não conheces a felicidade que me invadiu naquela noite. E também não conheces a tristeza de ter corrido de uma conduta que preguei a mim. Pequei Padre! - Mas é passado jovem. Continue sua história, o que houve após o acontecido? Eduardo pausou e reorganizou suas lembranças. - Após isto, os domingos amontoavam-se e as imagens dela também. Dia comparecia de cor de rosa, ora com um amarelo tênue. Chegava, fazia a genuflexão e assentava-se no quarto banco da fila à direita. Ficava sempre à
  • 4. esquerda do pai. Sempre estivera ali, linda. Sua beleza aguçava meus sentidos. Os olhos do jovem padre brilhavam ao descrever a pequena. - Dai então meu velho amigo, - continuou, - passamos a nos encontrar no confessionário sempre no mesmo horário. Às cinco da tarde ela chegava e conversávamos até o horário da missa. As sete ela assistia à missa atentamente. Quando a celebração acabava, voltávamos a conversar no confessionário. As nove eu a levava de volta para casa, batia uma prosa com o Senhor Nunes, elogiava-o pela filha e neto de ouro, enquanto ele se afogava em vinho. Lucas ia para a igreja comigo. Ajudava-me a contar o dinheiro do dízimo enquanto eu o ajudava com os deveres da escola. Dona Laura chegou a dizer que eu havia sido um desperdício da vida, que poderia ser um ótimo partido para a filha do casal. Tocara no meu ponto mais fraco. Sorri timidamente e abreviei a conversa, logo me despedi e voltei a minha clausura de culpa. Lentamente os meses se passaram e burburinhos surgiram na cidade de que a filha dos Nunes andava de namorico com o novo pároco da cidade. Imagine só Inácio, a desgraça que era para uma família tais comentários? O resultado meu amigo? Seus pais a proibiram de ir à missa e também não deixavam que o neto fosse ate a igreja para alegrar meus dias com a sua inocência e sorrisos. Caí em desgosto, meus dias já não eram iguais, sofria de forma descomunal e ninguém podia me ouvir. Neste ponto eu já não queria mais o Sacerdócio, queria uma vida normal e passar a viver outro sacramento que não este. Queria viver o Matrimônio com Maria Julieta. Enviei uma carta a João Paulo II pedindo que me aconselhasse neste caso, queria ouvir a opinião de alguém que não me condenasse. Minha carta foi respondida, por linhas desenhadas, dizia para que eu vivesse diante de minha razão, que não me deixasse levar pelas tentações do Demônio. Eu decidi que o faria. Mas naquele dia também recebi outra carta. - De quem era a carta? – perguntou Padre Inácio. - Era dela Padre, ela me mandara uma carta. Em suma, seu conteúdo me dizia estar partindo para a cidade grande, iria estudar e tornar-se uma jovem culta, cansara de viver presa às ordens e costumes dos pais. Pediu-me apoio e que eu nunca a esquecesse. Completou dizendo que voltaria logo mais, que voltaria para mim, mais cedo do que eu imaginava. De fato, ela voltou. Na mesma noite, fechei a igreja e retornei para os meus aposentos, enquanto fazia minhas orações ouvi batidas na porta.
  • 5. Levante-me e fui atender, acreditei que fosse algum fiel, que veio à procura de conselhos ou de alguma extrema unção, Doutor Mário Castelo Branco estava nas últimas. Doce ilusão. Abri a porta e deparei-me com Maria Julieta em minha porta. Trajava um grande casaco preto, seus cabelos estavam bem presos e peculiarmente, naquela noite, seus olhos estavam mais escuros que o de costume, feito grandes esmeraldas lapidadas com todo o cuidado em suas pupilas. - No que posso ajudá-la? - Posso entrar? – perguntou-me fria. - Claro. – assenti confuso. Ela entrou, seu perfume invadiu meus sentidos. - O que queres Julieta? – indaguei. - Fuja comigo, vamos viver esse amor Eduardo. Eu sei que é arriscado, que não é certo. Mas vamos, vamos viver em outra cidade, outra vida, vamos ser felizes, viver o que não podemos viver aqui! – disse agarrando-se a mim. Não a respondi, apenas deixei que ela se aconchegasse ao meu abraço. Pouco tempo depois, não obtendo resposta, olhou-me confusa, encontrou meu olhar vazio, inexpressivo. - O que houve? Sentei-a em minha cama e encarei seus olhos. - Bom, é meio confuso, mas desculpe-me. Eu não irei com você. Preciso cumprir meu compromisso com a Igreja. - Mas não é o que você quer, não é. Eu sei que não. - É o que eu quero. É o que farei. Vá e que sejas muito feliz, que Deus a acompanhe e que tu encontres alguém que não a magoe, que lhe seja possível. Mande-me notícias contando tudo o que viver na cidade grande. – Acariciei seu rosto, limpei a lágrima que estava prestes a cair, simulei um sorriso na face dela. – Sorria Julieta, seu sorriso é sempre minha melhor lembrança de tudo o que vivemos e podíamos ter vivido. – Beijei sua testa e a encaminhei até a porta, caprichei no abraço e ela partiu ainda chorando, mas tentando esboçar seu melhor sorriso. Minha vida acabou ali Padre Inácio, tudo se tornou uma verdadeira monotonia. Eu não a via mais sentada no quarto banco da fila à direita sentada ao lado esquerdo pai, Matheus me visitava com freqüência depois que a tia viajara em busca de seu sonho. - E isso faz quanto tempo? – perguntou Padre Inácio. - Já se passaram cinco meses desde a sua partida, e a partir de então eu não consigo retirar a imagem daquele sorriso e aqueles olhos fitando as profundezas de minha alma. Ainda a amo, e admito que por diversas vezes
  • 6. pensei em ir até ela. Mas logo desisto, ignoro e relevo tal loucura. Sinto-me infeliz Padre sempre que me falam sobre ela. - Eu entendo sua dor meu filho. Nunca vivi algo parecido, mas agora entendo tudo o que se passar neste teu pequeno coração aturdido. Porém, algo ainda lhe aflige o que há? - Há uma semana ela me mandou uma carta contando-me sobre o que fizera. Os seminários que participara, sobre as novidades e a parte mais triste daquelas belas letras desenhadas. Casar-se-á em seis semanas, com um sujeito chamado Renato e quer que eu realize o casamento. - E você o fará? - Claro Padre. Mesmo sendo um pecador em nenhum momento renunciei o Sacerdócio. E essa será minha última celebração, renunciarei meu posto a partir daí. - Mas como assim Eduardo? - Na carta também me fazia um pedido e eu o aceitei. – Padre Eduardo continuou a encarar Inácio. - O que tu aceitaste filho? - É a minha despedida Padre, fugiremos antes da cerimônia. Resolvi desenhar meu final feliz. Obrigado por estar comigo durante todo o tempo. Saiu sorrindo do confessionário, abandonara a batina em qualquer canto e abraçou a felicidade. Descobrira que se tivesse acontecido antes, não teria o mesmo gosto, casar-se-ia em cinco semanas com a mulher de sua vida. (Thaís – 24/11/2011)