Este documento é uma monografia apresentada por Paulo Henrique de Holanda Dantas à Escola Superior de Gestão e Contas Públicas de São Paulo como requisito para conclusão de curso de especialização em Administração Pública. A monografia avalia a qualidade do gasto público na educação municipal de São Paulo, estudando os fatores que influenciam o desempenho escolar e analisando a alocação dos recursos educacionais no município.
LISTA DE EXERCICIOS envolveto grandezas e medidas e notação cientifica 1 ANO ...
Monografia - Paulo Dantas
1. ESCOLA SUPERIOR DE GESTÃO E CONTAS PÚBLICAS
CONSELHEIRO EURÍPEDES SALES
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO “LATU SENSU” EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
PAULO HENRIQUE DE HOLANDA DANTAS
QUALIDADE DO GASTO PÚBLICO:
ESTUDO DE CASO DA EDUCAÇÃO PÚBLICA
MUNICIPAL DE SÃO PAULO
São Paulo
2010
2. ESCOLA SUPERIOR DE GESTÃO E CONTAS PÚBLICAS
CONSELHEIRO EURÍPEDES SALES
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO “LATU SENSU” EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
PAULO HENRIQUE DE HOLANDA DANTAS
QUALIDADE DO GASTO PÚBLICO:
ESTUDO DE CASO DA EDUCAÇÃO PÚBLICA
MUNICIPAL DE SÃO PAULO
Monografia apresentada à Escola Superior de
Gestão e Contas Públicas Conselheiro Eurípedes
Sales, como requisito para a conclusão do curso
de Especialização “Lato Sensu” em Administração
Pública.
Orientadora: Profª. Ms. Ruth Jenn Thai Shu
Inoshita
São Paulo
2010
3. FOLHA DE APROVAÇÃO
PAULO HENRIQUE DE HOLANDA DANTAS
QUALIDADE DO GASTO PÚBLICO:
ESTUDO DE CASO DA EDUCAÇÃO PÚBLICA
MUNICIPAL DE SÃO PAULO
Monografia apresentada à Escola Superior de Gestão e Contas Públicas
Conselheiro Eurípedes Sales, como requisito para a obtenção do certificado de
conclusão de curso.
BANCA EXAMINADORA:
______________________________________________________
Prof. Ms. Abrão Blumen
______________________________________________________
Profª. Ms. Josefa Tápia Salzano
________________________________________________________
Profª. Ms. Ruth Jenn Thai Shu Inoshita
Professora Orientadora – Presidente da Banca Examinadora
São Paulo, 12 de março de 2010.
4. A minha esposa, Carolina, pelo apoio
incondicional e pela compreensão nos
momentos dedicados a este trabalho.
5. AGRADECIMENTOS
A todo o pessoal do Tribunal de Contas do Município de São Paulo e, em especial, aos
professores e servidores da Escola Superior de Gestão e Contas Públicas Conselheiro
Eurípedes Sales, pela oportunidade de crescimento intelectual e pessoal que o curso
proporcionou.
A minha mãe, que, apesar de partir cedo, deixou-me lições valiosas.
A minha família e amigos, pelo conforto espiritual que me proporcionam.
A todos aqueles que, direta ou indiretamente, colaboraram para a conclusão deste trabalho.
7. RESUMO
Esta monografia teve por objetivo avaliar a qualidade do gasto público do Município de
São Paulo na rede pública municipal de ensino fundamental, particularmente na atual gestão.
Para tanto, utilizamos como base avaliativa um conjunto de fatores mensuráveis
objetivamente, levantados a partir do resultado de estudos nacionais e internacionais a
respeito das variáveis escolares, individuais e familiares que afetam significativamente o
desempenho estudantil. A partir daí, analisamos a situação da rede pública municipal de São
Paulo com relação a cada um desses fatores, identificando os pontos fortes e as oportunidades
de melhoria na política educacional paulistana. Como resultado, foi possível verificar que o
quadro não é tão grave quanto se divulga, mas ainda preocupante, pois a política pública
educacional do município põe em foco certos fatores que ou já apresentam um nível
satisfatório ou promovem impacto insignificante na melhoria da qualidade do ensino,
deixando alguns pontos-chave em segundo plano.
Palavras-chave: educação; ensino fundamental; gasto público; qualidade.
8. SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 1
1.1 A educação como um direito social fundamental ..................................................... 1
1.2 A educação como instrumento de desenvolvimento econômico ............................... 5
1.3 Derrubando o maior dos mitos.................................................................................. 6
1.4 Propósito do trabalho .............................................................................................. 13
1.5 Resultados esperados ............................................................................................... 14
2 FATORES DETERMINANTES DA QUALIDADE NA EDUCAÇÃO ...................... 15
2.1 Fatores escolares ...................................................................................................... 16
2.1.1 Fatores escolares com influência significativa no desempenho escolar .........................17
2.1.1.1 Número de Horas-Aula Diárias........................................................................17
2.1.1.2 Acesso a Livros e Materiais Didáticos .............................................................18
2.1.1.3 Escolaridade, Experiência e Assiduidade dos Professores ................................18
2.1.1.4 Estado de Conservação da Escola ....................................................................20
2.1.2 Fatores escolares com influência não significativa no desempenho escolar ..................21
2.1.1.1 Número de Alunos por Turma .........................................................................21
2.1.1.2 Salário dos Professores ....................................................................................22
2.1.1.3 Número de Escolas em que o Professor Leciona ..............................................23
2.1.1.4 Forma de Seleção dos Diretores das Escolas ....................................................24
2.1.3 Comentários adicionais................................................................................................24
2.2 Fatores individuais .................................................................................................. 25
2.3 Fatores familiares .................................................................................................... 28
2.4 Comentários adicionais ........................................................................................... 31
3 DIAGNÓSTICO DA EDUCAÇÃO NO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO ................... 32
3.1 Quanto e em que o Município de São Paulo gasta com educação? ........................ 34
3.2 Os gastos do Município de São Paulo com educação são coerentes? ..................... 37
3.2.1 Gasto do Município de São Paulo por aluno matriculado .............................................37
3.2.2 Desempenho dos alunos da rede pública municipal de São Paulo.................................42
3.2.3 Cruzamento dos dados de gastos por aluno com desempenho .......................................47
3.2.4 Comentários adicionais................................................................................................52
9. 3.3 Qual a alocação mais eficiente dos gastos com educação? ..................................... 53
3.3.1 Número de horas-aula diárias ......................................................................................54
3.3.2 Acesso a livros e materiais didáticos ............................................................................55
3.3.3 Escolaridade dos professores .......................................................................................56
3.3.4 Experiência dos professores .........................................................................................56
3.3.5 Assiduidade dos professores.........................................................................................58
3.3.6 Estado de conservação da escola .................................................................................58
3.3.7 Número de alunos por turma ........................................................................................59
3.3.8 Salário dos professores ................................................................................................60
3.3.9 Número de escolas em que o professor leciona.............................................................63
3.3.10 Forma de seleção dos diretores das escolas ...............................................................64
3.3.11 Cursar a pré-escola ...................................................................................................64
3.3.12 Idade do aluno compatível com a série e Histórico de repetência ...............................64
3.3.13 Leitura de livros, jornais e revistas.............................................................................66
3.3.14 Trabalhar e estudar ao mesmo tempo .........................................................................66
3.3.15 Motivação do aluno ...................................................................................................67
3.4 Lições de outros municípios e de outros países ....................................................... 67
4 CONCLUSÃO ............................................................................................................... 69
5 REFERÊNCIAS ............................................................................................................ 71
6 ANEXOS ........................................................................................................................ 74
ANEXO A – NOTA TÉCNICA – CÁLCULO DO IDEB. ................................................ 75
10. 1
1 INTRODUÇÃO
A educação é um dos assuntos mais discutidos no Brasil e no resto do mundo. Ocupa
lugar de destaque na pauta das notícias veiculadas na mídia e o cerne das discussões políticas.
É também uma seara cercada por mitos, paixões e controvérsias, de uma maneira tal que a
defesa de uma ou outra posição nos debates sobre o tema acaba por se tornar mais uma
questão de opção política, de fé ou de interesse (pessoal ou corporativista) do que uma
decisão racional.
De toda essa celeuma, duas constatações se sobressaem, por consistirem em raros
consensos:
1. o direito dos cidadãos à educação (e o correspondente dever do Estado em provê-la);
e
2. a relevância da educação como ferramenta para o desenvolvimento econômico de um
país.
1.1 A educação como um direito social fundamental
Nos regimes democráticos contemporâneos, desde a Constituição Alemã de 1919
(Constituição de Weimar), a educação foi inscrita no rol dos direitos dos cidadãos. No
Capítulo IV do Livro II, este documento erguia, pela primeira vez na história ocidental, a
educação ao patamar de direito social fundamental, assegurado pelo texto constitucional.
As Constituições brasileiras, a partir da Carta de 1934, adotaram a linha fundada pela
Constituição de Weimar e passaram a trazer, insculpido em seus textos, o direito dos cidadãos
à educação, atribuindo ao Estado o dever de provê-lo.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 reconheceu, em seu artigo 6º1
a educação como um direito social, o primeiro a ser enumerado. Os artigos 205 a 214 da Carta
Magna estabelecem o regramento constitucional à atuação dos entes federados com vistas à
concretização desse direito. Destacamos, a seguir, dois desses artigos (grifos nossos):
Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios
organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino.
1
Art. 6º - São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência
social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
(grifo nosso)
11. 2
§ 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios,
financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em
matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir
equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade
do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios.
§ 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e
na educação infantil.
§ 3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino
fundamental e médio.
(...)
Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no
mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de
transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.
Os entes federados brasileiros, regra geral, têm obedecido fielmente ao ditame
constitucional, aplicando na educação percentuais superiores aos mínimos estabelecidos pela
Carta Magna.
A título de exemplo, vejamos o que determina a Constituição do Estado de São Paulo, em
seu artigo 255 (grifos nossos):
Art. 255. O Estado aplicará, anualmente, na manutenção e no
desenvolvimento do ensino público, no mínimo, trinta por cento da receita
resultante de impostos, incluindo recursos provenientes de transferências.
A Lei Orgânica do Município de São Paulo, por sua vez, vai além (grifos nossos):
Art. 208. O Município aplicará, anualmente, no mínimo 31% (trinta e
um por cento) da receita resultante de impostos, compreendida a
proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino
fundamental, da educação infantil e inclusiva.
Verificando os relatórios de execução orçamentária elaborados pelos entes da Federação,
ao final de cada exercício, podemos comprovar as afirmações acima.
12. 3
TABELA 1 – Demonstração de Aplicação de Recursos na Educação do Governo do
Estado de São Paulo – Exercício 2008
13. 4
Para ilustrar, voltemos a analisar o caso do Estado de São Paulo. Na Tabela 1, vemos que,
no exercício de 2008, a despesa empenhada na manutenção e desenvolvimento do ensino
atingiu 30,13% do total das receitas arrecadadas de impostos e transferências, superando o
limite mínimo de 30% exigido pela Constituição Estadual, que, por sua vez, já é superior ao
exigido pela Constituição Federal.
Da mesma forma, vemos que, na Tabela 2, o Município de São Paulo aplicou, no
exercício de 2008, 31,77% do total das receitas arrecadadas de impostos e transferências na
manutenção e desenvolvimento do ensino, superando o limite mínimo de 31% exigido pela
Lei Orgânica do Município, que, por sua vez, já é superior ao exigido pela Constituição
Federal.
TABELA 2 – Demonstração de Aplicação de Recursos na Educação da Prefeitura do
Município de São Paulo – Exercício 2008
Poderíamos tomar inúmeros outros exemplos que confirmariam que, via de regra, o
volume de recursos despendidos em educação pelos entes federados brasileiros obedecem (e,
não raro, superam) os limites mínimos exigidos pela Carta Magna Federal.
14. 5
Tal constatação permite-nos concluir que, seja por consciência dos administradores
públicos, seja por imposição legal, a educação brasileira, a despeito das enormes
desigualdades regionais, conta, regra geral, com vultosa quantidade de recursos orçamentários
disponíveis.
1.2 A educação como instrumento de desenvolvimento econômico
Muito além de seu status de direito social, há que se destacar sua relevância como
ferramenta para o crescimento econômico de um país. O Estado, desse modo, mais do que
encarar o provimento da educação como uma obrigação, deve entendê-lo como um
investimento.
Nesse sentido, o impacto positivo da educação se apresenta em duas dimensões: a
individual e a social.
No que diz respeito ao impacto positivo da educação na esfera individual, há diversos
estudos, como o de ANGRIST e KRUEGER (1991) e o de DUFLO (2001), que mostram que
cada ano adicional de educação aumenta o salário recebido pelo indivíduo entre 7% e 10%.
Ou seja, um indivíduo com um ano a mais de escolaridade que seus colegas receberá, em
média, um salário entre 7% e 10% maior.
No tocante aos benefícios sociais da educação, os estudos de BARRO (1997) sugerem
que um ano adicional de escolaridade da população masculina adulta aumenta a taxa de
crescimento econômico (taxa de crescimento do PIB) em 1,2% por ano, em média, sendo
maior para os países menos desenvolvidos, e menor para os mais desenvolvidos. Pode parecer
pouco, mas, quando analisada ao longo do tempo, torna-se uma diferença significativa.
Entretanto, os benefícios sociais da educação não se resumem somente a um maior
crescimento do PIB. Há evidências de efeitos positivos nas mais diversas áreas:
• Redução dos índices de criminalidade – o estudo de LOCHNER e MORETTI (2001)
aponta que um ano adicional de escolaridade reduz a incidência de prisões entre 11%
e 16%. Segundo esse estudo, é mais barato investir em educação do que em
policiamento, como forma de reduzir a criminalidade.
• Redução dos índices de fertilidade – GREENWOOD (1997) sugere que o aumento
da escolaridade reduz o número de filhos por mulher, ao mesmo tempo em que
aumenta a idade da primeira gravidez. Famílias com maior educação tendem a ter
menos filhos, mas apresentam um gasto maior por filho.
15. 6
• Redução da mortalidade infantil – os estudos de McMAHON (2000) indicam que
populações como maior escolaridade tendem a apresentar menores taxas de
mortalidade infantil.
• Melhoria da saúde da população – WOLFE e ZUVEKAS (1997) apontam menores
índices de dependência de fumo e de álcool entre os indivíduos de maior
escolaridade. Tais indivíduos também tendem a praticar mais exercícios e apresentar
maior expectativa de vida que os de menor escolaridade.
Os impactos positivos da educação, tanto para os indivíduos quanto para toda a
sociedade, não se apresentam como novidade. Os estudos estatísticos apresentados (além de
um sem-número de outros não-mencionados) apenas corroboram o que já se intuía
empiricamente. Assim, desnecessário seria convencer os gestores públicos dos retornos
positivos dos investimentos públicos em educação.
1.3 Derrubando o maior dos mitos
Apesar dos grandes volumes financeiros despendidos na educação e a despeito da
consciência (ao menos intuitiva) do papel da educação como ferramenta de desenvolvimento
econômico para um país, inúmeros indicadores apontam para a baixa qualidade do ensino
oferecido pelo Estado, mormente no que diz respeito à educação básica (aqui entendida como
a formada pelos ciclos que precedem o ensino superior).
Para se ter uma idéia do baixo nível de qualidade do ensino brasileiro, basta ver o
desempenho de nossos estudantes no The Programme for International Student Assessment
(PISA), uma avaliação internacional de conhecimentos para alunos de 15 anos de idade. Os
testes do PISA são aplicados a cada 3 anos pela Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE)2 e medem a performance dos estudantes em ciências,
leitura e matemática, além de coletar dados pessoais, familiares e de fatores institucionais que
poderiam explicar as diferenças de desempenho.
2
A OCDE é uma organização sem fins lucrativos, fundada em 1961, com sede em Paris, França, e que conta
com 30 países-membros. Sua missão é criar um fórum intergovernamental para troca de experiências, com o
intuito de apoiar o crescimento econômico sustentável, melhorar a qualidade de vida das populações e auxiliar o
desenvolvimento econômico dos demais países.
16. 7
A última edição do PISA foi a de 20063, da qual participaram mais de 400.000 estudantes
de 57 países. Cerca de 90% da economia mundial estava representada na avaliação.
Dos 57 países participantes, o Brasil ficou em 52º em ciências, 50º em leitura e 54º em
matemática, como se pode ver na Tabela 3.
Numa primeira análise, identificamos que o topo da lista é formado pelos países mais
ricos do mundo (aqueles que apresentam elevados PIB per capita), enquanto que, na parte
inferior do ranking, encontram-se economias em desenvolvimento. Tal fato poderia sugerir, a
um observador mais impaciente, que a explicação para o baixo desempenho do Brasil é o fato
de não investirmos tanto em educação quanto os países ricos, seja por falta de capacidade
econômica, seja por desinteresse dos governantes.
Embutido nesse raciocínio, encontra-se o maior dos mitos que enfrentamos nessa seara: o
de que uma maior qualidade de ensino depende necessariamente de maiores investimentos
financeiros na área.
Em debates sobre a (baixa) qualidade do ensino brasileiro, é comum o pedido de “mais
recursos para a educação”, como se nossos problemas no setor se devessem simplesmente ao
baixo volume de recursos destinados a ele no orçamento público. Se essa fosse a única causa,
seria relativamente fácil promover um salto de qualidade no nível educacional do brasileiro,
destinando uma verba ainda maior do orçamento para a educação. Mas basta dar um passo
além na análise para ver que esse argumento não se sustenta.
O Gráfico 1 apresenta os gastos públicos com educação básica (aqui entendida como
educação primária e secundária, sem incluir a pré-escola) em 2006, como percentual do
Produto Interno Bruto (PIB) dos países participantes do PISA 2006, comparando-os com o
desempenho na referida avaliação (medido como a somatória das pontuações nas três
disciplinas avaliadas: Ciências, Leitura e Matemática).
Pelo gráfico, percebemos que o Brasil é um dos países que percentualmente mais
investem em educação, superando países como Estados Unidos, Canadá, Alemanha, Japão e
Coréia do Sul, cujos desempenhos no PISA 2006 são bem superiores.
3
Na verdade, a última edição do PISA foi a de 2009, mas seus resultados não estarão disponíveis antes de
Dezembro de 2010.
17. 8
TABELA 3 – Ranking de países em Ciências, Leitura e Matemática – PISA 2006
CIÊNCIAS LEITURA MATEMÁTICA
Posição País Pontuação Posição País Pontuação Posição País Pontuação
1 Finlândia 563 1 Coréia do Sul 556 1 Taiwan 549
2 Hong Kong 542 2 Finlândia 547 2 Finlândia 548
3 Canadá 534 3 Hong Kong 536 3 Hong Kong 547
4 Taiwan 532 4 Canadá 527 4 Coréia do Sul 547
5 Estônia 531 5 Nova Zelândia 521 5 Holanda 531
6 Japão 531 6 Irlanda 517 6 Suíça 530
7 Nova Zelândia 530 7 Austrália 513 7 Canadá 527
8 Austrália 527 8 Liechtenstein 510 8 Macau 525
9 Holanda 525 9 Polônia 508 9 Liechtenstein 525
10 Liechtenstein 522 10 Suécia 507 10 Japão 523
11 Coréia do Sul 522 11 Holanda 507 11 Nova Zelândia 522
12 Eslovênia 519 12 Bélgica 501 12 Bélgica 520
13 Alemanha 516 13 Estônia 501 13 Austrália 520
14 Reino Unido 515 14 Suíça 499 14 Estônia 515
15 República Tcheca 513 15 Japão 498 15 Dinamarca 513
16 Suíça 512 16 Taiwan 496 16 República Tcheca 510
17 Macau 511 17 Reino Unido 495 17 Islândia 506
18 Áustria 511 18 Alemanha 495 18 Áustria 505
19 Bélgica 510 19 Estados Unidos* 495 19 Eslovênia 504
20 Irlanda 508 20 Dinamarca 494 20 Alemanha 504
21 Hungria 504 21 Eslovênia 494 21 Suécia 502
22 Suécia 503 22 Macau 492 22 Irlanda 501
23 Polônia 498 23 Áustria 490 23 França 496
24 Dinamarca 496 24 França 488 24 Reino Unido 495
25 França 495 25 Islândia 484 25 Polônia 495
26 Croácia 493 26 Noruega 484 26 Eslováquia 492
27 Islândia 491 27 República Tcheca 483 27 Hungria 491
28 Letônia 490 28 Hungria 482 28 Luxemburgo 490
29 Estados Unidos 489 29 Letônia 479 29 Noruega 490
30 Eslováquia 488 30 Luxemburgo 479 30 Lituânia 486
31 Espanha 488 31 Croácia 477 31 Letônia 486
32 Lituânia 488 32 Portugal 472 32 Espanha 480
33 Noruega 487 33 Lituânia 470 33 Azerbaijão 476
34 Luxemburgo 486 34 Itália 469 34 Rússia 476
35 Rússia 479 35 Eslováquia 466 35 Estados Unidos 474
36 Itália 475 36 Espanha 461 36 Croácia 467
37 Portugal 474 37 Grécia 460 37 Portugal 466
38 Grécia 473 38 Turquia 447 38 Itália 462
39 Israel 454 39 Chile 442 39 Grécia 459
40 Chile 438 40 Rússia 440 40 Israel 442
41 Sérvia 436 41 Israel 439 41 Sérvia 435
42 Bulgária 434 42 Tailândia 417 42 Uruguai 427
43 Uruguai 428 43 Uruguai 413 43 Turquia 424
44 Turquia 424 44 México 410 44 Tailândia 417
45 Jordânia 422 45 Bulgária 402 45 Romênia 415
46 Tailândia 421 46 Sérvia 401 46 Bulgária 413
47 Romênia 418 47 Jordânia 401 47 Chile 411
48 Montenegro 412 48 Romênia 396 48 México 406
49 México 410 49 Indonésia 393 49 Montenegro 399
50 Indonésia 393 50 Brasil 393 50 Indonésia 391
51 Argentina 391 51 Montenegro 392 51 Jordânia 384
52 Brasil 390 52 Colômbia 385 52 Argentina 381
53 Colômbia 388 53 Tunísia 380 53 Colômbia 370
54 Tunísia 386 54 Argentina 374 54 Brasil 370
55 Azerbaijão 382 55 Azerbaijão 353 55 Tunísia 365
56 Quatar 349 56 Quatar 312 56 Quatar 318
57 Quirguistão 322 57 Quirguistão 285 57 Quirguistão 311
18. 9
GRÁFICO 1 – Gastos com Educação Básica em 2006 (em % do PIB) versus Pontuação Total dos Países no PISA 2006
5,5
Islândia
5,0
Dinamarca
4,5 Suécia
Gastos com Educação em % do PIB
Israel Nova Zelândia
Noruega
4,0 Finlândia
Brasil
Portugal Estados Unidos
3,5 Itália Coréia do Sul
México
Hungria
Canadá
3,0
Espanha República Tcheca
Japão
Chile Alemanha
2,5 Eslováquia
Rússia
2,0 Turquia
1,5
1.100 1.200 1.300 1.400 1.500 1.600 1.700
Pontuação Total no PISA 2006
19. 10
Pode-se argumentar que é de se esperar que o Brasil, como economia em
desenvolvimento e apresentando uma pirâmide etária de base larga, em que predominam as
crianças e jovens em idade escolar, destine percentualmente mais recursos à educação que os
países desenvolvidos, cuja estrutura demográfica é distinta.
Voltando ao gráfico, esse argumento também não se sustenta. Basta verificar o
comportamento de México e Chile, dois países latino-americanos com pirâmide demográfica
semelhante à do Brasil. Ambos os Estados comprometem percentualmente menos recursos
orçamentários (3,3% e 2,5% do PIB 2006, respectivamente) e apresentam desempenhos
superiores ao de nossos estudantes.
Até mesmo a Turquia, que gasta percentualmente metade (1,9% do PIB 2006) do que
investe o Brasil (3,8% do PIB), apresenta desempenho bem superior. Para se ter uma idéia, o
desempenho dos estudantes de Chile (somatória de 1.291 pontos no PISA 2006) e Turquia
(1.295 pontos) está a meio caminho das performances de Brasil (1.153 pontos) e Estados
Unidos (1.458 pontos).
Entretanto, algumas pessoas podem empregar o argumento de que a análise dos
percentuais do PIB investidos em educação não permite uma base de comparação adequada
entre os países, uma vez que é possível que uma grande economia que aplique no setor uma
pequena parcela de seu PIB apresente um gasto anual por aluno maior (em US$ PPP) do que
um Estado em desenvolvimento que aplique um elevado percentual de seu PIB em educação.
Por esse motivo, seria mais razoável comparar quanto cada país gasta anualmente por aluno
da rede pública de ensino.
Pois bem. O Gráfico 2 apresenta os gastos anuais por aluno da rede pública de ensino
básico (aqui entendido como ensino primário e secundário, sem incluir a pré-escola) em 2006,
em US$ PPP4, dos países participantes do PISA 2006, comparando-os com o desempenho na
referida avaliação (medido como a somatória das pontuações nas três disciplinas avaliadas:
Ciências, Leitura e Matemática).
4
PPP é a sigla para Purchasing Power Parity, uma metodologia de comparação entre moedas, baseada no poder
de compra e nas taxas de inflação dos diferentes países. Tal metodologia fornece taxas de conversão mais
estáveis ao longo do tempo, em comparação com as taxas de conversão de mercado, que flutuam diariamente.
A metodologia PPP parte da premissa de que, em mercados ideais, bens idênticos devem ter preços idênticos. É
definida uma cesta de bens, facilmente encontrados nos diferentes países pesquisados, e, a partir de seus preços,
estabelecidas as taxas de conversão PPP entre as diferentes moedas. Um exemplo curioso, mas
internacionalmente conhecido, é o Big Mac™ Index, que estabelece as diferenças de poder de compra entre as
moedas a partir da comparação entre os preços do sanduíche Big Mac™ da rede McDonald’s™.
Em nossos estudos, utilizaremos como base de comparação o US$ PPP, convertendo todas as moedas para
dólares americanos, pelas taxas de conversão PPP.
20. 11
Pelo gráfico, identificamos que realmente o Brasil é um dos países que apresentam o
menor gasto público por aluno, em US$ PPP, dentre os participantes do PISA 2006.
Observando melhor o gráfico, no entanto, percebemos que elevada destinação de recursos
financeiros para a educação não é garantia de uma boa qualidade de ensino.
Voltando a analisar os casos de Chile e Turquia, verificamos que ambos os países
apresentam desempenho superior ao brasileiro (1.291 e 1.295 pontos, respectivamente, contra
1.153 do Brasil), ainda que seus gastos públicos anuais por aluno sejam inferiores (US$ 1.521
e US$ 1.286, respectivamente, contra US$ 1.550, no caso brasileiro). Ou seja, podemos
concluir que os estudantes brasileiros poderiam apresentar, no mínimo, desempenho
semelhante aos chilenos e turcos, se a qualidade do ensino fosse explicada pelo volume de
recursos investidos em educação.
O Gráfico 2 ainda traz vários outros exemplos da inexistência de uma relação direta entre
o volume de recursos investidos em educação e a qualidade do ensino obtido.
Tomemos o caso de Noruega, Suécia e Finlândia, países vizinhos, com elevado nível de
desenvolvimento socioeconômico e que apresentam estruturas demográficas semelhantes.
Comparando seus gastos anuais por aluno da rede pública de ensino básico com seus
respectivos desempenhos no PISA, observamos que, dentre os três países, ao menor gasto por
aluno corresponde o melhor desempenho e vice-versa. A Finlândia gasta anualmente US$
6.822 por aluno e totalizou 1.658 pontos no PISA 2006, enquanto a Suécia gasta anualmente
US$ 8.116 e somou 1.512 pontos e a Noruega gasta US$ 10.448 e atingiu 1.461 pontos.
De forma semelhante, o Canadá gasta US$ 6.898 por aluno e tem um desempenho
superior ao dos Estados Unidos (1.588 pontos contra 1.458), que gasta anualmente US$ 9.399
por aluno.
Essas análises também não significam que quanto menor o investimento público em
educação, menor a qualidade do ensino. Há, obviamente, exemplos de países que gastam mais
e obtêm desempenhos superiores aos seus pares que gastam menos.
Na verdade, o que os dados apresentados (e a literatura consultada) apontam é que é
muito fraca a correlação entre o volume de recursos financeiros destinados à educação e a
qualidade do ensino. Os dois gráficos apresentados nesta seção parecem sugerir que, em se
tratando de educação, “gasta mais quem pode mais”, ou seja, os países mais ricos tendem a
investir mais em educação, sem que isso signifique que aqueles que mais investem obterão
desempenhos superiores aos demais.
21. 12
GRÁFICO 2 – Gastos Anuais por Aluno da Educação Básica em 2006 (em US$ PPP) versus Pontuação Total dos Países no PISA 2006
12.000
Noruega
10.000 Suíça
Estados Unidos
Gastos Públicos Anuais por Aluno (US$ PPP)
Islândia
Itália Suécia
8.000
França
Japão Canadá Finlândia
Espanha
Reino Unido
Austrália
Portugal
6.000
Alemanha
Israel Nova Zelândia Coréia do Sul
Hungria Estônia
4.000
Eslováquia Polônia
Rússia
2.000 México
Brasil Chile
Turquia
-
1.100 1.200 1.300 1.400 1.500 1.600 1.700
Pontuação Total no PISA 2006
22. 13
1.4 Propósito do trabalho
Enfrentado o maior dos mitos, é de se esperar, portanto, que haja outros fatores
envolvidos na determinação da qualidade da educação fornecida pelo Estado. O propósito
deste trabalho é, justamente, identificar, de forma ampla, os fatores que explicam as
diferenças na qualidade da educação, mesmo entre entes que apresentam o mesmo nível de
gasto público.
Para atingir esse objetivo, percorreremos o seguinte caminho:
1. Inicialmente, serão levantados, junto à literatura especializada, os fatores a quem os
estudos estatísticos atribuem influência significativa na qualidade do ensino,
comprovada por análises quantitativas;
2. Em seguida, será feito um diagnóstico da situação da educação brasileira (em
particular, a do ensino fundamental da rede pública municipal de São Paulo) no que
diz respeito a esses fatores;
3. Por fim, diante do que foi apreciado, serão propostas algumas medidas (baseadas,
principalmente, nas experiências de outros governos) que poderão surtir efeito
positivo na obtenção de uma melhor qualidade no ensino público brasileiro (mais
especificamente no Município de São Paulo).
A opção por focar o estudo na educação pública de nível fundamental do município de
São Paulo é explicada por três razões:
• Em primeiro lugar, a educação no Brasil, bem como na maioria dos países, é
fornecida primordialmente em caráter público. Nada menos do que 91,2% dos
recursos investidos em 2006 em educação nos países da OCDE foram de origem
pública. O Brasil não possui dados precisos a esse respeito, mas, de acordo com
dados do Censo Escolar 2009, 86,1% dos estudantes brasileiros da educação básica
estão matriculados na rede pública de ensino.
• A educação fundamental compete prioritariamente aos municípios, conforme atribui
a Constituição Federal.
• Por fim, a escolha do município de São Paulo justifica-se tanto pela facilidade de
obtenção de informações referentes aos gastos e resultados atingidos pela Secretaria
de Educação do Município de São Paulo, dada a vastidão de dados disponibilizados
em seu sítio na Internet (o que não é comum acontecer em municípios menores),
quanto pelo propósito primeiro deste trabalho, que serve como monografia de
23. 14
conclusão do curso de Especialização em Administração Pública, realizado na Escola
de Contas Conselheiro Eurípedes Sales, vinculada ao Tribunal de Contas do
Município de São Paulo. Nada mais adequado, como forma de retribuir os
investimentos de recursos municipais em nossa formação, do que aplicar os
conhecimentos adquiridos em um assunto que interessa diretamente aos cidadãos
paulistanos.
1.5 Resultados esperados
Ao final do trabalho, espera-se, mais do que realizar o diagnóstico da qualidade do ensino
público brasileiro, ressaltar a importância da boa gestão dos investimentos em educação para
o processo de construção de uma sociedade brasileira mais justa e igualitária.
A educação no Brasil é um território povoado por muitas falácias, tomadas como
“verdades inquestionáveis”. Muitas das práticas usuais e das reformas que são implantadas ou
propostas não têm fundamento científico, mas político. Dessa forma, acabam por agravar o já
desolador quadro da educação no país.
Com a elaboração dessa monografia, esperamos, mais do que desmistificar algumas
dessas “verdades”, colaborar com a administração municipal, no sentido de atingir uma
melhor gestão dos recursos da educação, ao direcioná-los para os programas e atividades que
geram um maior retorno para a sociedade, estancando a drenagem para aqueles que, apesar de
contarem com defensores fervorosos, pouco contribuem para uma maior qualidade na
educação.
Enfim, espera-se chegar à conclusão de que o Brasil (e, particularmente, o município de
São Paulo) não gasta pouco com educação, mas gasta mal. Ao contrário do que se possa
imaginar, essa seria uma boa notícia, já que não haveria a necessidade de obtenção de mais
recursos para financiar o Estado (muito mais difícil, uma vez que o brasileiro já está
submetido a uma elevada carga tributária), mas tão somente a redistribuição desses recursos
entre os programas.
24. 15
2 FATORES DETERMINANTES DA QUALIDADE NA EDUCAÇÃO
Vários são os estudos nacionais e internacionais que tentam encontrar os fatores
determinantes da qualidade do ensino.
Em geral, tais estudos procuram identificar, por meio de exames estatísticos, se um
determinado fator afeta significativamente (e, em caso afirmativo, se positiva ou
negativamente) o desempenho dos estudantes (geralmente medido através de suas notas em
um dado teste), a partir de dados levantados em pesquisas ou censos escolares.
Por se tratar de uma questão sobremaneira complexa, muitos dos fatores envolvidos são
difíceis de serem medidos objetivamente, reduzindo o escopo de análises possíveis. É o caso,
por exemplo, da dedicação dos professores. Intuitivamente, é de se esperar que professores
mais comprometidos com a qualidade das aulas sejam capazes de gerar um processo de
ensino-aprendizado de maior desempenho. Entretanto, não existem estudos estatísticos que
comprovem, de forma quantitativa, a influência de tal fator. Isso se repete para diversos outros
fatores.
Além disso, os resultados encontrados em um estudo, muitas vezes, contradizem o que
outros estudos haviam demonstrado, devido a diferenças na metodologia de análise
empregada ou mesmo imperfeições nas bases de dados utilizadas. Por isso, demos preferência
nesse trabalho para a utilização de meta-análises, isto é, estudos que analisam um conjunto
enorme de outros estudos, filtrando, assim, possíveis vícios que alguns deles venham a
apresentar.
A despeito dessas limitações, analisando tais estudos, é possível chegar a conclusões
surpreendentes e esclarecedoras a respeito dos fatores que determinam a qualidade da
educação.
Os estudos, em geral, debruçam-se sobre três grupos de fatores que afetariam a qualidade
do ensino fornecido pelo Estado:
• Fatores escolares – infra-estrutura escolar, carga horária, tamanho da turma, além
das características de professores e diretores etc.
• Fatores individuais – idade de ingresso no sistema escolar, reprovações prévias,
necessidade de trabalhar etc.
• Fatores familiares – escolaridade dos pais, renda familiar, etc.
Detalharemos cada um deles a seguir.
25. 16
2.1 Fatores escolares
As pesquisas realizadas no Brasil apontam que apenas 30% do desempenho escolar pode
ser explicado pelos fatores escolares, ficando os 70% restantes por conta dos atributos
individuais e familiares dos estudantes. Ainda assim são eles que, sem dúvida, despertam
mais interesse nos formuladores de políticas públicas, por serem, no dizer de VELEZ,
SCHIEFELBEIN & VALENZUELA (1993), “alteráveis”. Atributos individuais e familiares
são pouco atingidos por políticas educacionais, ao menos no curto e médio prazo, sendo
considerados, nesse espectro de tempo, “inalteráveis”. Por isso, à análise dos fatores escolares
é dedicada a maior parte dos estudos sobre os determinantes da qualidade do ensino.
De todos os estudos que foram realizados nessa área, escolhemos três que servirão como
base neste trabalho: o de HANUSHEK, RIVKIN & TAYLOR (1996), que analisou 377
estudos sobre a influência de fatores escolares no desempenho dos estudantes norte-
americanos; o de VELEZ, SCHIEFELBEIN & VALENZUELA (1993), que revisou os
resultados de 18 pesquisas sobre o rendimento acadêmico de estudantes da educação primária
na América Latina e Caribe, no período de 1972-1992; e o de MENEZES-FILHO (2007), que
realizou estudos sobre os fatores que determinam o desempenho escolar dos alunos
brasileiros, tomando por base os dados obtidos do SAEB 20035. Assumiremos aqui que os
fatores que determinam o desempenho escolar de estudantes são os mesmos no Brasil, nos
Estados Unidos ou em qualquer outro país.
Os estudos acima concluíram que os fatores escolares que afetam significativamente o
desempenho estudantil são:
• Número de horas-aula diárias;
• Acesso a livros e materiais didáticos;
• Escolaridade dos professores;
• Experiência dos professores;
• Assiduidade dos professores;
5
O SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica) é composto por dois exames: a Avaliação Nacional da
Educação Básica (Aneb) e a Avaliação Nacional do Rendimento Escolar (Anresc). Ambas consistem na
aplicação de provas de Língua Portuguesa e Matemática aos alunos avaliados.
A Aneb é realizada por amostragem das Redes de Ensino, em cada unidade da Federação e tem foco nas gestões
dos sistemas educacionais. É realizada nos anos ímpares, nas 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental e na 3ª série
do Ensino Médio das unidades de ensino públicas e privadas, nas áreas urbana e rural. A Aneb recebe o nome de
Saeb em suas divulgações.
A Anresc é mais extensa e detalhada que a Aneb e tem foco em cada unidade escolar. Também é realizada nos
anos ímpares, mas somente nas 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental das unidades de ensino públicas da área
urbana. A Anresc recebe o nome de Prova Brasil em suas divulgações.
26. 17
• Estado de conservação da escola.
Por outro lado, os seguintes fatores escolares, comumente citados como importantes, não
apresentaram, nos estudos analisados, influência significativa no desempenho escolar dos
estudantes:
• Número de alunos por turma;
• Salário dos professores;
• Número de escolas em que o professor leciona;
• Forma de seleção dos diretores das escolas.
Vale ressaltar que, dentre os fatores escolares, não foram analisados neste trabalho as
diferenças de desempenho escolar atribuídas aos diversos métodos pedagógicos empregados,
por dois motivos. Em primeiro lugar, o processo ensino-aprendizado é um fenômeno
complexo, o que torna inviável classificar, dentro de uma única filosofia pedagógica, a
metodologia empregada por um determinado professor. Além disso, no Brasil, como na
maioria dos países, é difícil controlar, na prática, a forma como se dá a interação do professor
com a turma de alunos. Por mais que a escola adote certa orientação pedagógica, poucos são
os mecanismos de que dispõe a direção para assegurar seu cumprimento pelo professor.
2.1.1 Fatores escolares com influência significativa no desempenho escolar
2.1.1.1 Número de Horas-Aula Diárias
O número de horas-aula a que os estudantes estão submetidos diariamente é uma das
poucas variáveis que, de maneira consistente, aparece como significativa em todos os estudos
analisados. Ou seja, como era de se esperar, quanto maior o tempo que o aluno permanece na
escola, assistindo aulas, maior é seu desempenho escolar.
O estudo de MENEZES-FILHO (2007) indica que os alunos que passam de 4 a 5 horas
ou mais de 5 horas na sala de aula têm um desempenho melhor do que aqueles que ficam
menos de 4 horas. Tal estudo ainda indica que o número de horas-aula diárias é a variável
escolar que apresenta a maior influência dentre as apresentadas. Portanto, é nela que devem
ser investidos prioritariamente os recursos para melhoria da qualidade do ensino, para que se
obtenha o maior salto qualitativo com o menor dispêndio financeiro.
27. 18
2.1.1.2 Acesso a Livros e Materiais Didáticos
O estudo de VELEZ, SCHIEFELBEIN & VALENZUELA (1993) chegou à conclusão de
que a utilização de livros-texto e outros materiais de leitura apresentam uma relação positiva e
significativa com o desempenho escolar. No entanto, o mesmo artigo aponta que a utilização
de materiais didáticos adicionais, como mapas e maquetes, não apresenta efeitos da mesma
magnitude.
O estudo de WOESSMANN (2001) confirma essa associação, encontrando uma relação
negativa e significativa entre a constante falta de materiais didáticos (como livros-texto) e o
desempenho escolar, ao mesmo tempo em que encontrou uma relação positiva e significativa
entre as escolas que não apresentavam falta de material didático e o bom desempenho escolar
de seus estudantes.
Portanto, é fundamental garantir aos alunos o acesso aos livros didáticos (de boa
qualidade, obviamente), sem atrasos e outros inconvenientes, sob pena de prejudicar seu
desempenho escolar.
2.1.1.3 Escolaridade, Experiência e Assiduidade dos Professores
Os fatores escolares relacionados aos professores são, sem sombra de dúvida, os mais
polêmicos. Os estudos apontam, muitas vezes, resultados contraditórios ou de interpretação
dúbia. Dos estudos analisados, é possível concluir que a escolaridade, a experiência e a
assiduidade dos professores possuem influência significativa e positiva no desempenho
escolar.
Começando pela escolaridade dos docentes, MENEZES-FILHO (2007) encontrou um
efeito pequeno da escolaridade do professor sobre o desempenho dos alunos. HANUSHEK
(2006) não encontrou relação significativa entre a escolaridade do professor e o desempenho
escolar de seus alunos. Por outro lado, VELEZ, SCHIEFELBEIN & VALENZUELA (1993)
e WOESSMANN (2001) encontraram evidências de uma influência significativa da
escolaridade dos docentes no rendimento acadêmico dos estudantes.
Diante dessa divisão, mesmo entre os especialistas, e considerando que, intuitivamente, é
de se esperar que um professor com um nível maior de escolaridade seja capaz de ministrar
melhores aulas, pois detém um melhor domínio da matéria, estamos considerando, neste
trabalho, a escolaridade do professor como um dos fatores escolares relevantes para um bom
rendimento acadêmico dos alunos.
28. 19
A experiência letiva do professor tem uma relação um pouco mais significativa com o
desempenho escolar, ainda que não apresente evidências irrefutáveis. VELEZ,
SCHIEFELBEIN & VALENZUELA (1993) e WOESSMANN (2001) identificaram uma
associação significativa e positiva entre a experiência do docente e o rendimento acadêmico
dos estudantes. HANUSHEK (2006), por sua vez, teme em afirmar convictamente tal relação,
preferindo aguardar por mais estudos. Ele aponta, no entanto, uma possível explicação para
essa dubiedade: a relação não-linear entre a experiência letiva e a qualidade da aula
ministrada pelo professor. Para Hanushek, a experiência do professor faz diferença nos seus
primeiros anos de magistério, quando os docentes apresentam um desempenho pior do que ao
atingirem uma maior experiência. Passados esses primeiros anos, o efeito do ganho de
experiência é relativamente amenizado, de forma que a diferença entre 5 anos ou 30 anos de
experiência é modesta.
De toda forma, ainda que pairem algumas dúvidas quanto à real dimensão da influência
da experiência dos professores no rendimento acadêmico de seus estudantes, considerá-la-
emos um fator significativo.
Por fim, tratemos de um fator escolar tipicamente brasileiro: a (falta de) assiduidade dos
professores da rede pública. Para se ter uma idéia da gravidade da situação, em 2007, a rede
estadual de São Paulo apresentava 30 mil faltas diárias de professores (12,8% do total de
docentes). É como se a cada 7 ou 8 dias todo o contingente de professores faltasse.
Apesar de essas faltas estarem, em sua maioria, amparadas por dispositivos legais (que,
inclusive, impedem seu desconto em folha de pagamento), não deixam de ser prejudiciais aos
alunos, como comprova um recente estudo (publicado em 2009) da Secretaria Estadual de
Educação de São Paulo.
O referido estudo cruzou dados de faltas de docentes com o desempenho dos estudantes
da 4ª série do ensino fundamental no Saresp6 2007, e chegou à conclusão de que a cada 1
ponto percentual de aumento de faltas de professores há perda de 14 pontos em língua
portuguesa e 16 pontos em matemática entre os alunos. Considerando que a nota média dos
alunos da 4ª série do ensino fundamental foi de 186,8 em língua portuguesa e de 182,5 em
matemática, cada aumento de 1 ponto percentual de faltas de professores piora em 7,5% a
6
O Saresp é o sistema de avaliação de aprendizagem do governo do Estado, que consiste na aplicação de provas
de Língua Portuguesa e Matemática aos alunos e questionários aos alunos e às escolas. São avaliados todos os
alunos da 2ª, 4ª, 6ª e 8ª séries do Ensino Fundamental e da 3ª série do Ensino Médio da rede pública estadual.
Sua escala varia de 0 a 500 pontos.
29. 20
nota média em língua portuguesa e em 8,8% a nota média em matemática. É uma influência
muito significativa para um único fator.
Felizmente, medidas já estão sendo tomadas para sanar esse problema. O próprio governo
do Estado de São Paulo conseguiu aprovar mudanças nos dispositivos legais, estabelecendo
um limite para o número de faltas por atestados médicos. Os resultados da medida são
animadores, tendo-se reduzido o número de faltas em 60%, nos 6 primeiros meses de vigor da
nova lei.
2.1.1.4 Estado de Conservação da Escola
O estudo de MENEZES-FILHO (2007) associa o estado de conservação da escola
(medido por um observador do MEC, para a avaliação do SAEB 2003) a um melhor
desempenho escolar. Tal associação é confirmada pelo estudo de VELEZ, SCHIEFELBEIN
& VALENZUELA (1993).
Essa associação faz mais sentido quando analisada de maneira indireta, ou seja, se
encararmos o estado de conservação da escola não como um fator direto de melhoria no
desempenho escolar, mas como um sinalizador do grau de zelo com que o diretor, os
professores, os funcionários, os pais e os próprios alunos tratam a educação e,
conseqüentemente, as instalações físicas da escola. É difícil imaginar uma escola com
instalações mal-conservadas, mas com excelência de ensino. Em geral, o descuido com o
patrimônio físico anda de mãos dadas com o desleixo com a função primária da instituição, no
caso, o ensino.
Assim, provida a infra-estrutura básica (mobiliário adequado, água e energia elétrica),
faz-se importante cobrar dos diretores uma política de preservação do patrimônio escolar.
Aqueles que não estiverem conseguindo manter em boas condições as instalações cuja
administração lhes foi confiada, devem ter sua capacidade de gestão revista.
Apesar disso, não entendemos que a melhoria das condições de infra-estrutura das escolas
públicas deva ser uma das preocupações primeiras da administração pública. Dispêndios
adicionais com vistas simplesmente a uma infra-estrutura melhor podem não ser um meio
muito eficaz de melhorar a qualidade da educação.
30. 21
2.1.2 Fatores escolares com influência não significativa no desempenho escolar
2.1.1.1 Número de Alunos por Turma
Uma das falácias mais recorrentes nas discussões sobre qualidade do ensino público é a
preocupação com o tamanho das turmas. Quase a totalidade das afirmações que são feitas
nesses debates tomam o grande número de alunos por turma como sendo um dos principais
responsáveis pela baixa qualidade do ensino. Por esse discurso, o mais adequado a se fazer é
distribuir os alunos em turmas menores, para que o professor possa (supostamente) dedicar
mais atenção a cada aluno, individualmente. Para isso, no entanto, faz-se necessário contratar
mais professores e construir mais salas de aula (ou, ao menos, reformar a escola, para criar
duas ou mais salas de aula, onde antes havia uma).
Entretanto, todos os estudos nacionais e internacionais analisados nos trazem uma grata
surpresa, ao comprovar que não há correlação alguma entre o número de alunos por turma e o
desempenho estudantil.
VELEZ, SCHIEFELBEIN & VALENZUELA (1993) afirma que, “confirmando o
encontrado no mundo, o tamanho da turma não tem efeitos negativos no rendimento”.
HANUSHEK, RIVKIN & TAYLOR (1996) apontam que o aumento de despesas com
educação derivadas do esforço em reduzir a relação alunos/professor7 nas escolas norte-
americanas apresentaram sistematicamente pouco impacto no desempenho estudantil.
WOESSMANN (2001) chega a encontrar efeitos negativos significativos entre turmas
pequenas e o desempenho estudantil, associando classes menores a piores desempenhos.
MENEZES-FILHO (2007) diz (grifos nossos):
Existe uma polêmica muito grande quanto aos efeitos do tamanho da
turma sobre a qualidade do ensino e nossos resultados indicam que no
sistema público brasileiro o tamanho da turma não parece ser importante
para explicar o desempenho escolar.
E propõe, levando em conta que, como já visto, o aumento do número de horas-aula
diárias está associado a um maior desempenho estudantil (grifos nossos):
Isto nos fornece uma proposta simples de política pública: devemos
aumentar o tamanho das turmas para que os alunos permaneçam mais
tempo na escola.
7
A relação alunos/professor é um indicador do tamanho da turma. Quanto maior a relação, maior o tamanho da
turma.
31. 22
2.1.1.2 Salário dos Professores
Chegamos, sem dúvida, ao mais polêmico dos fatores tratados neste trabalho. Entretanto,
a polêmica não se constrói pela existência de estudos que demonstram resultados
contraditórios, mas porque os estudos estatísticos apontam, quase que unanimemente, para a
direção que contraria o senso comum: os estudos nacionais e internacionais mais famosos
sobre o tema concluem que o salário pago aos professores não tem relação significativa com o
desempenho escolar dos estudantes, nem, portanto, com a qualidade do ensino.
É um resultado que choca, à primeira vista, ao se levar em conta que é “fato notório” a
má remuneração dos professores brasileiros da rede pública. A mídia, impulsionada pelos
próprios docentes e por alguns administradores públicos, associam (como se vê, sem
fundamento científico algum) a má qualidade do ensino público brasileiro aos baixos salários
pagos aos profissionais do magistério, o que impediria a rede pública de atrair os melhores
profissionais, com as conseqüências que todos conhecemos. Por isso, são tão comuns os
pedidos por uma melhor remuneração para os professores, apoiados não somente pelos
membros da própria classe, mas por todos os “cidadãos conscientes” em busca de uma melhor
qualidade de ensino para nossos estudantes. Infelizmente, não poderiam estar mais errados.
Hanushek, em dois estudos (HANUSHEK, RIVKIN & TAYLOR (1996) e HANUSHEK
& RIVKIN (2006)) concluiu que não há evidência estatística alguma de que exista uma
relação significativa entre os salários recebidos pelos professores norte-americanos e o
desempenho escolar de seus alunos. Os poucos estudos que encontraram alguma relação não
apresentaram resultados estatisticamente significativos.
VELEZ, SCHIEFELBEIN & VALENZUELA (1993) também afirmam que, no caso da
América Latina e Caribe, “os incentivos salariais (...) não parecem ser importantes para a
melhoria do desempenho acadêmico dos estudantes”.
MENEZES-FILHO (2007), por sua vez, afirma que “o salário dos professores [da rede
pública] não tem nenhum impacto na proficiência dos seus estudantes”. Curiosamente, o
mesmo estudo encontrou uma relação significativa e positiva entre os salários dos professores
da rede privada e o desempenho escolar de seus alunos. Na opinião de Menezes-Filho, “isto é
consistente com o fato de que no sistema privado os melhores professores obtêm maiores
salários, o que não ocorre na rede pública”.
Encontramos aí um raciocínio muito esclarecedor: o simples aumento de salários não vai,
por si só, melhorar a qualidade do ensino ministrado pelos professores já contratados, nem
será eficiente em atrair pessoas mais qualificadas para o magistério, pois a renovação dos
32. 23
quadros de docência depende do surgimento de vagas deixadas por seus atuais ocupantes.
Entretanto, uma boa solução seria seguir o exemplo do ensino privado, e atrelar uma parte
considerável da remuneração dos professores da rede pública ao atendimento de metas de
desempenho acadêmico de seus alunos (motivando os atuais professores a melhorarem a
qualidade de suas aulas), ao mesmo tempo em que se torne possível demitir professores que
sistematicamente não atinjam as metas estipuladas, abrindo a oportunidade para que suas
vagas sejam preenchidas por novos professores, mais dispostos a trabalhar. Certamente,
seriam medidas de difícil implementação, dado o forte lobby de que dispõem os professores,
mas com resultados promissores.
2.1.1.3 Número de Escolas em que o Professor Leciona
Realidade tipicamente brasileira, não há estudos internacionais sobre a influência deste
fator escolar no desempenho escolar dos estudantes, muito provavelmente por não estar
presente no sistema educacional de outros países. Por mais surpreendente que possa parecer,
também quase não existem estudos nacionais que analisem a importância desse fator na
qualidade do ensino público brasileiro.
O único estudo encontrado que abordava esta variável foi o de MENEZES-FILHO
(2007), que chegou à conclusão de que o fato de o professor lecionar em mais de uma escola
não afeta o desempenho dos alunos.
Contudo, apesar de aparentemente não se caracterizar como algo nocivo, também não
parece carregar em si vantagem alguma. Ainda que apenas por questões de melhoria da
qualidade de vida do professor, sobretudo em grandes centros, um sistema educacional mais
adequado seria aquele em que os docentes não ocupam mais de um emprego, seja por
necessidade de complementar o salário, seja por mera opção de preencher os períodos
disponíveis do dia, dada a carga horária exigida ser menor do que 40 horas semanais.
Pessoalmente, acreditamos que as razões para a carga horária típica dos professores ser
reduzida (20 ou 30 horas semanais) em relação à maioria dos demais trabalhadores (40 horas
semanais) sejam históricas. Mas quaisquer que fossem essas razões, hoje já não se sustentam.
Na educação básica, o fato de o professor ter uma segunda ocupação, ainda que distinta
do magistério, não traz vantagem adicional para os estudantes. Isso talvez faça sentido no
ensino técnico e superior, quando a experiência profissional do docente em ramos distintos do
magistério adicione conteúdo prático impossível de se adquirir apenas na teoria.
33. 24
Dessa forma, acreditamos que o ideal seria que cada professor trabalhasse apenas em uma
escola, com carga horária equivalente às 40 horas semanais dos demais trabalhadores,
recebendo, obviamente, uma remuneração compatível à jornada.
2.1.1.4 Forma de Seleção dos Diretores das Escolas
Esta é outra variável pouco estudada internacionalmente. No dizer de VELEZ,
SCHIEFELBEIN & VALENZUELA (1993):
Apesar do consenso geral sobre o papel-chave dos diretores, poucas
pesquisas foram feitas sobre este tópico nos países da América Latina e do
Caribe. (...) Os estudos não mostram resultados claros e se devem realizar
mais pesquisas que incluam aspectos como liderança e motivação dos
diretores (...).
No Brasil, há alguns estudos que avaliam a influência deste fator no desempenho escolar
dos estudantes, dos quais destacaremos dois.
O estudo de MENEZES-FILHO (2007) não encontrou relação estatisticamente
significativa entre a forma de escolha dos diretores da escola e o desempenho estudantil,
concluindo que “o critério de seleção do diretor (processo seletivo ou indicação técnica ou
política) tem pouca influência no desempenho dos alunos, (...) o que não deixa de ser
surpreendente”.
A análise de BIONDI & FELICIO (2007) foi mais rica, ainda que tenha chegado ao
mesmo resultado. As autoras empregaram três métodos estatísticos distintos e obtiveram
resultados diferentes para cada um deles, quando aplicados sobre esta variável. Todavia,
nenhum destes resultados indica, de forma robusta, a presença de uma associação
estatisticamente significativa entre a forma de seleção dos diretores das escolas e a
proficiências dos alunos.
2.1.3 Comentários adicionais
Gostaríamos, neste momento, de fazer um mea culpa com a classe docente. Para isso,
colocamos um trecho de MENEZES-FILHO (2007), que traduz exatamente nosso propósito
(grifos nossos):
É importante enfatizar neste ponto que o fato de várias das
características dos professores não explicarem o desempenho dos alunos
não significa que o professor não importa. Isto pode significar apenas que
34. 25
as características que realmente importam, tais como didática, esforço e
preparação, não são observáveis nos nossos dados. Estudos com dados dos
Estados Unidos, por exemplo, mostram que determinados professores
sempre conseguem aumentar o aprendizado de seus alunos, mas que estes
professores não tendem a ser os mais educados, nem os mais bem pagos,
nem os mais experientes (...).
Assim, queremos que fique claro que nosso objetivo, nesta parte do trabalho, não foi
desmerecer o professor, nem diminuir sua importância como facilitador do processo de
aprendizado. Nosso intuito foi, tão-somente, derrubar alguns dos tantos mitos que ainda
rondam a política educacional brasileira em sua busca por uma melhor qualidade de ensino.
2.2 Fatores individuais
Passemos agora para a análise dos atributos individuais dos estudantes que estão
associados com um melhor desempenho escolar. Aqui estão contemplados fatores “alteráveis”
(como o fato de o aluno trabalhar enquanto estuda) e “inalteráveis” (como o Q.I.8, por
exemplo) por políticas públicas. Discutiremos, preferencialmente, os fatores “alteráveis”, por
motivos óbvios, eventualmente abordando um fator “inalterável” quando indispensável.
Nesta seção, também não discutiremos diferenças de desempenho escolar atribuídas a
sexo (masculino e feminino) nem a cor de pele, pois acreditamos não serem relevantes do
ponto de vista de formulação de políticas públicas educacionais. No primeiro caso, devido a
diferenças genéticas, mulheres têm notas médias em leitura superiores aos homens, ao passo
que estes têm notas médias em matemática superiores a aquelas. No segundo caso, as
diferenças observadas entre desempenhos de alunos de cores de pele distintas devem-se,
fundamentalmente, à diferença de status socioeconômico entre eles. Além disso, em ambos os
casos é difícil imaginar, no Brasil, a construção de políticas educacionais diferenciadas por
sexo e por cor de pele que sejam bem-sucedidas.
Dos vários estudos, nacionais e internacionais, realizados nessa área, escolhemos dois
que servirão como base nesta seção: o de VELEZ, SCHIEFELBEIN & VALENZUELA
(1993), que revisou os resultados de 18 pesquisas sobre o rendimento acadêmico de
estudantes da educação primária na América Latina e Caribe, no período de 1972-1992; e o de
MENEZES-FILHO (2007), que realizou estudos sobre os fatores que determinam o
8
O Quociente de Inteligência (Q.I.), cada vez mais em desuso, é um indicador desenvolvido para avaliar as
capacidades cognitivas (inteligência) de um indivíduo, conforme a faixa etária em que se enquadra. É obtido por
meio da aplicação de testes de raciocínio.
35. 26
desempenho escolar dos alunos brasileiros, tomando por base os dados obtidos do SAEB
2003. Continuamos a assumir aqui que os fatores que determinam o desempenho escolar de
estudantes são os mesmos no Brasil, nos Estados Unidos ou em qualquer outro país.
Os estudos acima concluíram que os fatores individuais que afetam significativamente o
desempenho estudantil são:
• Cursar a pré-escola;
• Idade do aluno compatível com a série;
• Histórico de repetência;
• Leitura de livros, jornais e/ou revistas;
• Trabalhar e estudar ao mesmo tempo;
• Motivação do aluno.
Diferentemente do que aconteceu durante a análise dos fatores escolares, não nos
deparamos com muitas surpresas nos resultados desses estudos. A maior parte do que foi
encontrado condiz com o que seria esperado utilizando o senso comum.
Os resultados encontrados tanto por MENEZES-FILHO (2007) quanto por VELEZ,
SCHIEFELBEIN & VALENZUELA (1993) mostram claramente que os alunos que cursaram
a pré-escola apresentam uma melhor proficiência do que seus colegas que não o fizeram. Isso
parece indicar que os investimentos na educação infantil (pré-escola) produzem resultados
efetivos na melhoria da qualidade do ensino.
Por outro lado, o aluno cuja idade não é compatível com a série que cursa (distorção
série-idade), ou seja, aquele que está numa série inferior à que seria ideal na sua idade
(independentemente de repetência), apresenta um desempenho muito pior do que seus colegas
que estão na série correta ou mesmo do que aqueles que estão “adiantados” (numa série
superior à que seria ideal na sua idade). MENEZES-FILHO (2007) suspeita que isso seja
reflexo do “efeito de variáveis ligadas à entrada tardia na escola ou discriminação”. Qualquer
que seja o motivo, é a característica individual que apresenta a maior influência negativa no
desempenho escolar.
Outro fator associado de forma negativa ao desempenho acadêmico é a repetência. No
estudo de MENEZES-FILHO (2007) a repetência foi o segundo fator de maior influência
negativa no desempenho estudantil, perdendo apenas para a distorção série-idade. Nas
palavras de Menezes-Filho (grifos nossos):
Os resultados indicam também que a repetência anterior provoca uma
grande diminuição na proficiência atual, ao contrário do que advogam os
36. 27
críticos dos programas de progressão continuada. Parece claro, portanto,
que a repetência, além de aumentar os custos da educação para os estado e
municípios, não recupera o aluno em termos de aprendizado.
Os achados de VELEZ, SCHIEFELBEIN & VALENZUELA (1993) corroboram as
conclusões acima:
Da mesma forma que o encontrado em outros países mais
desenvolvidos, as experiências de repetição de alguma série escolar estão
associadas a um baixo rendimento cognoscitivo. A repetição de uma série
escolar não é solução para os problemas de aprendizagem, a menos que
esteja acompanhada por um trabalho preventivo e de regularização.
Como se vê, estamos diante de uma das poucas, por assim dizer, “surpresas” encontradas
na análise dos fatores individuais determinantes do desempenho escolar. A maior parte dos
“especialistas” em educação, respaldados pela mídia, apressa-se em condenar os regimes de
progressão continuada, implantados nos últimos anos em grande parte das redes públicas de
ensino (a exemplo da rede estadual de São Paulo, em 1998). Atribuem a eles grande parte da
culpa pela baixa qualidade do ensino brasileiro. Os resultados encontrados pelos estudos
estatísticos, como os apresentados aqui, apontam na direção oposta.
Prosseguindo com nossa análise, MENEZES-FILHO (2007) encontrou ainda que os
estudantes que costumam ler livros, jornais e/ou revistas apresentam, em geral, desempenhos
melhores do que os que nunca ou quase nunca o fazem. Tal resultado já era de se esperar.
Os estudos MENEZES-FILHO (2007) também concluem que os alunos que trabalham e
estudam têm desempenho pior do que aqueles que só estudam. Isso vale tanto para os
estudantes que trabalham fora de casa quanto para aqueles cujas responsabilidades nos
afazeres domésticos superam 4 horas.
Por fim, os dois estudos sugerem que a motivação dos alunos é determinante no
desempenho escolar. VELEZ, SCHIEFELBEIN & VALENZUELA (1993) encontraram uma
forte associação positiva entre o desempenho acadêmico e a atitude dos alunos com relação
aos estudos. Os estudos de MENEZES-FILHO (2007), por sua vez, indicam que “os jovens
que ambicionam estudar tempo integral após o término do ciclo em que estão têm uma nota
muito superior aos que pretendem largar a escola, e ligeiramente superior aos que pretendem
estudar e trabalhar ao mesmo tempo”. Ou seja, aqueles estudantes que não conseguem
enxergar uma aplicação prática para seus estudos no curto prazo tendem a ter motivação para
aprender mais baixa e, conseqüentemente, a apresentar desempenhos piores.
37. 28
2.3 Fatores familiares
Analisaremos, por fim, as características que afetam significativamente o desempenho
escolar e que estão relacionadas às famílias dos estudantes. São, por sua própria condição,
“inalteráveis”, ao menos no curto e médio prazos, havendo muito pouco o que as políticas
públicas possam fazer para alterar consideravelmente tal quadro. Justamente por esse motivo,
são mais utilizados nos estudos estatísticos como “variáveis de controle”, isto é, seus efeitos
são “anulados” (ou compensados) no estudo da influência dos demais fatores (escolares e
individuais).
Os quatro (dentre inúmeros) estudos que servirão como fonte para a análise dos fatores
familiares são: o de WOESSMANN (2001), que analisou os fatores que explicariam os
resultados do Third International Mathematics and Science Study (TIMSS); o de VELEZ,
SCHIEFELBEIN & VALENZUELA (1993), que revisou os resultados de 18 pesquisas sobre
o rendimento acadêmico de estudantes da educação primária na América Latina e Caribe, no
período de 1972-1992; o de MENEZES-FILHO (2007), que realizou estudos sobre os fatores
que determinam o desempenho escolar dos alunos brasileiros, tomando por base os dados
obtidos do SAEB 2003; e o de MACEDO (2004), que analisou os fatores que explicam o
comportamento do desempenho de dois grupos de estudantes brasileiros de 4ª e 5ª séries do
ensino fundamental em testes aplicados em anos subseqüentes. Desnecessário lembrar que
continuamos a assumir aqui que os fatores que determinam o desempenho escolar de
estudantes são os mesmos no Brasil, nos Estados Unidos ou em qualquer outro país.
Os estudos acima concluíram que os fatores familiares que afetam significativamente o
desempenho estudantil são:
• Renda da família;
• Renda média da vizinhança;
• Escolaridade dos pais;
• Escolaridade média dos pais dos colegas;
• Tamanho da família;
• Número de livros em casa;
• Presença de computador em casa.
Vale ressaltar que os mecanismos pelos quais os fatores familiares influenciam o
desempenho escolar ainda não são bem compreendidos. Todos os estudos analisados limitam-
38. 29
se a confirmar ou rejeitar a influência de tais fatores, bem como sua direção (se positiva ou
negativa) e sua magnitude.
Comentando, agora, cada item da lista acima, temos que os dois fatores com maior
influência são o status socioeconômico (representado pela renda da família e da vizinhança) e
a escolaridade dos pais (do próprio aluno e dos seus colegas).
Os estudos de VELEZ, SCHIEFELBEIN & VALENZUELA (1993) apontam que
estudantes que pertencem a famílias com maior status socioeconômico (maior renda)
apresentam desempenho melhor do que seus pares oriundos de famílias de menor poder
aquisitivo. Da mesma forma, alunos que moram em regiões de renda média mais elevada
tendem a apresentar performances melhores do que aqueles que vivem em lugares de renda
média inferior.
A conclusão acima não é de todo surpreendente, diante do que normalmente se vê no dia-
a-dia. Há várias explicações possíveis para tal efeito: acesso dos estudantes de maior poder
aquisitivo a materiais escolares de melhor qualidade; alunos de maior renda têm, em geral,
mais oportunidades de aprendizagem fora da escola (por meio de professores particulares,
cursos livres, programas de TV e navegação em sites da Internet); filhos de famílias com
maior renda não necessitam começar a trabalhar desde jovens, dedicando-se integralmente aos
estudos etc.
As razões acima também servem para explicar o melhor desempenho dos estudantes que
vivem em regiões de renda média mais elevada. Os estudantes de menor renda da vizinhança
podem, por exemplo, usufruir (ainda que parcialmente) dos recursos disponíveis para seus
colegas de maior renda, como materiais didáticos de melhor qualidade, acesso a programas de
TV e Internet etc.
Os estudos de WOESSMANN (2001), de MENEZES-FILHO (2007) e de MACEDO
(2004) concluíram que a escolaridade dos pais apresenta forte correlação positiva com o
desempenho escolar. Ou seja, filhos de pais com maior escolaridade tendem a apresentar
melhor performance.
Os motivos pelos quais a escolaridade dos pais influencia tão fortemente o desempenho
estudantil ainda não são conhecidos. É normal que pais de maior escolaridade dêem à
educação de seus filhos uma atenção igual ou maior à que deram a sua própria educação,
incentivando-os e cobrando dedicação aos estudos. Além disso, tais pais têm maior
capacidade de auxiliar os filhos nas tarefas escolares e orientá-los nos estudos. Contudo, tais
razões não foram claramente identificadas.
39. 30
Um fato curioso é que os estudos citados adotaram abordagens diferentes sobre a
variável. WOESSMANN (2001) considerou a escolaridade de ambos os pais como uma única
variável. MENEZES-FILHO (2007) analisou apenas a escolaridade da mãe, provavelmente
para superar as dificuldades metodológicas de lidar com os dados referentes a alunos que não
conhecem ou não convivem com o pai. MACEDO (2004), por sua vez, tratou a escolaridade
do pai como uma variável distinta da escolaridade da mãe, chegando à conclusão de que,
enquanto a escolaridade da mãe é de fundamental importância, a escolaridade do pai não
apresenta nenhuma influência significativa. Em nossa análise, adotaremos indistintamente a
escolaridade dos pais como um fator de influência no desempenho escolar, sem distinguir
entre mãe e pai.
O estudo de MENEZES-FILHO (2007) sugere ainda que, por mais que a escolaridade da
mãe tenha enorme impacto no desempenho escolar, a escolaridade média das mães de todos
os alunos da escola é um fator ainda mais importante. O autor introduz algumas possíveis
explicações para esse fenômeno:
Pode ser que mães mais escolarizadas aumentem a pressão sobre a
escola para melhorar a qualidade do ensino, ou que o professor tenha mais
facilidade de transmitir conhecimento e motivação para ensinar numa
classe com melhor background familiar, ou ainda que os alunos com mais
dificuldades sintam-se estimulados pela presença de alunos mais capazes.
São necessárias mais pesquisas para esclarecer os motivos por trás deste
efeito.
Com relação ao tamanho da família, o estudo de MENEZES-FILHO (2007) indica que os
estudantes de famílias com até 5 pessoas apresentam desempenho superior aos seus colegas
que fazem parte de lares mais numerosos. Apesar de não mencionada pelo autor, uma
explicação plausível para tal efeito seria a de que é mais fácil aos integrantes de famílias
menos numerosas encontrarem um ambiente (lugar e momento) adequado para estudar, sem
serem interrompidos por seus parentes.
Quanto às variáveis “número de livros em casa” e “presença de computador em casa”,
entendemos que elas não são, de per si, fatores de influência no desempenho escolar, mas
sinalizadores tanto da preocupação dos pais com a educação (sua e de seus filhos) quanto do
status socioeconômico das famílias (pois livros e computadores não são considerados artigos
de primeira necessidade, como o são alimentos, roupas e medicamentos), fatores já analisados
nos parágrafos anteriores.
40. 31
2.4 Comentários adicionais
Nesse capítulo, foram apresentadas e discutidas, ainda que de forma resumida, as
variáveis que comumente aparecem em discussões a respeito da qualidade do ensino público
no Brasil e em outros países.
Apesar de alguns resultados encontrados serem esperados (por vezes, óbvios), ainda
assim o exercício de comprová-los estatisticamente foi válido, ao menos para evitar
contestações infundadas. Em outros casos, foi possível desfazer mitos estabelecidos e chegar
a conclusões surpreendentes, mas elucidativas.
Finda a construção do substrato teórico, debrucemo-nos no capítulo a seguir sobre os
fatos e dados a respeito da educação no Município de São Paulo, utilizando o conhecimento
até aqui adquirido para realizar uma análise racional da qualidade do ensino público
municipal.
41. 32
3 DIAGNÓSTICO DA QUALIDADE DA EDUCAÇÃO NO MUNICÍPIO DE SÃO
PAULO
Apesar do alto nível de recursos aplicados na educação, é notório o fato de que a
educação brasileira ainda padece de uma qualidade sofrível, fato comprovado pelo baixo
desempenho dos estudantes brasileiros nos testes internacionais, como o PISA, conforme
discutido na introdução deste trabalho.
Durante muito tempo, o Brasil preocupou-se com a quantidade na questão da educação.
Isso, obviamente, fazia sentido num país que não dispunha de infra-estrutura para atender à
demanda por ensino. Então, a preocupação das administrações era construir novas escolas e
ampliar a oferta de vagas nas já existentes, além de prover mais professores etc.
E, ao que tudo indica, tais investimentos surtiram resultado. Hoje, com 97,6% das
crianças e adolescentes entre 7 e 14 anos matriculados (dados do Pnad 2007), e taxas de
crescimento populacional decrescentes, o país está muito próximo de atingir a universalização
do Ensino Fundamental. Dessa forma, a preocupação com a quantidade deve ceder seu lugar
para a busca pela qualidade.
Iniciativas como o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), criado em 2007 pelo
governo federal, já refletem essa mudança de foco. A prioridade do PDE é com a qualidade da
educação básica.
Dois dos pilares do plano são a construção de sistemas de informação que dêem
transparência ao processo educacional brasileiro, permitindo a toda a sociedade acompanhar a
condução das políticas públicas na área, bem como a implantação de uma sistemática de
avaliação do desempenho de alunos e professores, sem o qual seria impossível qualquer
diagnóstico sério a respeito do real estado da educação no país.
Aliados a esses instrumentos, o PDE estabeleceu metas de qualidade para a educação
básica. Uma das mais importantes está atrelada ao Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica (IDEB), que é calculado com base na taxa de rendimento escolar (aprovação e evasão)
e no desempenho dos alunos no Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB)
e na Prova Brasil, da seguinte forma:
IDEBji = Nji . Pji ; 0 ≤ Nj ≤ 10; 0 ≤ Pj ≤ 1 e 0 ≤ IDEBj ≤ 10
em que
i = ano do exame (SAEB e Prova Brasil) e do Censo Escolar;
42. 33
Nji = média da proficiência em Língua Portuguesa e Matemática, padronizada para um
indicador entre 0 e 10, dos alunos da unidade j, obtida em determinada edição do exame
realizado ao final da etapa de ensino;
Pji = indicador de rendimento baseado na taxa de aprovação da etapa de ensino dos alunos
da unidade j.
Para maiores detalhes a respeito do cálculo do IDEB, recomendamos consultar o Anexo I.
A escala do IDEB vai de 0,0 (zero) a 10,0 (dez). A nota 6,0 (seis) no índice equivale à
média dos países desenvolvidos9 e é a meta estabelecida para o Brasil, a ser atingida até 2021.
O IDEB é calculado para cada estabelecimento de ensino, público e privado, e esses
resultados são consolidados por município, por estado e, finalmente, para todo o Brasil. Em
2005, o IDEB consolidado do Brasil era de 3,8 (para os primeiros anos do Ensino
Fundamental) e, em 2007, era de 4,2. Ao longo da trajetória da atual situação até a meta, são
estabelecidas metas intermediárias, que devem ser cumpridas pelos Estados e Municípios que
aderiram ao convênio 10, sob pena de cessarem as transferências voluntárias de recursos da
União para os entes descumpridores.
O Município de São Paulo, foco de nosso trabalho, mostra-se nitidamente engajado nessa
busca pela qualidade da educação, particularmente a de competência pública. Além da adesão
do Município ao PDE, estão sendo criadas diversas iniciativas que sinalizam essa
preocupação, como o Plano da Educação da Cidade de São Paulo (que está sendo elaborado
por meio de um intenso debate envolvendo o Executivo municipal, entidades civis e sindicais,
representantes de pais e alunos, e demais interessados) e a Prova da Cidade de São Paulo
(avaliação de desempenho dos alunos da rede municipal de ensino fundamental por meio de
um exame contendo questões de Língua Portuguesa e Matemática, com sua primeira edição
sendo realizada em 2009).
Apesar das louváveis intenções envolvidas nessas iniciativas, preocupa-nos a qualidade
das premissas que elas tomam por base.
Para ilustrar o que nos aflige, vejamos um trecho retirado do texto de subsídio para
debate no processo de construção participativa do Plano de Educação da Cidade de São Paulo
(grifos nossos):
9
Quando se aplica a metodologia do IDEB em seus resultados educacionais. Essa comparação internacional foi
possível através do emprego de uma técnica de compatibilização entre os resultados do PISA e os do SAEB.
Para maiores detalhes, ver Anexo I.
10
A inclusão do ente federado no PDE depende de sua assinatura do Termo de Adesão voluntária ao Plano de
Metas Compromisso Todos pela Educação.
43. 34
O nosso esforço permanente tem sido o de ampliar e qualificar o
atendimento da Educação Infantil, acabar com as escolas de terceiro turno,
diminuir o número de alunos por sala de aula, valorizar nossos
educadores e aumentar o tempo de permanência dos alunos nas escolas. O
Plano traçará novas e mais auspiciosas metas em direção à qualidade de
ensino que buscamos.
Vimos, no capítulo anterior deste trabalho, que fatores como o número de alunos em sala
de aula e o salário dos professores não afetam significativamente o desempenho dos alunos e,
por conseqüência, a qualidade do ensino. Portanto, incluir a diminuição do número de alunos
por sala de aula e o aumento dos salários dos professores entre as ações de esforço
permanente sugerem que ainda se encontram disseminadas algumas idéias errôneas a respeito
dos fatores que melhoram a qualidade da educação.
Neste último capítulo, procuraremos realizar um diagnóstico da qualidade da educação
pública municipal de São Paulo, com base na teoria exposta nos capítulos anteriores,
identificando pontos fortes e oportunidades de melhoria e, na medida do possível, sugerindo
caminhos mais eficazes para atingir a meta almejada: um ensino público digno de países
desenvolvidos.
Inicialmente, vamos analisar as despesas com educação do Município de São Paulo,
identificando quanto e em que gasta a prefeitura. Em seguida, propomo-nos a verificar se o
gasto é coerente com a atual situação da educação pública municipal e compatível com outros
municípios do mesmo porte. Por fim, procuraremos assinalar quais os gastos são mais
eficazes para obter uma melhora no desempenho estudantil, a partir dos conhecimentos
teóricos levantados nos capítulos anteriores e das experiências de outros municípios bem-
sucedidos.
3.1 Quanto e em que o Município de São Paulo gasta com educação?
A Tabela 4 apresenta o detalhamento do orçamento municipal empenhado na função
educação no exercício de 2009.