Este documento descreve um estudo sobre como o uso de tradutores online pode contribuir para o desenvolvimento de competências linguísticas e cognitivas em estudantes. O estudo acompanhou estudantes ao longo de um ano letivo enquanto eles usavam tradutores online para traduzir vários textos. Os resultados mostraram que, inicialmente, os estudantes confiavam cegamente nos tradutores, mas ao longo do tempo desenvolveram uma abordagem mais crítica e melhoraram suas habilidades de pesquisa e tradução.
2. Génese
- Necessidade urgente de trabalhar o pensamento reflexivo e
crítico dos nossos alunos que vivem actualmente numa
sociedade em que tudo se compra e/ou aparece feito.
- Contacto diário com esta realidade;
- Expectativa de ser possível melhorar o uso que os nossos
alunos fazem das tecnologias digitais com que trabalham no seu
dia-a-dia.
- Tradução versus tradução nas escolas;
- Tradução como auxiliar no ensino das línguas estrangeiras bem
como o seu contributo na produção de trabalhos escolares de
qualidade.
3. QUESTÃO DE INVESTIGAÇÃO
Estudar o contributo dos tradutores online para o
desenvolvimento de competências linguísticas e
cognitivas.
4. OBJECTIVOS
- Desenvolver as competências necessárias à elaboração de
trabalhos escolares de qualidade através do tratamento de
informação, da tradução (com apoio de tradutores online) e
do sentido crítico de correcção e adequação
- Estudar a evolução dos alunos desde o início até ao final do
ano escolar, em termos de pensamento reflexivo
operacionalizado no uso crítico do tradutor online;
- Apurar o contributo dos tradutores online para o
desenvolvimento de competências linguísticas e cognitivas.
5. Fundamentação teórica
- Problemática da tradução automática;
- Uso de tradutores em contexto de ensino;
- Crianças, tecnologias, pensamento crítico, ensino
das línguas estrangeiras e o papel do professor.
6. Estudo de caso
- “…investigação empírica que investiga um fenómeno
contemporâneo no seio do seu contexto real e no
decurso do qual são utilizadas múltiplas fontes de
evidência” (Yin 1984,p.23)
METODOLOGIA
7. Recolha de dados
- Observação participante
- Entrevistas conversacionais
- Notas de campo
- Trabalhos realizados pelos alunos
- Relatórios e opiniões de professores da escola e
outros elementos da comunidade educativa
8. Projecto de
Intervenção
- 13 alunos do 8º Ano de escolaridade
-Laboratório de Línguas ( Escola E.B. 2,3 de Ribeirão)
- Semanalmente (45m) durante um ano lectivo.
9. -Foram escolhidos e fornecidos aos alunos ao longo das
sessões três tipos de textos, em Inglês :
- Instruções de funcionamento de uma máquina de café
(Técnico);
- “The Pearl” - John Steinbeck (Literário);
- “The Blackboard Jungle” – Evan Hunter (Descritivo).
A tarefa proposta foi a tradução desses textos para
Português, recorrendo aos tradutores automáticos.
Houve portanto três fases no estudo.
10. Os alunos utilizaram vários tradutores automáticos :
-Babel fish;
-Translito;
-Bússola Escolar;
-WorldLingo;
-Systran;
-Intertran;
-Freetranslation.
12. Após a tradução do 1ºTexto verificou-se que:
● A maior parte dos alunos fez “copiar” e “colar”
directamente do que lhes foi fornecido pelo tradutor
automático para o designado “trabalho final” ;
● Não fizeram correcções ao texto em termos de Língua
Portuguesa (construção frásica; concordância em
número e género,…);
● O vocabulário desconhecido pelo tradutor, e portanto
não traduzido, manteve-se em Inglês e os alunos não
identificaram esses vocábulos nem os alteraram (porque
nem sequer uma leitura atenta fizeram).
13. Medidas implementadas :
- Análise de uma tradução correcta do texto (feita
por um profissional) e comparação com a tradução
dos alunos;
- Chamada de atenção para a necessidade de se
avaliar o resultado fornecido pelo tradutor e
aperfeiçoar, recorrendo a dicionários, gramáticas,
prontuários,…
14. Após a tradução do 2º texto verificou-se que:
● Os alunos pediram mais sessões para a execução
desta segunda tradução.
● Fizeram algumas correcções ao texto em termos de
Língua Portuguesa.
● Os alunos identificaram o vocabulário desconhecido
pelo tradutor automático e recorreram a dicionários
para corrigir.
● Leram várias vezes o trabalho antes de o
entregarem.
15. Após a tradução do 3º texto verificou-se que:
● Os alunos necessitaram de mais tempo para a
execução desta terceira tradução.
● Fizeram correcções ao texto em termos de Língua
Portuguesa.
● Dividiram o texto em segmentos/frases.
(intuitivamente).
● Utilizaram dicionários, gramáticas e nem tudo foi
traduzido “à letra”, recorrendo para isso a sinónimos
que melhor se adequassem ao contexto.
● Leram várias vezes o trabalho antes de o
entregarem.
16. Após a tradução do 1º texto (novamente)
verificou-se que:
● Os alunos não necessitaram das minhas
intervenções/ ajuda.
● Sentiram-se confiantes e já tinham “em mente” a
metodologia usada, por isso obtiveram uma melhor
tradução, quando comparada com a primeira.
Veja-se o exemplo (quadro que se segue):
17. Texto em Inglês
(original)
1ªTradução
feita pelo aluno
(início deste
estudo)
2ªTradução
feita pelo aluno
(final deste estudo)
Texto Traduzido
por um
profissional
Fill bottom containerFill bottom container
with water to brim.with water to brim.
Encher até cima
o recipiente com
água para borda.
Encha o recipiente
com água.
Encher a parte
inferior com água
até ao bordo.
Insert funnel-shapedInsert funnel-shaped
filter.filter.
Introduzir funil
forma filtro.
Insira o filtro em
forma de funil.
Meter o filtro em
forma de funil.
Fill with coffeeFill with coffee
powder.powder.
Encher com café
em pó.
Encha com café em
pó .
Encher de café.
Do not press.Do not press. Não prima. Não Prima. Não comprimir.
Screw top to bottom.Screw top to bottom. Parafuso de cima
para baixo.
Apertar a máquina. Atarraxar a parte
superior e a inferior.
Heat over fire.Heat over fire. Aquecer durante
incêndio.
Aquecer. Aquecer ao lume.
19. Neste estudo/ projecto os alunos:
- aprenderam a fazer pesquisa e a usar com espírito crítico
o tradutor online recorrendo não só aos tradutores mas
também a dicionários, gramáticas, prontuários e
enciclopédias;
- descobriram que os tradutores online não são eficazes:
desconhecem muitas palavras e traduzem mal muitas
outras (pois desconhecem o contexto em que se inserem
bem como os binómios e as expressões idiomáticas);
- deram-se conta de que podem ser “Falantes Ingénuos”
(Fillmore, 1979) quer como aprendizes de uma língua
estrangeira quer como falantes da própria língua materna;
20. - aprenderam que há palavras que, quando
“acompanhadas por outras” adquirem novos significados
(expressões idiomáticas);
-enriqueceram o vocabulário;
- aprenderam que é mais fácil dividir o texto que se
pretende traduzir em frases/segmentos ( unidades de
tradução).
- assumiram uma postura crítica perante o texto
fornecido pelo tradutor ( a que já não lhe chamavam
“produto final”) e não davam o trabalho por concluído
sem, eles próprios, analisarem construtivamente e
fazerem as devidas correcções/ alterações.
21. Em suma, e com base nas reflexões feitas quer pelos
alunos intervenientes como pelos professores envolvidos,
todos afirmaram que foi uma experiência enriquecedora e
que as suas habilidades recém-adquiridas de pesquisa,
análise crítica e pensamento reflexivo no uso dos
tradutores online bem como a sua contribuição para o
desenvolvimento de competências linguísticas e
cognitivas lhes vai ser útil ao longo do seu percurso
escolar.
22. Segundo Gouvêa (1999):
“O professor será mais importante do que nunca, pois ele precisa se
apropriar dessa tecnologia e introduzi-la na sala de aula, no seu dia-a-
dia, da mesma forma que um professor, um dia, introduziu o primeiro livro
numa escola e teve de começar a lidar de modo diferente com o
conhecimento – sem deixar as outras tecnologias de comunicação de
lado. Continuaremos a ensinar e a aprender pela palavra, pelo gesto,
pela emoção, pela afectividade, pelos textos lidos e escritos, pela
televisão, mas agora também pelo computador, pela informação em
tempo real, pela tela em camadas, em janelas que vão se aprofundando
às nossas vistas...”