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A NOVA MARAVILHA
Fernando Palacios
CAPÍTULO 1
O ANÚNCIO QUE MUDOU O MUNDO



                                                    03/10/2011, Hora local 11:23
     Amazonas / sobrevoando uma área fora-de-mapa ainda que especial da Floresta



ACORDOU, não do sono, mas de volta para a realidade. Foi o
silêncio súbito que o resgatou da imersão nos próprios
pensamentos. Agora seus olhos pareciam uma bola de pinball
que ricocheteavam para reconhecer os arredores. As janelas
continuavam a exibir um repetitivo oceano verde de copas de
árvores. Desenroscou a cabeça para o lado e deu de cara com o
olhar fixo do parceiro de conversa. Ele aguardava algo.
Provavelmente uma resposta para uma pergunta que ele sequer
ouviu. Teve que se esforçar para conter a expressão de susto.
Não queria levantar a bandeira de desatento. Sua mente
acelerou na missão de resgate das últimas palavras que teriam
sido registradas. Brotaram gotas frias em todo o horizonte da
testa. A boca abriu muda. A memória encontrou apenas
fragmentos inúteis. As cordas vocais resolveram se manifestar
antes que o suor rolasse bochecha abaixo. Arranhou a garganta
três vezes. A voz tentou soar convincente 'sim, você tem
razão. Você tem toda razão, meu velho amigo. É tudo muito
curioso. Essa história toda de um convite de surpresa. Voar
nesse troço. O dia promete mesmo ser interessante.'

O velho amigo não escondeu a frustração com cada palavra.
Retrucou em tom de bronca -Ô, Dodô, voc- mas foi interrompido
pelos alto-falantes. O Capitão anunciou que a tripulação
iniciaria os preparativos para o pouso.

O breu vazou através das janelas e inundou o ambiente. Dodô
era um homem do Sol, da luz do dia. Nunca foi fã da noite.
Para piorar, bastou sair da aeronave para que todas as luzes
se apagassem. Era como se vendasse os olhos com as duas mãos.
Dessa vez, a voz do capitão dispensou amplificadores:
"Em nome de Cezar Goldman peço desculpas pelos inconvenientes
da viagem. Continuarei guiando os senhores durante o processo
de descompressão."

A escuridão reinou absoluta até cintilarem pequenos pontos de
luz. Mesmo quando criança, Dodô nunca foi de sonhar em ser
astronauta e não gostou de se sentir perdido no espaço. Os
pontos estelares começaram a valsar ao som de um zumbido
industrial. Dodô relembrou sua fábrica deixada sem supervisão
em Fortaleza. A voz do Capitão ecoou para longe "por
gentileza, queiram me seguir."

Os pequenos pontos cintilantes se aproximaram até delinearem
uma caixa tridimensional. O capitão indicou que adentrassem.
O velho amigo disse "vai você primeiro, Dodô, você é o
novato". Assim que todos entraram o chão começou a se mover.
Dodô teve a sensação de ser uma bagagem numa esteira de
aeroporto. O Capitão aproveitou o trajeto para narrar alguns
causos da Floresta Amazônica. Não que isso fosse suficiente
para amenizar a ansiedade do Dodô. Foram três histórias até
que a esteira estacionasse. Diante deles um clarão. Dodô
sentiu vontade de empurrar o Capitão e correr direto para a
luz no fim do escuro.

- Senhores, já não precisam mais de mim. Até a volta. - foram
as últimas palavras do Capitão, antes de recuar sozinho na
caixa fosforescente.

Dodô apressou o passo. Entrou num recinto amadeirado que não
era tão retangular quanto um corredor, nem tão arredondado
quanto um túnel. Ficou com a impressão de estar no interior
oco de uma sequoia caída. Um grande tronco esculpido, polido,
envernizado e lustrado. A única coisa que destoava da madeira
era uma série de lâminas de vidro dispostas lado a lado. Dodô
foi inspecionar mais de perto. Quando ficou diante de um dos
vidros, surgiu o rosto de uma moça. Parecia um quadro
digital, até o momento em que ela abriu um sorriso. Dodô
olhou para os vidros ao lado e entendeu que eram
recepcionistas virtuais, com feições e nomes peculiares:
'Marianne, Marla, Melina, Mhilena...' Quando olhou de novo
para a que estava sorrindo diante de si, ela começou a falar:

- Seja muito bem-vindo, Senhor Domingos, nosso check-in será
rápido. Para sua comodidade peço que deixe comigo alguns
itens pessoais. Vejo que não trouxe malas ou pastas. Por
gentileza coloque a carteira dentro da caixa. Os dispositivos
eletrônicos devem ser acoplados à dockstation para que sejam
mantidos carregados.

Dodô não se sentia nada bem com a ideia de se separar de sua
carteira e, preferia estar sempre com seu celular, ainda que
sem sinal. Olhou em volta. Relembrou que estava rodeado de
multibilionários. Todos pareciam muito confortáveis, de certa
forma até aliviados em deixar seus pertences em poder das
moças dos vidros. Ele que já era visto como o novato, não
queria ser também o chatão da turma. A sorridente Marla
encerrou o check-in "muito obrigada, Senhor Domingos, desejo
que seu tempo por aqui seja produtivo e memorável."

Dodô voltou a observar os demais. Alguns foram até a parede
de madeira que de tão lustrada parecia molhada, no melhor
estilo da tampa dos pianos mais caros. Para espanto de Dodô,
eles revelaram armários até então imperceptíveis e lá
deixaram suas pastas e maletas. Por um breve momento Dodô se
sentiu no vestiário do seu yatch club. Botou reparo ao redor
e notou que extremidade por onde entraram permanecia escura
enquanto que a oposta radiava uma luz esverdeada. Foi
justamente nesse momento que uma silhueta se formou contra a
luminosidade. Dodô ficou parado enquanto a mancha negra
cresceu em sua direção. Enfim alguém do grupo identificou o
forasteiro. "Luzio!"

Luzio vestia branco em tudo, camisa, terno e sobretudo.
Caminhou confiante entre o grupo e retribui os olhares
atentos com um sorriso seguido por uma respeitosa saudação.
"Cavalheiros... Madame."

Dodô levou um susto. Não tinha reparado nesse detalhe.
Aproveitou para inspecionar os rostos enquanto todos se
mantinham vidrados em Luzio, que prosseguiu em sua saudação
"nem que eu fosse o mais hábil dos poetas gregos seria capaz
de expressar a satisfação que sinto ao encontrar todos vocês
aqui reunidos. O Cezar Goldman compartilha dessa satisfação e
deve se juntar à reunião em dezessete minutos."

Uma surpresa confirmou o susto. No meio dos paletós encontrou
um rosto delicado. A madame vestia um terninho preto e estava
com cabelos presos. Dodô entrou num modo de
autorrecriminação. Tamanha beleza não devia ter passado
despercebida. Decidiu compensar dedicando um olhar mais
demorado. Luzio alternou o tom de voz e puxou a atenção de
Dodô para finalizar o discurso. "Sou o responsável em
garantir que todos se sintam como se estivessem em casa.
Podem aposentar os sapatos ao lado e sejam muito bem-vindos
ao Manauéden!"

Dodô viu que Luzio olhava diretamente para ele e apontava
para uma estante. Já estava achando tudo muito estranho. Mas
julgou isso de ter que tirar os sapatos como 'demais da
conta'. Começaram os pensamentos de que não deveria ter
deixado sua empresa num dia tão importante. Devia ter ficado
e assinado os papéis. Amaldiçoou a hora que se deixou seduzir
por histórias fantásticas de um homem misterioso e um passeio
de zepelim. Justo ele, o coronel da objetividade e da
produtividade. Que jeito mais fora de linha para começar uma
semana. Ainda assim acabou se rendendo ao espírito do bom-
convidado. Se bem que a verdade é que a proposta não era tão
ruim assim. Sempre desfrutou de um certo prazer ao
desaprisionar os pés.

O chão também era de madeira. Uma espécie de deck que seguia
até a saída do recinto. Antes de colocar o primeiro pé para
fora, Dodô sucumbiu a uma estranha sensação. Teve a impressão
de estar prestes a andar descalço em plena Floresta. Comentou
pra si mesmo em voz baixa "Onde já se viu uma coisa dessas?"

Só então percebeu que apesar das árvores e da grama e de toda
aquela natureza aparente, eles ainda estavam do lado de
dentro. Paredes compostas de lâminas de vidros verdes cobriam
a área 'externa'. Esquadrinhou as paredes translúcidas e viu
que formavam grandes degraus. Jogou a cabeça para trás e
ficou intrigado. Ao deslizar o olhar para o teto entendeu que
estava no interior de uma pirâmide. Ainda assim era possível
ver a densa mata do lado de fora. Concluiu que estava dentro
de um Chitchen-Itza de paredes de esmeralda.

-É uma variedade de cristal - disse Luzio - capaz de nos
manter protegidos... não se preocupe com os pés, a grama é
cuidadosamente cultivada.

A maré de sentimentos revoltosos começou a virar. Dodô foi
tomado por uma felicidade súbita no momento em que seus pés
acariciaram a grama curta e aveludada. Parecia estar pisando
um tapete de pelúcia. E esse pensamento o transportou de
volta às manhãs em que brincava com a sua irmã e a girafinha
verde chamada Magula.

Só mesmo um apertão no braço seria capaz de trazer Dodô de
volta dessa viagem no tempo. "Dodô, Dodô... é a quinta vez
que te vejo mergulhado em pensamentos. O que há com você,
velho colega? Quatro décadas e continua um sonhador? Venha
cá, deixa te apresentar alguns dos pares."

Dodô sempre detestou essa coisa de chegar a encontros sociais
e ter de sair cumprimentando as pessoas. Ainda mais quando se
tratava de uma maioria de estranhos. Não era aberto a fazer
novos amigos e quando forçado a falar com desconhecidos
preferia manter o contato no nível profissional. Até por
isso, numa ocasião normal, iria insistir para que ficassem
ali, relembrando o passado e evitando o presente. Mas havia
alguma coisa naquele lugar, aquele ar, que estava distorcendo
seu modelo tradicional. Mais do que disposição para ser
abordado, sentia vontade de ir até os outros e iniciar
conversas. Era como se previsse um futuro em que todos ali já
fossem grandes amigos. Queria saber quem eram e como tinham
chegado até ali. Em especial aquela dama. Ficou se indagando
como uma patroa de tamanha beleza não vestia uma aliança.
Ensaiou galanteios imaginários... voltou a ser adolescente.

Ficou inspirado, literalmente. Ouviu o ar preencher os
pulmões. Decidiu não perguntar dela para seu velho amigo.
Queria saber tudo sobre ela. Mas queria saber da boca dela -
ah, aqueles lábios - não queria estragar a naturalidade da
conversa. Iria beber direto da fonte. Iria ter com ela.

Na imaginação já estava tudo premeditado. Só que hesitou na
hora de dar o primeiro passo em direção ao real. Fazia anos
que não abordava uma mulher... pelo menos não dessa forma,
tão de igual para igual. Mais uma vez, foi interrompido.

Olhou para o lado e deu de cara com um velhote. Seu rosto
lembrava uma uva passa desbotada. O esquisito apoiou o pouco
peso do corpo em cima uma bengala negra e falou "eu acho que
faz falta um carrinho de golfe aqui. Na verdade, o golfe faz
falta". Como ninguém riu da piada o estranho emendou "eu
queria vir pessoalmente dar as minhas boas vindas ao novato."

O velho amigo tratou logo de fazer as introduções "Carmona,
esse aqui é o Domingos. Dodô, Carmona". Dodô desconfiado se
limitou ao aperto de mãos. Antes que o silêncio se juntasse
ao grupo, o amigo puxou conversa "por que será que o Cezar
Goldman chamou a gente aqui, hoje, assim tão de repente?". O
estranho Carmona engatou na conversa:

-Só pode ser para se gabar daquele negócio que ele acabou de
fechar na China. Sim, eu aposto.
-Não, não pode ser. Ele não iria quebrar o protocolo por uma
coisa dessas. Fora que gabação não faz o estilo do Goldman.

Dodô entrou na conversa - mas afinal que tipo de sujeito é
esse Cezar Goldman? E que lugar é esse?

Carmona respondeu - Esse Cezar, meu caro novato, é um
rapazote que comprou a boa vontade de todos aqui pela
bagatela de visitarem esse resort.

- Não é bem assim - protestou o amigo - esse lugar favorece
os negócios. Sempre me sinto tão bem aqui. Esse equilíbrio
perfeito entre civilização e natureza. Esse cheiro de mata
sem nenhum mosquitinho pra atrapalhar a conversa... Vai? Esse
lugar foi uma grande contribuição do Cezar Goldman.

-Ora, por favor. Ele mal tinha entrado na associação e já
saiu sugerindo um novo local para o encontro. Em seguida o
quê? Quando percebemos, ele já estava se intitulando de
'ímpar'. Ímpar! Quanta arrogância e prepotência desse
sujeito.

-Não seja assim, Carmona. Todos aqui têm saído com
incrementos substanciais a cada encontro. Também não gosto
muito dessa coisa de ímpar, mas é fato que ele está fazendo
muito mais do que qualquer antes dele.

-Nah. O Cezar nunca me enganou. Nunca! - Carmona apontava a
bengala para o alto para enfatizar sua revolta.

Dodô já não ouvia mais nada da conversa. Sua atenção já
retornara para aquela dama. Deusa. Absoluta. Como seria o
nome dela? De certo, deveria ter um nome aristocrático. Nada
de Sheila ou Josefa. Só podia ser um nome distinto. Estava na
hora de descobrir. Só não sabia se pedia licença ou se
simplesmente deixava os dois falando. Nem um, nem outro.
Foram todos interrompidos por um tilintar de taças. Dodô
notou uma certa movimentação.

Girou a cabeça por cima do ombro para olhar para trás e teve
a impressão de ver uma série de mulheres nuas. Cerrou os
olhos e viu que estavam vestidas a caráter. O tom dos
uniformes é que se confundia com a pele. Só então notou que
cada uma delas equilibrava uma espécie de bandeja. Quando
voltou a cabeça para frente estava sozinho.
Seus pares haviam se deslocado para a névoa baixa que pairava
sobre o leito do rio, que começava numa cachoeira à borda da
pirâmide e repartia o ambiente até sair por debaixo da
esquina oposta. Dodô se juntou aos seus pares que aguardam na
margem.

A brigada de garçonetes e garçons chegou até eles numa fila
indiana. A primeira tinha a beleza clássica dos quadros de
Botticelli. Parou diante do velho amigo de Dodô e ofereceu a
bandeja que, de perto, dava para ver que era uma planta.

O velho amigo arregalou os olhos, levantou as duas mãos na
altura do rosto e ficou ondulando os dedos, como se jogasse
um feitiço sobre a planta, que a bela garçonete retirou
gentilmente para descortinar uma garrafa deitada junto a um
copo de conhaque com água e gelo até a boca. A planta foi
devolvida ao leito do rio em seu estado natural, era uma
vitória régia que até então estava de ponta cabeça. A garrafa
foi erguida deixando evidente seu contorno circular. Era
feita de cristal negro. Não havia rótulo, apenas letras em
relevo "Blue Moon Rare Whisky".

O amigo alcançou o copo suado. Deu um farto gole na água,
pescou um gelo entre dois dedos e despejou o resto no rio. O
copo voltou para a bandeja. A garçonete empunhou a garrafa e
quebrou o lacre de cera que prendia a rolha. Ao depositar o
líquido viscoso e dourado no copo, disse:

-esse blended malt scotch foi produzido no interior da
Escócia de acordo com a tradição iniciada em 1913 por um
grupo de rebeldes. Motivados pela Lei Seca instituída em
algumas regiões do País, eles se encontravam 'once in a blue
Moon', nas raras ocasiões em que a Lua é vista no céu como um
espectro azul. Cada um levava seu melhor malte e durante toda
a noite eles trabalhavam no equilíbrio da combinação. O
esconderijo nunca foi encontrado e a bebida não é
comercializada. Apenas os descendentes diretos têm acesso à
bebida. Depois de quase um Século de rebeldia, o Senhor será
o primeiro fora das famílias a provar. Seja bem-vindo a essa
dinastia!

O amigo posicionou o punho cerrado acima da boca do copo. O
gelo começou a derreter. Pingou apenas uma gota de água, com
a cautela de um chef de cozinha que dá seu toque final no
prato a ser provado pelo crítico gastronômico. A bebida
dançou dentro do copo. Finalmente o amigo degustou o
aguardado gole e ficou inerte, como se nada mais importasse.
A próxima garçonete da fila se manifestou. Dona de uma beleza
exótica, ela ficou diante do mais jovem entre todos ali.
Mesmo com toda seriedade do traje formal, ele aparentava não
ter comemorado mais do que vinte aniversários. Sua pele
reluzia um bronzeado sedimentado, uma declaração de que ele
passava muito menos tempo encavernado que os demais. A
suposição era fortificada pelo porte atlético.

A exótica garçonete destampou a bandeja para exibir um
aparelho celular, deu uma piscadela e comentou "é o iPhone 4S
de platina, ainda indisponível no mercado. E já está
configurado com alguns números bastante interessantes." O
jovem pegou admirado e começou a brincar com o gadget.

Foi a vez de um garçom, homem, e com pinta de descolado. Do
tipo que nas horas vagas deve trabalhar como barman em alguma
praia particular do norte da Espanha, fazendo malabarismos
com garrafas. Ele chegou perto do velhote e jogou a planta na
água como se fosse um frisbee.

Dodô espiou uma caixa metade mostarda, metade enxadrezada com
a silhueta de um rosto. Logo abaixo da icônica menina do
rabo-de-cavalo, as 6 letras mágicas: C O H I B A. O abrir da
caixa revelou um charuto do comprimento de um talão de
cheques e da espessura de um dedinho. O garçom fitou os olhos
de Carmona, pegou uma guilhotina e passou calmamente pela
ponta arredondada. Antes de decepar, o garçom discursou:

- Hoje é o aniversário de 40 anos deste lancero, recebido das
mãos do próprio Fidel. Acabou de sair do seu quinto e último
humidor para comemorar com você, Carmona. Flame on!

Carmona enfiou a mão dentro do paletó e sacou um maço de
notas de 100 euros, enrolou e ateou fogo na ponta. Trocou o
isqueiro pelo charuto e rodou a ponta cortada sobre o fogo.
Deixou escapar um riso de puro prazer.
"Uhuhu!"
Descartou as notas queimadas no rio e deu a primeira
baforada. Bochechou a fumaça como se escovasse os dentes e
finalmente cuspiu uma série de anéis.

- Ahhh... as notas queimadas complementam a última nota. -
esnobou contemplando o vazio.

Uma garçonete chegou atrasada com uma xícara de Nespresso
fora de catálogo. O próximo garçom entregou um perfume feito
a partir da Edelweiß, a flor dos alpes. Depois, um documento
confidencial. Uma peça de arte. Um baralho egípcio. E assim,
um após o outro, os pares foram presenteados. Cada um com um
ritual mais esquisito que outro: cheiravam, inspecionavam,
alisavam, provavam... terminando sempre em regozijo.

Enfim chegou um garçom para a dama. Debaixo da vitória-régia
havia uma joia. Uma espécie de tiara de brilhantes. Antes que
o garçom pudesse se pronunciar, a madame se antecipou:

-não precisa dizer, querido, eu sei. Ai, esse Cezar me paga!
Já falei pra ele que não precisa me mimar. Mas eu amei, amei.
Muito obrigada, viu?

De todos os presentes inusitados, aquele era o único que Dodô
conhecia de fato. Uma joia da coroa italiana. A primeira dona
da tiara foi a Rainha Elena de Montenegro. A crise na Itália
obrigou que as peças fossem vendidas. Um leilão público devia
acontecer no fim do ano. Mas já havia acontecido um
particular com as peças mais valiosas e, de certa forma, mais
embaraçosas para a monarquia. Dodô sabia disso porque esteve
nesse leilão. Seu interesse era por outro item, mas a joia
foi marcante. Primeiro porque não estava anunciada
previamente. Segundo porque não é sempre que um governo
decide se desfazer de sua coroa. E terceiro porque havia sido
arrematada por um valor desproporcional por um comprador
anônimo. Pronto! O Universo conspirou a seu favor. Agora Dodô
tinha um ótimo começo de conversa. E que essa conversa
acontecesse logo. Ela ficou ainda mais deslumbrante com a
tiara...

Mas antes que ele desse um passo, veio a última garçonete em
sua direção. Era linda, mas ele conteve seus impulsos. Sabia
que a dama e sua tiara estariam de olho. Preferiu se fixar na
exuberante vitória-régia que ocultava seu presente. Ficou
nervoso. Nem ele sabia ao certo qual seria seu maior desejo.
Como haveria o Cezar de saber? Dodô já tinha tudo, tanto que
nenhum dos outros presentes havia despertado inveja ou
cobiça. Dispensava as frugalidades da vida. Seu desejo - se
havia algum - devia estar em sonhos distantes deste mundo.

A respiração estancou por um instante. Seus olhos refletidos
na flor iluminavam o que estava por acontecer. Desviou a
visão em busca de um olhar fugido, mas cúmplice. E se ele
ficasse frustrado com o presente? Deveria fingir a mesma
estupefação dos outros? Não seria mais autêntico mostrar que
ele não é tão superficial ou previsível assim?
A garçonete subtraiu a planta e eliminou o dilema. Sobre a
bandeja apenas uma colher e uma pequena lata recheada com
massa. Não podia ser verdade.

A garçonete agarrou a lata com uma das mãos e num movimento
subido colidiu contra a bandeja. Ao sumir com a lata, sobre a
bandeja restou um pequeno bolo. "Domingos, o bolo está
desenformado, mas eu estou desinformada. O Cezar disse apenas
que você saberia. Bom mergulho."

Suor de ansiedade. Seus dedos se apoderaram do garfo de prata
como tentáculos de um polvo. Ao cavar a iguaria sua mão
tremia. Arregalou a boca, fechou os olhos e embarcou na
viagem mais longa de sua vida. Em tempo e distância. Estava
de volta ao útero.

Havia se desprendido do espaço-tempo. Mastigou durante meses.
Finalmente engoliu e despertou. Olhou em volta com novos
olhos. Sentiu a vibração viva da composição de verdes.
Reparou na mobília lustrosa esculpida na própria madeira das
árvores. Aquele lugar era mais aconchegante do que cama
quente em noite fria.

- Não lembro como vocês chamam esse lugar. Mas eu vou chamar
de ventre. Sempre que vier cá vou sentir um prazer enorme em
virar pras pessoas e dizer, olha gente, um abraço, mas tenho
que voltar pro ventre.' - disse Dodô num tom estranho, como
se estivesse compartilhando algo que talvez não devesse.
Ameaçou rir e então chorou. Chorou copiosamente. Levou as
duas mãos ao rosto e caiu de joelhos. Lágrimas e soluços.

Olhares atônitos. Nem tanto pela reação, mas principalmente
pelo motivo. O que um bolinho poderia conter de tão especial?

Dodô sentiu os olhares grudados em si e tentou despistar: -
olha aqui, minha gente, isso aqui não é bolinho, não! - mas
logo viu que teria que ser realmente estúpido para dissipar a
curiosidade. Achou melhor se render e explicar:

- Pensem no bolo favorito de vocês. É sério. Se querem saciar
a curiosidade, precisam me acompanhar. É pra pensar mesmo.
Lembrem do bolo favorito... Qual é o sabor? Chocolate? Coco?
Merengue? - Dodô olhou em volta com ares de inquisidor. Já
que queriam tanto saber, então que colaborassem. Prosseguiu:
- E quem que faz a melhor versão desse sabor? É alguma
doceria? Algum parente? - Fez uma pausa para que pensassem.
Continuou:

- Agora fechem os olhos e imaginem esse sabor. Como se
estivessem acabado de dar uma mordida. Agora mesmo, nesse
momento. Qual é a sensação? - Dodô se certificou que todos
estavam prestando atenção e então sentenciou:

- Pois esse bolo aqui precisa ficar um ano curtindo dentro da
lata. Era uma receita que minha avó fazia e que tinha se
perdido. A última vez que comi foi pouco depois que ela
faleceu. Eu já era órfão de pai e mãe e vivia com uma
governanta terrível que estava destruindo o patrimônio da
família. Esse último bolo minha avó preparou justamente para
meu aniversário de dezoito anos. Esse bolo não é de chocolate
ou baunilha. Esse bolo tem sabor de liberdade, com recheio de
reconquista e cobertura de afeto.

Todos ficaram parados e pensativos, com a exceção da dama,
que aterrissou a mão compadecida sobre o ombro de Dodô. Mas
antes que pudesse esboçar qualquer reação uma voz trovejante
preencheu o ambiente:

- CAMINHEM COMIGO!

Pela primeira vez, viu Cezar Goldman. Ele passou de relance e
todos foram depressa atrás dele. Ele caminhava em ritmo
rápido enquanto discursava:

- Em primeiro lugar, gostaria de agradecer a resposta de
todos a um convite tão emergencial. Estou certo que para
estarem aqui agora, tumultos fizeram parte da manhã de todos.
- alguns acenaram com a cabeça.

Mesmo quando tinha que se esquivar de um galho de árvore,
Cezar Goldman mantinha a fala num ritmo cadenciado:

- Reitero que a presença individual hoje é fundamental e será
recompensada. – exceto por Carmona, todos pareciam alegres.

- Dois anos atrás, iniciei a concepção de um empreendimento.
Mas só agora tomei a decisão de levar esse desígnio adiante.

Seu timbre de voz carregava um traço de profunda seriedade,
talvez até preocupação:
- Sei que essa decisão vai afetar direta ou indiretamente
todos os brasileiros. Assim, gostaria que os senhores aqui
presentes fossem os primeiros e, por enquanto, os únicos a
saber.

Depois de uma pausa para o consentimento, continuou: - Estou
em processo de liquidar em absoluto todo o meu patrimônio. É
possível, inclusive, que este seja nosso último encontro
nesse local.

O nível de atenção era tanta que algumas pessoas ali mal
respiravam. Um dos pares chegou a tropeçar numa raiz.

- Pretendo concentrar todos os meus recursos, sejam
financeiros, humanos, sociais e de tempo, para investir em um
único projeto...

Cezar Goldman fez uma pausa dramática, como quem procura o
termo mais preciso para se expressar. Até que disparou.

- Vou construir a Nova Maravilha da Humanidade.

A informação estarreceu! Pequenos comentários começaram a
formar um zunido. Todos diziam algo na linha de "como assim?"

Cezar se calou e o zunido logo cessou. Deu continuidade ao
seu anúncio:

- Confesso que não sei que Maravilha é essa. Por isso chamei
os senhores aqui. Para pedir que me tragam ideias. Não
medirei esforços e cuidarei pessoalmente para assegurar que o
melhor projeto seja realizado.

Cezar Goldman desacelerou o passo para frisar a próxima
informação:

- Minha única exigência é que esta Maravilha seja entregue
até meu aniversário de 60 anos, em 21 de Dezembro do próximo
ano.

Continuaram a caminhada em silêncio enquanto Cezar ponderava
um pensamento importante. Finalmente disse que era tudo o que
tinha a dizer sobre o assunto. Como sempre, todos estavam
convidados a permanecer hospedados no Manauéden. Mas que o
zepelim estava a postos para levar aqueles que tivessem que
voltar aos seus assuntos.
Começou a movimentação. Alguns já se prepararam para ir. Dodô
ficou de olho na dama... O que ela fizesse, ele faria também.
E para sua alegria, ela não pareceu disposta a deixar aquele
paraíso tão cedo. Pensou que as conquistas são feitas assim,
nas pequenas manobras. E que as vitórias são resultado dos
pequenos golpes, nem que sejam de sorte.

Cezar Goldman seguiu sua caminhada até a rocha esfumaçada por
onde havia chegado. Por fim reverenciou a todos e, antes de
deixar o ambiente, encerrou o momento com seu bordão 'quem
não muda o Mundo, o Mundo molda.'



-----------------------------------------------------------
Para acompanhar a continuação dessa história, bem como os bastidores da
sua escrita, basta curtir a página: www.facebook.com/proximamaravilha


Disclaimer: os direitos autorais dessa história, bem como de seus
personagens, estão registrados, ficando proibida sua reprodução ou
adaptação seja parcial ou integralmente sem o consentimento escrito do
autor.

Dúvidas sobre publicação e licenciamento podem ser esclarecidas pelo e-
mail palacios@storytellers.com.br


Este arquivo foi inteiramente redigido como uma grande mensagem de texto
diretamente em um aparelho celular E71 durante uma viagem a Buenos Aires.

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  • 2. CAPÍTULO 1 O ANÚNCIO QUE MUDOU O MUNDO 03/10/2011, Hora local 11:23 Amazonas / sobrevoando uma área fora-de-mapa ainda que especial da Floresta ACORDOU, não do sono, mas de volta para a realidade. Foi o silêncio súbito que o resgatou da imersão nos próprios pensamentos. Agora seus olhos pareciam uma bola de pinball que ricocheteavam para reconhecer os arredores. As janelas continuavam a exibir um repetitivo oceano verde de copas de árvores. Desenroscou a cabeça para o lado e deu de cara com o olhar fixo do parceiro de conversa. Ele aguardava algo. Provavelmente uma resposta para uma pergunta que ele sequer ouviu. Teve que se esforçar para conter a expressão de susto. Não queria levantar a bandeira de desatento. Sua mente acelerou na missão de resgate das últimas palavras que teriam sido registradas. Brotaram gotas frias em todo o horizonte da testa. A boca abriu muda. A memória encontrou apenas fragmentos inúteis. As cordas vocais resolveram se manifestar antes que o suor rolasse bochecha abaixo. Arranhou a garganta três vezes. A voz tentou soar convincente 'sim, você tem razão. Você tem toda razão, meu velho amigo. É tudo muito curioso. Essa história toda de um convite de surpresa. Voar nesse troço. O dia promete mesmo ser interessante.' O velho amigo não escondeu a frustração com cada palavra. Retrucou em tom de bronca -Ô, Dodô, voc- mas foi interrompido pelos alto-falantes. O Capitão anunciou que a tripulação iniciaria os preparativos para o pouso. O breu vazou através das janelas e inundou o ambiente. Dodô era um homem do Sol, da luz do dia. Nunca foi fã da noite. Para piorar, bastou sair da aeronave para que todas as luzes se apagassem. Era como se vendasse os olhos com as duas mãos. Dessa vez, a voz do capitão dispensou amplificadores:
  • 3. "Em nome de Cezar Goldman peço desculpas pelos inconvenientes da viagem. Continuarei guiando os senhores durante o processo de descompressão." A escuridão reinou absoluta até cintilarem pequenos pontos de luz. Mesmo quando criança, Dodô nunca foi de sonhar em ser astronauta e não gostou de se sentir perdido no espaço. Os pontos estelares começaram a valsar ao som de um zumbido industrial. Dodô relembrou sua fábrica deixada sem supervisão em Fortaleza. A voz do Capitão ecoou para longe "por gentileza, queiram me seguir." Os pequenos pontos cintilantes se aproximaram até delinearem uma caixa tridimensional. O capitão indicou que adentrassem. O velho amigo disse "vai você primeiro, Dodô, você é o novato". Assim que todos entraram o chão começou a se mover. Dodô teve a sensação de ser uma bagagem numa esteira de aeroporto. O Capitão aproveitou o trajeto para narrar alguns causos da Floresta Amazônica. Não que isso fosse suficiente para amenizar a ansiedade do Dodô. Foram três histórias até que a esteira estacionasse. Diante deles um clarão. Dodô sentiu vontade de empurrar o Capitão e correr direto para a luz no fim do escuro. - Senhores, já não precisam mais de mim. Até a volta. - foram as últimas palavras do Capitão, antes de recuar sozinho na caixa fosforescente. Dodô apressou o passo. Entrou num recinto amadeirado que não era tão retangular quanto um corredor, nem tão arredondado quanto um túnel. Ficou com a impressão de estar no interior oco de uma sequoia caída. Um grande tronco esculpido, polido, envernizado e lustrado. A única coisa que destoava da madeira era uma série de lâminas de vidro dispostas lado a lado. Dodô foi inspecionar mais de perto. Quando ficou diante de um dos vidros, surgiu o rosto de uma moça. Parecia um quadro digital, até o momento em que ela abriu um sorriso. Dodô olhou para os vidros ao lado e entendeu que eram recepcionistas virtuais, com feições e nomes peculiares: 'Marianne, Marla, Melina, Mhilena...' Quando olhou de novo para a que estava sorrindo diante de si, ela começou a falar: - Seja muito bem-vindo, Senhor Domingos, nosso check-in será rápido. Para sua comodidade peço que deixe comigo alguns itens pessoais. Vejo que não trouxe malas ou pastas. Por gentileza coloque a carteira dentro da caixa. Os dispositivos
  • 4. eletrônicos devem ser acoplados à dockstation para que sejam mantidos carregados. Dodô não se sentia nada bem com a ideia de se separar de sua carteira e, preferia estar sempre com seu celular, ainda que sem sinal. Olhou em volta. Relembrou que estava rodeado de multibilionários. Todos pareciam muito confortáveis, de certa forma até aliviados em deixar seus pertences em poder das moças dos vidros. Ele que já era visto como o novato, não queria ser também o chatão da turma. A sorridente Marla encerrou o check-in "muito obrigada, Senhor Domingos, desejo que seu tempo por aqui seja produtivo e memorável." Dodô voltou a observar os demais. Alguns foram até a parede de madeira que de tão lustrada parecia molhada, no melhor estilo da tampa dos pianos mais caros. Para espanto de Dodô, eles revelaram armários até então imperceptíveis e lá deixaram suas pastas e maletas. Por um breve momento Dodô se sentiu no vestiário do seu yatch club. Botou reparo ao redor e notou que extremidade por onde entraram permanecia escura enquanto que a oposta radiava uma luz esverdeada. Foi justamente nesse momento que uma silhueta se formou contra a luminosidade. Dodô ficou parado enquanto a mancha negra cresceu em sua direção. Enfim alguém do grupo identificou o forasteiro. "Luzio!" Luzio vestia branco em tudo, camisa, terno e sobretudo. Caminhou confiante entre o grupo e retribui os olhares atentos com um sorriso seguido por uma respeitosa saudação. "Cavalheiros... Madame." Dodô levou um susto. Não tinha reparado nesse detalhe. Aproveitou para inspecionar os rostos enquanto todos se mantinham vidrados em Luzio, que prosseguiu em sua saudação "nem que eu fosse o mais hábil dos poetas gregos seria capaz de expressar a satisfação que sinto ao encontrar todos vocês aqui reunidos. O Cezar Goldman compartilha dessa satisfação e deve se juntar à reunião em dezessete minutos." Uma surpresa confirmou o susto. No meio dos paletós encontrou um rosto delicado. A madame vestia um terninho preto e estava com cabelos presos. Dodô entrou num modo de autorrecriminação. Tamanha beleza não devia ter passado despercebida. Decidiu compensar dedicando um olhar mais demorado. Luzio alternou o tom de voz e puxou a atenção de Dodô para finalizar o discurso. "Sou o responsável em garantir que todos se sintam como se estivessem em casa.
  • 5. Podem aposentar os sapatos ao lado e sejam muito bem-vindos ao Manauéden!" Dodô viu que Luzio olhava diretamente para ele e apontava para uma estante. Já estava achando tudo muito estranho. Mas julgou isso de ter que tirar os sapatos como 'demais da conta'. Começaram os pensamentos de que não deveria ter deixado sua empresa num dia tão importante. Devia ter ficado e assinado os papéis. Amaldiçoou a hora que se deixou seduzir por histórias fantásticas de um homem misterioso e um passeio de zepelim. Justo ele, o coronel da objetividade e da produtividade. Que jeito mais fora de linha para começar uma semana. Ainda assim acabou se rendendo ao espírito do bom- convidado. Se bem que a verdade é que a proposta não era tão ruim assim. Sempre desfrutou de um certo prazer ao desaprisionar os pés. O chão também era de madeira. Uma espécie de deck que seguia até a saída do recinto. Antes de colocar o primeiro pé para fora, Dodô sucumbiu a uma estranha sensação. Teve a impressão de estar prestes a andar descalço em plena Floresta. Comentou pra si mesmo em voz baixa "Onde já se viu uma coisa dessas?" Só então percebeu que apesar das árvores e da grama e de toda aquela natureza aparente, eles ainda estavam do lado de dentro. Paredes compostas de lâminas de vidros verdes cobriam a área 'externa'. Esquadrinhou as paredes translúcidas e viu que formavam grandes degraus. Jogou a cabeça para trás e ficou intrigado. Ao deslizar o olhar para o teto entendeu que estava no interior de uma pirâmide. Ainda assim era possível ver a densa mata do lado de fora. Concluiu que estava dentro de um Chitchen-Itza de paredes de esmeralda. -É uma variedade de cristal - disse Luzio - capaz de nos manter protegidos... não se preocupe com os pés, a grama é cuidadosamente cultivada. A maré de sentimentos revoltosos começou a virar. Dodô foi tomado por uma felicidade súbita no momento em que seus pés acariciaram a grama curta e aveludada. Parecia estar pisando um tapete de pelúcia. E esse pensamento o transportou de volta às manhãs em que brincava com a sua irmã e a girafinha verde chamada Magula. Só mesmo um apertão no braço seria capaz de trazer Dodô de volta dessa viagem no tempo. "Dodô, Dodô... é a quinta vez que te vejo mergulhado em pensamentos. O que há com você,
  • 6. velho colega? Quatro décadas e continua um sonhador? Venha cá, deixa te apresentar alguns dos pares." Dodô sempre detestou essa coisa de chegar a encontros sociais e ter de sair cumprimentando as pessoas. Ainda mais quando se tratava de uma maioria de estranhos. Não era aberto a fazer novos amigos e quando forçado a falar com desconhecidos preferia manter o contato no nível profissional. Até por isso, numa ocasião normal, iria insistir para que ficassem ali, relembrando o passado e evitando o presente. Mas havia alguma coisa naquele lugar, aquele ar, que estava distorcendo seu modelo tradicional. Mais do que disposição para ser abordado, sentia vontade de ir até os outros e iniciar conversas. Era como se previsse um futuro em que todos ali já fossem grandes amigos. Queria saber quem eram e como tinham chegado até ali. Em especial aquela dama. Ficou se indagando como uma patroa de tamanha beleza não vestia uma aliança. Ensaiou galanteios imaginários... voltou a ser adolescente. Ficou inspirado, literalmente. Ouviu o ar preencher os pulmões. Decidiu não perguntar dela para seu velho amigo. Queria saber tudo sobre ela. Mas queria saber da boca dela - ah, aqueles lábios - não queria estragar a naturalidade da conversa. Iria beber direto da fonte. Iria ter com ela. Na imaginação já estava tudo premeditado. Só que hesitou na hora de dar o primeiro passo em direção ao real. Fazia anos que não abordava uma mulher... pelo menos não dessa forma, tão de igual para igual. Mais uma vez, foi interrompido. Olhou para o lado e deu de cara com um velhote. Seu rosto lembrava uma uva passa desbotada. O esquisito apoiou o pouco peso do corpo em cima uma bengala negra e falou "eu acho que faz falta um carrinho de golfe aqui. Na verdade, o golfe faz falta". Como ninguém riu da piada o estranho emendou "eu queria vir pessoalmente dar as minhas boas vindas ao novato." O velho amigo tratou logo de fazer as introduções "Carmona, esse aqui é o Domingos. Dodô, Carmona". Dodô desconfiado se limitou ao aperto de mãos. Antes que o silêncio se juntasse ao grupo, o amigo puxou conversa "por que será que o Cezar Goldman chamou a gente aqui, hoje, assim tão de repente?". O estranho Carmona engatou na conversa: -Só pode ser para se gabar daquele negócio que ele acabou de fechar na China. Sim, eu aposto.
  • 7. -Não, não pode ser. Ele não iria quebrar o protocolo por uma coisa dessas. Fora que gabação não faz o estilo do Goldman. Dodô entrou na conversa - mas afinal que tipo de sujeito é esse Cezar Goldman? E que lugar é esse? Carmona respondeu - Esse Cezar, meu caro novato, é um rapazote que comprou a boa vontade de todos aqui pela bagatela de visitarem esse resort. - Não é bem assim - protestou o amigo - esse lugar favorece os negócios. Sempre me sinto tão bem aqui. Esse equilíbrio perfeito entre civilização e natureza. Esse cheiro de mata sem nenhum mosquitinho pra atrapalhar a conversa... Vai? Esse lugar foi uma grande contribuição do Cezar Goldman. -Ora, por favor. Ele mal tinha entrado na associação e já saiu sugerindo um novo local para o encontro. Em seguida o quê? Quando percebemos, ele já estava se intitulando de 'ímpar'. Ímpar! Quanta arrogância e prepotência desse sujeito. -Não seja assim, Carmona. Todos aqui têm saído com incrementos substanciais a cada encontro. Também não gosto muito dessa coisa de ímpar, mas é fato que ele está fazendo muito mais do que qualquer antes dele. -Nah. O Cezar nunca me enganou. Nunca! - Carmona apontava a bengala para o alto para enfatizar sua revolta. Dodô já não ouvia mais nada da conversa. Sua atenção já retornara para aquela dama. Deusa. Absoluta. Como seria o nome dela? De certo, deveria ter um nome aristocrático. Nada de Sheila ou Josefa. Só podia ser um nome distinto. Estava na hora de descobrir. Só não sabia se pedia licença ou se simplesmente deixava os dois falando. Nem um, nem outro. Foram todos interrompidos por um tilintar de taças. Dodô notou uma certa movimentação. Girou a cabeça por cima do ombro para olhar para trás e teve a impressão de ver uma série de mulheres nuas. Cerrou os olhos e viu que estavam vestidas a caráter. O tom dos uniformes é que se confundia com a pele. Só então notou que cada uma delas equilibrava uma espécie de bandeja. Quando voltou a cabeça para frente estava sozinho.
  • 8. Seus pares haviam se deslocado para a névoa baixa que pairava sobre o leito do rio, que começava numa cachoeira à borda da pirâmide e repartia o ambiente até sair por debaixo da esquina oposta. Dodô se juntou aos seus pares que aguardam na margem. A brigada de garçonetes e garçons chegou até eles numa fila indiana. A primeira tinha a beleza clássica dos quadros de Botticelli. Parou diante do velho amigo de Dodô e ofereceu a bandeja que, de perto, dava para ver que era uma planta. O velho amigo arregalou os olhos, levantou as duas mãos na altura do rosto e ficou ondulando os dedos, como se jogasse um feitiço sobre a planta, que a bela garçonete retirou gentilmente para descortinar uma garrafa deitada junto a um copo de conhaque com água e gelo até a boca. A planta foi devolvida ao leito do rio em seu estado natural, era uma vitória régia que até então estava de ponta cabeça. A garrafa foi erguida deixando evidente seu contorno circular. Era feita de cristal negro. Não havia rótulo, apenas letras em relevo "Blue Moon Rare Whisky". O amigo alcançou o copo suado. Deu um farto gole na água, pescou um gelo entre dois dedos e despejou o resto no rio. O copo voltou para a bandeja. A garçonete empunhou a garrafa e quebrou o lacre de cera que prendia a rolha. Ao depositar o líquido viscoso e dourado no copo, disse: -esse blended malt scotch foi produzido no interior da Escócia de acordo com a tradição iniciada em 1913 por um grupo de rebeldes. Motivados pela Lei Seca instituída em algumas regiões do País, eles se encontravam 'once in a blue Moon', nas raras ocasiões em que a Lua é vista no céu como um espectro azul. Cada um levava seu melhor malte e durante toda a noite eles trabalhavam no equilíbrio da combinação. O esconderijo nunca foi encontrado e a bebida não é comercializada. Apenas os descendentes diretos têm acesso à bebida. Depois de quase um Século de rebeldia, o Senhor será o primeiro fora das famílias a provar. Seja bem-vindo a essa dinastia! O amigo posicionou o punho cerrado acima da boca do copo. O gelo começou a derreter. Pingou apenas uma gota de água, com a cautela de um chef de cozinha que dá seu toque final no prato a ser provado pelo crítico gastronômico. A bebida dançou dentro do copo. Finalmente o amigo degustou o aguardado gole e ficou inerte, como se nada mais importasse.
  • 9. A próxima garçonete da fila se manifestou. Dona de uma beleza exótica, ela ficou diante do mais jovem entre todos ali. Mesmo com toda seriedade do traje formal, ele aparentava não ter comemorado mais do que vinte aniversários. Sua pele reluzia um bronzeado sedimentado, uma declaração de que ele passava muito menos tempo encavernado que os demais. A suposição era fortificada pelo porte atlético. A exótica garçonete destampou a bandeja para exibir um aparelho celular, deu uma piscadela e comentou "é o iPhone 4S de platina, ainda indisponível no mercado. E já está configurado com alguns números bastante interessantes." O jovem pegou admirado e começou a brincar com o gadget. Foi a vez de um garçom, homem, e com pinta de descolado. Do tipo que nas horas vagas deve trabalhar como barman em alguma praia particular do norte da Espanha, fazendo malabarismos com garrafas. Ele chegou perto do velhote e jogou a planta na água como se fosse um frisbee. Dodô espiou uma caixa metade mostarda, metade enxadrezada com a silhueta de um rosto. Logo abaixo da icônica menina do rabo-de-cavalo, as 6 letras mágicas: C O H I B A. O abrir da caixa revelou um charuto do comprimento de um talão de cheques e da espessura de um dedinho. O garçom fitou os olhos de Carmona, pegou uma guilhotina e passou calmamente pela ponta arredondada. Antes de decepar, o garçom discursou: - Hoje é o aniversário de 40 anos deste lancero, recebido das mãos do próprio Fidel. Acabou de sair do seu quinto e último humidor para comemorar com você, Carmona. Flame on! Carmona enfiou a mão dentro do paletó e sacou um maço de notas de 100 euros, enrolou e ateou fogo na ponta. Trocou o isqueiro pelo charuto e rodou a ponta cortada sobre o fogo. Deixou escapar um riso de puro prazer. "Uhuhu!" Descartou as notas queimadas no rio e deu a primeira baforada. Bochechou a fumaça como se escovasse os dentes e finalmente cuspiu uma série de anéis. - Ahhh... as notas queimadas complementam a última nota. - esnobou contemplando o vazio. Uma garçonete chegou atrasada com uma xícara de Nespresso fora de catálogo. O próximo garçom entregou um perfume feito
  • 10. a partir da Edelweiß, a flor dos alpes. Depois, um documento confidencial. Uma peça de arte. Um baralho egípcio. E assim, um após o outro, os pares foram presenteados. Cada um com um ritual mais esquisito que outro: cheiravam, inspecionavam, alisavam, provavam... terminando sempre em regozijo. Enfim chegou um garçom para a dama. Debaixo da vitória-régia havia uma joia. Uma espécie de tiara de brilhantes. Antes que o garçom pudesse se pronunciar, a madame se antecipou: -não precisa dizer, querido, eu sei. Ai, esse Cezar me paga! Já falei pra ele que não precisa me mimar. Mas eu amei, amei. Muito obrigada, viu? De todos os presentes inusitados, aquele era o único que Dodô conhecia de fato. Uma joia da coroa italiana. A primeira dona da tiara foi a Rainha Elena de Montenegro. A crise na Itália obrigou que as peças fossem vendidas. Um leilão público devia acontecer no fim do ano. Mas já havia acontecido um particular com as peças mais valiosas e, de certa forma, mais embaraçosas para a monarquia. Dodô sabia disso porque esteve nesse leilão. Seu interesse era por outro item, mas a joia foi marcante. Primeiro porque não estava anunciada previamente. Segundo porque não é sempre que um governo decide se desfazer de sua coroa. E terceiro porque havia sido arrematada por um valor desproporcional por um comprador anônimo. Pronto! O Universo conspirou a seu favor. Agora Dodô tinha um ótimo começo de conversa. E que essa conversa acontecesse logo. Ela ficou ainda mais deslumbrante com a tiara... Mas antes que ele desse um passo, veio a última garçonete em sua direção. Era linda, mas ele conteve seus impulsos. Sabia que a dama e sua tiara estariam de olho. Preferiu se fixar na exuberante vitória-régia que ocultava seu presente. Ficou nervoso. Nem ele sabia ao certo qual seria seu maior desejo. Como haveria o Cezar de saber? Dodô já tinha tudo, tanto que nenhum dos outros presentes havia despertado inveja ou cobiça. Dispensava as frugalidades da vida. Seu desejo - se havia algum - devia estar em sonhos distantes deste mundo. A respiração estancou por um instante. Seus olhos refletidos na flor iluminavam o que estava por acontecer. Desviou a visão em busca de um olhar fugido, mas cúmplice. E se ele ficasse frustrado com o presente? Deveria fingir a mesma estupefação dos outros? Não seria mais autêntico mostrar que ele não é tão superficial ou previsível assim?
  • 11. A garçonete subtraiu a planta e eliminou o dilema. Sobre a bandeja apenas uma colher e uma pequena lata recheada com massa. Não podia ser verdade. A garçonete agarrou a lata com uma das mãos e num movimento subido colidiu contra a bandeja. Ao sumir com a lata, sobre a bandeja restou um pequeno bolo. "Domingos, o bolo está desenformado, mas eu estou desinformada. O Cezar disse apenas que você saberia. Bom mergulho." Suor de ansiedade. Seus dedos se apoderaram do garfo de prata como tentáculos de um polvo. Ao cavar a iguaria sua mão tremia. Arregalou a boca, fechou os olhos e embarcou na viagem mais longa de sua vida. Em tempo e distância. Estava de volta ao útero. Havia se desprendido do espaço-tempo. Mastigou durante meses. Finalmente engoliu e despertou. Olhou em volta com novos olhos. Sentiu a vibração viva da composição de verdes. Reparou na mobília lustrosa esculpida na própria madeira das árvores. Aquele lugar era mais aconchegante do que cama quente em noite fria. - Não lembro como vocês chamam esse lugar. Mas eu vou chamar de ventre. Sempre que vier cá vou sentir um prazer enorme em virar pras pessoas e dizer, olha gente, um abraço, mas tenho que voltar pro ventre.' - disse Dodô num tom estranho, como se estivesse compartilhando algo que talvez não devesse. Ameaçou rir e então chorou. Chorou copiosamente. Levou as duas mãos ao rosto e caiu de joelhos. Lágrimas e soluços. Olhares atônitos. Nem tanto pela reação, mas principalmente pelo motivo. O que um bolinho poderia conter de tão especial? Dodô sentiu os olhares grudados em si e tentou despistar: - olha aqui, minha gente, isso aqui não é bolinho, não! - mas logo viu que teria que ser realmente estúpido para dissipar a curiosidade. Achou melhor se render e explicar: - Pensem no bolo favorito de vocês. É sério. Se querem saciar a curiosidade, precisam me acompanhar. É pra pensar mesmo. Lembrem do bolo favorito... Qual é o sabor? Chocolate? Coco? Merengue? - Dodô olhou em volta com ares de inquisidor. Já que queriam tanto saber, então que colaborassem. Prosseguiu:
  • 12. - E quem que faz a melhor versão desse sabor? É alguma doceria? Algum parente? - Fez uma pausa para que pensassem. Continuou: - Agora fechem os olhos e imaginem esse sabor. Como se estivessem acabado de dar uma mordida. Agora mesmo, nesse momento. Qual é a sensação? - Dodô se certificou que todos estavam prestando atenção e então sentenciou: - Pois esse bolo aqui precisa ficar um ano curtindo dentro da lata. Era uma receita que minha avó fazia e que tinha se perdido. A última vez que comi foi pouco depois que ela faleceu. Eu já era órfão de pai e mãe e vivia com uma governanta terrível que estava destruindo o patrimônio da família. Esse último bolo minha avó preparou justamente para meu aniversário de dezoito anos. Esse bolo não é de chocolate ou baunilha. Esse bolo tem sabor de liberdade, com recheio de reconquista e cobertura de afeto. Todos ficaram parados e pensativos, com a exceção da dama, que aterrissou a mão compadecida sobre o ombro de Dodô. Mas antes que pudesse esboçar qualquer reação uma voz trovejante preencheu o ambiente: - CAMINHEM COMIGO! Pela primeira vez, viu Cezar Goldman. Ele passou de relance e todos foram depressa atrás dele. Ele caminhava em ritmo rápido enquanto discursava: - Em primeiro lugar, gostaria de agradecer a resposta de todos a um convite tão emergencial. Estou certo que para estarem aqui agora, tumultos fizeram parte da manhã de todos. - alguns acenaram com a cabeça. Mesmo quando tinha que se esquivar de um galho de árvore, Cezar Goldman mantinha a fala num ritmo cadenciado: - Reitero que a presença individual hoje é fundamental e será recompensada. – exceto por Carmona, todos pareciam alegres. - Dois anos atrás, iniciei a concepção de um empreendimento. Mas só agora tomei a decisão de levar esse desígnio adiante. Seu timbre de voz carregava um traço de profunda seriedade, talvez até preocupação:
  • 13. - Sei que essa decisão vai afetar direta ou indiretamente todos os brasileiros. Assim, gostaria que os senhores aqui presentes fossem os primeiros e, por enquanto, os únicos a saber. Depois de uma pausa para o consentimento, continuou: - Estou em processo de liquidar em absoluto todo o meu patrimônio. É possível, inclusive, que este seja nosso último encontro nesse local. O nível de atenção era tanta que algumas pessoas ali mal respiravam. Um dos pares chegou a tropeçar numa raiz. - Pretendo concentrar todos os meus recursos, sejam financeiros, humanos, sociais e de tempo, para investir em um único projeto... Cezar Goldman fez uma pausa dramática, como quem procura o termo mais preciso para se expressar. Até que disparou. - Vou construir a Nova Maravilha da Humanidade. A informação estarreceu! Pequenos comentários começaram a formar um zunido. Todos diziam algo na linha de "como assim?" Cezar se calou e o zunido logo cessou. Deu continuidade ao seu anúncio: - Confesso que não sei que Maravilha é essa. Por isso chamei os senhores aqui. Para pedir que me tragam ideias. Não medirei esforços e cuidarei pessoalmente para assegurar que o melhor projeto seja realizado. Cezar Goldman desacelerou o passo para frisar a próxima informação: - Minha única exigência é que esta Maravilha seja entregue até meu aniversário de 60 anos, em 21 de Dezembro do próximo ano. Continuaram a caminhada em silêncio enquanto Cezar ponderava um pensamento importante. Finalmente disse que era tudo o que tinha a dizer sobre o assunto. Como sempre, todos estavam convidados a permanecer hospedados no Manauéden. Mas que o zepelim estava a postos para levar aqueles que tivessem que voltar aos seus assuntos.
  • 14. Começou a movimentação. Alguns já se prepararam para ir. Dodô ficou de olho na dama... O que ela fizesse, ele faria também. E para sua alegria, ela não pareceu disposta a deixar aquele paraíso tão cedo. Pensou que as conquistas são feitas assim, nas pequenas manobras. E que as vitórias são resultado dos pequenos golpes, nem que sejam de sorte. Cezar Goldman seguiu sua caminhada até a rocha esfumaçada por onde havia chegado. Por fim reverenciou a todos e, antes de deixar o ambiente, encerrou o momento com seu bordão 'quem não muda o Mundo, o Mundo molda.' ----------------------------------------------------------- Para acompanhar a continuação dessa história, bem como os bastidores da sua escrita, basta curtir a página: www.facebook.com/proximamaravilha Disclaimer: os direitos autorais dessa história, bem como de seus personagens, estão registrados, ficando proibida sua reprodução ou adaptação seja parcial ou integralmente sem o consentimento escrito do autor. Dúvidas sobre publicação e licenciamento podem ser esclarecidas pelo e- mail palacios@storytellers.com.br Este arquivo foi inteiramente redigido como uma grande mensagem de texto diretamente em um aparelho celular E71 durante uma viagem a Buenos Aires.