1. O documento discute as premissas e o sentido religioso do homem. Apresenta o realismo, a razão e a moralidade como fundamentais para o conhecimento.
2. Aborda o empenho do homem com a vida através da tradição, do presente e da crítica. Aponta que o homem busca respostas para perguntas sobre com quem compartilhar a vida e quem ele é.
3. Explica que o homem tende a assumir atitudes irracionais quando nega ou evita as perguntas sobre o sentido da exist
1. Cristianismo e Cultura
Premissas
1. Realismo:
“Poucas observações e muito raciocínio conduzem ao erro. Muitas
observações e pouco raciocínio conduzem à verdade.” – Alexis Carrel
De facto a verdade está mais na observação do que no simples raciocínio e
experiência. O método para conhecer um objecto é me dado pelo próprio
objecto, não pode ser definido por mim.
É de notar que quando se fala de observação/experiência, não se fala
exclusivamente de experimentar. O que caracteriza a experiência é o facto
de perceber as coisas, descobrir o seu sentido. Por exemplo: uma pessoa
pode saber que o cancro é mau, mesmo nunca tendo tido cancro (pode ter ti
um familiar com esse problema).
Experiência elementar – Conjunto de exigências e evidências do coração
do Homem, ou seja conjunto de experiências que estão implícitas na
pessoa, no seu oração, antes de lhe ter sido incutido ou educado. Por
exemplo: apesar da multiplicidade de costumes existentes no nosso planeta,
a maneira de uma mãe olhar para o seu filho aquando do seu nascimento é
sempre o mesmo.
2. Razoabilidade:
Antes de mais entende-se como razão a capacidade de se dar conta do real
na totalidade dos seus factores.
Assim, como se sabe se uma atitude é ou não razoável?
Uma atitude razoável é uma atitude motivada por razões adequadas.
Exemplo: Imagine-se que uma pessoa ao falar para uma plateia se
apresenta-se com um megafone e se justificasse dizendo que estava rouco
isso não seria considerado razoável.
È que ter em conta que uma atitude racional nem sempre está intimamente
ligado com o que é demonstrável.
Demonstrável significa percorrer todos os passos de um processo e por
vezes isso não é possível. Por exemplo: o homem não pode demonstrar
como é que as coisas existem. Mesmo que alguém possa demonstrar que
esta mesa é feita de um material que tem uma determinada composição,
nunca poderá percorrer todas as passagens pelas quais esta mesa existe.
Surge assim o método da certeza moral que consiste na interpretação
simultânea de uma multiplicidade de indícios, cuja única leitura razoável é
aquela certeza.
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2. Exemplo: como é que seu sei que “a minha mãe quer me bem” vou
observando a minha mãe ao longo do tempo e vou recolhendo vários
indícios que convergem para a certeza de que ela me quer bem.
Aplicação do método de certeza moral: fé.
A fé é aderir àquilo que outra pessoa afirma. Assim se eu ceguei à certeza
de que uma pessoa sabe aquilo que diz e não me engana, posso acreditar
nela, sem precisar de provar todos os passos. Se a única razoabilidade
estivesse na evidência imediata ou demonstrada pessoalmente, o homem
não poderia avançar, porque cada um teria de refazer todos os processos
desde o início.
É obvio que este método pode falhar, mas as certezas científicas também
falham e isso não tira o facto de que com estes métodos se podem alcançar
certeza.
3. Incidência moralidade na dinâmica do conhecimento:
A razão é inseparável da unidade do eu. De facto, o instrumento para
conhecer é a razão, no entanto há uma profunda relação entre o instrumento
da razão e o resto da nossa pessoa. A razão não é uma máquina que se pode
separar do resto da personalidade, de modo a que possa a agir sozinha, e
por isso não a usamos bem quando temos uma dor ou temos raiva ou
desilusão pela incompreensão dos outros.
Exemplo: um rapaz é muito bom a português, mas no dia do teste ele tem
uma dor de barriga, e tem má nota no teste.
De facto o sentimento activa a nossa dinâmica para conhecer. Quanto mais
interessado estiver por uma coisa, e quanto mais me causar curiosidade em
conhecer, mais estou impelido a conhecer. Assim os meus sentimentos
condicionam o meu instrumento de conhecimento.
Assim dado que a razão e a emoção misturam-se, deve-se conseguir
colocar os sentimentos no devido lugar.
A regra moral do conhecimento é “Amar a verdade mais do que nós
próprios”. Isto significa estarmos livres de preconceitos.
Todos temos preconceitos, no entanto não devemos ficar presos a esses
preconceitos, deve-se procurar ultrapassa-los.
Sentido Religioso
1. A vida é procura de si próprio
Para podemos enfrentar a experiência religiosa, temos de partir de nós
mesmos, e assim detectar os aspectos que a constituem. Mas para partirmos
de nós mesmos temos de observar nos a nós próprios em acção visto que só
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3. em acção sabemos o que verdadeiramente somos capazes de fazer, sem cair
no preconceito do que pensamos que somos.
Imaginemos, por exemplo, um rapaz que, por vários motivos, não gosta de
aritmética e por isso nunca se tenha esforçado em estuda-la. Ele não estará
na altura de perceber se tem uma capacidade pelo menos normal nesse
campo. Se, pelo contrário, começa a empenhar-se, até pode chegar a
descobrir que tem uma capacidade acima da média. Precisamente porque só
em acção podemos descobrir o nosso talento.
2. O empenhamento com a vida
Quanto mais uma pessoa está empenhada com a vida, mais percepção terá
dos factores próprios da vida. No entanto, o fenómeno religioso tem a ver
com a totalidade do homem, por isso, para o homem o compreender de
forma correcta, não deve empenhar apenas alguns aspectos da sua
existência, mas toda a sua vida.
O empenhamento é manifestado de várias formas:
-Lealdade à Tradição – A tradição é o ponto de partida, é a hipótese de
trabalho com o qual a natureza nos coloca diante da vida e da história. Será
uma atitude desleal com a realidade considerar a tradição errada.
- Vivência do presente – O presente é um factor fundamental para
compreender o valor do eu. É no presente que a vida deve ser avaliada, o
passado poderá auxiliar na compreensão do presente mas não o explica.
- Critica – Deve avaliar essa tradição e escolher aquilo que queremos para
nós.
3. Dupla realidade
O Homem é constituído por duas realidade, uma material (mensurável,
divisível e mutável) e outra espiritual (não quantificável e permanente),
duas realidades que são inseparáveis.
4. O nível de certas perguntas
O sentido religioso coincide com a tentativa do Homem de se conhecer a si
próprio, de se empenhar com a vida, através de certas perguntas:
Com quem partilhar a vida?
O que vale a pena?
Quem sou eu?
Estas perguntas dirigem-se ao fundo do nosso ser e não se podem extinguir
exigindo uma resposta total.
5. A exigência de uma resposta total
Estas perguntas exigem uma resposta total, que cubra o horizonte inteiro da
razão, caso contrário levará a um estado de irrequietação e insatisfação.
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4. O homem tem uma atracção pelo infinito que o homem gostaria de agarrar,
mas que sempre lhe foge. Ou seja ele depara-se com uma tensão contínua
para andar para além daquilo que momentaneamente se atinge, em direcção
a uma meta que está sempre mais além, quase inalcançável. Isto porque o
que move a pessoa não é mais eu a procura da verdade, procura essa que se
vai demonstrar inalcançável, mesmo que toda a vida tenhamos que esperar
por ele.
6. Desproporção em relação à resposta total
Quanto mais uma pessoa avança na tentativa de responder àquelas
perguntas, tanto mais se apercebe da potência, e tanto mais descobre a sua
própria desproporção face à resposta total.
7. Tristeza e desespero
Esta tentativa de querer atingir o infinito e não conseguir leva a que o
Homem fique triste. No entanto essa tristeza está carregada de esperança
visto que a pessoa tem noção do que quer e continua a procurar
De facto quando o Homem exclui a possibilidade do infinitamente grande
tem como único destino cair no desespero até morrer por causa dele.
8. Sentido religioso na sua dimensão
O sentido religioso é a capacidade que tem a razão para exprimir a sua
natureza profunda na interrogação última, ou seja é um conjunto de
perguntas que nos provocam e nos levam a perceber quem somos.
Logo o sentido religioso coloca-se na realidade do nosso eu.
9. A inevitabilidade de uma resposta
É inevitável para o homem dar um sentido à vida: faz parte da própria
estrutura do ser, do próprio facto de existir.
Assim o Homem vai percebendo que não está sozinho e há um último que
dá sentido à vida. O Homem sem esse significado para a sua existência
(Deus), desespera e morre.
Atitudes Irrazoáveis
Diante da pergunta última, o Homem pode assumir uma atitude ou posição
irrazoável, quando não reconhece a sua evidência, pelo que desvaloriza,
reduz, nega ou evita as perguntas do porquê da existência.
Quem nega as perguntas fundamentais da vida, quem não as enfrenta, quem
as reduz à sua própria medida, perde a sua própria identidade conduzindo a
que o homem já não saiba entrar em relação com a riqueza do passado e
identifique a vida com a mera reacção do instante; feche se em si mesmo e
já não consiga comunicar com o outro, e já não experimente a liberdade
como realização do desejo de infinito que o caracteriza.
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5. Podem identificar-se 6 posições irrazoáveis:
1. Negação teórica das perguntas
Neste caso as perguntas sobre o significado da vida são definidas como
sem sentido. Essas perguntas são desnecessárias logo são rapidamente
abafadas.
2. Substituição voluntarista das perguntas
No lugar daquelas perguntas põe-se a energia da vontade, uma energia que
faz agir com o objectivo de afirmação de si próprio.
Esta vivência voluntarista tem como ponto de partida:
Vivência baseada no gosto pessoal
Sentimento utópico pelo qual a energia de vontade não é activada
por uma meta reconhecida mas sim por uma meta que a vontade
estipula.
Projecto social que esquece o conteúdo mais autêntico e pessoal da
existência.
Exemplo: Um pai que trabalha dia e noite para conseguir ascender na
carreira e que se esquece que a sua função principal é ser pai.
Abdicando da sua função principal, perde de vista a essência daquilo
que é, não dando resposta ao seu sentido religioso.
3. Negação prática das perguntas
É visível naqueles que, não querendo perder tempo a perguntar se Deus
existe ou não, vivem como se Ele não existisse. Evitam que certas
perguntas que lhe inquietam surjam ou, quando elas se lhe deparam reagem
de modo indiferente.
Esta atitude caracteriza-se por um medo de enfrentar o próprio ser, um
medo de pensar e de avivar um mistério que há dentro do Homem.
4. Evasão estética ou sentimental
Acontece quando o Homem, diante do porquê da existência, vê somente
um espectáculo de beleza e sentimentos, mas não se empenha com a
seriedade na procura de resposta.
5. A negação desesperada
Negação da possibilidade de resposta às perguntas depois de terem sido
levadas a sério. È tanto mais viva esta atitude, quanto mais se sentem as
perguntas. No entanto é a dificuldade de resposta que a um dado momento,
faz dizer “que não é possível”.
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6. Exemplo: Florbela Espanca que depois de ter perseguido o amor infinito e
nunca o ter conseguido alcançar, desespera e nega que esse amor seja
possível.
6. A alienação
A resposta às perguntas está num projecto que se realizará no futuro, e que
portanto se cumprirá sem que o eu possa fazer experiência dele.
A vida tem um sentido positivo: contribuir para o progresso. Assim as
perguntas fundamentais têm como objectivo servir esse progresso.
Ora isto leva a um grande problema. De facto as perguntas fundamentais
constituem a minha pessoa. È impossível encaminhar a resposta a essas
perguntas para uma realização que diga respeito a uma colectividade, sem
que isso dissolva a identidade do homem, sem que isso leve à alienação o
Homem.
O eu seria sacrificado e teria de se destruir para que aquela evolução da
realidade acontecesse.
Exemplo: Revolução soviética que impôs uma ditadura levando a que as
pessoas perdessem toda a sua liberdade, sendo impedidos de pensar e de
tomar as decisões que fossem melhor para eles próprios.
Consequências das atitudes Irrazoáveis
Estas atitudes irrazoáveis levam-nos a desvalorizar as perguntas últimas e
consequentemente a perder o controlo de nós próprios, o sentido da nossa
existência, conduzindo a três consequências:
1. A ruptura com o passado
2. Solidão
3. Perda de liberdade
1. Ruptura com o passado
Quando o homem perde o sentido de viver não reconhecendo o significado
pelo qual vive, a sua personalidade torna-se frágil e débil, reduzindo a sua
existência a uma pura reacção do instante. Sendo assim é perdida toda a
riqueza da história e da tradição: o homem corta as pontes com o passado.
Ao retirar ao Homem os seus alicerces, torna-se mais fácil manipulá-lo
visto este desconhecer a direcção do seu sentido religioso.
2. Solidão
A falta de significado torna o homem incapaz de comunicar: de facto, o
homem que não está empenhado com a sua vida não tem nada de
interessante para comunicar ao outro homem e não tem motivos para
caminhar ao seu lado. Portanto, a solidão que daí deriva não é estar
sozinho, mas sim, a ausência de um significado. Esta solidão leva a que o
Homem perca a paixão e o gosto de viver.
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7. 3. A perda de liberdade
A liberdade não é ser selvagem, ou seja, tomar o seu prazer como absoluto,
a liberdade é sim: o cumprimento total de si mesmo e a capacidade de
adesão ao ser.
O homem percebe que é livre quando vive a experiência de satisfação de
um desejo. A liberdade é a realização do destino para que o Homem é feito,
é portanto, a experiência da verdade de si. No entanto, a verdade do próprio
eu é um outro; Deus, o único em que o homem pode fazer experiência da
satisfação plena do seu desejo.
Assim, o Homem só será verdadeiramente livre quando reconhecer a sua
dependência, não ao poder, mas sim a Deus, quando a sua adesão a Deus
for total. Quando isto acontecer: “O Mundo pode fazer de mim aquilo que
quiser, mas não me vence pois eu sou livre”.
Itinerário do sentido religioso
As perguntas últimas são despertadas pela relação com a realidade.
O Homem, para não cair em atitudes irrazoáveis, deixando-se levar por
preconceitos e ideologias, deve manter uma relação verdadeira com a
realidade, baseada na razão, de modo a que as perguntas últimas sejam uma
constante.
O primeiro sentimento que o ser humano experimenta, no seu contacto com
o mundo, é o espanto e o entusiasmo, motivado pela existência de algo que
existe independentemente dele, e da qual ele depende.
O homem quando se dá conta desta presença inexorável, dá-se conta de que
existe uma ordem dentro desta realidade, ordem esta que traz consigo uma
beleza e harmonia a esta realidade.
É através desta percepção que nos apercebemos de que a vida é um dom:
que não é fruto da decisão de cada um de nós, mas que a nossa existência é
nos totalmente dada, isto é que depende de Outro.
O eu do Homem, que se descobre feito e dependente de Deus, escuta dentro
de si uma voz que lhe diz o que é o bem e o mal: esta consciência do bem e
do mal está de tal forma impressa no coração do homem, que guiará a
pessoa em cada juízo por si feito. É assim, ao viver em relação com o
mundo, que todos nós nos apercebemos que há algo de transcendente, que
vai para além da realidade, isto é, que nos apercebemos do valor da
analogia.
A provocação do real em ir para além daquilo que aparece introduz a
experiência do sinal. O sinal é uma experiência real que me remete para
outra coisa. Assim, a capacidade humana vai descobrir nos sinais o sentido
das coisas.
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8. Na relação com o mundo, emerge o carácter exigencial da vida humana isto
é carácter que instigue o homem para a procura de respostas plenas.
Existem quatro categorias fundamentais eu são:
1. Exigência de verdade Exigência do significado das coisas, da
existência.
2. Exigência de justiça Exigência de justiça que é o próprio homem
3. Exigência de felicidade Cumprimento de si mesmo
4. Exigência de amor Separar-se completamente de si mesmo para
entrar num tu.
Sem a hipótese de um além, essas exigências seriam sufocadas.
O dinamismo do sinal e o facto da natureza da existência humana ser
exigêncial conduzem à descoberta do mundo como sinal de qualquer coisa
de Outro que cumpre o homem mais do que qualquer posse.
A dinâmica do sinal faz descobrir o verdadeiro sentido da razão. A razão é
a exigência de explicação total. Como esta exigência não encontra resposta
no horizonte da experiência humana, a razão, para ser coerente consigo
própria, lança-se mais além, chegando à percepção do desconhecido,
inatingível mas real. É ao descobrirmos o mistério que a razão deixa de ter
barreiras.
O homem, enquanto ser livre, não pode chegar ao seu cumprimento, não
pode chegar ao seu destino, a não ser através da sua liberdade. É através da
minha liberdade que o destino, o fim, o objectivo se pode tornar numa
resposta a mim.
De facto, o Homem, no jogo da sua liberdade tem duas opções:
Enfrentar o real mantendo um espírito aberto a todas as provocações
ou,
Encarar o mundo segundo o seu parecer
Assim reconhecer Deus não é antes de mais um problema da ciência, nem
da filosofia, nem da sensibilidade, mas da liberdade, ou seja do ponto de
vista com que uma pessoa se põe diante da realidade.
A interpretação necessita de liberdade, mas necessita de uma liberdade que
esteja educada a estar aberta a toda a realidade, a pôr-se numa posição de
espera e de pedido e a admitir cada possibilidade de resposta, sem a priori
excluir nenhuma. De facto a liberdade joga-se no quotidiano: ao se ter
liberdade para não só:
1. se ser capaz de estar aberto à totalidade dos factores, como também,
2. saber reconhecer o positivo do quotidiano da vida e não esperar que
a vida seja diferente isto é ser capaz de abraçar de forma consciente
aquilo que nos surge diante dos olhos, aquilo que nos foi dado.
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9. O homem, nesta aventura à descoberta do mistério, vive inevitavelmente a
experiência do risco, que consiste no facto de apesar de serem evidentes as
razões da existência de Deus, o Homem permanece como que bloqueado,
não conseguindo aderir a essa verdade, na medida em que existe uma
separação; “uma brecha entre a razão e a afectividade, a razão e a vontade”
Há duas formas de enfrentar esse medo:
1. Pela força de vontade, força da liberdade
2. A dimensão comunitária proporciona ao homem encontrar uma
energia extra, através da qual se torna possível ultrapassar esse
abismo. Assim, a dimensão comunitária deve ser encarada como
uma base e um sustento à liberdade humana. De facto a comunidade
não substitui a liberdade, mas sustenta-a, fazendo com que o Homem
corra o risco de aderir a Deus.
Razão e Revelação
O ponto mais importante da razão é a percepção do mistério pois aquilo
que move a razão é o desejo de entrar no mistério, de o descobrir, de o
conhecer. No entanto, o homem é incapaz de entrar no mistério pois este
está para além da capacidade da razão, com instrumentos puramente
humanos.
Assim a vida do homem é uma tensão contínua em direcção ao mistério,
onde por um lado se sente a presença do mistério, mas por outro lado não
pode alcança-lo.
Esta tensão, no qual somos chamados a reconhecer o mistério sem o
podermos ver, é uma posição vertiginosa que não é fácil de manter, pois o
Homem é muitas vezes levado a definir o significado do mistério, caindo
na pretensão de particularizar o todo.
O homem pode viver a dramaticidade da sua relação com o mistério de 2
modos:
1. Tentar defini-lo com os seus próprios meios – Caindo-se no ídolo
onde se concebe o homem como medida de todas as coisas, e onde a
razão procura definir o significado último da realidade, ou seja
pretende ser Deus, substituindo a realidade por uma interpretação no
qual o Homem perde o seu verdadeiro rosto. Isto não está correcto
pois este facto não corresponde à natureza da razão e porque leva a já
não se saber reconhecer o verdadeiro rosto da vida e da realidade e
consequentemente não responde adequadamente ao desejo humano.
Mos dias de hoje, o ídolo assume a forma de ideologias. Assim se o
Homem não depender de Deus ficará dependente da ideologia e
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10. consequentemente poderá levar à violência nas relações e mesmo à
guerra (exemplo: ideologia nazi).
2. Revelação – A razão reconhece a existência do mistério, mas
também a sua incapacidade para o definir positivamente, pelo que
admite, como o único caminho para o conhecer, que o próprio
mistério revele o seu rosto, se mostre de modo compreensível. O
vértice da razão é, então, deixar aberta a possibilidade de Deus tome
a iniciativa de se revelar.
Condições para aceitar a revelação:
Admitir que é possível – Pois é própria da razão deixar aberta
todas as possibilidades, mesmo a de que seja Deus a fazer-Se
conhecer pelo Homem e não o homem a descobrir Deus e não
impor condições ao Mistério, sob pena de não o reconhecer
verdadeiramente.
Esta hipótese de revelação é conveniente. – e leva o Homem a
compreender-se a si próprio.
A hipótese da revelação deve permitir aprofundar o mistério (e
não reduzi-lo). – isto é devemos adaptar a revelação à
experiência humana de modo a aproximarmo-nos a ele.
A hipótese da revelação deve ser compreensível ao Homem
Assim, a vida do Homem é a expectativa de que Deus se revele e, deste
modo, venha ao encontro do desejo de conhecer o mistério presente na
realidade.
Na origem da Pretensão Cristã
O homem, se usar a razão, é levado a reconhecer que, para dar sentido à
vida (para reconhecer a razão da sua existência), é preciso admitir a
existência de mistério, isto é, de uma realidade da qual dependem todas as
coisas.
Se o sentido da existência é o Mistério que está na origem da realidade e na
qual tudo encontra valor, se a felicidade está na sua presença, se aquilo por
que vale a pena viver é Deus, então o único problema da existência é como
é que se faz para entrar em relação com ele para que, se possa satisfazer,
dentro do possível, as exigências da felicidade, justiça e de amor que
caracterizam o coração do homem.
Há dois modos para enfrentar o problema da relação com o mistério:
Parte do pressuposto de que o mistério permanecerá sempre sem
rosto e portanto é impossível entrar em relação directa com ele.
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11. Surge assim as várias religiões que são tentativas por parte do
homem de imaginar o mistério e de se pôr em relação com ele.
O Mistério entra na vida do homem e acompanha-o de forma a
este descobrir o seu destino de felicidade. Nesse sentido, não seria
já o homem a tentar entrar em relação com o mistério, mas seria o
próprio mistério a entrar em relação com cada pessoa, revelando a
sua natureza divina.
A escolha de uma religião exige um conjunto de regras. No entanto estas
regras não asfixiam a pessoa, mas sim, potenciam a sua liberdade, pois
essas pessoas desejam essas regras, dado que há uma relação de amor.
Para avaliar qual é a religião que imagina Deus de modo mais
correspondente à realidade, podem seguir-se estes critérios:
Conhecer todas as religiões que existiram para depois fazer uma
escolha razoável. Este critério é utópico
Conhecer as religiões mais importantes, as que são mais
praticadas no mundo No entanto, o que me interessa não é o
número de seguidores de dada religião, mas sim a verdadeira, a
resposta ao meu coração.
Criar uma religião universal tomando o melhor de cada religião
(sincretismo religioso) Isto é impossível pois o melhor é
sempre diferente, e muda de pessoa para pessoa. Além disso, se
essa religião estivesse nas mãos de alguns homens que
estabelecessem o que é melhor, criar-se ia uma religião submetida
ao poder.
Seguir a religião da sua tradição Que sugere que cada homem
siga a religião da sua tradição a apartir daí vamos verificar se
corresponde ao nosso coração, ou se por outro lado ao longo da
vida encontra uma religião mais adequada à sua razão, e ao seu
coração. Se isso acontecer, por amor à verdade abandona tudo e
converte-se.
O homem exprime por isso a sua exigência de identificar a relação com o
mistério através da criatividade religiosa: qualquer religião tem em comum
com as outras, o facto de ser um esforço do homem para imaginar qual é o
significado último. A religião é por isso uma tentativa do homem, que deve
ser considerada e valorizada por toda a dignidade que implica.
New Age
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12. A New Age é uma tendência religiosa enraizada no esoterismo ocidental do
século XIX e vulgarizada na segunda metade do século XX, que se
apresenta sob o sinal do mito astrológico do Aquário. Este movimento
mistura elementos das várias religiões (sincretismo religioso), sobretudo
das orientais como:
Primado do espírito sobre a matéria
Necessidade da interioridade
Importância da consciência
Várias práticas de meditação
Procura de paz e de uma fraternidade universal.
Esta “nova espiritualidade” procura, baseando-se nas antigas religiões e
culturas, dar uma visão alternativa à espiritualidade cristã. Aqui o homem
descobre que está intimamente ligado à Força ou Energia universal, que é
sagrada e está na origem de toda a vida, é nesta energia que o Homem
busca a harmonia e a unidade com o real, que cura o homem de qualquer
sentido de imperfeição e de limite.
A música é uma das expressões significativas da New Age. Trata-se de um
tipo de música relaxante e apaziguadora, que permite ao homem destacar-
se da realidade e isolar-se no seu próprio mundo interior, encontrando aí
aquelas forças espirituais que lhe dão bem-estar e paz.
Na base desta corrente cultural encontra-se, então, a busca de
aperfeiçoamento e da exaltação do homem. Para atingir esse
aperfeiçoamento pode-se seguir:
A via esotérica busca de conhecimento
A via ocultista Busca de poder onde o homem se sente capaz de
controlar o mundo e obter os bens que deseja. Revela ao homem que
ele possui um poder divino.
Diferenças entre a New Age e a fé cristã:
Cristianismo New Age
Acredita num Deus. Deus não
coincide com o mundo nem com o
homem. De facto mora nele, mas é
seu Criador.
Na New Age não há um Deus. Deus
está em tudo
Na oração entra-se em diálogo com
Deus. A oração não é a simples
redescoberta do eu, mas pressupõe o
encontro de duas pessoas.
A oração no New Age está na
própria pessoa e não num Outro.
O homem peca e a única via de Para a New Age a salvação vem de
12
13. salvação é Cristo. Nenhuma técnica
de libertação, nenhum esforço de
concentração pessoal, nenhuma
sintonia de consciências pode salvar
o homem.
todos. Não há um Deus para este
movimento a salvação vem do
próprio esforço do homem.
O sofrimento e a morte têm um
significado. O sofrimento vivido em
união com Jesus crucificado, que na
cruz revelou o Seu amor pelos
homens, é fonte de salvação. A
morte é vista como a passagem
obrigatória para entrar na vida
eterna.
Não aceitam o sofrimento e a morte.
O mundo novo constrói-se com as
obras de amor recíproco.
A New Age quer mudar o mundo
Uma pretensão inimaginável: um facto
Todas as religiões são verdadeiras pelo que nenhuma deverá pretender ser a
única verdadeira. No entanto, o cristianismo afirma-se como tal. Enquanto
pessoas com espírito aberto a qualquer possibilidade, devemos perceber o
porquê da sua arrogância.
Segundo a hipótese da revelação, o mistério poderá ter entrado em relação
com o Homem, num certo momento da história, indicando ao Homem a
maneira de O conhecer e de estar em relação com ele. A questão que se
coloca é se isso aconteceu, ou não?
O cristianismo baseia-se nesse facto, anunciando o encontro do Homem
com Deus. Caso esta possibilidade seja verdade, o problema central do
fenómeno religioso deixa de ser uma tentativa de imaginar Deus, mas sim a
preocupação de se estar no caminho por ele indicado. Trata-se portanto de
uma escolha de liberdade, que aceita ou recusa este facto e para O
conhecer, temos de ir ao Seu encontro e comprometermo-nos com Ele (tem
de se fazer experiência do encontro).
Assim o cristianismo funde-se no facto de que Jesus é Deus, pelo que a
pergunta “É verdade que Deus interveio na história” torna-se “Quem é
Jesus Cristo”, para aqueles que acreditam que Deus interveio na história.
Assim, para estes, a pergunta “Quem é Jesus Cristo?” não pode passar ao
lado de ninguém. Ao enfrentar-se com alguém que se intitula de Deus, é
que o Homem se vê obrigado a tomar uma posição pessoal. Quer seja
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14. verdade ou não que Cristo é filho de Deus não tem o valor de uma
curiosidade intelectual, mas é decisivo para a vida.
Deparamo-nos assim com um facto histórico, pois o cristianismo tem como
base um homem, Jesus Cristo, que se diz filho de Deus, e não um conjunto
de regras. Daí que se fosse provado que Jesus nunca tinha existido, todo o
cristianismo cairia põe terra.
É preciso ter presente que, enquanto todas as grandes personalidades
religiosas evidenciaram um sentido de desproporção em relação ao divino e
se definiram no máximo como mensageiros de Deus, Cristo é o único
homem que se identificou com Deus.
Como se colocou o problema cristão na história
Para avaliar a pretensão de Cristo, é preciso levar em conta o anúncio que
as suas primeiras testemunhas fizeram dele, isto é os apóstolos, daí a
criação dos evangelhos.
Os evangelhos são um documento histórico que trata, segundo recordações
dos apóstolos, de factos relacionados com Cristo. Os apóstolos sentiram
esta necessidade pois acharam que deviam dar a conhecer e anunciar a toda
a humanidade que Deus se fez homem em Cristo.
Para compreender os evangelhos é preciso estarmos dispostos a conhecer
os factos históricos partindo do pressuposto de que o anúncio é verídico, ou
seja é preciso ter contacto ou deixar-se provocar pela totalidade do facto,
que não consiste no somatório de elementos históricos mas na pretensão de
Cristo ser Deus.
Para compreender a pretensão de Cristo, temos que ter em atenção que
apenas partilhando, através do tempo, a vida com uma pessoa, é possível
compreende-la e confiar nas suas palavras e acções, sendo essa certeza,
essa segurança e confiança sobre o outro apenas atingidas, a partir de
ténues indícios, se o homem se mostrar portador de um espírito aberto e de
uma inteligência humana.
Foi o que aconteceu aqueles que iam contactando cm Cristo, e que sendo
tocados por essa pessoa, se tornavam seus amigos. A sua convivência
quotidiana com Ele acaba por confirmar a convicção inicial de que Cristo é
verdadeiramente o Filho de Deus.
Devido a esta convivência, os primeiros discípulos descobriram que Cristo
é um homem excepcional, é dono da realidade, tem uma inteligência única
do humano e uma dialéctica imbatível, mas principalmente, dirige-se a
cada homem com uma capacidade impressionante de captar a sua
humanidade e a revelar. Por fim, Cristo não era apenas poderoso e
inteligente, mas também era bom, olhando para cada pessoa com amor.
14
15. Diante de um homem tão excepcional surgiu a questão “Quem é?”, não só
perante os seus amigos, mas também perante todos aqueles que o
encontravam, mesmo nos seus inimigos. De facto, era de tal forma evidente
que aquele homem não tinha comparação, que para entender quem ele era,
não podiam senão confiar nas suas palavras.
A pedagogia de Jesus Cristo ao revelar-se
Capitulo VII
Uma ideia discute-se, um homem não.
Jesus Cristo é um homem, não uma ideia, nem uma doutrina ou um
conjunto de preceitos, logo o cristianismo baseando-se no facto de um
homem, de nome Jesus, não se discute. Caso se provasse que Jesus não era
historicamente verdade, o Cristianismo perderia a credibilidade.
Hoje em dia, a maioria das pessoas reconhece a existência de Jesus, o que
algumas não acreditam é na pretensão d’Ele ser o Filho de Deus. De facto a
pergunta “Quem é Jesus Cristo?” transforma-se inevitavelmente em “Será
que Jesus Cristo é verdadeiramente o filho de Deus?”.
De facto Jesus Cristo afirmava-se não só como homem, mas também como
filho de Deus, sendo a resposta para o coração de todos os homens.
Como saber quem é Jesus Cristo?:
Ir à fonte, isto é aos evangelhos. Tomar consciência que Jesus Cristo
é um facto que entra dentro da história do homem com a pretensão
de ser a revelação do mistério.
Inteligência que reconhece os indícios e desperta a convicção inicial.
A fé é um caso prático de certeza moral.
Mas será que este homem tão normal poderá ser ao mesmo tempo Filho de
Deus?
Só há três justificações para um homem se afirmar como sendo Deus:
1. É louco – No entanto se observarmos o evangelho, descritos por
quem O conheceu e quem contactou com ele, verifica-se que tudo o
que fez foi sensato, e nunca demonstrou nenhum sinal de loucura ou
irrazoabilidade.
2. Queria chamar a atenção e poder – Ele nunca viveu rodeado de
riqueza, bem pelo contrário. O que foi evidente perante a sua pena de
morte, que naquela altura era a pena de morte mais mal vista pela
sociedade.
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16. 3. Estava a dizer a verdade – e nesse caso merece um pouco da
atenção de cada um de nós.
A excepcionalidade do comportamento de Jesus era tal que as evidências
do seu contexto familiar, já não serviam para defini-Lo.
Jesus foi, assim, revelando-se devagar, usando uma inteligente pedagogia
para se auto-definir.
Como era essa pedagogia?
Á pergunta “ Quem és tu?” Cristo não deu imediatamente uma resposta
completa, mas sim foi fazendo-o de uma forma progressiva, usando uma
pedagogia reveladora que permitia que cada pessoa se pusesse na melhor
posição para reconhecer o seu verdadeiro rosto.
Etapas da pedagogia:
1. Cristo pede a quem o encontra que o siga: Nesta fase apesar da
mensagem ser entendível e aceitável por todos, o seu conteúdo real
ainda não era percebido. De facto Jesus tinha em mente, uma
implicação muito maior, a de possibilitar ao homem que este faça
experiência de si mesmo, seguindo aquilo que está na sua natureza,
mas, nesta fase, as pessoas não se apercebem disso.
2. Cristo pede a quem o segue que renuncie a si mesmo: Sendo para tal
necessário abandonar a posição de si mesmo, ou seja, separar-se de
bens, família etc. Coloca-se, assim, no centro de afectividade e de
liberdade do homem. Pedindo ao homem que realize cada acção por
sua causa, entregando-lhe a sua vida, porque apenas n’Ele pode
encontrar o seu sentido e a sua realização, chamando, no entanto, a
atenção para o risco de, ao fazê-lo, e no confronto com a mentalidade
comum, se pode ser ostracizado pela sociedade. Mesmo ele próprio
desliga-se dos sentimentos naturais enquanto filho e irmão, dando
primazia à sua própria pessoa enquanto Filho de Deus.
3. Que testemunhe diante de todos o seu seguimento: isto porque uma
relação verdadeira precisa de se afirmar perante a sociedade, de
modo a permanecer sustentável, tendo, por isso, que ser divulgada e
ter força suficiente para todos confrontar. É neste momento que
Cristo se identifica com Deus, e fá-lo segundo três aspectos:
a. Identifica-se com a origem da lei – “lei” era para os fariseus,
sinónimo de Deus, de divino. Jesus modifica aquilo que para
os fariseus representava o divino comunicado ao homem,
identificando-se assim com a fonte da lei.
b. Atribui a si, o poder de perdoar os pecados, poder esse detido
apenas por Deus – Dizendo que o poder de perdoar os pecados
é muito superior ao simples poder de curar uma doença.
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17. c. Cristo identifica-se com o princípio ético – Quem faz o bem
sem se dar conta d’Ele, sem ter consciência d’Ele, faz o bem
porque estabelece, mesmo sem saber uma relação com Ele.
Jesus coloca-se como discriminante entre o bem e o mal, não
tanto como juiz. Ele é o bem e não estar com Ele é mal. Viver
bem significa servi-Lo, segui-Lo.
4. Nos últimos tempos de vida terrena, Cristo chega-se a declarar
explicitamente Filho de Deus. - Esta declaração explicita acontece
em três momentos:
a. Jesus decide ir a Jerusalém, apesar de até então ter fugido dos
fariseus, de modo a evitar ser preso. No templo, Jesus decide
confrontar os fariseus no domínio da interpretação das
Escrituras: afirmando a sua natureza divina e negando o facto
de Cristo ser filho de David.
b. Discussão passada no templo de Jerusalém com os judeus,
onde estes insistem serem filhos de Abrão e Jesus responde:
“Antes que Abraão existisse, Eu sou”, provocando revolta nos
judeus.
c. No Sinédrio, quando o Sumo-sacerdote lhe pergunta se é
realmente Cristo, Filho de Deus, Ele apenas afirma “Tu o
disseste” acrescentando inclusive, “ De hoje em diante vereis o
Filho do Homem sentado à direita de Deus, e Vê-lo-eis a vir
sobre as nuvens do céu”. Perante tal afirmação e pretensão, foi
acusado de blasfémia, sendo condenado à morte.
Assim, o reconhecimento de Jesus enquanto Filho de Deus é uma questão
de liberdade, ou seja, Ele revela-se perante o Homem de forma discreta e
sustentada, para que o homem se pudesse desenvolver e tornar consciente
da posição originária que tinha tomado diante d’Ele.
O Coração do Problema da Igreja
Capitulo IX
O coração do problema da Igreja consiste em enfrentar a pergunta “Como
pode o homem que não entrou em contacto com directo com Jesus avaliar
se Ele é verdadeiramente Filho de Deus?”
Ao longo dos tempos, fruto da tentativa de encontrar respostas à questão
posta, verifica-se a existência de 3 posições culturais diferentes:
1. Atitude racionalista – Diz que Cristo é um facto do passado e
portanto, para o estudar aplica-se o método da razão histórica:
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18. recolhe-se todos os dados sobre a existência histórica de Cristo,
compara-se e avalia-se, e chega-se à certeza sobre Ele.
No entanto, este método em vez de aproximar o homem de Cristo,
afasta-o pois não considera um dos aspectos com que o facto de
Cristo se colocou: de facto, a mensagem cristã não é a de uma
ausência, mas o método de Deus connosco, ou seja o método da
presença, aqui e agora, que o método racionalista não toma em
consideração, pois considera Cristo como um facto passado.
2. Atitude protestante – Profundamente religiosa, diz que a distância
que existe entre o homem e Deus é preenchida pelo Espírito de Deus,
que iluminando o coração do homem, fá-lo sentir a verdade da
pessoa de Jesus Cristo. O método protestante é portanto, o da relação
interior e directa entre o Homem e Deus, através das Escrituras.
O problema é que esta atitude não respeita o método que Deus
escolheu para se comunicar ao homem. Deus podia ter optado pela
revelação interior, mas preferiu escolher um outro modo, o de se
tornar homem e partilhar a sua vivência entre nós. A atitude
protestantista reduz a experiência cristã a uma experiência
meramente interior.
Além disso dá lugar a uma infinidade de interpretações e
subjectividade, pois cada um lê as escrituras e interpreta-as à sua
maneira.
Protestantismo Catolicismo
Somente a fé – a única coisa
que me interessa para me
salvar é a fé.
Para me salvar tenho de ter fé e a
minha fé deve se aproximar das
minhas obras (caridade).
A única fonte de
conhecimento de Cristo são
as escrituras (Bíblia)
A única fonte de conhecimento é as
palavras de Deus (escritura +
tradição que inclui aquilo que foi
revelado aos santos etc.)
Não acreditam na
transubstanciação, a
eucaristia é apenas um
simbolo
Acreditam na transubstanciação, a
eucaristia representa efectivamente
que Deus está a entrar dentro de
nós, através da hóstia.
3. Atitude ortodoxo-católico – É coerente com a estrutura do
acontecimento cristão tal qual ele se apresentou na história, como
anúncio de que Deus se fez “carne”, se fez presença integralmente
humana. Tal presença e seu significado foi e continuará a ser
encontrada ao longo dos tempos entre os crentes e a sua unidade, na
Igreja e nos sacramentos. A realidade de Cristo torna-se presente,
faz-se encontro existencial em todos os tempos através da espécie
18
19. humana que Ele acolheu. Esta historia é transmitida através dos
evangelhos.
O olhar ortodoxo-católico valoriza os factos positivos presentes nas duas
atitudes:
Esta atitude não elimina a pesquisa histórica, mas sim, dá
possibilidade de utilizar essa pesquisa de modo mais adequado. Pois
apenas envolvendo-se na experiência, é possível atingir o seu sentido
objectivo e a realidade que encerra coerentemente.
Relativamente à atitude protestantista, partilha da ideia de que o
absoluto, independentemente dos desvios humanos, pode manifestar-
se ao homem.
Os factores constitutivos do fenómeno cristão na
história
Capitulo X
A Igreja apresenta-se como a relação com Cristo vivo. O início da Igreja
começa com um conjunto de amigos que estão juntos porque tinham a
noção de que Cristo estava vivo no meio deles, e tinham de transmitir a sua
palavra. A Igreja surge assim como a continuidade de Cristo na historia.
Os 3 factores constitutivos são:
1. Comunidade – A Igreja era um conjunto de pessoas ligadas entre si,
e era-o de modo visível. Esta realidade comunitária distinguia-se de
todas as outras pelas seguintes características:
a. Tinha a consciência de ser, como o povo hebraico,
propriedade de Deus. Mas enquanto uma pessoa fazia parte do
povo hebraico por uma derivação étnica (um hebreu nascia
hebreu), os cristãos formavam um povo porque Deus os coloca
juntos através da fé comum em Jesus Cristo.
b. Tinha um novo conceito de verdade. A verdade é conhecida
confiando-se a uma testemunha, e é convivência com a
testemunha que nos torna certos da verdade.
c. Tinha a consciência de ser a comunidade de Deus, seja no
sentido de que o conteúdo da vida da Igreja é o mistério feito
carne, seja no sentido de que é Deus a reunir aqueles que são
seus.
d. Tinha a consciência de ser em toda a parte a mesma Igreja.
Assim a Igreja não é a soma de muitas igrejas, mas é a mesma
consciência de ser relação com Cristo, que vive onde um
grupo de cristãos se reúne em seu nome.
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20. 2. Dom de espírito – Consciência que os cristãos tinham sido tocados
por este dom de espírito. Esta consciência implicava:
a. O homem investido por este dom de espírito fazia experiência
de uma mudança profunda no seu ser, que lhe transformava
numa pessoa nova.
b. O inicio de uma plenitude de vida, de tal forma que a relação
do cristão com a realidade se tornava rica de verdade e
carregada de amor.
c. A força do altus leva as pessoas a arriscarem-se a pronunciar-
se, pois sabem que estão acompanhadas. Essa força vai me
sustentar para me fazer transmitir a verdade, quando não tenho
força humana, para o fazer.
d. O acontecer do milagre, que leva o homem a pedir o dom de
espírito, invoca-lo, mendiga-lo.
3. Comunhão – Que significa posse em comum, do qual derivava uma
solidariedade partilhando todas as coisas da vida, quer as materiais
quer as espirituais. A comunhão entre os cristãos implicava os
seguintes aspectos:
a. A lei de convivência entre os cristãos era a tensão para pôr em
comum toda a vida. Esta tensão implicava a liberdade de cada
um.
b. A igreja era caracterizada por uma estrutura social nova.
c. A igreja tinha uma expressão ritual. Nesse sentido, a
Eucaristia, que significava dom de graça, era o sinal de toda a
vida da comunidade.
d. Assumia uma posição hierárquica, ou seja era uma autoridade,
procurando ajudar o homem a crescer e a seguir o caminho
certo, podendo para tal dizer me quando estou a fazer algo
mal.
e. Tinha uma dimensão missionária, uma urgência de comunicar
o anúncio de Cristo a todos os homens.
f. Procuravam caminhar para a santidade, sendo que santo
significava pertencente a Cristo.
O factor Humano na Igreja
Capitulo XI
A Igreja tem consciência de ser não apenas o veiculo do divino, mas o
veiculo do divino através do humano. O factor humano é essencial e não
contingente: de facto Deus é a vida e uma vida não se comunica através de
20
21. ideias, mas sim através de uma modalidade que implique todos os factores
da vida: através do humano.
A Igreja é portanto o prolongamento de Cristo na história, no tempo e no
espaço. Sendo este prolongamento, ela é a modalidade com que Cristo
continua a estar presente na história e, portanto, é o método cm que o
Espírito de Cristo mobiliza o mundo para a verdade, a justiça e a felicidade.
Como a Igreja é uma realidade humana, se se quer avalia-la de modo
correcto é preciso ter em consideração as seguintes implicações:
O cristão que é chamado a comunicar o divino fá-lo através do seu
temperamento particular e mentalidade.
Os cristãos são livres, logo o ideal cristão realiza-se na medida em
que a liberdade do cristão o queira, podendo acontecer que o indivíduo
traga consigo o ideal mas, ao mesmo tempo o contradiga na sua maneira
de viver. Isto não significa que os outros homens se encostem à parede,
e não sigam a mensagem cristã, pois quem a transmite também não o
faz. De facto a mensagem divina que a Igreja nos propõe tem de passar
através do humano e por isso mesmo nunca realizará integralmente o
ideal, existirá sempre defeitos. Imagine-se uma mulher casada, com um
filho pequeno e este adoece, ela precisando de ir à farmácia buscar um
remédio pede ao pai que vá buscar o remédio, no entanto este recusa-se
a ir pois considera que a preocupação da mãe é excessivo. Será que a
mãe desiste? Se aquele de quem seria óbvio esperar um certo
compromisso falha e se o outro ama o objecto desse compromisso,
então este outro multiplicará as energias, sem se esconder atrás do
incumprimento do outro.
Os valores que a Igreja comunica passam através do ambiente e dos
valores histórico-culturais em que ela vive.
O cristianismo, não está no mundo para esvaziar a dinâmica da
evolução histórica, mas para comunicar aqueles valores que se forem
preservados dão a qualquer evolução os instrumentos para se tornar
mais útil como expressão dos homens. A Igreja não se propõe
certamente esvaziar os conteúdos que a evolução histórica introduz na
vivência humana: a fé incide e determina a personalidade do sujeito que
se dispõe à acção e ele usará os meios que os seus dotes pessoais e os
condicionalismos históricos lhe sugerirem e se ele viver
conscientemente o contexto universal da Igreja, há de fazê-lo com um
equilíbrio, uma paciência, que de outro modo não teria.
A Igreja desenvolve nas relações do homem, a mesma função de Jesus, isto
é, educar o sentido religioso de cada homem. No horizonte desta
funcionalidade, a Igreja é caracterizada pelos seguintes factores:
21
22. A Igreja comunica a palavra definitiva sobre o homem e a história.
Esta ideia conduz-nos a duas vias: A pessoa é fonte de valores e não
está sujeito a nenhuma dependência, excepto a dependência original
constituída por Deus; por outro lado tudo tende para o significado do
“reino de Deus”. Esta palavra definitiva salva o homem e
encaminha-o para uma posição justa diante de si mesmo e do mundo.
A Igreja, enquanto prolongamento de Cristo, pretende dar ao homem
esta palavra.
A função da Igreja é o chamamento contínuo para conduzir o homem
a viver em consciência da dependência total do Mistério (solicitude
continua).
A Igreja educa o homem para a consciência da sua dependência
original, de tal forma que o homem se coloque na sua posição ideal
para enfrentar e encontrar a solução de todos os problemas humanos.
Os problemas humanos podem ser sintetizados em quatro categorias:
a cultura, o amor, o trabalho e a politica.
A Igreja não tem o objectivo de resolver os problemas do homem,
mas sim a de dar um significado ao homem, que facilita o enfrentar
desses problemas.
É tarefa do Homem e da sua liberdade enfrentar e resolver as
problemáticas da sua existência. No entanto, esta liberdade está
subordinada a Deus. A Igreja tem assim como papel orientar o
homem a solucionar os seus problemas, dentro de uma atitude
religiosa. Por exemplo, através da caridade.
O homem tem sempre a possibilidade de fazer o bem ou o mal, que
põe continuamente em jogo a liberdade do homem.
O cristão está consciente de que a vida é uma tensão contínua para
um destino de bem que só Deus pode cumprir. Assim a vida é um
empenhamento sem limites e sem tréguas, em que a paz está no
apoiar-se no apoiar-se do Mistério.
O factor Divino na Igreja
Capitulo XII
A Igreja, através de um veículo humano, e por isso imperfeito, comunica
uma realidade divina, comunicando a verdade da vida introduzida por
Cristo no mundo, e respondendo, assim, à questão fundamental acerca do
sentido da existência.
A primeira forma que o divino tem de se fazer presente ao homem consiste
na comunicação de si mesmo como verdade. A Igreja é a comunicação da
verdade no sentido em que é através dela que o divino se faz presente ao
22
23. homem, comunicando-se a si mesmo como verdade. Deus faz chegar a
verdade através da Igreja que pretende transmitir a verdade última acerca
da existência humana. Esta verdade ensinada pela Igreja é válida na medida
em que não esquece nenhum aspecto da realidade, valoriza o bem e julga
ou transforma o mal, redimindo e transformando todas as coisas.
A comunicação da verdade divina na Igreja é feita através de um veículo
humano e, como tal, imperfeito e falível, e dá-se de duas formas:
Magistério ordinário:
O magistério ordinário, que é a forma mais comum de comunicação da
verdade por parte da Igreja, consiste no facto desta se fazer por osmose
(difusão), pois é através da comunidade eclesial (que está unida ao bispo
que por sua vez está unido ao Papa) que o cristão chega às verdades
divinas. De facto, a vida da comunidade apresenta-se como a evolução de
Cristo na história.
Os instrumentos essenciais através dos quais se desenvolve o magistério
ordinário podem ser:
Encíclicas
Discursos dos Papas
Documentos e as cartas dos bispos à sua diocese.
Quando este método osmótico de aprendizagem se prolonga no tempo,
chama-se tradição, que é o maior instrumento de comunicação da verdade
cristã. A tradição é a memória da comunidade que vive agora, enriquecida
pela memória de toda a história.
Assim o magistério ordinário tem uma função bastante importante na vida
da igreja.
Magistério extraordinário:
O magistério extraordinário consiste numa iniciativa excepcional que o
Papa toma para esclarecer um conteúdo de fé ou de moral cristã. Pode fazê-
lo através:
Convocação de um Concilio Ecuménico
Intervenção pessoal
Estas iniciativas excepcionais que pretendem explicitar valores que já
fazem parte da vida e da consciência da comunidade cristã designam-se por
dogmas.
A verdade que é definida com o magistério extraordinário já faz parte da
vida da Igreja. A autoridade apenas a identifica, defendendo-a e
esclarecendo o que era desde sempre vivido, não é fruto de uma convicção
repentina ou de uma reacção irreflectida.
A autoridade tem na Igreja uma dupla função:
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24. Função ideal – indicando a direcção e o caminho a seguir
Função limite – Compete-lhe julgar quando ocorre algum
desvio à direcção ideal e definir o limite.
Na Igreja nem tudo é dogma: antes de mais porque poderia não ser
necessária essa explicitação extraordinária, para além disso, nem tudo pode
já ter emergido de modo claro à consciência da comunidade cristã.
De facto, a proclamação de um dogma tem uma função pedagógica, tendo
o dogma a tarefa a educar para a verdade que Cristo confiou à Igreja. Com
o tempo, a Igreja toma consciência de si mesmo (amadurece) e do que
Cristo lhe deu, coincidindo a formulação dogmática com este salto
qualitativo que a Igreja faz.
Na formulação do dogma, que é explicitado dentro de uma trajectória
histórica, a Igreja é assistida pelo espírito santo, que lhe permite cumprir a
sua missão de comunicação da verdade ao mundo e não definir um erro
como dogma.
A segunda forma que o divino tem de se fazer presente ao homem consiste
na Igreja comunicar uma realidade divina. Isto é, a Igreja não se limita a
comunicar a verdade, comunica também uma realidade divina pois
transmite a presença de Deus.
Na comunicação do divino com a realidade, a Igreja desenvolve os
seguintes factores:
Esta comunicação toca o homem e transforma-o, gerando uma
criatura nova. De facto, verifica-se no homem que se aproxima de
Cristo uma participação mais profunda no seu ser.
Verifica-se assim “ graça santificante”.
Graça santificante – É o termo utilizado pela tradição cristã para designar a
acção pelo qual se realiza um novo ser. Aqueles que aderem à iniciativa
gratuita de Deus, mudam o seu ser, tornando-se novos homens e santos. Por
santos, entenda-se, homem que adere a Deus, que vive tudo em Cristo.
A graça santificante comunica-se através de gestos chamados
sacramentos. Estes gestos são, assim, o prolongamento histórico dos
gestos de Cristo, através dos quais ele comunica a salvação e como
tal se comunica a si próprio. Assim, a própria Igreja é sacramento na
medida em que é sinal da presença de Cristo e da força divina.
Os sacramentos sustêm eficazmente o homem em todo o caminho da
vida.
O sacramento é a experiência da relação com Cristo dentro do gesto
concreto.
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25. O sacramento implica a liberdade do homem, a qual é indispensável
para que o ser humano comunique eficazmente com o divino. Para
que o homem mude o seu ser e se transforme num homem novo, é
necessário que participe no sacramento com plena consciência de
liberdade e não de um modo mecânico. É a liberdade que torna plena
a participação de ser humano no sacramento, envolvendo-se com o
significado do gesto. Em suma, para entrar em relação com o divino,
para aderir a Cristo, o homem deve estar livre de automatismos e
entregar-se por inteiro.
Mesmo no baptismo isto acontece, porque a liberdade está sempre inscrita
num contexto comunitário: é a realidade comunitária em que a criança
nasce e da qual faz parte com toda a dignidade do seu ser, que educará a
sua liberdade e que permitirá o desenvolvimento consciente da novidade da
vida que o gesto do baptismo comunica.
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