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Texto
Marta Correia
Miguel Correia
Ilustração
Daniela Leal
32
Olá!
Eu sou a Laura, tenho doze anos, e vivo estes dias fechada em casa, com
a minha mãe, a minha irmã, de 18 anos, e o meu irmão, de 14. Tudo isto porque
apareceu um vírus, o SARS-CoV-2, que provoca uma doença chamada
COVID-19 e que se espalhou por todo o mundo. Como é contagiosa, fomos
obrigados todos a ficar em casa, onde estou… e nunca a casa me pareceu
tão pequena!
4
— Nunca tinha reparado na cor dos teus olhos! São verdes! — exclamou o Samuel,
verdadeiramente surpreendido.
— Pois são… nunca tinhas reparado porque eu uso óculos, é normal — afirmei
envergonhada. Afinal estava a falar com o meu amigo Samuel, amigo há já
dois anos, e parecia que não nos conhecíamos… estava a sentir-me estranha.
5
— Pareces diferente… acho que se calhar nunca tinha olhado bem para ti.
Estamos sempre a rir… ou então é do computador, não sei — o Samuel parecia
também sentir a mesma estranheza que eu.
— Olha, já falamos, tenho que ir almoçar. Falamos todos no grupo à hora
combinada para acabarmos o trabalho de ciências, ok? Até logo! — apressei-me
a terminar aquela conversa. Não estava a perceber bem o que me estava
a acontecer, mas até a barriga me doía.
6
Sentei-me na minha cama com aquela sensação nova. Ainda faltava algum
tempo para a hora do almoço. Agora o almoço e o jantar tinham horas certas
e muito pouco flexíveis. «Zero flexibilidade! São os nossos momentos de família!
Têm o dia todo para as vossas coisas».
Esta é a conversa diária da minha mãe. Nós, eu e os meus irmãos, reviramos
os olhos, o que a põe à beira de um ataque de nervos. Às vezes penso que não
deve ser nada fácil ser mãe, muito menos em tempos como este; tempos
de isolamento social.
7
8
É verdade que fomos todos apanhados de surpresa com este vírus, foi tudo
mesmo muito rápido. Ouvimos falar sobre um vírus novo lá na China, a que
chamavam coronavírus, depois começámos a ouvir dizer que já estava em Itália,
que era muito contagioso… De repente já estava cá e agora estamos fechados
em casa, para que não fiquemos doentes com COVID-19, o nome da doença.
9
A minha mãe, a adulta da casa, parece ser a pessoa que tem mais dificuldade
em aceitar todas as mudanças que nos estão a acontecer. De vez em quando
ouço-a dizer a um de nós: «Mas tu já percebeste bem o que está a acontecer?
Estás maluco? Não percebes que vivemos tempos diferentes? Não podes estar
sempre a comer». Para nós, crianças e adolescentes, parece que é mais fácil.
10
Primeiro, ficámos surpreendidos. Mas agora, não sei bem explicar, acho que
rapidamente nos adaptámos.
Passamos o dia em casa, podemos falar constantemente com os amigos,
o meu irmão joga consola enquanto fala com os amigos…
A minha mãe parece mais preocupada. Tem um ar tenso e raramente ri com
aquelas gargalhadas altas que até nos fazem rir só de a ver rir com tanta vontade.
11
Não sei se isto vai demorar muito tempo
mas, para já, não está a ser assim tão mau.
Tenho conversado muito com os meus
amigos. Temos feito jogos, desenhos
e até ginástica. Todos ao mesmo tempo…
Farto-me de rir com as tentativas de
cambalhota da Maria; nunca vai conse-
guir fazer uma cambalhota!
E o Samuel. Parece que agora nos olhamos
com outros olhos, vemos coisas que nunca
suspeitámos e sentimos outras muito novas.
Estamos longe, não nos tocamos, mas às vezes
até parece que estamos mais próximos. É uma
sensação estranha, diferente.
12
— Almoço! — a minha mãe está a chamar. Instalou a mesa em frente à televisão
para podermos acompanhar as notícias em dois momentos do dia. Que ironia!
Antigamente, a mãe nunca deixava que se comesse com a televisão ligada.
Era uma regra rígida. Refeições sem televisão.
13
Agora a regra é refeições a acompanhar as notícias. Quando comentei esta
contradição, a mãe respondeu: «É para vos obrigar a estarem informados,
assim ninguém escapa e ninguém pode dizer que não sabe!». Como se todos
nós já não tivéssemos nos nossos telemóveis os sites da Direção-Geral
da Saúde e do CoronaKids. Enfim…
14
Vamos todos almoçar e o assunto
é logo: «Já sabem quantos são
hoje?». A minha irmã faz sempre
esta pergunta como se fosse uma
coisa óbvia, estes são os únicos
números que lhe interessam.
Parece que a vida das pessoas
agora se resume a números...
15
16
Nestes dias de isolamento tudo é diferente logo de manhã. Normalmente
quando eu me levanto a minha mãe já está pronta para sair, parece que vai
enfrentar uma batalha.
Tem um ar sério, põe uma máscara e umas luvas e dá orientações: «Não
te esqueças de estudar piano e de fazer uma ficha de matemática e uma
de português; não comas muito e faz os exercícios que o professor de Educação
Física mandou. Qualquer coisa liga, não comas demais…».
17
A mãe tem muitas mensagens para dar, mas eu noto que ela engole algumas
porque sente que nós pensamos que ela está a ser chata. Às vezes é.
18
Vai às compras. Vai comprar pão,
vai ao supermercado aqui da rua
e vai para a fila da farmácia com-
prar medicamentos para a minha
irmã, que tem asma.
Não vai todos os dias, mas tam-
bém não compra muito de uma
vez. Diz que há uma gestão das
compras que deve ser feita, para
que uns não comprem tudo e fique
depois a faltar a outros.
19
Um dia, já há umas semanas, desa-
bafou: «Que loucura… tanta gente
com papel higiénico nas mãos! Mas
o que é que as pessoas fazem com
tanto papel higiénico?».
A procura do papel higiénico foi um
dos fenómenos mais extraordinários
destes dias. Quando começámos
a ouvir as histórias de pessoas que
compravam sacos e mais sacos
de papel higiénico, rimos. Rimos
mesmo muito.
20
Mas agora às vezes estamos preocupados. Eu preocupo-me com o dinheiro
que pode faltar à minha mãe e de vez em quando lembro-a que pode usar as
minhas economias. «Não te preocupes com isso, mas obrigada» — é sempre a
resposta da mãe.
21
Mas eu percebo, já ouvi conversas
da mãe ao telefone com amigos, em
que ela se mostra muito preocupada
com o «impacto na economia»
de tudo isto.
22
Ainda não tinha percebido muito bem o que é que isto quer dizer e um dia
destes, a mãe aproveitou estarmos todos juntos a almoçar e tentou explicar-nos
de maneira simples: «É assim: estão a ver o restaurante do tio, certo? Ele tem
empregados com filhos pequenos e outros com pais mais velhotes que vivem
com eles. Essas pessoas não podem ir trabalhar, certo? Mas o tio tem que lhes
pagar e eles têm que receber o seu ordenado, claro.
23
Mas assim ele fica sem pessoal para trabalhar. Reduz o horário, ok, mas vai ter
que pagar todas as despesas, como a luz, a água, etc. Estão a acompanhar?
Tem as mesmas despesas mas tem muito menos receitas. Imaginemos que
acaba por ter que despedir pessoas, essas pessoas vão ficar sem emprego; sem
dinheiro, portanto. E se não têm dinheiro também não vão comprar
coisas, entendem? Isto está tudo ligado e relacionado!».
A mãe explicou dando vários exemplos
de pessoas que nós conhecemos e eu
acho que já percebi. Isto do impacto
económico é sério para muita gente.
24
Mas como estamos todos em casa, aproveitamos estes tempos de quarentena
para fazermos mais coisas juntos, em família. Então, às oito da noite vamos
todos jantar, ver o telejornal, comentar o estado das coisas. E depois segue-se
um filme.
25
26
E o Samuel. Está na hora do encontro do grupo do trabalho de ciências. Estou
ansiosa por começar, mas ao mesmo tempo estou nervosa. É que agora parece
que reparamos nos pormenores todos uns dos outros, coisas em que antes
nem reparávamos.
27
Às vezes invade-me uma sensação de medo, será que nada vai voltar a ser
como era? O que é que vai ser «normal»? A mãe diz: «A vida mudou, há muita
coisa que não vai ser como era, ponham isso na cabeça».
Parece que estamos a viver um filme, mas não; está mesmo a acontecer. Não
podemos sair de casa! Às vezes parece que a casa encolheu.
28
A minha irmã mais velha insiste que quer sair e que precisa de «apanhar ar»
e que «não aguenta mais estar fechada». Já todos lhe explicámos que é para
proteção de todos e, sobretudo, pelo menos aqui em casa, proteção dela
própria, já que é a única que tem alguma doença, asma.
29
Eu acho que o problema é que, como
se trata de um vírus, algo que não se
vê, ela continua a achar que não vai
ficar doente, que consegue proteger-se,
fintando-o.
30
Dia sim, dia não, a mãe vai visitar os avós e
levar-lhes comida. Insiste para que não saiam,
mas eles também insistem que estamos a exagerar
e que é preciso ter calma. Parece que muitas
pessoas mais velhas, apesar de serem as que são
mais afetadas pela doença por terem um sistema
imunitário mais fraco e muitas vezes já várias
doenças crónicas, são quem mais facilita.
31
Fizemos o trabalho. Até foi divertido, tudo isto é novidade e acontecem coisas
engraçadas. O Samuel já se deve ter habituado ao meu novo eu, quer dizer,
à minha nova imagem, ou seja, a olhar para mim com olhos de ver.
Está ainda mais simpático comigo e até já combinámos fazer o trabalho
de português juntos.
32 33
E tudo vai ficar bem!
Telefona aos avós, aos tios,
aos primos, aos amigos e a todos
aqueles de quem gostas.
A distância só tem de ser física!
Informa-te! Vê as notícias
e consulta os sites que nos dão
informação verdadeira, como
o da Direção-Geral da Saúde
ou o site CoronaKids, da editora
Ideias com História. Tem cuidado
com notícias falsas que possam
aparecer nas redes sociais
e em sites que não sabes
se são confiáveis.
Estuda e faz atividades.
O conhecimento é muito
importante e neste período
não deves parar de aprender. Brinca e estimula a tua
criatividade: podes ler livros
novos, desenhar, ouvir música,
ver filmes que não conhecias
ou criar fortalezas no teu quarto;
a escolha é tua. Diverte-te!
É natural termos medo
numa situação destas. O medo
ajuda-nos a sermos cuidadosos
e a protegermo-nos, o que é muito
importante. Não tenhas vergonha
se sentires medo, porque todos
sentimos. Partilha esse sentimento
com as pessoas que te rodeiam,
ocupa-te, procura fazer coisas
de que gostas e não te esqueças
que esta situação é temporária.
Alimenta-te de forma saudável.
É importante que o nosso
organismo se mantenha forte
e capaz de combater as doenças.
Colabora nas tarefas domésticas.
Estes dias em casa são difíceis
para toda a família!
Respeita o espaço dos teus
familiares. É importante que
todos se sintam confortáveis,
mesmo que isso signifique
passarem algum tempo
sozinhos.
Faz exercício físico! Estar
em casa pode dar vontade
de passar o dia imóvel, no sofá
ou na cama a ver televisão ou
a jogar, mas o teu corpo precisa
de se mexer. O exercício faz bem
ao teu corpo e à tua mente.
Enquanto a família está fechada em casa,
lembra-te…
Título: Dias de uma família fechada em casa
Coleção: Tudo vai ficar bem
Coordenação editorial: Miguel Correia
Texto: Marta Correia e Miguel Correia
Direção de arte e paginação: Joana M. Gomes
Ilustração: Daniela Leal
Edição: Ideias com História — 2020
A Laura tem doze anos e vive com a mãe,
a irmã e o irmão. Os quatro vivem estes
dias de isolamento em casa, como
quase todos nós, ao abrigo da COVID-19.
Apreensivos, mas enfrentando as vicis-
situdes de cada dia.
É pela voz desta rapariga que nos che-
gam os relatos de momentos diferentes,
impensáveis há apenas umas semanas.
Mas também a esperança de um rápido
regresso à normalidade, aos dias de
escola, abraços, beijos e de olhares que
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Livro dias de uma familia fechada em casa

  • 2. 32 Olá! Eu sou a Laura, tenho doze anos, e vivo estes dias fechada em casa, com a minha mãe, a minha irmã, de 18 anos, e o meu irmão, de 14. Tudo isto porque apareceu um vírus, o SARS-CoV-2, que provoca uma doença chamada COVID-19 e que se espalhou por todo o mundo. Como é contagiosa, fomos obrigados todos a ficar em casa, onde estou… e nunca a casa me pareceu tão pequena!
  • 3. 4 — Nunca tinha reparado na cor dos teus olhos! São verdes! — exclamou o Samuel, verdadeiramente surpreendido. — Pois são… nunca tinhas reparado porque eu uso óculos, é normal — afirmei envergonhada. Afinal estava a falar com o meu amigo Samuel, amigo há já dois anos, e parecia que não nos conhecíamos… estava a sentir-me estranha. 5 — Pareces diferente… acho que se calhar nunca tinha olhado bem para ti. Estamos sempre a rir… ou então é do computador, não sei — o Samuel parecia também sentir a mesma estranheza que eu. — Olha, já falamos, tenho que ir almoçar. Falamos todos no grupo à hora combinada para acabarmos o trabalho de ciências, ok? Até logo! — apressei-me a terminar aquela conversa. Não estava a perceber bem o que me estava a acontecer, mas até a barriga me doía.
  • 4. 6 Sentei-me na minha cama com aquela sensação nova. Ainda faltava algum tempo para a hora do almoço. Agora o almoço e o jantar tinham horas certas e muito pouco flexíveis. «Zero flexibilidade! São os nossos momentos de família! Têm o dia todo para as vossas coisas». Esta é a conversa diária da minha mãe. Nós, eu e os meus irmãos, reviramos os olhos, o que a põe à beira de um ataque de nervos. Às vezes penso que não deve ser nada fácil ser mãe, muito menos em tempos como este; tempos de isolamento social. 7
  • 5. 8 É verdade que fomos todos apanhados de surpresa com este vírus, foi tudo mesmo muito rápido. Ouvimos falar sobre um vírus novo lá na China, a que chamavam coronavírus, depois começámos a ouvir dizer que já estava em Itália, que era muito contagioso… De repente já estava cá e agora estamos fechados em casa, para que não fiquemos doentes com COVID-19, o nome da doença. 9 A minha mãe, a adulta da casa, parece ser a pessoa que tem mais dificuldade em aceitar todas as mudanças que nos estão a acontecer. De vez em quando ouço-a dizer a um de nós: «Mas tu já percebeste bem o que está a acontecer? Estás maluco? Não percebes que vivemos tempos diferentes? Não podes estar sempre a comer». Para nós, crianças e adolescentes, parece que é mais fácil.
  • 6. 10 Primeiro, ficámos surpreendidos. Mas agora, não sei bem explicar, acho que rapidamente nos adaptámos. Passamos o dia em casa, podemos falar constantemente com os amigos, o meu irmão joga consola enquanto fala com os amigos… A minha mãe parece mais preocupada. Tem um ar tenso e raramente ri com aquelas gargalhadas altas que até nos fazem rir só de a ver rir com tanta vontade. 11 Não sei se isto vai demorar muito tempo mas, para já, não está a ser assim tão mau. Tenho conversado muito com os meus amigos. Temos feito jogos, desenhos e até ginástica. Todos ao mesmo tempo… Farto-me de rir com as tentativas de cambalhota da Maria; nunca vai conse- guir fazer uma cambalhota! E o Samuel. Parece que agora nos olhamos com outros olhos, vemos coisas que nunca suspeitámos e sentimos outras muito novas. Estamos longe, não nos tocamos, mas às vezes até parece que estamos mais próximos. É uma sensação estranha, diferente.
  • 7. 12 — Almoço! — a minha mãe está a chamar. Instalou a mesa em frente à televisão para podermos acompanhar as notícias em dois momentos do dia. Que ironia! Antigamente, a mãe nunca deixava que se comesse com a televisão ligada. Era uma regra rígida. Refeições sem televisão. 13 Agora a regra é refeições a acompanhar as notícias. Quando comentei esta contradição, a mãe respondeu: «É para vos obrigar a estarem informados, assim ninguém escapa e ninguém pode dizer que não sabe!». Como se todos nós já não tivéssemos nos nossos telemóveis os sites da Direção-Geral da Saúde e do CoronaKids. Enfim…
  • 8. 14 Vamos todos almoçar e o assunto é logo: «Já sabem quantos são hoje?». A minha irmã faz sempre esta pergunta como se fosse uma coisa óbvia, estes são os únicos números que lhe interessam. Parece que a vida das pessoas agora se resume a números... 15
  • 9. 16 Nestes dias de isolamento tudo é diferente logo de manhã. Normalmente quando eu me levanto a minha mãe já está pronta para sair, parece que vai enfrentar uma batalha. Tem um ar sério, põe uma máscara e umas luvas e dá orientações: «Não te esqueças de estudar piano e de fazer uma ficha de matemática e uma de português; não comas muito e faz os exercícios que o professor de Educação Física mandou. Qualquer coisa liga, não comas demais…». 17 A mãe tem muitas mensagens para dar, mas eu noto que ela engole algumas porque sente que nós pensamos que ela está a ser chata. Às vezes é.
  • 10. 18 Vai às compras. Vai comprar pão, vai ao supermercado aqui da rua e vai para a fila da farmácia com- prar medicamentos para a minha irmã, que tem asma. Não vai todos os dias, mas tam- bém não compra muito de uma vez. Diz que há uma gestão das compras que deve ser feita, para que uns não comprem tudo e fique depois a faltar a outros. 19 Um dia, já há umas semanas, desa- bafou: «Que loucura… tanta gente com papel higiénico nas mãos! Mas o que é que as pessoas fazem com tanto papel higiénico?». A procura do papel higiénico foi um dos fenómenos mais extraordinários destes dias. Quando começámos a ouvir as histórias de pessoas que compravam sacos e mais sacos de papel higiénico, rimos. Rimos mesmo muito.
  • 11. 20 Mas agora às vezes estamos preocupados. Eu preocupo-me com o dinheiro que pode faltar à minha mãe e de vez em quando lembro-a que pode usar as minhas economias. «Não te preocupes com isso, mas obrigada» — é sempre a resposta da mãe. 21 Mas eu percebo, já ouvi conversas da mãe ao telefone com amigos, em que ela se mostra muito preocupada com o «impacto na economia» de tudo isto.
  • 12. 22 Ainda não tinha percebido muito bem o que é que isto quer dizer e um dia destes, a mãe aproveitou estarmos todos juntos a almoçar e tentou explicar-nos de maneira simples: «É assim: estão a ver o restaurante do tio, certo? Ele tem empregados com filhos pequenos e outros com pais mais velhotes que vivem com eles. Essas pessoas não podem ir trabalhar, certo? Mas o tio tem que lhes pagar e eles têm que receber o seu ordenado, claro. 23 Mas assim ele fica sem pessoal para trabalhar. Reduz o horário, ok, mas vai ter que pagar todas as despesas, como a luz, a água, etc. Estão a acompanhar? Tem as mesmas despesas mas tem muito menos receitas. Imaginemos que acaba por ter que despedir pessoas, essas pessoas vão ficar sem emprego; sem dinheiro, portanto. E se não têm dinheiro também não vão comprar coisas, entendem? Isto está tudo ligado e relacionado!». A mãe explicou dando vários exemplos de pessoas que nós conhecemos e eu acho que já percebi. Isto do impacto económico é sério para muita gente.
  • 13. 24 Mas como estamos todos em casa, aproveitamos estes tempos de quarentena para fazermos mais coisas juntos, em família. Então, às oito da noite vamos todos jantar, ver o telejornal, comentar o estado das coisas. E depois segue-se um filme. 25
  • 14. 26 E o Samuel. Está na hora do encontro do grupo do trabalho de ciências. Estou ansiosa por começar, mas ao mesmo tempo estou nervosa. É que agora parece que reparamos nos pormenores todos uns dos outros, coisas em que antes nem reparávamos. 27 Às vezes invade-me uma sensação de medo, será que nada vai voltar a ser como era? O que é que vai ser «normal»? A mãe diz: «A vida mudou, há muita coisa que não vai ser como era, ponham isso na cabeça». Parece que estamos a viver um filme, mas não; está mesmo a acontecer. Não podemos sair de casa! Às vezes parece que a casa encolheu.
  • 15. 28 A minha irmã mais velha insiste que quer sair e que precisa de «apanhar ar» e que «não aguenta mais estar fechada». Já todos lhe explicámos que é para proteção de todos e, sobretudo, pelo menos aqui em casa, proteção dela própria, já que é a única que tem alguma doença, asma. 29 Eu acho que o problema é que, como se trata de um vírus, algo que não se vê, ela continua a achar que não vai ficar doente, que consegue proteger-se, fintando-o.
  • 16. 30 Dia sim, dia não, a mãe vai visitar os avós e levar-lhes comida. Insiste para que não saiam, mas eles também insistem que estamos a exagerar e que é preciso ter calma. Parece que muitas pessoas mais velhas, apesar de serem as que são mais afetadas pela doença por terem um sistema imunitário mais fraco e muitas vezes já várias doenças crónicas, são quem mais facilita. 31
  • 17. Fizemos o trabalho. Até foi divertido, tudo isto é novidade e acontecem coisas engraçadas. O Samuel já se deve ter habituado ao meu novo eu, quer dizer, à minha nova imagem, ou seja, a olhar para mim com olhos de ver. Está ainda mais simpático comigo e até já combinámos fazer o trabalho de português juntos. 32 33 E tudo vai ficar bem!
  • 18. Telefona aos avós, aos tios, aos primos, aos amigos e a todos aqueles de quem gostas. A distância só tem de ser física! Informa-te! Vê as notícias e consulta os sites que nos dão informação verdadeira, como o da Direção-Geral da Saúde ou o site CoronaKids, da editora Ideias com História. Tem cuidado com notícias falsas que possam aparecer nas redes sociais e em sites que não sabes se são confiáveis. Estuda e faz atividades. O conhecimento é muito importante e neste período não deves parar de aprender. Brinca e estimula a tua criatividade: podes ler livros novos, desenhar, ouvir música, ver filmes que não conhecias ou criar fortalezas no teu quarto; a escolha é tua. Diverte-te! É natural termos medo numa situação destas. O medo ajuda-nos a sermos cuidadosos e a protegermo-nos, o que é muito importante. Não tenhas vergonha se sentires medo, porque todos sentimos. Partilha esse sentimento com as pessoas que te rodeiam, ocupa-te, procura fazer coisas de que gostas e não te esqueças que esta situação é temporária. Alimenta-te de forma saudável. É importante que o nosso organismo se mantenha forte e capaz de combater as doenças. Colabora nas tarefas domésticas. Estes dias em casa são difíceis para toda a família! Respeita o espaço dos teus familiares. É importante que todos se sintam confortáveis, mesmo que isso signifique passarem algum tempo sozinhos. Faz exercício físico! Estar em casa pode dar vontade de passar o dia imóvel, no sofá ou na cama a ver televisão ou a jogar, mas o teu corpo precisa de se mexer. O exercício faz bem ao teu corpo e à tua mente. Enquanto a família está fechada em casa, lembra-te…
  • 19. Título: Dias de uma família fechada em casa Coleção: Tudo vai ficar bem Coordenação editorial: Miguel Correia Texto: Marta Correia e Miguel Correia Direção de arte e paginação: Joana M. Gomes Ilustração: Daniela Leal Edição: Ideias com História — 2020
  • 20. A Laura tem doze anos e vive com a mãe, a irmã e o irmão. Os quatro vivem estes dias de isolamento em casa, como quase todos nós, ao abrigo da COVID-19. Apreensivos, mas enfrentando as vicis- situdes de cada dia. É pela voz desta rapariga que nos che- gam os relatos de momentos diferentes, impensáveis há apenas umas semanas. Mas também a esperança de um rápido regresso à normalidade, aos dias de escola, abraços, beijos e de olhares que vão certamente passar a ter outro valor.