Este documento apresenta uma dissertação de mestrado sobre a atividade das sociedades de capital de risco em Portugal entre 1993-2004. Resume os principais conceitos relacionados com o capital de risco, o processo de investimento, os intervenientes da indústria, o enquadramento legal e fiscal em Portugal e analisa os dados sobre fundos angariados, investimento e desinvestimento no período em questão.
Conferência SC 24 | Estratégias de precificação para múltiplos canais de venda
Tese capital de risco última versão
1. A presente dissertação foi expressamente
elaborada para a obtenção do grau de
Mestre em Gestão – Especialização em
Finanças e Contabilidade, de acordo com
o disposto no Decreto-Lei n.º 216/92 de
13 de Outubro.
3. RESUMO
Nos últimos anos e um pouco por toda Europa, a procura de soluções alternativas
de investimento e de novas fontes de financiamento para as empresas, tem sido uma forte
tendência. Daí, existir cada vez mais um maior interesse pelo sector do capital de risco.
Com o intuito de conhecermos a evolução deste sector em Portugal, estabelecemos
como objectivo principal desta investigação analisar a actividade das sociedades de capital
de risco portuguesas ao longo do período de 1993-2004.
Em termos metodológicos, a pesquisa teve início com o desenvolvimento dum
suporte teórico que nos permitisse identificar, analisar e melhor compreender os vários
conceitos e aspectos relacionados com a indústria de capital de risco. De seguida, foram
estabelecidos contactos, formais e informais, com instituições-chave do sector para que
pudéssemos recolher a informação exigida por esta investigação. Os dados secundários
assim obtidos foram posteriormente organizados de forma a serem tratados, analisados e
comparados.
Os resultados atingidos mostram que o desempenho das sociedades de capital de
risco portuguesas tem vindo a evoluir de forma positiva, porém, não tanto como seria
desejável. Relativamente à angariação de fundos, verifica-se que o ano de 2004 foi o mais
produtivo em matéria de captação de recursos. Quanto aos montantes investidos e na
sequência da queda verificada após o boom de 2000, a indústria de capital de risco nacional
tem vindo a dar indícios de recuperação. No entanto, a recente evolução positiva é um
reflexo da recuperação em apenas algumas das formas de actividade deste mercado,
nomeadamente das operações de expansão. Infelizmente, verifica-se uma apetência pouco
significativa por parte dos operadores de capital de risco nacionais para projectos em fase
de desenvolvimento inicial. Por último e em relação aos desinvestimentos, os montantes
realizados também têm tido um aumento significativo. Todavia, a sua distribuição está
demasiado concentrada em apenas algumas das modalidades de saída, nomeadamente nas
Trade Sale e Buy-back.
Palavras-chave: Capital de Risco, Investimento, Financiamento, Empreendedorismo.
4. ABSTRACT
During the last years and a little all throughout Europe, the search of alternative
solutions for investment and new sources of financing for companies, has been one
predominant tendency. Hence the existence, of an increasingly bigger interest for the
venture capital sector.
With the intention of knowing the evolution of this sector in Portugal, we have
established as the main goal of this research the activity analysis of the Portuguese venture
capital societies over the period between 1993 and 2004.
In methodological terms, the research had begun with the development of a
theoretical support, which allowed them to identify, analyze and conception of a broader
understanding of some of the concepts and aspects related with the venture capital
industry. Following this iniciative, formal as well as informal contacts have been
established with pivotal institutions in this sector so that we could collect the required
information for this research. The secondary data gathered in this iniciative was later
organized in a fashion which could be given the proper treatment analysis and subsequent
comparison.
The attained results show that the performance of the Portuguese venture capital
societies has come to evolve in a positive way, however, not in the desired degree.
Relatively to the fund raising, it is verified that the year of 2004 was the most productive in
terms of gathering resources. As for the amounts invested and following the decline
verified after the 2000 boom, the national venture capital industry is showing
improvements. However, the recent positive evolution is a consequence of the recovery in
only some of the forms of activity of this market, namely in expansion operations.
Unfortunately, less than significant appetency is shown by the national venture capital
operators regarding projects in stages of initial development. Finally and in relation to the
withdrawn investments, the amounts also carried out have had a significant increase.
However, its distribution is too much bent on the benefit of some of the exit modalities,
namely in the Trade Sale and Buy-back venues.
Key words: Venture Capital, Investment, Financing, Entrepreneurship.
5. i
ÍNDICE
INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 1
1 – O CONCEITO DE CAPITAL DE RISCO ................................................................. 5
1.1 – Definição ................................................................................................................ 5
1.2 – Tipologia de capital de risco: estádios de desenvolvimento das empresas
participadas........................................................................................................... 10
1.3 – Vantagens do capital de risco............................................................................... 13
1.4 – Breve evolução histórica ...................................................................................... 16
2 – O PROCESSO DE INVESTIMENTO VIA CAPITAL DE RISCO....................... 20
2.1 – A angariação de fundos ........................................................................................ 20
2.2 – Análise e selecção de propostas............................................................................ 22
2.2.1 – Fontes de propostas .................................................................................. 22
2.2.2 – Selecção.................................................................................................... 22
2.2.3 – Avaliação.................................................................................................. 24
2.2.3.1 – Abordagem financeira ............................................................... 24
2.2.3.2 – Abordagem qualitativa .............................................................. 26
2.3 – Estruturação.......................................................................................................... 32
2.4 – Actividades pós-investimento: o acompanhamento ............................................. 34
2.4.1 – Acompanhamento: hands-on.................................................................... 34
2.4.2 – Acompanhamento: hands-off.................................................................... 35
2.5 – Actividades pós-investimento: cessão da participação......................................... 36
2.5.1 – Recompra (buy back)................................................................................ 37
2.5.2 – Venda a terceiros ...................................................................................... 39
2.5.3 – Venda a instituições financeiras ............................................................... 39
2.5.4 – Venda no mercado de capitais.................................................................. 40
2.5.5 – Liquidação da empresa............................................................................. 42
6. Índice
ii
3 – OS INTERVENIENTES DA INDÚSTRIA DE CAPITAL DE RISCO................. 46
3.1 – Venture capitalits.................................................................................................. 46
3.2 – Business angels..................................................................................................... 47
3.2.1 – Perfil do investidor ................................................................................... 48
3.2.2 – Motivações ............................................................................................... 48
3.2.3 – Avaliação das oportunidades de investimento.......................................... 49
3.2.4 – Fontes das oportunidades de investimento............................................... 50
3.2.5 – O investimento no mercado de capital de risco informal......................... 51
3.2.6 – Foco do investimento ............................................................................... 51
3.2.7 – Contribuição para o valor acrescentado.................................................... 53
3.2.8 – Características geográficas ....................................................................... 53
3.2.9 – Potencial para expansão ........................................................................... 54
3.2.10 – Estratégias para promover a actividade do capital de risco informal..... 55
3.3 – Corporate venturing ............................................................................................. 60
3.4 – Venture catalysts .................................................................................................. 62
4 – ENQUADRAMENTO GERAL DA ACTIVIDADE DE CAPITAL DE RISCO EM
PORTUGAL ................................................................................................................ 65
4.1 – Regime legal......................................................................................................... 65
4.1.1 – Das Sociedades de Capital de Risco......................................................... 66
4.1.2 – Dos Fundos de Capital de Risco............................................................... 71
4.1.3 – Dos Fundos de Reestruturação e Internacionalização Empresarial.......... 81
4.1.4 – Dos Fundos de Sindicação de Capital de Risco ....................................... 82
4.2 – Regime Fiscal ....................................................................................................... 85
4.2.1 – Das Sociedades de Capital de Risco......................................................... 85
4.2.2 – Dos Fundos de Capital de Risco............................................................... 89
5 - ASPECTOS METODOLÓGICOS DA INVESTIGAÇÃO...................................... 91
5.1 - Descrição e recolha dos dados .............................................................................. 92
5.2 – Tratamento dos dados........................................................................................... 94
6 - ANÁLISE DOS DADOS.............................................................................................. 95
6.1 – Fundos Angariados............................................................................................... 95
7. Índice
iii
6.1.1 – Por tipo de investidor................................................................................ 95
6.1.2 – Por zona geográfica .................................................................................. 99
6.1.3 – Distribuição esperada para os fundos captados...................................... 100
6.2 – Investimento ....................................................................................................... 101
6.2.1 – Por zona geográfica ................................................................................ 106
6.2.2 – Por sector de actividade.......................................................................... 108
6.2.3 – Por estádio de desenvolvimento ............................................................. 112
6.2.4 – Através de sindicatos de investimento.................................................... 117
6.3 – Desinvestimento ................................................................................................. 119
CONCLUSÃO.................................................................................................................. 124
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 129
ANEXOS .......................................................................................................................... 136
8. Índice
iv
LISTA DE FIGURAS
Figura 2.1: Modelo de decisão ............................................................................................ 22
Figura 3.1: Necessidades de financiamento da empresa ao longo do seu ciclo de vida...... 52
Figura 3.2: Como as redes de business angels funcionam na prática.................................. 57
Figura 5.1: As fontes documentais ...................................................................................... 93
Figura 6.1: Evolução dos fundos captados por tipo de investidor....................................... 96
Figura 6.2: Origem dos fundos por tipo de investidor......................................................... 97
Figura 6.3: Novos fundos versus ganhos de capital ............................................................ 98
Figura 6.4: Evolução dos fundos captados por tipo de investidor....................................... 99
Figura 6.5: Origem geográfica dos fundos captados......................................................... 100
Figura 6.6: Distribuição esperada para os fundos captados anualmente........................... 101
Figura 6.7: Evolução dos fundos angariados/fundos investidos ....................................... 102
Figura 6.8: Investimento inicial versus investimento de reforço....................................... 104
Figura 6.9: Distribuição do investimento por zona geográfica ......................................... 106
Figura 6.10: Distribuição do n.º de investimentos por zona geográfica............................ 108
Figura 6.11: Evolução do investimento por sector de actividade...................................... 109
Figura 6.12: Evolução do n.º empresas participadas por sector de actividade.................. 111
Figura 6.13: Evolução do n.º empresas participadas por tipo de empresas....................... 112
Figura 6.14: Distribuição do investimento por estádio de desenvolvimento .................... 113
Figura 6.15: Distribuição do n.º de empresas participadas por estádio de desenvolvimento
................................................................................................................................... 116
Figura 6.16: Evolução do investimento médio por participação em cada estádio de
desenvolvimento........................................................................................................ 117
9. Índice
v
Figura 6.17: Evolução do investimento através de sindicatos de investimento ................ 118
Figura 6.18: Distribuição do n.º de operações por sindicatos de investimento................. 118
Figura 6.19: Evolução do desinvestimento ....................................................................... 119
Figura 6.20: Evolução das modalidades de desinvestimento ............................................ 121
Figura 6.21: Evolução do n.º de operações por modalidade de desinvestimento.............. 122
10. Índice
vi
LISTA DE QUADROS
Quadro 1.1: As vantagens do capital de risco face ao endividamento tradicional.............. 15
Quadro 3.1: Comparação entre os Business Angels e os Venture Capitalists..................... 60
Quadro 3.2: Exemplos de Corporate Venturing.................................................................. 62
Quadro 6.1: Fundos captados por tipo de investidor (em milhões de euros) ...................... 96
Quadro 6.2: Evolução dos fundos angariados e fundos investidos ................................... 102
Quadro 6.3: Investimento por sector de actividade (milhões de euros) ............................ 109
Quadro 6.4: Distribuição das participações por sector de actividade................................ 111
Quadro 6.5: Investimento por estádio de desenvolvimento (em milhões de euros).......... 113
Quadro 6.6: Nº de empresas participadas por estádio de desenvolvimento ...................... 115
Quadro 6.7: Investimento médio por estádio de desenvolvimento ................................... 116
11. Índice
vii
LISTA DE SIGLAS UTILIZADAS
APCRI – Associação Portuguesa de Capital de Risco
AR&D – American Research & Development
BIMBO – Buy-in Management Buy-out
BVCA – British Venture Capital Association
CCE – Comissão das Comunidades Europeias
CMVM – Comissão do Mercado de Valores Mobiliários
CEE – Comunidade Económica Europeia
CRC – Código do Registo Comercial
EBF – Estatuto dos Benefícios Fiscais
EUA – Estados Unidos da América
EVCA – European Private Equity and Venture Capital Association
FCP – Fundos Comercializáveis junto do Público
FCR – Fundos de Capital de Risco
FIQ – Fundos para Investidores Qualificados
FRIE – Fundos de Reestruturação e Internacionalização Empresarial
FSCR – Fundos de Sindicação de Capital de Risco
IAPMEI – Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento
IDEIA – Apoio à Investigação e Desenvolvimento Empresarial Aplicado
IPO – Initial Public Offering
IRC – Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Colectivas
IRS – Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares
12. Índice
viii
MBI – Management Buy In
MBO – Management Buy Out
NEST – Novas Empresas de Suporte Tecnológico
OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico
PME – Pequena e Média Empresa
POE – Programa Operacional da Economia
SCR – Sociedade de Capital de Risco
SFE – Sociedades de Fomento Empresarial
SGPS – Sociedades Gestoras de Participações Sociais
SIME – Sistema de Incentivos à Modernização Empresarial
TIR – Taxa de Rentabilidade Interna
VAL – Valor Actualizado Líquido
13. 1
INTRODUÇÃO
Hoje, mais do que nunca, as pequenas e médias empresas (PME’s) assumem um
protagonismo notório no contexto empresarial, revelando-se um pilar da actividade
económica, nomeadamente no volume de negócios, nas exportações e no emprego. O papel
destas empresas é determinante para sustentar o crescimento económico e a
competitividade na Europa. Daí, a temática relacionada com o incentivo do espírito
empresarial e o apoio aos jovens empreendedores tenha vindo a assumir uma importância
crescente na agenda europeia. Apesar dos esforços, a dinâmica empresarial europeia
necessita ainda “de mais empresas novas e bem sucedidas que desejem aproveitar os
benefícios da abertura de mercado e assumir riscos criativos ou inovadores no sentido da
exploração comercial numa escala mais alargada” (CCE, 2003: 4).
De facto, a iniciativa empresarial ainda não abunda na Europa, em parte por causa
de uma série de constrangimentos e obstáculos que as empresas de pequena dimensão têm
de enfrentar, os quais provocam o insucesso de umas e desmotivam a criação de outras. De
entre uma panóplia de factores, salientamos as fortes limitações financeiras com que estas
empresas se deparam e as dificuldades que as mesmas têm em mobilizar os meios
financeiros adequados. Nestas situações, o capital de risco torna-se uma alternativa de
financiamento interessante, que devido às suas características peculiares, como veremos
mais à frente, é bastante distinta das tradicionais.
A essência do capital de risco traduz-se basicamente na participação no capital e na
gestão, de forma temporária e minoritária, em empresas com elevado potencial de
14. Introdução
2
crescimento e valorização, com uma perspectiva de rentabilidade de médio e longo prazo
(Soares, 1995).
Historicamente, a actividade de capital de risco está ligada aos Estados Unidos da
América (EUA), onde esta prática já vem a desenvolver-se desde 1946. Na Europa, a
actividade é mais recente, mas o seu crescimento tem sido bastante rápido, principalmente,
durante a década de oitenta, com destaque para o Reino Unido e França.
O capital de risco, para além de ser considerado uma alternativa de investimento
credível, tem vindo a contribuir para o crescimento sustentável da economia europeia,
gerando emprego, inovação e riqueza. Contudo, o grau de desenvolvimento, assim como as
principais características deste tipo de investimento variam muito de país para país.
Em Portugal, a actividade de capital de risco é relativamente recente. O seu efectivo
arranque deu-se em 1989, tanto ao nível do número de Sociedades de Capital de Risco
(SCR) em funcionamento, como ao nível dos fundos disponíveis para investir (Tomé,
1995). Porém, algumas dessas SCR foram criadas apenas para beneficiarem dos incentivos
fiscais disponíveis e da possibilidade de pedirem crédito bancário (Monitor Company,
1994). Como resultado, poucas SCR foram pro-activas na disseminação do conhecimento
deste tipo de financiamento entre as PME´s.
Relativamente ao volume de fundos ao dispor do sector, o primeiro grande salto
deveu-se sobretudo à constituição de duas SCR com fundos provenientes do Programa
Específico de Desenvolvimento da Indústria Portuguesa 1 (PEDIP I) e distribuídos via
Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento (IAPMEI) – a
NORPEDIP e a SULPEDIP (PME Capital e PME Investimentos desde 1999). No início,
pretendia-se que estas sociedades investissem em sectores considerados estratégicos pelo
Estado. Contudo, as decisões de investimento acabaram por ser dirigidas à recuperação de
15. Introdução
3
empresas ao invés de promoverem negócios com potencial de crescimento (Tejada, 2003).
Mesmo assim, não impediram que muitas delas fossem à falência (Gouveia, 2006).
A complicar a conjuntura, do lado procura encontrava-se uma elevada percentagem
de empresas familiares interessadas em manter o controlo do seu negócio e com uma fraca
aceitação para novas formas de financiamento (Monitor Company, 1994).
Durante vários anos criou-se em Portugal um cenário altamente negativo sobre o
sector de capital de risco. A sua imagem ficou desde o início marcada pela perversão dos
seus objectivos e, pior, no caso do de origem pública, pela noção de “hospital de empresas”
e de dinheiro a fundo (quase) perdido (Sampaio, 2005).
Partindo destas reflexões e assumindo a hipótese de que o capital de risco é
fundamental para o crescimento económico do nosso país, surgiu-nos a ideia de levar a
cabo o presente estudo, cujo objectivo central consiste em analisar a evolução da
actividade das SCR portuguesas ao longo do período de 1993-2004. De forma mais
específica, procura-se saber quais são as características da sua actividade no que respeita:
(1) à angariação de fundos, (2) ao investimento e (3) ao desinvestimento.
Tendo presente os objectivos supra citados, a concretização do processo de
pesquisa reclamava a recolha de informação sobre a actividade de capital de risco em
Portugal. Tomando nós conhecimento da existência de dados secundários que se
adequavam às necessidades e exigências requeridas por esta investigação, procedeu-se à
sua selecção e recolha junto das instituições suas detentoras. Uma vez obtidos os dados,
efectuou-se a análise e a comparação dos mesmos, bem como a apresentação dos
resultados.
A estrutura desta dissertação compreende, no essencial, seis capítulos; dos quais, os
quatro primeiros dizem respeito às principais ideias resultantes da revisão da literatura.
16. Introdução
4
No Capítulo 1 pretende-se clarificar o conceito de capital de risco, descrever as
suas características específicas, sintetizar as vantagens que oferece aos empreendedores e
efectuar uma breve resenha da sua evolução histórica.
No Capítulo 2 procura-se apresentar as várias etapas que constituem o processo de
investimento via capital de risco, desde a angariação de fundos até ao abandono da
participação.
No Capítulo 3 efectua-se um levantamento das principais características dos
intervenientes da indústria de capital de risco.
No Capítulos 4 abordam-se os aspectos legais e fiscais da actividade de capital de
risco em Portugal.
No Capítulo 5 desenvolve-se a metodologia da investigação, abordando os
aspectos relacionados com a recolha e tratamento dos dados.
No Capítulo 6 faz-se a apresentação e análise dos resultados obtidos. De acordo
com os objectivos desta investigação, organiza-se o capítulo em três tópicos fundamentais:
(1) fundos angariados, (2) investimento, e (3) desinvestimento.
Por último, apresenta-se a Conclusão, na qual se englobam as principais
conclusões obtidas, algumas recomendações e sugestões para futura investigação.
17. 5
1 – O CONCEITO DE CAPITAL DE RISCO
1.1 – Definição
O termo capital de risco foi a tradução encontrada em Portugal para a expressão
anglo-saxónica venture capital. Apesar de ser usado com bastante frequência, ainda existe
alguma confusão sobre o seu significado.
Para Lachmann (1992), esta tradução desvirtua a filosofia e o entendimento que
este tipo de financiamento tem nos meios anglo-saxónicos. Pois, da aventura explícita no
termo – venture – sobrou apenas o seu aspecto mais negativo – o risco, enquanto a
expressão original sublinha mais o aspecto dinâmico, aventureiro e ganhador do
investimento.
Ribeiro (1995) afirma que é uma escolha pouco feliz. Pois se a tradução de capital
não deixa qualquer dúvida, o mesmo não acontece com a tradução de venture, que significa
empreendimento, por risco. Capital de empreendimento é um termo longo e difícil de
exprimir mas seria mais adequado e atractivo para definir a actividade de venture capital,
porque ao espírito empreendedor está subjacente “um processo dinâmico através do qual os
indivíduos identificam constantemente oportunidades económicas e as aproveitam,
desenvolvendo, produzindo e vendendo bens e serviços. Este processo exige qualidades
como autoconfiança, a capacidade de arriscar e o empenho pessoal” (Comissão Europeia,
1998: 2). Já o termo capital de risco, apesar de ser mais curto, tem uma conotação negativa
18. O Conceito de Capital de Risco
6
na cultura latina, induzindo os seus potenciais utilizadores, ou mesmo qualquer indivíduo,
a ter uma reacção de certo receio (Ribeiro, 1995).
Também é importante referir que “parte dos operadores do mercado consideram
que alguns dos problemas que o desenvolvimento da actividade tem enfrentado, nos seus
primeiros anos, deveu-se à percepção que o capital de risco apenas apoiava projectos de
elevado risco, quando na realidade a actividade apoia projectos de investimento em capital
com um risco calculado, que tanto pode ser muito elevado, como médio/baixo” (Ribeiro,
1995: 13).
Uma vez que o termo português é limitativo e pouco adequado, Ribeiro (1995)
sugere outro – investimento em capital, mas reconhece que a actividade de venture capital
é conhecida por capital de risco e muito dificilmente o deixará de ser.
Ao nível conceptual as divergências mantêm-se, registando-se definições mais ou
menos latas, que derivam das características da actividade que os respectivos autores
consideram importantes ou da cultura do próprio país.
Embora não exista uma definição exacta para capital de risco (Tykvová, 2000),
apresentamos de seguida as opiniões de alguns autores.
Comecemos por Lachmann (1992: 10) que define capital de risco como “une
activité de financement à tous les stades de développement de l’entreprise”. É uma
definição abrangente, porque o autor considera que o capital de risco pode financiar o
arranque de um projecto, o crescimento ou a retoma de uma empresa, o investimento
imaterial de um programa de desenvolvimento ou mesmo as despesas a realizar com a
criação de uma empresa.
Para Sach (1985) in Martens (1995: 3-4), capital de risco é “o capital fornecido para
as empresas novas ou jovens que estão direccionadas para áreas de alto risco de negócio,
mas onde as possibilidades de crescimento são atractivas. Em muitos casos, existe uma
19. O Conceito de Capital de Risco
7
dimensão adicional de risco, quer pelo uso de uma nova tecnologia, quer de um mercado
ainda pouco explorado”.
Pellón (s/d) in Rodrigues (1999: 135), identifica o capital de risco como “um
conjunto de recursos financeiros e serviços de assessoria canalizados para as PME’s
inovadoras, já existentes ou em processos de criação, através de participações minoritárias
com carácter temporal, com a expectativa de obter mais-valias importantes em forma de
endividamento, convertível ou não, com a participação nos êxitos da gestão”.
Soares (1995) afirma que a actividade de capital de risco traduz-se basicamente no
financiamento de empresas, geralmente PME’s, por meio de recursos estáveis e
duradouros, com algumas particularidades:
• O financiamento concretiza-se com a participação no capital social1
;
• Os capitais investidos participam nos lucros e nas perdas;
• A participação é normalmente minoritária, o que significa que a SCR acompanha a
empresa mas não a lidera; e também temporária, terminando assim que a empresa
atinja a estabilidade necessária ao seu bom desenvolvimento, o que geralmente
acontece cinco a sete anos após a tomada de participação2
;
• Ao participar no capital da empresa, a SCR está a partilhar com o empresário o
risco decorrente do seu investimento, pelo que irá manter um diálogo permanente
com as equipas dirigentes, concedendo-lhes, simultaneamente, apoios a vários
níveis: estratégico, técnico, marketing, administrativo;
1
De acordo com o art. 3.º do Decreto-Lei n.º 319/2002 de 28 de Dezembro e com alterações introduzidas
pelo Decreto-Lei n.º 151/2004 de 29 de Junho, para efeitos de capital de risco considera-se participação a
aquisição ou a detenção de parte do capital social de uma sociedade com potencial elevado de crescimento e
valorização, bem como de valores mobiliários ou de direitos convertíveis, permutáveis, ou que confiram
direito à aquisição de parte desse capital social.
2
Em Portugal está estipulado por lei, através do n.º 1 do art. 10.º do Decreto-Lei n.º 319/2002 de 28 de
Dezembro, que é especialmente proibido às SCR “a titularidade de participações em sociedades, por um
período de tempo, seguido ou interpolado, superior a 10 anos”.
20. O Conceito de Capital de Risco
8
• Os investidores procuram empresas de elevado potencial de crescimento e
valorização, que necessitam de um financiamento para demonstrar o seu potencial;
• A perspectiva de rentabilidade é a médio/longo prazo, pelo que a SCR manter-se-á
na empresa por um período relativamente longo;
• O objectivo é o de obter mais-valias resultantes da alienação posterior da
participação adquirida, como contrapartida dos elevados riscos incorridos;
• A capacidade de gestão é potenciada pela complementaridade dos parceiros
(empreendedor e financiador).
Apesar da diversidade de definições, na maioria das vezes registam-se apenas
diferenças de pormenor. Em alguns casos, as divergências são profundas, ao ponto de “the
term venture capital is used by different people to mean different things” (Tykvová, 2000:
5). Por exemplo, na Europa uma definição alargada de capital de risco inclui as operações
de mudança de propriedade, Management Buy Out (MBO) e Management Buy In (MBI)3
,
enquanto que nos EUA nem tão-pouco fazem parte da indústria de capital de risco4
.
Cada país ou região desenvolveu, de acordo com a sua conjuntura económica e
cultural, um mercado de capital de risco com especificidades próprias. Todavia, na opinião
da European Private Equity and Venture Capital Association (EVCA) in Rodrigues
(1994), existem três factores que são comuns a todos os mercados e que claramente
diferenciam o capital de risco de outras formas de financiamento:
3
Que contam para metade do total dos investimentos de capital de risco, ver Tykvová (2000: 5).
4
Para Lucius Cary (1992) in Tavares (1999), as operações de mudança de propriedade não devem ser
consideradas operações de capital de risco, porque, normalmente, ocorrem numa fase de desenvolvimento em
que a empresa já possui uma carteira de clientes fidelizados, e o mercado e a concorrência são amplamente
conhecidos, o que reduz significativamente a incerteza que caracteriza a actividade do capital de risco. O
autor acrescenta que a classificação como capital de risco de operações que não o são, implica um
empolamento das estatísticas do mercado, tanto a nível dos montantes investidos como da taxa de
rentabilidade, transmitindo uma imagem distinta da realidade.
21. O Conceito de Capital de Risco
9
• O capital de risco implica um risco financeiro para o investidor e é orientado para
empresas com potencial de crescimento;
• O mais importante, o capital de risco é mais do que dinheiro. O capitalista de risco
procura uma parceria com o empreendedor e pode adicionar valor à empresa
através do conhecimento, da experiência e da rede de contactos que possui;
• O capitalista de risco investe a médio/longo prazo e espera maximizar o retorno para
ambas as partes.
Na definição a adoptar neste trabalho, tomar-se-á em consideração as orientações
de Soares (1995), que, em nossa opinião, descrevem de forma clara as bases conceptuais
da actividade em Portugal.
Assim, entendemos que o capital de risco é um instrumento financeiro vocacionado
para o médio/longo prazo, que consiste, fundamentalmente, na participação temporária e
minoritária de uma dada organização, a SCR5
, no capital social de uma empresa que
apresenta um elevado potencial de crescimento e valorização. Nesta modalidade de
financiamento, a SCR disponibiliza fundos, tornando-se sócia ou accionista da empresa
financiada, partilhando directamente, com os restantes detentores do capital, o risco do
negócio.
O desenvolvimento da actividade tem início na aquisição pelo investidor (público
ou privado) de uma participação no capital de uma empresa, geralmente PME, esperando
que, com essa compra, possa obter mais-valias resultantes do sucesso da actividade da
5
Ou outras entidades com capacidade legal para gerir fundos específicos de capital de risco. De acordo com
os n.os
2 e 3 do art. 15.º do D.L. n.º 319/2002, “a gestão de Fundos para Investidores Qualificados (FIQ) pode
ser exercida por SCR, por sociedades de desenvolvimento regional e por entidades legalmente habilitadas a
gerir fundos de investimento mobiliário fechados” e “a gestão de Fundos Comercializáveis junto do Público
(FCP) apenas pode ser exercida pelas entidades legalmente habilitadas a gerir fundos de investimento
mobiliário fechados”. Doravante, utilizaremos, genericamente, o termo SCR, como forma de simplificação.
22. O Conceito de Capital de Risco
10
empresa. O investidor pode dirigir-se directamente à empresa objecto do investimento e
adquirir uma participação no seu capital (constituindo aquilo que é comum designar-se por
business angels)6
ou pode preferir fazê-lo através de um intermediário (SCR ou outras
entidades equiparadas) que diversifique as oportunidades de investimento, mas que para
além disso apoie activamente a gestão da empresa.
Deste modo, a indústria de capital de risco tem três intervenientes principais:
• a montante: os investidores que requerem altos retornos - agentes excedentários;
• a jusante: os empreendedores que necessitam de financiamento - agentes
deficitários;
• a intermediar: agentes dispostos a correrem grandes riscos (SCR) em troca de
potenciais e compensadoras mais-valias.
1.2 – Tipologia de capital de risco: estádios de desenvolvimento das
empresas participadas
Os capitalistas de risco têm várias formas de caracterizar os seus investimentos. Um
elemento essencial nessa caracterização é o estádio de desenvolvimento em que a empresa
participada se encontra aquando da entrada da SCR, podendo apresentar a seguinte
estrutura (OCDE, 1996; IAPMEI e APCRI, 1999; APCRI, 2005a):
• Seed Capital – financia ideias/projectos de investimento que ainda se encontram
numa fase de concepção. Para a sua concretização é necessário comprovar a
viabilidade através do desenvolvimento de um protótipo, da validação de uma
teoria ou da pesquisa de mercado, para testar a aceitação no mercado;
6
Vide ponto 3.2.
23. O Conceito de Capital de Risco
11
• Start-up – é um investimento dirigido a empresas recém-criadas ou em fase de
constituição, que ainda não confrontaram os seus produtos com o mercado. Permite
às empresas iniciarem a produção e desenvolverem um marketing inicial;
• Early Stage – consiste no financiamento de empresas que já concluíram a fase de
desenvolvimento inicial do produto e que necessitam de recursos adicionais para
iniciarem as suas funções comerciais e de vendas. Nesta fase, as empresas ainda
não geraram resultados positivos;
• Expansão – este investimento, geralmente, aparece articulado com um plano
estratégico de relançamento ou expansão da empresa. Poderá ter como finalidade o
reforço dos capitais próprios e/ou reestruturação financeira, a ampliação da
capacidade produtiva, no desenvolvimento de produtos/mercados, ou o aumento de
capital circulante. Nesta fase, geralmente, os riscos são menores, as empresas já se
encontram em situação de equilíbrio, mas a capacidade de autofinanciamento é
insuficiente para realizar o projecto em causa;
• Bridge Finance/Mezzanine – investimento destinado a empresas que se suponha
virem a ser admitidas no mercado de valores mobiliários no prazo de seis meses a
um ano. Normalmente, este financiamento é estruturado de forma a que possa ser
reembolsado pelas receitas provenientes de uma subscrição pública;
• Management Buy-out (MBO) – é um tipo de investimento que possibilita à equipa
de gestão interna adquirir parte ou a totalidade do capital da empresa que gerem. A
equipa de gestão contribui apenas com uma pequena parte do total do capital
utilizado na aquisição;
• Management Buy-in (MBI) – é um tipo de investimento que possibilita a um
gestor ou uma equipa de gestores, exteriores à empresa, a aquisição da mesma;
24. O Conceito de Capital de Risco
12
• Buy-in Management Buy-out (BIMBO) – financiamento destinado a permitir o
controlo da empresa pela equipa de gestão interna, auxiliada pela entrada de uma
equipa de gestores externa (funde o MBO e o MBI);
• Institutional Buy-out (IBO) – este tipo de investimento implica um envolvimento
extraordinário do investidor e destina-se a permitir à SCR ou ao investidor de risco
o controlo da empresa, sendo geralmente percursor de um MBO;
• Turnaround – capital destinado ao financiamento de projectos de recuperação de
empresas financeiramente desequilibradas, mas com inequívoca viabilidade
económica;
• Capital de Substituição / Replacement Capital – é capital fornecido apenas para
permitir a aquisição de parte ou da totalidade da participação de actuais accionistas,
ocorrendo uma simples substituição de accionistas. Normalmente não existem
alterações a nível interno nem investimentos produtivos;
• Refinanciamento – quando necessário pode dar indícios de fracasso ou de sucesso.
Quando uma empresa tem um desempenho insatisfatório pode necessitar de fundos
adicionais. O mesmo pode ocorrer numa empresa com um bom desempenho, os
accionistas podem decidir refinanciar o negócio em termos mais favoráveis para
eles com financiadores de capital de risco originais ou por vezes com novo
conjunto de financiadores;
O estádio de desenvolvimento da empresa tem igualmente implicações ao nível do
risco e, consequentemente, do retorno esperado pelo investidor. Se analisarmos o mercado
de capital de risco em função destas variáveis, obtemos quatro segmentos (Ribeiro, 1995):
25. O Conceito de Capital de Risco
13
• Seed Capital / Capital Semente (Risco – muito elevado / Retorno potencial - muito
elevado) – é um segmento do mercado que só tem real expressão nos países onde o
capital de risco está mais desenvolvido;
• Risk Capital / Capital de Risco (Risco – elevado / Retorno potencial – elevado) –
embora existam opiniões diferentes, este segmento engloba, normalmente, o capital
utilizado para financiar o lançamento de novas empresas (Early Stage) e as
operações de reestruturação financeira (Turnaround);
• Development Capital / Capital de Desenvolvimento (Risco – médio a baixo /
Retorno potencial – médio) – neste segmento são considerados os investimentos
que apoiam a expansão de empresas via crescimento interno ou via aquisição, as
operações MBO ou MBI;
• Replacement Capital / Capital de Substituição (Risco – baixo / Retorno potencial
– médio/baixo) – é um investimento utilizado apenas para adquirir uma
participação, havendo uma simples troca de accionistas.
1.3 – Vantagens do capital de risco
Na opinião de Roquette (1995), hoje em dia o pequeno empresário, o gestor da
média empresa e o empreendedor já conhecem, razoavelmente, as diferentes formas de
financiamento para os seus negócios. Contudo, o mesmo autor afirma que relativamente à
alternativa que o capital de risco pode constituir e ao relacionamento com uma SCR, tudo
indica que os potenciais “consumidores” – as PME’s – têm ainda uma percepção pouco
clara e muitas vezes incorrecta das suas reais vantagens, isto porque:
26. O Conceito de Capital de Risco
14
• As SCR têm vindo a ser divulgadas como “parceiros activos e construtivos” sem
que seja explicitado aquilo que realmente oferecem, prevalecendo quase sempre a
ideia de “um parceiro exigente e controlador”, esquecendo-se o seu valioso
contributo que é a experiência de gestão em situações empresariais difíceis;
• É necessário reforçar a filosofia básica das SCR: além de não liderarem o negócio,
também não querem ser parceiros eternos, pretendem revender as suas
participações, devolvendo aos promotores originais a sua autonomia;
• Muitas vezes o empreendedor não sabe da existência de vários tipos de SCR e que
deve procurar aquela que melhor sirva os interesses do seu projecto;
• O empreendedor não tem conhecimento da melhor forma de apresentar um projecto
a uma SCR e dos critérios de avaliação que são utilizados.
De facto, são reconhecidas inúmeras vantagens na utilização do capital de risco,
entre as quais destacamos:
• Não exige o pagamento de encargos financeiros;
• Não exige garantias reais ou pessoais para os empresários;
• Partilha o risco do negócio;
• Dá apoio a nível económico, financeiro e administrativo;
• Aumenta a credibilidade junto dos stakeholders da empresa (todos aqueles que se
relacionam com esta e têm um interesse directo ou indirecto na sua existência:
clientes, fornecedores, accionistas, trabalhadores, bancos, Estado, etc.) (Soares,
1995);
• Incrementa contactos comerciais a nível nacional e internacional;
27. O Conceito de Capital de Risco
15
• Redução do endividamento bancário com repercussão na diminuição dos encargos
financeiros e consequente melhoria na rentabilidade das empresas (Martens, 1995).
Para a APCRI (2005a), a melhor forma de definir as vantagens do capital de risco
passa por estabelecer uma comparação com os meios de endividamento tradicionais (ver
Quadro 1.1).
Quadro 1.1: As vantagens do capital de risco face ao endividamento tradicional
Capital de risco Endividamento
Perspectiva de médio e longo prazo. Qualquer prazo.
Empenhamento total até ao desinvestimento.
Análise do risco de solvabilidade e exigência de
garantias patrimoniais.
Disponibiliza o financiamento com
objectivos de crescimento e valorização do
negócio.
Salvaguarda do risco. Quanto mais conservadora a
situação patrimonial e financeira da empresa, o
recurso ao crédito fica mais facilitado.
Pagamento de dividendos e amortização do
capital dependente dos resultados da
empresa.
Imposição de planos pré-definidos de reembolso e
pagamentos de juros.
A rentabilidade do capital de risco está
dependente dos resultados do negócio.
O retorno depende apenas do cumprimento do
plano de pagamentos e da manutenção dos activos
apresentados em garantia.
Se o negócio for inviável, o capital de risco
fica na mesma posição de qualquer outro
sócio da empresa. Não tem garantias
especiais e a sua remuneração está
dependente do sucesso da empresa.
As garantias conferem aos financiadores
tradicionais uma posição credora privilegiada.
O capital de risco tem sempre por objectivo
valorizar o negócio. Se algo corre mal, o
capital de risco irá trabalhar em conjunto
com o seu parceiro de negócio para encontrar
as melhores soluções.
Se existirem sinais de problemas, os financiadores
tradicionais procurarão renegociar a dívida,
impondo mais garantias ou precipitando o
reembolso, para salvaguardarem a sua posição.
O capital de risco é um parceiro da empresa,
que partilha os riscos do negócio e que
contribui para a sua gestão e valorização.
O seu interesse principal é o cumprimento dos
planos de pagamento e reembolso. Poderão prestar
assistência à gestão como serviço adicional, mas
isso dependerá da entidade financiadora e das
relações globais com a empresa.
Fonte: APCRI (2005a).
28. O Conceito de Capital de Risco
16
Soares (1995: 57) conclui que “as principais vantagens do capital de risco decorrem
do seu carácter de parceria no capital, no risco e na gestão, resultando num posicionamento
de complementaridade e supletividade da liderança do promotor, potenciando as suas
capacidades de gestão/empreendimento e a sua imagem/credibilidade junto dos sistemas
empresarial e financeiro e do Estado”.
Para Banha (2002: 228), as vantagens tornam-se mais relevantes para o empresário
que tenha:
• Falta de capitais próprios e capacidade de endividamento muito limitada;
• Vontade de desenvolver um negócio salvaguardando o controle do mesmo;
• Necessidade de crescer, mantendo a estabilidade e flexibilidade interna;
• Necessidade de planear a estratégia futura da empresa, sem afectar a gestão
corrente.
1.4 – Breve evolução histórica
De acordo com Banha (1998: 33) “o capital de risco tem as suas origens no próprio
nascimento da actividade comercial”. Desde sempre houve empreendedores com
disposição para arriscar as suas poupanças em projectos que, na maioria dos casos, não é
possível determinar a priori a certeza do êxito ou do fracasso. Se recuarmos no tempo,
reparamos que já na época dos descobrimentos, os reis de Portugal e Espanha apoiaram
financeiramente projectos de elevado potencial - as viagens marítimas (Soares, 1995).
Todavia, foi nos EUA, no final da Segunda Guerra Mundial, que, de forma
institucionalizada, apareceu o capital de risco (Cornelius, 2005). A necessidade de
aproveitar os avanços tecnológicos resultantes das experiências militares e a existência de
29. O Conceito de Capital de Risco
17
uma quantidade significativa de capitais inactivos provenientes de companhias de seguros
e de fundos de investimento, são alguns dos factores que justificaram o aparecimento e
desenvolvimento deste produto financeiro (Banha, 1998). Foi perante este contexto que,
em 1946, o General Georges Doriot, Ralph Flanders, Karl Compton, Merrill Griswold e
outros fundaram a American Research & Development (AR&D), a primeira (e por muitos
anos a única) SCR (Bartlett, 1999; Gompers e Lerner, 2001).
Para Bartlett (1999), o General Doriot é uma figura distinta na indústria tradicional
do capital de risco, não só porque proporcionou as orientações preliminares à AR&D (até
que foi adquirida pela Textron), mas também por ter introduzido uma percentagem
significativa de capitalistas de risco no negócio, devido aos cursos que leccionou na
Harvard Business School. Além disso, com o investimento na Digital Equipment
Corporation (DEC)7
, mostrou ao mundo como uma estratégia de investimento em capital
de risco pode produzir elevadas recompensas.
O sucesso da AR&D contribuiu para o aparecimento de outras SCR. Porém,
durante vários anos, a indústria do capital de risco manteve-se um pouco apagada. Só com
as grandes alterações macroeconómicas, financeiras e culturais iniciadas a partir da
segunda metade dos anos setenta, é que surgiu um cenário propício ao (re)nascimento do
capital de risco (Rodrigues, 1995). Dessas alterações, a mesma autora destaca, a nível
macroeconómico, o desmoronar do “sistema de Bretton Woods”, com a consequente
instabilidade cambial e monetária e o posterior aumento dos níveis das taxas de juro reais
resultantes, também, em parte, da política económica americana do início dos anos oitenta;
a nível financeiro, o processo de globalização dos mercados e o desfasamento crescente
entre estes e as necessidades financeiras de um número cada vez maior de empresas; e a
7
O investimento mais rentável na história do capital de risco. A AR&D, em apenas quinze anos, viu o seu
investimento multiplicado em 5800 vezes.
30. O Conceito de Capital de Risco
18
nível cultural, a retoma do conceito de empresário e empresa no sentido schumpeteriano do
termo.
Durante os anos oitenta viveu-se um período de grande euforia. A nível europeu, o
capital de risco deixou de estar circunscrito ao Reino Unido, estendendo-se ao resto da
Europa Ocidental, e nos EUA presenciou-se o seu apogeu.
A par da conjuntura favorável do início da década de oitenta, os poderes públicos
desenvolveram várias acções com vista à promoção do capital de risco. No âmbito da
Comunidade Europeia destacam-se:
• A criação da European Private Equity and Venture Capital Association (EVCA),
em 1983. É uma Associação que representa o sector do capital de risco europeu e
tem como objectivo fomentar a actividade dentro e fora da Europa. A sua sede é em
Bruxelas e em Maio de 2005 contava com 917 membros8
distribuídos por 49 países
(EVCA, 2005).
• O lançamento do programa Venture Consort, em 1985, com o objectivo de
aumentar o financiamento às PME’s envolvidas nas novas tecnologias através da
formação de redes transnacionais de operadores de capital de risco;
• A iniciativa Eurotech Capital, operacional desde 1988, com vista a estimular o
investimento de capitais privados em projectos transnacionais de alta tecnologia
através de operadores de capital de risco;
8
Dos quais 574 eram membros efectivos, 314 membros associados e 29 associações nacionais de capital de
risco.
Os membros efectivos são constituídos por organizações que estão activamente ligadas a actividade de
capital de risco e cujo negócio é realizado dentro da Europa.
Os membros associados são constituídos por: i) organizações que fornecem serviços para o sector de capital
de risco, como por exemplo: firmas de advogados, grupos de consultores, institutos de pesquisa e
universidades; ii) organizações que invistam em capital de risco, como por exemplo: bancos, companhias de
seguro ou fundos de pensão; iii) empresas de capital de risco não europeias.
31. O Conceito de Capital de Risco
19
• O European Seed Capital Fund Scheme, criado em 1988 e em vigor até 1995, com
o propósito de incentivar o investimento privado em empresas novas, inovadoras e
de base tecnológica.
Ainda na década de oitenta, mais precisamente em 1986, surgiu a actividade de
capital de risco em Portugal, regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 17/86 de 5 de Fevereiro.
A sua criação é justificada pela necessidade de modernização do tecido empresarial
português, resolvendo a insuficiência de capitais próprios com que se deparava a
generalidade das PME’s e potenciando o desenvolvimento de novos projectos (Silva,
1995).
Nos últimos anos regista-se um desenvolvimento desta actividade nos países da
Europa de Leste. No EVCA Yearbook 2001 surgem, pela primeira vez, dados sobre a
República Checa, Polónia, Hungria e Eslováquia.
32. 20
2 – O PROCESSO DE INVESTIMENTO VIA CAPITAL DE RISCO
O investimento via capital de risco materializa-se numa parceria entre o investidor e
o empreendedor, e tem a duração de um período que medeia os três e os dez anos. Durante
esse período, o investidor torna-se sócio do empresário partilhando com ele os riscos do
negócio. A rentabilidade da operação vai depender da performance que a empresa obtenha
no futuro. Assim, os investidores procurarão aplicar os seus fundos em empresas que lhes
pareçam, à partida, ter melhores condições de evolução e valorização, para que, mais tarde,
aquando da alienação da participação, possam obter uma significativa mais-valia
(Pimentel, 1995).
Este processo de investimento é complexo e para o melhor compreendermos
apresentamos agora as várias etapas que o constituem.
2.1 – A angariação de fundos
De forma simplificada, podemos dizer que a actividade das SCR se resume a um
processo sequencial de investimentos e desinvestimentos. Para que o ciclo se inicie torna-
se necessária a angariação de fundos (Gompers e Lerner, 2001). Por isso, é importante que
as SCR apresentem uma boa performance histórica, uma perspectiva de gerar rendimentos
superiores aos atingidos através de investimentos com taxas de juro fixas e tenham provas
dadas em fazer negócios idênticos, de forma a serem atractivas para os investidores
(IAPMEI e APCRI, 1999).
33. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
21
Os fundos arrecadados serão aplicados na aquisição de partes de capital de
empresas, a deter por um período mais ou menos longínquo, com objectivo de gerar mais
riqueza para alimentar posteriores investimentos9
(Santos, 1995).
Normalmente, neste tipo de actividade, somente após alguns anos é que os
empreendimentos começam a apresentar resultados significativos. Logo, os recursos
devem provir, maioritariamente, de investidores voltados para aplicações de longo prazo.
Entre as várias alternativas encontramos como sendo as principais: Bancos, Fundos
de Pensões, Companhias de Seguros, Investidores Privados, Estado e Organismos
Públicos.
De país para país, por razões de natureza económica, cultural e legal, existem
divergências ao nível da origem dos fundos. Todavia, em termos globais, duas grandes
tendências predominam (Bentes, 1997):
• Nos países de cultura anglo-saxónica (em especial EUA e Reino Unido) os fundos
provêm, essencialmente, de instituições de natureza privada, sobretudo, de Fundos
de Pensões;
• Na Europa Ocidental os fundos são de origem mista, pública e privada, aparecendo
os Organismos Públicos e os Bancos como os principais fornecedores.
Na fase seguinte à angariação de fundos, as SCR têm pela frente um trabalho
intensivo de análise e pesquisa, que começa na selecção das melhores propostas e termina
na fase de desinvestimento. Para o melhor compreendermos, Tyebjee e Bruno (1984)
elaboraram o seguinte modelo de decisão (ver Figura 2.1).
9
Pressupondo que os investimentos geram ganhos de capital, ainda que moderados, pois, dado que o risco é
consideravelmente elevado, as hipóteses de perda total do capital são muito elevadas.
34. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
22
Figura 2.1: Modelo de decisão
2.2 – Análise e selecção de propostas
2.2.1 – Fontes de propostas
As SCR recebem diariamente um elevado número de propostas e oportunidades de
negócio (Roquette, 1995). Dum modo geral, em quase todos os países, as SCR têm uma
postura pouco agressiva na procura de oportunidades de investimento. A maioria das
propostas chega às SCR por intermédio de outros agentes ou por iniciativa dos próprios
empreendedores (Rodrigues, 1994). Esses agentes são os bancos, advogados, auditores e
consultores, que estão directamente ligados aos empreendedores que necessitam do capital
e dão conhecimento às SCR.
2.2.2 – Selecção
Devido ao elevado número de propostas apresentado às SCR e não tendo estas
colaboradores suficientes para uma análise em profundidade, torna-se necessário fazer uma
Selecção
Avaliação
Fontes de propostas
Estruturação
Actividades de pós-investimento
35. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
23
pré-selecção das empresas empreendedoras. Para este efeito é importante um plano de
negócios bem elaborado, que permita ao investidor em pouco tempo obter resposta a cinco
questões básicas (Banha, 2000):
• Qual a actividade?
• Qual o posicionamento face à concorrência?
• Qual o perfil da equipa de gestão?
• Qual o volume de negócios previsto a três/cinco anos?
• Qual o montante de capital necessário?
Para tal existe o sumário executivo e é mediante este que o capitalista de risco vê se
se impõe uma análise mais aprofundada (IAPMEI e APCRI, 1999). É composto por duas
ou três páginas, que se encontram logo no início do plano de negócios, e funciona como a
“fotografia” de todo o projecto (Banha, 2000). O texto deve ser claro e fortemente
persuasivo, equilibrando argumentos típicos de “vendas” com realismo, de modo a
convencer (IAPMEI e APCRI, 1999).
Nesta fase de selecção, os critérios são rigorosos e a probabilidade de aceitação é
baixa (+/-10%), visto que, a avaliação a fazer posteriormente exige muito tempo e custa
muito dinheiro (Roquette (1992), Engelen (1993); in Martens (1995)). Daí, o acesso dos
empreendedores a esta forma de financiamento obrigar sempre a um maior esforço de
preparação prévia (Gaspar, 2003).
As propostas que passaram a fase da pré-selecção, agora em número bastante mais
reduzido, vão ser sujeitas a uma análise mais pormenorizada. O capitalista de risco
elaborará a primeira análise técnica e económica, contactará algumas pessoas que
costumavam trabalhar com o empreendedor e pode, ainda, convidá-lo para uma entrevista
36. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
24
particular, a fim de o mesmo expor e comentar as características mais importantes do plano
de negócios.
A tomada de decisão, desde a recepção do plano de negócios até ao momento de
concretizar o investimento, pode demorar entre quatro meses e um ano (IAPMEI e APCRI,
1999). Há sempre excepções à regra, mas em função da qualidade da informação
fornecida, da credibilidade dos promotores e da atractividade do negócio, as SCR têm todo
o interesse em acelerar o processo.
2.2.3 – Avaliação
Nesta fase é feita uma análise exaustiva às propostas que passaram as fases
anteriores, com o objectivo de seleccionar aquelas que têm as maiores expectativas de
sucesso e os rendimentos potencias mais elevados. Inicia-se, desde logo, o trabalho “due-
diligence”10
, que poderá culminar com a participação da SCR no projecto.
O êxito da decisão vai depender de uma correcta avaliação, quer quantitativa quer
qualitativa, a todos os aspectos da proposta.
2.2.3.1 – Abordagem financeira
Durante o processo de análise e selecção de projectos, a SCR utiliza um conjunto
de critérios que a auxiliam na tomada de decisão. As decisões de investimento em capital
de risco envolvem, por natureza, níveis elevados de risco e incerteza, pelo facto de serem
baseadas em previsões sobre um futuro mais ou menos longínquo.
10
“Termo de origem anglo-saxónica que significa a medida de prudência que legitimamente se pode esperar
de determinado sujeito tendo em conta um conjunto de circunstâncias” (Banha, 2000: 110).
37. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
25
Porfírio (1993) fez uma pesquisa sobre os critérios de análise e selecção de
projectos utilizados pelas SCR portuguesas11
e constatou que, independentemente da
dimensão de cada uma, a utilização dos métodos tradicionais como o VAL (Valor
Actualizado Líquido), a TIR (Taxa de Rentabilidade Interna) e o “Payback” é
generalizada, e que 45% das SCR utilizam nas suas análises os três métodos em
simultâneo. Contudo, a TIR é o método preferido pelas SCR inquiridas, 85% das mesmas
utilizam-no na generalidade das suas análises. De seguida aparece o VAL e por último o
“Payback” (usado como critério secundário, complementar a TIR e ao VAL).
Relativamente aos métodos de programação matemática (como por exemplo:
programação linear, programação não linear e programação multiobjectivos)12
, a não
utilização é generalizada, por causa de restrições que se prendem, principalmente, com
questões financeiras e com a capacidade (aptidão) dos gestores. Todas as SCR inquiridas
afirmam considerar a variável – risco – durante as suas análises aos projectos. Para tal
efeito, a maioria das SCR inquiridas prefere os métodos empíricos: a análise de
sensibilidade e a simulação, utilizados, respectivamente, por 82,5% e 62,5% das SCR, e o
método do ajustamento das taxas de desconto, utilizado por 62,5% das SCR.
Uma questão muito importante nesta fase é a determinação do valor da empresa (ou
do projecto, no caso de estarmos perante uma operação start-up), porque dela vai depender
a quota-parte da participação da SCR no capital social, a sua força negocial e o resultado
da alienação da mesma (Rodrigues, 1994). Porém, sobre este ponto poderão surgir algumas
divergências: o empresário deseja, com a participação da SCR, conseguir o máximo de
capital possível, mas em contrapartida da menor percentagem no capital social, o que
implica uma valorização o mais elevada possível do valor da empresa no momento da
11
Realizou um inquérito às 20 SCR existentes em Portugal no ano de 1993, conseguindo apurar respostas de
16 delas, o que representa uma percentagem de 80%.
12
Para maiores desenvolvimentos sobre cada um dos métodos, ver Porfírio (1993).
38. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
26
participação; por sua vez, a SCR deseja investir o mínimo, mas em contrapartida obter a
maior quota-parte possível do capital.13
Começam, assim, as primeiras negociações.
2.2.3.2 – Abordagem qualitativa
Para além da análise económica-financeira, os gestores da SCR procuram efectuar
uma abordagem qualitativa a cada oportunidade de investimento que, segundo Roquette
(1995), costuma (ou deveria) basear-se nos aspectos que a seguir apresentamos.
1) Avaliar a qualidade do plano de negócios apresentado
O plano de negócios assume um papel fundamental em todo o processo de
investimento em capital de risco. É um documento “que permite, por um lado, ao
empreendedor, atingir o seu grande objectivo – angariar o capital necessário ao seu
negócio, por outro lado, aos investidores, possuírem uma ferramenta útil na análise de
oportunidades de investimento” (Banha, 2000: 103). Como tal, a sua elaboração e
apresentação devem ficar a cargo de profissionais especializados que garantam
credibilidade e confidencialidade.
Este documento funciona como um cartão de visita, cujo conteúdo e a forma, bem
como o modo em que é exposto no contacto inicial, podem ser vistos como os primeiros
indícios do potencial de cada iniciativa (Roquette, 1995).
13
A empresa participada tem receio de ser dominada pela SCR. Mas, o carácter minoritário e temporário da
participação transmite-lhe mais confiança. Todavia, o poder que a SCR exerce, na maioria dos casos, advém
de outros factores (como por exemplo dos conhecimentos aprofundados em algumas áreas de negócios ou do
peso que exercem nas negociações com algumas instituições financeiras) e, sobretudo, das cláusulas do
contrato em que se fixam as obrigações mútuas, e que por vezes conferem privilégios incompatíveis com o
respectivo peso da participação no capital (Rodrigues, 1994). Portanto, a participação minoritária permite à
SCR aceder mesmo com uma fatia menor a um bolo significativamente maior (Soares, 1995).
39. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
27
No momento de redigir o plano de negócios, o empreendedor deve ter em conta os
seguintes aspectos (IAPMEI e APCRI, 1999):
• Legibilidade: o português deve ser claro, simples e direccionado para “não
especialistas”. Os detalhes desnecessários devem ser evitados, de modo que o plano
não se torne demasiado longo;
• Extensão: a extensão do plano de negócios depende das circunstâncias
particulares. Deverá ser suficientemente longo para cobrir convenientemente o
assunto e deverá ser suficientemente curto de modo a manter o interesse.
Recomenda-se que seja o mais breve possível – até porque, se necessário, os
investidores podem solicitar informação adicional;
• Aparência: recomenda-se a utilização de gráficos e quadros para ilustrar e
clarificar informação complexa. Os títulos e subtítulos são úteis para separar
aspectos diferentes do assunto em análise. Os erros de ortografia, pontuação ou
sintácticos causam uma impressão muito negativa.
Para Santana (2003: 7), um plano de negócios “bem elaborado, com fontes de
informação credíveis, com cálculos financeiros bem organizados, utilizando conceitos
correctos de marketing e finanças, revela que o empreendedor tem visão e ideias bem
fundamentadas, que é um profissional e está preparado para gerir o negócio”.
Durante a avaliação do plano de negócios, o investidor de risco costuma dedicar
uma especial atenção (Roquette, 1995: 86):
• Ao grau de objectividade com que é definida a missão da empresa;
• Ao pormenor com que é descrito o produto/serviço idealizado;
40. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
28
• À relevância e consistência das informações de mercado apresentadas
(conhecimento de clientes, fornecedores e concorrentes);
• Ao domínio da tecnologia envolvida;
• À identificação dos vários responsáveis da equipa de gestão e das suas
competências específicas;
• À coerência das projecções elaboradas e do plano de médio/longo prazo.
Em suma, o rigor, a credibilidade e a clareza do plano apresentado, são reveladores
das competências dos promotores, bem como da viabilidade do projecto.
2) Identificar os tipos de riscos envolvidos
Numa segunda etapa desta abordagem qualitativa, a SCR irá tentar detectar os
aspectos que apresentam maior vulnerabilidade e avaliar se esses riscos são de natureza
controlável. Por exemplo, para um projecto start-up, o investidor de risco costuma
identificar quatro potenciais fontes e tipos de risco (Roquette, 1995: 87):
• Risco de desenvolvimento: trata-se de analisar se será possível conceber e
produzir o produto/serviço imaginado em condições eficientes;
• Risco comercial: desenvolvida a produção em condições favoráveis, é necessário
saber se será possível colocá-la no mercado de forma competitiva;
• Risco de gestão: após a concepção de uma política comercial eficaz, é importante
estudar se será possível obter lucros interessantes por via da margem ou do volume;
41. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
29
• Risco de crescimento: estabelecidas, de forma eficiente, as áreas da produção e do
marketing, avança-se para a análise do potencial e da viabilidade do crescimento do
negócio.
A resposta aos dois primeiros tipos de risco ficará, em princípio, a cargo dos
promotores. Se, casualmente, existir a necessidade dos investidores intervirem nessas
áreas, será um forte indício de vulnerabilidade do negócio. Pois, tais situações exigem
consumos de tempo e de recursos financeiros que, apesar de não-contabilizados, implicam
desgaste na capacidade financeira e na estrutura da SCR.
O risco de gestão, deveria ser o único aceitável pelo investidor de risco, visto tratar-
se de uma área onde detém competências específicas e na qual a sua intervenção poderá
acrescentar valor às iniciativas.
No que respeita ao risco de crescimento, as SCR poderão ter os instrumentos ideais
para o gerir. Mas, a este nível, existem outros investidores com competências suficientes
para com elas competir. Além disso, muitos projectos com elevado risco de crescimento
não costumam oferecer perspectivas de rentabilidade que satisfaçam as SCR.
3) Testar a “razão económica” do projecto
A viabilidade de um projecto deve ser comprovada pela sua razão económica, isto
é, pela certeza de que os promotores reúnem as condições necessárias para aproveitar a
oportunidade de uma forma competitiva. Para tal, o investidor de risco costuma avaliar
(Roquette, 1995: 87):
42. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
30
• A relevância do «Problema» que o projecto pretende resolver (mercado/segmento
insatisfeito, necessidades emergentes, dificuldades e/ou carências tecnológicas,
etc.);
• A originalidade e solidez da «Solução» que se pretende desenvolver.
O real valor da iniciativa será medido pela conjugação destes dois factores e, à
partida, terá um peso significativo na decisão de investimento. Contudo, é necessário
relembrar que a qualidade da equipa de gestão é importante para levar o projecto a bom
termo.
Subjacente à filosofia de actuação dos capitalistas de risco está a apetência para a
inovação, isto é, para projectos de investimento que tenham a missão clara de resolver um
problema relevante através uma solução original.
4) Auditar as capacidades dos promotores e da equipa de gestão
As características da equipa promotora são o indicador que mais cedo permite
antever o sucesso/fracasso do projecto. Para Roquette (1995) é impensável apostar numa
ideia, por mais inovadora que ela seja, sem conhecer previamente o curriculum, a
personalidade e as motivações dos elementos que irão liderar cada uma das áreas-chave do
negócio.
Relativamente à equipa como um todo, é importante analisar os seguintes aspectos
(Roquette, 1995: 88):
• Motivo da escolha do capital de risco e clareza dos objectivos;
• Grau de formação, experiência empresarial, capacidade de gestão e liderança;
• Conhecimento do sector/mercado e «apport» de contactos;
43. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
31
• Motivações dominantes, grau de dedicação ao projecto;
• Situação financeira pessoal, empenho material na iniciativa e seriedade.
Na opinião de Banha (2000), cada SCR tem as suas próprias rotinas de avaliação,
desenvolvidas a partir da experiência, embora todas elas tenham o objectivo de detectar o
mais cedo possível se o empreendedor tem capacidades altamente desenvolvidas para fazer
face ao:
• Esforço: capacidade de concretizar os seus planos, enfrentando os obstáculos que
apareçam no decurso do projecto;
• Risco: ser permanentemente capaz de avaliar o risco inerente aos seus planos;
• Liderança: no caso de não possuir as capacidades anteriores, o empreendedor
deverá ser capaz de recrutar uma equipa que as possua e mostrar que a consegue
liderar com sucesso.
A qualidade da equipa de gestão é outro factor que influencia a decisão final de
investimento (Wrigley, 1995). O perfil psicológico, a formação, os conhecimentos do
métier, a capacidade de gerir o negócio, a capacidade de liderança, a motivação e a
dedicação são algumas das características que o capitalista de risco observa na equipa de
gestão para determinar se a proposta tem hipóteses de êxito (Ondernemen, 1983 in
Martens, 1995). Nesta etapa é importante analisar o desempenho dos gestores nas
realizações anteriores e proceder à verificação das referências.
Qualquer que seja o estádio de desenvolvimento da empresa, a avaliação da equipa
de gestão é fundamental. No entanto, torna-se mais relevante quando se trata de um
investimento em empresas jovens, nomeadamente no caso de capital semente, por ser
44. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
32
quase o único critério que os capitalistas de risco têm à sua disposição (Clark, 1991 in
Martens, 1995).
2.3 – Estruturação
Depois de uma análise pormenorizada à proposta e demonstrada a sua viabilidade,
entra-se na fase de negociações da qual resultará um contrato, onde são sintetizados os
interesses das partes envolvidas. Roquette (1995) designa esse contrato como um
“casamento” que irá durar cerca de quatro a seis anos, e cujo sucesso costuma exigir uma
dedicação constante e um elevado rigor na gestão. Portanto, é necessário clarificar desde o
início os interesses das partes, bem como reservar algum tempo para a criação conjunta de
uma filosofia geral de condução do negócio. É uma fase muito importante para o bom
andamento do projecto, como tal, é necessário bastante rigor e habilidade.
Na opinião de Banha (2000), o processo de negociações é bastante complexo, por
isso, os empreendedores devem estar atentos aos termos e condições que as entidades
investidoras exigem, sob pena de não efectuarem concessões que futuramente poderão
levar a conflitos ruinosos.
Para Esperança (1995), apesar das partes procurarem objectivos próprios e nem
sempre coincidentes, a experiência demonstra que a janela de entendimento, ou o intervalo
de negociação, podem ser suficientemente amplos para que possam chegar a acordo.
Das negociações resultam os acordos parassociais14
, que vão disciplinar as relações
futuras entre a SCR e os empreendedores. Assim, fica definido de forma clara e precisa os
direitos e deveres de ambas as partes.
14
Estes acordos estão previstos no direito português pelo n.º 1 do artigo 17º do Código das Sociedades
Comerciais.
45. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
33
As matérias abrangidas pelos acordos parassociais são bastante diversas, podendo
respeitar a tudo o que tenha conexão com o contrato de sociedade, regulando normalmente
os seguintes aspectos (IAPMEI e APCRI, 1999: 37):
• Os termos de entrada, permanência e saída da SCR;
• A transmissão de quotas e acções;
• A distribuição de lucros;
• O apoio financeiro e técnico a facultar à gestão da empresa;
• A definição dos princípios orientadores da política empresarial a ser adoptada;
• A eleição e composição dos corpos sociais;
• A informação periódica sobre a evolução da situação económica-financeira da
empresa;
• A definição da forma como se fará a saída da SCR da sociedade participada;
• As consequências do incumprimento do acordo parassocial.
Apesar da sua forte ligação ao contrato de sociedade, o acordo parassocial é
autónomo relativamente a este, apenas produz efeitos entre os seus intervenientes e não
tem qualquer eficácia em relação à sociedade (Banha, 2000).
A celebração do contrato parassocial pode ocorrer em três momentos distintos
(Banha, 2000: 118):
• Anteriormente à constituição da sociedade;
• No acto de constituição da sociedade;
• Em qualquer fase da vida da sociedade.
46. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
34
2.4 – Actividades pós-investimento: o acompanhamento
Após a conclusão das negociações e a assinatura dos contratos, entra-se na fase
crucial da actividade de capital de risco – o desenvolvimento do negócio, a partir da qual
os interesses da SCR e do empresário devem tornar-se convergentes (Rodrigues, 1994).
O acompanhamento – nível de envolvimento na gestão – é um input não financeiro
muito importante, que nasce da necessidade do investidor de risco acompanhar as áreas
que costumam ser as principais fontes de problemas, como por exemplo: planeamento
financeiro atrasado, sistemas de controle interno deficientes, dificuldades na negociação de
financiamentos, afastamento da estratégia original e concentração em metas de curto prazo
(Roquette, 1995).
O envolvimento na gestão é uma opção estratégica, em que a SCR decide se
pretende ou não acrescentar valor aos capitais fornecidos. Consoante a sua decisão, o
acompanhamento da empresa participada pode assumir vários níveis, em que as posturas
hands-on15
(activa) e hands-off (passiva) correspondem às situações extremas.
2.4.1 – Acompanhamento: hands-on
Quando o capitalista de risco utiliza uma filosofia “hands-on”, é um efectivo
“parceiro de gestão”, visto que participa activamente na condução do empreendimento,
tanto ao nível estratégico como ao nível da gestão corrente, com o objectivo de potenciar
todos os recursos e capacidades ao dispor da equipa de gestão (Soares, 1995). Porém, não é
intenção da SCR intervir na gestão diária da empresa participada (Wrigley, 1995), apenas
pretende influenciar as decisões com impacto no futuro da empresa.
15
Alguns autores fazem a distinção entre hands-on (reactivos) e hands-in (activos).
47. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
35
Este envolvimento activo, na opinião de Soares (1995: 57), “não deverá ser
confundido com interferência ou liderança na gestão, devendo sim significar apoio à
liderança dos promotores do empreendimento em causa”. Para proporcionar esse apoio,
algumas SCR nomeiam um representante para a direcção da empresa, que tanto pode ser
um quadro da SCR como um consultor externo (BVCA, 2004). Em contrapartida a
empresa participada terá que pagar o chamado “Management fee”16
.
De acordo com Tavares (1999), os investidores hands-on defendem a sua posição
por:
• A maioria dos insucessos dever-se à má gestão, podendo a SCR disponibilizar
capital humano adequado e consequentemente diminuir a probabilidade de falhar;
• As SCR poderem partilhar o know-how adquirido com outras experiências;
• Ao participar na gestão poderem detectar mais facilmente necessidades nas mais
diversas áreas;
• As SCR possuírem uma vasta rede de contactos que facilitam a resolução de
problemas.
2.4.2 – Acompanhamento: hands-off
Alguns investidores optam por uma posição passiva em relação à empresa
participada. Neste tipo de abordagem, a gestão fica a cargo da equipa promotora, não
havendo grande envolvimento da SCR até ao momento da saída. O acompanhamento é
16
Management fee (comissão de gestão): “é um encargo anual correspondente a uma média de 2,5% do
montante investido. Alguns investidores insistem que os grandes fundos que fazem investimentos later stage
deveriam cobrar menos porque as empresas que têm em carteira necessitam de menos tempo de
acompanhamento. Outros dizem que a comissão deveria ser menor à medida que os fundos amadurecem e
menos investimentos novos são feitos” (Banha, 2000: 316).
48. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
36
feito à distância, baseando-se em informação de natureza financeira, técnica ou comercial,
previamente definida.
Para Tavares (1999), os investidores hands-off justificam a sua estratégia por:
• A tendência ser a de investir em empresas com uma boa capacidade de gestão;
• A maioria dos empresários preferir evitar a partilha da função de gestão;
• Quando as empresas participadas são muito pequenas, poderão ter dificuldades em
remunerar os gestores das SCR, ou só o poderão fazer se substituírem os quadros
existentes, que são frequentemente os sócios.
Caso a empresa participada falte a pagamentos, não atinja os objectivos acordados
ou encontre outro tipo de dificuldades, o investidor hands-off envolver-se-á mais na gestão
com o intuito de garantir o cumprimento das perspectivas (BVCA, 2004).
2.5 – Actividades pós-investimento: cessão da participação
Os investidores de risco têm, desde o primeiro momento, o objectivo de vender a
sua posição na empresa participada, realizando mais-valias consideráveis sobre o montante
investido. Assim, após um percurso em comum mais ou menos longo, dá-se o culminar do
esforço de empenhamento do investidor de risco na empresa em termos de mobilização de
capital e trabalho, bem como de transmissão de experiência. Não se trata de um abandono,
mas do claro reconhecimento de que a SCR já cumpriu a sua missão e deve desinvestir
para poder apostar noutras iniciativas (Roquette, 1995).
A participação tem uma duração média de três a sete anos, estando o momento de
saída/desinvestimento dependente (APCRI, 2002):
49. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
37
• Do grau de desenvolvimento em que se encontrava a empresa no momento da
entrada do capital de risco;
• Da envolvente externa – situação em que se encontra o sector de actividade da
empresa e da própria evolução da economia;
• Do nível de êxito da gestão.
A existência de mecanismos de saída/desinvestimento bem desenvolvidos é um dos
factores fundamentais para o sucesso da actividade de capital de risco, cuja lógica das
operações pressupõe um desinvestimento no menor prazo possível e com o maior retorno
possível (Gorgulho, 1996). Entre as várias opções de saída destacam-se as seguintes
(IAPMEI e APCRI, 1999; APCRI, 2002):
• A recompra (buy back);
• A venda a terceiros;
• A venda a instituições financeiras;
• A venda no mercado de capitais (IPO)17
;
• Liquidação da empresa.
2.5.1 – Recompra (buy back)
Nesta opção, a SCR vende a sua participação à empresa participada ou à equipa de
gestão da mesma. Costa (1995) classificou este procedimento como “um circuito fechado”,
na medida em que o capital volta aos iniciais proprietários.
17
Refere-se ao termo anglo-saxónico IPO (Initial Public Offering).
50. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
38
Esta decisão pode ocorrer por duas razões (Rodrigues, 1994): primeiro, por ser uma
solução negociada à partida, independentemente da evolução do negócio, e que fica
prevista no contrato através de cláusulas de preferência a favor do empresário; segundo,
por ser uma possível e desejada alternativa, dado que por vezes o investimento não atinge a
rentabilidade esperada e o investidor de risco tem dificuldades em conseguir encontrar no
mercado compradores interessados em adquirir a participação.
Segundo a mesma autora, para o investidor esta solução não é a mais desejada,
porque, em geral, não permite satisfazer os níveis de rentabilidade inicialmente
estabelecidos. Para o empreendedor, verifica-se precisamente o contrário, principalmente
se o recurso ao capital de risco teve como fundamento suprimir insuficiências de fundos
não colmatáveis por autofinanciamento ou por recurso ao endividamento, quer pelo
elevado nível deste, quer pela inexistência de garantias suficientes para prestar às
instituições de crédito. Mas, se o empreendedor for mais aberto ao exterior e menos
preocupado com quem detém uma parcela minoritária do capital, a recompra representa
para este uma das possibilidades de saída.
Esta alternativa levanta, normalmente, várias questões sobre a valorização da
participação, em particular, quando o comparador é a equipa de gestão e esta dispõe de
reduzida capacidade financeira (IAPMEI e APCRI, 1999). Todavia, no momento da
alienação, podem ser utilizados vários métodos para ultrapassar essa questão, tais como
(Rodrigues, 1999: 147):
• O valor da empresa no momento da venda;
• A actualização dos benefícios futuros;
• O montante de dividendos;
51. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
39
• A aplicação de uma taxa mínima para capitalizar os fluxos desde o momento do
investimento até ao desinvestimento.
2.5.2 – Venda a terceiros
Com esta opção de saída, a SCR vende as acções/quota da empresa participada a
uma outra empresa (não financeira) que, provavelmente, pertence ao mesmo sector.
De acordo com o IAPMEI e a APCRI (1999), esta alternativa costuma apresentar-
se como a mais vantajosa para a SCR. Normalmente, o comprador precisa da empresa
(eventuais sinergias, quota de mercado, acesso ao mercado), ao contrário de um normal
investidor no mercado bolsista. Porém, é difícil de concretizar, em especial para as grandes
empresas, uma vez que é necessário identificar um comprador interessado. Este trabalho de
pesquisa do melhor comprador tem sido facilitado com a melhoria das comunicações e
com a circulação da informação no sector, em outros sectores, a nível europeu e mundial
(globalização). Apresentando-se, deste modo, como um processo mais rápido e económico
do que a venda no mercado de capitais, mas merece bastante atenção por parte da equipa
de gestão.
Na opinião de Rodrigues (1994), a venda a terceiros é, cada vez mais, a estratégia
de desinvestimento preferida pelas SCR. Contudo, na maioria das vezes a empresa
participada é contra esta opção, porque receia a perda de autonomia e tomada do seu
controlo pelo comprador.
2.5.3 – Venda a instituições financeiras
A venda da participação a uma instituição financeira é uma alternativa a considerar
pela SCR no momento da saída, embora ocorra com pouca frequência.
52. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
40
Segundo o IAPMEI e a APCRI (1999), esta alternativa é encarada pela SCR que,
por algum motivo18
, necessita de desinvestir e a empresa participada ainda não quer
recorrer (ou não pode) à cotação no mercado de capitais ou não está pronta para a venda a
terceiros.
É uma solução pouco atractiva em termos de ganhos, visto que, o vendedor da
participação transacciona-a com um intermediário que pretende voltar a vendê-la com a
máxima valorização possível (Rodrigues, 1994).
2.5.4 – Venda no mercado de capitais
A maioria das empresas participadas por SCR não cumpre os exigentes requisitos
de admissão ao Mercado de Cotações Oficiais. Nestes casos, a utilização do Segundo
Mercado, menos exigente no que respeita à percentagem do capital a difundir pelo público
e do tipo de informação a disponibilizar (Costa, 1995), constitui uma alternativa para a
colocação da participação detida pela SCR. Porém, em Portugal, o Segundo Mercado na
realidade “não funciona”, sendo esta alternativa pouco usual (IAPMEI e APCRI, 1999).
Em outros países foram criados “mercados de acesso”, com custos menores e
regulamentações menos exigentes, para facilitar o acesso das PME’s aos mercados de
capitais (Gorgulho, 1996). O caso mais conhecido é o National Association of Securities
Dealers Automated Quotation (NASDAQ), dos EUA. Mas outros casos podem ser citados,
como o Unlisted Securities Market (USM) do Reino Unido, criado em 1980, o Second
Marché da França, criado em 1982 e o Tweede Markt da Bélgica, criado em 1985, entre
outros. Recentemente, em termos europeus, tem havido alguns desenvolvimentos
encorajadores: em 1995, o Reino Unido lançou o Alternative Investments Market (AIM)
18
Podemos salientar a falta de capitais para acompanhar o crescimento do negócio ou a necessidade de
realizar mais valias (devido a razões fiscais ou de reporting).
53. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
41
como sucessor do USM e a França criou o Nouveau Marché em alternativa ao Second
Marché; em 1996, foram criados o European Association of Securities Dealers Automated
Quotation (EASDAQ) e o EURO.NM19
(associação das Bolsas de Bruxelas, Paris,
Frankfurt, Amesterdão e Milão).
A venda da participação no mercado de capitais é, tipicamente, a alternativa mais
rentável para o investidor20
(Gompers e Lerner, 2001). Mas, a par de algumas vantagens
traz-lhe outras desvantagens significativas.
Entre as primeiras salientamos (IAPMEI e APCRI, 1999: 42-43):
• A facilidade de venda, que depende sempre da situação do mercado;
• O aumento da notoriedade devido à presença no mercado;
• A possibilidade de motivar os colaboradores via incentivos com acções;
• Mantendo algumas acções poderá vir a beneficiar do crescimento futuro do negócio.
Em relação às segundas referimos (IAPMEI e APCRI, 1999: 42):
• A possível perda de controlo face à situação de partida;
• As elevadas exigências para acesso e manutenção neste mercado, quer em termos
de disponibilização de informação (alguma útil para os concorrentes), quer em
termos de custos (taxas de admissão e manutenção);
• O mercado não é líquido para muitos títulos e, na realidade, não constitui uma
alternativa para as pequenas empresas;
19
Para oferecer uma verdadeira dimensão europeia e garantir um fácil acesso aos mercados por parte das
empresas com elevado potencial de crescimento. Ver Banha (2000).
20
Até ao Crash de 1987 esta saída era a mais ambicionada e harmoniosa para o investimento em capital de
risco. Porém, hoje em dia, depois de demonstrada a fragilidade do segundo mercado às perturbações
financeiras, já não aparecem defensores tão convictos desta opção. Ver Rodrigues (1994).
54. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
42
• Ao contrário da venda a terceiros, em que tem de convencer um ou poucos
compradores, aqui terá de seduzir o mercado;
• Mantendo algumas acções poderá vir a correr o risco de os ganhos de capital não se
concretizarem.
2.5.5 – Liquidação da empresa
Não é uma opção desejável, no entanto, apresenta-se como a última hipótese de
saída para os investimentos mal sucedidos. De facto, as SCR também assistem ao fracasso
de vários projectos aparentemente prometedores, nos quais sofrem consideráveis perdas
financeiras. As razões de insucesso mais comuns que as SCR detectam nos seus
investimentos são as seguintes (Roquette, 1995):
1) Iniciativas que não se enquadram no objecto do capital de risco
Um dos primeiros obstáculos ao sucesso de um projecto é o seu perfil não se
adequar às características específicas do instrumento financeiro em questão. Uma boa parte
das oportunidades de investimento que são apresentadas às SCR já percorreram, sem êxito,
as diversas instituições de crédito ou encontram-se numa situação financeira de tal forma
desequilibrada que o único investimento que pretendem fazer é sanear o seu passivo.
Nestes casos, o capital de risco é encarado como uma mera fonte de liquidez não sujeita a
encargos financeiros: o último recurso antes da falência ou do abandono do negócio.
Também é comum a apresentação de projectos às SCR que nada têm de inovador e
que, muitas vezes, não pretendem responder a nenhuma oportunidade concreta. De facto, a
criação e o desenvolvimento de produtos ou serviços “normais” que procuram servir, com
55. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
43
tecnologias correntes, as necessidades de mercados já tradicionais não costumam interessar
às SCR, por não oferecerem perspectivas de rentabilidade interessantes.
Em suma, a incompreensão do que é o capital de risco e que tipo de projectos é que
as SCR têm por missão apoiar são ainda fortes limitações do sucesso deste instrumento
financeiro inovador.
2) Planos de negócios fracos
Muitas vezes, um projecto é abandonado ou enfrenta problemas no seu arranque
(quer se trate da criação de uma empresa ou da expansão de um negócio existente), só
porque o seu plano de negócio é fraco. Na base deste problema costumam estar algumas
deficiências que dificultam a sua implementação, como por exemplo: (1) uma
visão/compreensão incompletas do ramo de negócio; (2) um conhecimento insuficiente dos
clientes-alvo e da concorrência; (3) um planeamento financeiro pouco rigoroso; (4) uma
falta de clareza de objectivos e de metas a atingir.
3) Análises do mercado superficiais
Outra razão para o insucesso de um projecto de capital de risco é o facto do
mercado-alvo não ter sido bem definido e/ou não ter sido objecto de um estudo
aprofundado. Este problema gera situações de instabilidade que, a posteriori, são
facilmente explicáveis pelos mitos sobre os quais os promotores costumam construir os
seus projectos e dos quais se destacam os seguintes: (1) a inexistência de barreiras à
entrada no ramo de negócio, quando essas existem mas têm uma natureza informal; (2) a
ideia de que só é necessária uma pequena quota de mercado, quando isso não só é difícil de
conquistar, como não garante o sucesso da iniciativa; (3) o encontro de perturbações
56. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
44
inesperadas, tais como o poder negocial dos fornecedores, as dificuldades em recrutar uma
força de vendas eficiente ou o aparecimento de produtos substitutos; (4) a suposição de
taxas de crescimento elevadas e constantes, bem como de ciclo de vida dos produtos
intermináveis; (5) a desvalorização do poder da concorrência e a ideia de que não haverá
retaliações a novas entradas no mercado; (6) a confiança cega na ideia de que o produto se
vende por si só e de que há filas de clientes à espera dele.
Em síntese, trata-se de aspectos qualitativos do mercado que foram menosprezados
mas que são determinantes para o sucesso de uma iniciativa, bem como de optimismos dos
promotores que os leva a pressupor cenários irrealistas para o desenvolvimento do
projecto.
4) Gestão ineficiente
Um quarto aspecto muito importante deste tema é o da má gestão de bons planos de
negócios. É uma situação que costuma surgir quando: (1) a equipa de gestão não está
completa ou é fundamentalmente composta por empreendedores com criatividade e
espírito de iniciativa, faltando um gestor com sentido prático para as decisões correntes; (2)
os elementos da equipa detêm uma sólida experiência profissional e incontestáveis
competências técnicas mas têm pouca prática na gestão de negócios próprios; (3) a
obsessão dos promotores pelo seu novo produto ou tecnologia revolucionária traduz-se
numa falta de rigor orçamental e em deficientes sistemas de controle interno da empresa;
(4) a pressão das metas de curto prazo impede a manutenção de uma visão estratégica de
longo prazo.
Em suma, são problemas de gestão dos recursos humanos que nascem quer com a
falta objectiva de profissionais em áreas específicas, quer de uma deficiente coordenação
da equipa reunida, quer ainda de incapacidades inesperadas dos promotores.
57. O Processo de Investimento Via Capital de Risco
45
5) Investimentos sobre-dimensionados
Por último, é também importante indicar algumas razões de insucesso que se
prendem com uma análise deficiente do projecto de investimento. De facto, algumas
iniciativas de capital de risco acabam por não produzir, num prazo razoável para a SCR,
níveis de resultados que proporcionam a recuperação dos fundos comprometidos. Na base
destas situações costumam estar, entre outras, as seguintes razões: (1) aposta
exagerada/precipitada em equipamento dificilmente recuperável; (2) investimento em
iniciativas orientadas para nichos de mercado ou mercados com crescimento limitado; (3)
projectos em sectores de actividade pouco atractivos e com más perspectivas de liquidez;
(4) existência de barreiras à saída do mercado só conhecidas a posteriori; (5) pagamento de
prémios de subscrição iniciais que impedem a realização de ganhos, apesar da boa
performance do projecto.
Em termos práticos, são apostas demasiado caras em iniciativas válidas cujas
perspectivas de rentabilidade e recuperação do capital investido ficam limitadas.
58. 46
3 – OS INTERVENIENTES DA INDÚSTRIA DE CAPITAL DE RISCO
A indústria de capital de risco é, normalmente, caracterizada pela existência de três
tipos de intervenientes, a saber: os venture capitalits, os business angels e os corporate
venturing. Porém, existe ainda um outro elemento igualmente importante na
industrialização do sector de capital de risco - os venture catalyst.
Nos pontos seguintes, iremos expor as principais características de cada um dos
intervenientes.
3.1 – Venture capitalits
Os venture capitalits (ou as SCR, designação genérica no âmbito deste trabalho)
representam os agentes tradicionais do mercado de capital de risco. A sua actividade
profissional consiste em angariar fundos junto de outros investidores para, posteriormente,
aplicar em empresas jovens com grande potencial e espírito de crescimento (Bottazzi e
Rin, 2002). Estes agentes têm vindo a ser divulgados como “parceiros activos e
construtivos” e caracterizam-se pela (Roquette, 1995: 80):
• Sensibilidade apurada para avaliar oportunidades e detectar ameaças;
• Capacidade para acrescentar valor às iniciativas em que apostam, sobretudo em
termos de reforço da capacidade de gestão e da força negocial junto da banca;
• “Obsessão” por projectos inovadores e por equipas empreendedoras.
59. Os Intervenientes da Indústria de Capital de Risco
47
As SCR podem investir com fundos próprios (que obtêm normalmente junto de
instituições bancárias ou de organismos públicos dedicados ao desenvolvimento
empresarial) ou gerir fundos em nome de outras instituições (Banha, 2000).
Ao representarem o papel de intermediário financeiro (OCDE, 1996; Cornelius e
Persson, 2006), possibilitam a transferência de meios de agentes excedentários para
agentes deficitários especiais, que apresentam condições muitos particulares: informação
disponível reduzida, e por vezes pouco fiável, riscos elevados, boas potencialidades de
crescimento e elevadas rentabilidades esperadas (Rodrigues, 1994; Viala, 1998).
O facto de as SCR serem membros e cumprirem os critérios das associações de
capital de risco nacionais e da EVCA, podemos afirmar que representam o capital de risco
institucional (Banha, 2000).
A Associação Portuguesa de Capital de Risco (APCRI) é a estrutura representativa
das entidades que se envolvem na realização de investimentos de capital de risco em
Portugal.
3.2 – Business angels
Os business angels são investidores privados que aplicam parte das suas poupanças
em empresas novas ou em expansão não cotadas na bolsa (financiamento na fase de
constituição) e, em muitos casos, facilitam também o financiamento da fase subsequente
do ciclo de vida das empresas recém-criadas (fase de arranque) (CCE, 2001; Comissão
Europeia, 2002; Aernoudt, 2005). A sua actividade é designada por capital de risco
informal, por sinal menos conhecida e documentada que o capital de risco formal.
60. Os Intervenientes da Indústria de Capital de Risco
48
3.2.1 – Perfil do investidor
Estes investidores são, geralmente, homens maioritariamente de média idade (40-
65 anos); altamente formados, com pelo menos o primeiro grau (bacharel) e geralmente em
disciplinas de gestão e engenharia; com experiência em negócios: muitos são
empreendedores de sucesso, iniciando, desenvolvendo e, em alguns casos, vendendo um
ou mais negócios, outros são profissionais liberais (ex: contabilistas, consultores,
advogados) e executivos seniores em grandes empresas (OCDE, 1996). Para além do
capital, “também fornecem recomendações e aconselhamento (formais e informais) sobre
os negócios” (Comissão Europeia, 2002: 18). A sua presença é maior nos países com
mercados de capitais mais desenvolvidos, como os EUA e o Reino Unido.
Além de efectuarem investimentos de forma isolada, muitas vezes estes
investidores organizam-se informalmente e investem em conjunto como parte integrante de
um sindicato que compreende, tipicamente, amigos e associações de negócio. O que lhes
permite obter largas somas de capital, que individualmente não conseguiriam, e ainda
reduzir substancialmente o risco (Aernoudt, 2005; Pereira, 2005).
O investimento em conjunto é mais habitual entre os business angels mais
experientes (Kelly e Hay, 2000).
3.2.2 – Motivações
Como qualquer outro investidor, os business angels são movidos pelos ganhos
potenciais. Contudo, existem importantes considerações secundárias que devem ser tidas
em conta quando analisamos as motivações que envolvem este tipo de investimentos,
nomeadamente, a satisfação pessoal de investir em determinados empreendimentos e
outras razões altruístas (OCDE, 1996; Manson e Harrison, 2002).