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Autobiografia
Manuel Jorge

Curso EFA

Identidade
Preciso ser um outro
para ser eu mesmo

Sou grão de rocha
Sou o vento que a desgasta

Sou pólen sem insecto

Sou areia sustentando
o sexo das árvores

Existo onde me desconheço
aguardando pelo meu passado
ansiando a esperança do futuro

No mundo que combato morro
no mundo por que luto nasço

Mia Couto, in "Raiz de Orvalho e Outros Poemas



ESS-S                                                                  Escola Secundária de Sampaio – Sesimbra



INTRODUÇÃO


    Moçambique, considerada terra da boa gente, situa-se na zona austral e
na costa oriental de África. Com uma supefície de 799.380 quilómetros
quadrados, faz fronteira a norte com a Tanzania, a ocidente com o Malawi,
Zambia, Zimbabwe e África do Sul, e a Sul com a Swazilandia e a África do
Sul. A sua faixa costeira, é banhada pelo oceano Índico, numa extensão de
2.515 quilómetros.
    José Jorge, cidadão português, nascido em Portugal Continental,
deslocado para a colónia de Moçambique em 1944, casou-se com Virigínia
Jorge, nascida e criada nesta Província Ultramarina, onde se uniram pelo
Santo Sacramento do matrimónio.
    Anos depois e já com dois filhos, resolveu o casal, após entendimento
conjugal, continuar a procriação, dando a minha mãe à luz ao terceiro filho,
baptizado com o nome de Manuel Jorge, às 13,00 horas do dia 10/05/1965,
na Missão do Lifidzi, mais ou menos um ano após o início da luta de
libertação nacional levada a cabo pela Frelimo – Frente de Libertação de
Moçambique, que teve uma duração de sensivelmente 10 anos e a qual
culminou com a independência de Moçambique em 1975, formando-se
assim o primeiro governo pós colonialismo, com um programa de trabalho
orientado para a construção de uma sociedade pro-socialista.


    Deixo reflectido em síntese neste portfolio parte da minha caminhada
pela viagem da vida, nomeadamente algumas etapas da infância, da
adolescência e enquanto adulto; o que aprendi, o que descobri, o que senti e
o que vivenciei.
    Parte do aqui escrevo tem por objectivo responder às exigências do
programa a que me submeti para a aquisição de novas aprendizagens, o que
ficará reflectido a partir do final desta introdução.




    1- A MINHA INFÂNCIA
    Até 1970, vivi num recanto que considero paradisíaco, mais
precisamente Vila Velha de Ulongué, vila esta situada no distrito de
Angónia, uma localidade pacata a Noroeste de Moçambique, mais
precisamente na província de Tete (antigo distrito; visto Moçambique ser
uma Província Ultramarina).
    Caracterizada por um microclima, encontramo-nos na zona mais
ocidental de Moçambique, muito verdejante e onde tudo o que se cultivava
dava os seus frutos. Campos enormes de longo verdejante, espairecendo até
aos sopés das montanhas que envolviam a vila como se fosse um abraço da
mãe natureza.
    Por motivos logísticos, e como o meu pai era veterinário e tinha que se
deslocar frequentemente por várias zonas da província (distrito), quando fiz
os meus seis anos, fui morar para a Vila Nova, capital de distrito, que se
localizava sensivelmente a 10km da vila onde nasci, distância esta
percorrida por caminhos ermos, rodeados por florestas de árvores enormes,
onde nas suas copas se podiam observar algumas das mais belas criaturas da
natureza, nomeadamante babuinos, primatas da família dos símios.
    Desta fase da minha infância, recordo-me das várias vezes que me
deslocava, junto dos meus pais e de um de meus irmãos (o do meio), às
quintas circundantes, onde se podiam observar as suas belas terras, umas
cultivadas outras de pasto e onde também se podiam observar algumas
manadas de gado bovino que pastavam nesses prados. Era lindo!
   Acompanhava também muitas vezes o meu pai quando ele se deslocava
para os tanques que existiam na zona, para os chamados banhos carracícidas
do gado bovino. Recordo-me das vezes que ficava com ele a contabilizar o
número de animais existentes nas variadas manadas. Aqui aprendi os
primeiros números, enquanto em conjunto com o meu pai contava os que
perfilavam por entre dois muros que os encaminhavam para o respectivo
tanque de banhos.
   Em 1971, chegada a hora da entrada para o ensino primário, os meus
pais matricularam-me na escola primária de Vila Nova, onde frequentei a
pré-primária.
   1972, a primeira das mudanças radicais na minha vida, pois fui morar
para a capital do distrito, cidade de Tete, onde continuei os meus estudos até
ao liceu e onde conclui o Curso Geral dos Liceus, o actual 9º ano.


   2- A MINHA ADOLESCÊNCIA
   Enquanto Ser, amigo da natureza e também aliado à curiosidade, vários
factores fizeram com que despertasse um indicador de que mais tarde seria a
minha directriz para um sonho que nunca se tornou realidade, pois o voo das
cegonhas pelos céus em redor da minha casa, ainda quando morava na Vila
Velha, “aguçavam-me o apetite” para algo que na altura me era de todo
desconhecido, o ser um dia piloto de linha aérea.
   Enquanto aluno primário, fui adquirindo conhecimentos, naturalmente
virados para o ensino regular e pouco mais se fazia senão estudar, brincar e
algumas saidas para aqui e acolá, sempre na companhia dos meus pais.
   Entretanto, o tempo foi passando e eis que chega a altura da entrada no
liceu, transição que coincide precisamente com o fim da ocupação colonial
de que eu na altura não fazia ideia do que era. Até à data e tudo o que tinha
aprendido era de que Moçambique seria uma Província Ultramarina de
Portugal.
   1975, é declarada a independência de Moçambique, o que foi de facto
uma enorme confusão para mim, pois ouvia falar de terroristas, de
malandros que andavam pelas matas e que, de vez em quando, atacavam os
brancos que viviam em propriedades nas zonas mais remotas da provínica,
longe das cidades capitais, e que eram vítimas da barbariedade criminal, o
que para mim não fazia sentido, pois até à independência nunca havia
sofrido nenhum “encontro imediato” com quem quer seja que lutava pela
ocupação colonial; ironia do destino.
   Com o desenrolar dos tempos e, com a entrada do novo governo,
criaram-se novas estruturas de ensino, assente numa ideologia pro-socialista.
   Fui adquirindo novos conhecimentos sobre a realidade da colonização.
Começo por perceber, de facto, o que era o passado e o que seria o presente,
restando-me por descobrir o futuro.
   Entretanto, nos tempos disponíveis e principalmente nas férias, o meu
pai, pessoalmente muito conhecido de várias entidades, não só
governamentais, como mesmo a nível social, por exemplo pelos
comerciantes da cidade, preocupava-se em arranjar, sempre que possível,
uma ocupação para os filhos nas épocas de interrupção das aulas. Umas
vezes lá ia eu para uma oficina reparadora de automóveis, outras de
electrodmésticos, outras ainda para oficinas de reparação de rádios, onde,
em todas estas áreas, pude adquirir novos conhecimentos e aprendizagens.
   Nos meus tempos de ócio, fazia caminhadas com os meus amigos da
altura pelas matas e montanhas circundantes, andávamos nós felizes e
contentes, pois podíamos assim passar bons momentos de contacto com a
fauna e flora existente nessas zonas.
   As épocas das férias grandes (o período de férias maior do ano) eram
geralmente preenchidas com viagens e também visitas de estudo, não pela
escola, mas sim a título particular, pois, o meu pai era o meu guia e levava-
me a conhecer cidades e localidades que me eram desconhecidas até então,
tendo assim oportunidade de ficar a conhecer um dos maiores ex-líbris da
engenharia portuguesa em Moçambique e para o mundo, a barragem de
Cahora Bassa.
   Por vezes, também fazíamos férias nos países vizinhos como o Malawi e
Zimbabwe.
   Eis então chegados a 1976, ano em que surgem os primeiros indícios de
desestabilização pós-independência em Moçambique, cujo desenvolvimento
atinge a forma de uma guerra civil alargada a todo o país, sobretudo na
década de 80, opondo a FRELIMO – Frente de Libertação de Moçambique e
a RENAMO - Resistência Nacional de Moçambique. A desestabilização
provocada por estes conflitos internos é agravada por agressões militares
que a Rodésia (país vizinho) faz a Moçambique, tendo como justificação o
apoio que o governo Moçambicano dava aos guerrilheiros que lutavam
contra a ocupação branca. É de se considerar este tipo de referência visto a
Rodésia nesta altura já não ser colónia britânica, apesar do domínio
governamental continuar a ser maioritariamente branco, pois era governado
por um nacionalista de nome Douglas Ian Smith, primeiro-ministro, que
houvera declarado nem relação à coroa britânica unilateralmente a
independência em 11 de Novembro de 1965 ficando no governo até 1 de
Junho de 1979, data da segunda independência, declarada pelos
considerados os verdadeiros nacionalistas.
   Neste interregno, o meu irmão do meio completava os 18 anos de idade,
o que se tornou um caso sério para a estabilidade emocional da minha
família, tendo os meus pais que envia-lo para Portugal, visto o mesmo andar
a ser seguido pelas autoridades locais no sentido de o alistar nas forças
armadas de Moçambique para posteriormente ser enviado para o combate
que se desenrolava entre as tropas governamentais e a RENAMO.
   Apenas em 1992, com a assinatura do ‘Acordo Geral de Paz’ entre a
FRELIMO e a RENAMO, cessam as hostilidades e inicia-se um processo de
reconciliação.
   Apesar deste “clima” de destabilização, lá se ia vivendo com mais ou
menos receio de que algo de mal nos pudesse acontecer.
   Em 1984 desloco-me mais a minha família definitivamente para
Portugal.
   Esta mudança é um novo traçado na caminhada da minha vida. Novas
aventuras e novas aprendizagens, voltam a cruzar-se no meu percurso de
vida.


   3- A MINHA VIDA ADULTA
   Em Portugal, sinto-me deslocado no tempo e no espaço, apesar de que,
de quando em vez, eu visitado o mesmo em épocas de férias, mas pesava
aqui o facto das minhas raízes se encontrarem a milhares de quilómetros.
   Um dos meus objectivos foi sempre o de continuar os estudos, mas a
realidade da vida assim não o permitiu.
Com o meu pai já com alguma idade, aposentado e ainda com dois filhos
para apoiar no seu crescimento como Homens, a vida torna-se um pouco
complicada para ele, pois era o único com rendimentos sustentáveis e sobre
o qual pesava a responsabilidade do sustento da família, composta por um
agregado de quatro elementos.
   Com o sentido de responsabilidade apurado tive que arregaçar as
mangas e tentar entrar para o mercado de trabalho com o objectivo e espírito
de entreajuda, o que consegui com alguma facilidade; mais uma vez valeram
os conhecimentos do meu pai.
   Vindo eu de África e já com alguns conhecimentos de mecânica auto
adquiridos na época de férias, consigo emprego num concessionário
automóvel com a designação de Auto Monumental do Areeiro, onde fico a
trabalhar no departamento de Tuneup (preparação e afinação de veículos de
competição) durante aproximadamente dois anos e meio, altura em que sou
chamado para o cumprimento do Serviço Militar Obrigatório - finais de
1987.
   Faço a recruta em Elvas onde em simultâneo e através do exército tiro a
carta de pesados com reboque, o que era uma mais-valia para mim, pois
dava muito valor a tudo o que conseguia obter e considerava-o como um
troféu pelo esforço e empenho dedicado.
   Depois de terminada a recruta, sou transferido para Santa Margarida,
onde sita o Agrupamento Base, o maior centro de aquartelamentos do país.
Sou destacado para a 1ª BMI (Brigada Mista Independente), onde cumpro
18 meses de serviço militar e de onde saio com o devido reconhecimento
pelos meus préstimos como militar, pela ordem e disciplina, juntando assim
ao meu curriculum um diploma de louvor (um dos quatro militares
premiados de entre os 400 do batalhão).
   Estamos no primeiro trimestre de 1989, mais uma página passada, novos
desafios se advinham.
   Depois do cumprimento do serviço militar, eis que torno ao mercado de
trabalho, e como já possuía licença de condução para pesados com reboque,
e enquanto estava à espera de ser chamado para um concessionário Citroen,
empresa para a qual concorri para o lugar de recepcionista, consigo emprego
temporário numa empresa de distribuição de combustível em bombas de
abastecimento para automóveis. Permaneço dois/três meses. Aqui, adquiro
novos conhecimentos de formas e técnicas para o abastecimento, inclusive
regras de segurança para o procedimento de descarga.
   Próximo do terceiro trimestre do ano de 1998, eis que sou chamado pela
empresa concessionária de automóveis da marca Citroen, para a qual
concorri, onde sou admitido e aí permaneço sensivelmente 10 anos.
   Faço pela empresa várias formações, como a de recepcionista e mais
tarde a de escriturário, tempos que me ficaram na memória gravados como
uma fase positiva da minha vida.
   Eis que quando estou no “auge” digamos assim, de uma vida estável,
começa a manifestar-se, entretanto, a patologia de padeço (neuro-muscular),
e que me vai marcando ao longo dos tempos através de alguma mobilidade
reduzida.
   Em 1999, nova reviravolta; a firma onde trabalho declara insolvência,
tendo eu que regressar ao mercado de emprego. Desta feita e ponderando já
um certo grau de incapacidade que possuía, e também no meu futuro,
consigo emprego numa clínica de diagnóstico como escriturário, da qual
faço parte dos quadros efectivos.
   Entretanto, com o agravar da minha situação de saúde e visto ter iniciado
um processo de baixa por incapacidade temporária, eis que traço um novo
objectivo, o de continuar os estudos e para já, tendo como meta a conclusão
do 12º ano, com a complementaridade de um curso técnico, podendo assim
preencher com este feito mais uma página e um capítulo do livro da minha
vida.
   14 de Setembro de 2009, o virar da página para o início do tão desejado
destino.
   Matriculado na ESS (Escola Secundária de Sampaio) em Sesimbra, eis-
me na presença de mais uma aventura para um somatório de novos
conhecimentos e aprendizagens…
Autobiografia de Manuel Jorge

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  • 1. Autobiografia Manuel Jorge Curso EFA Identidade Preciso ser um outro para ser eu mesmo Sou grão de rocha Sou o vento que a desgasta Sou pólen sem insecto Sou areia sustentando o sexo das árvores Existo onde me desconheço aguardando pelo meu passado ansiando a esperança do futuro No mundo que combato morro no mundo por que luto nasço Mia Couto, in "Raiz de Orvalho e Outros Poemas ESS-S Escola Secundária de Sampaio – Sesimbra INTRODUÇÃO Moçambique, considerada terra da boa gente, situa-se na zona austral e na costa oriental de África. Com uma supefície de 799.380 quilómetros quadrados, faz fronteira a norte com a Tanzania, a ocidente com o Malawi, Zambia, Zimbabwe e África do Sul, e a Sul com a Swazilandia e a África do Sul. A sua faixa costeira, é banhada pelo oceano Índico, numa extensão de 2.515 quilómetros. José Jorge, cidadão português, nascido em Portugal Continental, deslocado para a colónia de Moçambique em 1944, casou-se com Virigínia Jorge, nascida e criada nesta Província Ultramarina, onde se uniram pelo Santo Sacramento do matrimónio. Anos depois e já com dois filhos, resolveu o casal, após entendimento conjugal, continuar a procriação, dando a minha mãe à luz ao terceiro filho, baptizado com o nome de Manuel Jorge, às 13,00 horas do dia 10/05/1965, na Missão do Lifidzi, mais ou menos um ano após o início da luta de libertação nacional levada a cabo pela Frelimo – Frente de Libertação de
  • 2. Moçambique, que teve uma duração de sensivelmente 10 anos e a qual culminou com a independência de Moçambique em 1975, formando-se assim o primeiro governo pós colonialismo, com um programa de trabalho orientado para a construção de uma sociedade pro-socialista. Deixo reflectido em síntese neste portfolio parte da minha caminhada pela viagem da vida, nomeadamente algumas etapas da infância, da adolescência e enquanto adulto; o que aprendi, o que descobri, o que senti e o que vivenciei. Parte do aqui escrevo tem por objectivo responder às exigências do programa a que me submeti para a aquisição de novas aprendizagens, o que ficará reflectido a partir do final desta introdução. 1- A MINHA INFÂNCIA Até 1970, vivi num recanto que considero paradisíaco, mais precisamente Vila Velha de Ulongué, vila esta situada no distrito de Angónia, uma localidade pacata a Noroeste de Moçambique, mais precisamente na província de Tete (antigo distrito; visto Moçambique ser uma Província Ultramarina). Caracterizada por um microclima, encontramo-nos na zona mais ocidental de Moçambique, muito verdejante e onde tudo o que se cultivava dava os seus frutos. Campos enormes de longo verdejante, espairecendo até aos sopés das montanhas que envolviam a vila como se fosse um abraço da mãe natureza. Por motivos logísticos, e como o meu pai era veterinário e tinha que se deslocar frequentemente por várias zonas da província (distrito), quando fiz os meus seis anos, fui morar para a Vila Nova, capital de distrito, que se localizava sensivelmente a 10km da vila onde nasci, distância esta percorrida por caminhos ermos, rodeados por florestas de árvores enormes, onde nas suas copas se podiam observar algumas das mais belas criaturas da natureza, nomeadamante babuinos, primatas da família dos símios. Desta fase da minha infância, recordo-me das várias vezes que me deslocava, junto dos meus pais e de um de meus irmãos (o do meio), às quintas circundantes, onde se podiam observar as suas belas terras, umas
  • 3. cultivadas outras de pasto e onde também se podiam observar algumas manadas de gado bovino que pastavam nesses prados. Era lindo! Acompanhava também muitas vezes o meu pai quando ele se deslocava para os tanques que existiam na zona, para os chamados banhos carracícidas do gado bovino. Recordo-me das vezes que ficava com ele a contabilizar o número de animais existentes nas variadas manadas. Aqui aprendi os primeiros números, enquanto em conjunto com o meu pai contava os que perfilavam por entre dois muros que os encaminhavam para o respectivo tanque de banhos. Em 1971, chegada a hora da entrada para o ensino primário, os meus pais matricularam-me na escola primária de Vila Nova, onde frequentei a pré-primária. 1972, a primeira das mudanças radicais na minha vida, pois fui morar para a capital do distrito, cidade de Tete, onde continuei os meus estudos até ao liceu e onde conclui o Curso Geral dos Liceus, o actual 9º ano. 2- A MINHA ADOLESCÊNCIA Enquanto Ser, amigo da natureza e também aliado à curiosidade, vários factores fizeram com que despertasse um indicador de que mais tarde seria a minha directriz para um sonho que nunca se tornou realidade, pois o voo das cegonhas pelos céus em redor da minha casa, ainda quando morava na Vila Velha, “aguçavam-me o apetite” para algo que na altura me era de todo desconhecido, o ser um dia piloto de linha aérea. Enquanto aluno primário, fui adquirindo conhecimentos, naturalmente virados para o ensino regular e pouco mais se fazia senão estudar, brincar e algumas saidas para aqui e acolá, sempre na companhia dos meus pais. Entretanto, o tempo foi passando e eis que chega a altura da entrada no liceu, transição que coincide precisamente com o fim da ocupação colonial de que eu na altura não fazia ideia do que era. Até à data e tudo o que tinha aprendido era de que Moçambique seria uma Província Ultramarina de Portugal. 1975, é declarada a independência de Moçambique, o que foi de facto uma enorme confusão para mim, pois ouvia falar de terroristas, de malandros que andavam pelas matas e que, de vez em quando, atacavam os brancos que viviam em propriedades nas zonas mais remotas da provínica,
  • 4. longe das cidades capitais, e que eram vítimas da barbariedade criminal, o que para mim não fazia sentido, pois até à independência nunca havia sofrido nenhum “encontro imediato” com quem quer seja que lutava pela ocupação colonial; ironia do destino. Com o desenrolar dos tempos e, com a entrada do novo governo, criaram-se novas estruturas de ensino, assente numa ideologia pro-socialista. Fui adquirindo novos conhecimentos sobre a realidade da colonização. Começo por perceber, de facto, o que era o passado e o que seria o presente, restando-me por descobrir o futuro. Entretanto, nos tempos disponíveis e principalmente nas férias, o meu pai, pessoalmente muito conhecido de várias entidades, não só governamentais, como mesmo a nível social, por exemplo pelos comerciantes da cidade, preocupava-se em arranjar, sempre que possível, uma ocupação para os filhos nas épocas de interrupção das aulas. Umas vezes lá ia eu para uma oficina reparadora de automóveis, outras de electrodmésticos, outras ainda para oficinas de reparação de rádios, onde, em todas estas áreas, pude adquirir novos conhecimentos e aprendizagens. Nos meus tempos de ócio, fazia caminhadas com os meus amigos da altura pelas matas e montanhas circundantes, andávamos nós felizes e contentes, pois podíamos assim passar bons momentos de contacto com a fauna e flora existente nessas zonas. As épocas das férias grandes (o período de férias maior do ano) eram geralmente preenchidas com viagens e também visitas de estudo, não pela escola, mas sim a título particular, pois, o meu pai era o meu guia e levava- me a conhecer cidades e localidades que me eram desconhecidas até então, tendo assim oportunidade de ficar a conhecer um dos maiores ex-líbris da engenharia portuguesa em Moçambique e para o mundo, a barragem de Cahora Bassa. Por vezes, também fazíamos férias nos países vizinhos como o Malawi e Zimbabwe. Eis então chegados a 1976, ano em que surgem os primeiros indícios de desestabilização pós-independência em Moçambique, cujo desenvolvimento atinge a forma de uma guerra civil alargada a todo o país, sobretudo na década de 80, opondo a FRELIMO – Frente de Libertação de Moçambique e a RENAMO - Resistência Nacional de Moçambique. A desestabilização
  • 5. provocada por estes conflitos internos é agravada por agressões militares que a Rodésia (país vizinho) faz a Moçambique, tendo como justificação o apoio que o governo Moçambicano dava aos guerrilheiros que lutavam contra a ocupação branca. É de se considerar este tipo de referência visto a Rodésia nesta altura já não ser colónia britânica, apesar do domínio governamental continuar a ser maioritariamente branco, pois era governado por um nacionalista de nome Douglas Ian Smith, primeiro-ministro, que houvera declarado nem relação à coroa britânica unilateralmente a independência em 11 de Novembro de 1965 ficando no governo até 1 de Junho de 1979, data da segunda independência, declarada pelos considerados os verdadeiros nacionalistas. Neste interregno, o meu irmão do meio completava os 18 anos de idade, o que se tornou um caso sério para a estabilidade emocional da minha família, tendo os meus pais que envia-lo para Portugal, visto o mesmo andar a ser seguido pelas autoridades locais no sentido de o alistar nas forças armadas de Moçambique para posteriormente ser enviado para o combate que se desenrolava entre as tropas governamentais e a RENAMO. Apenas em 1992, com a assinatura do ‘Acordo Geral de Paz’ entre a FRELIMO e a RENAMO, cessam as hostilidades e inicia-se um processo de reconciliação. Apesar deste “clima” de destabilização, lá se ia vivendo com mais ou menos receio de que algo de mal nos pudesse acontecer. Em 1984 desloco-me mais a minha família definitivamente para Portugal. Esta mudança é um novo traçado na caminhada da minha vida. Novas aventuras e novas aprendizagens, voltam a cruzar-se no meu percurso de vida. 3- A MINHA VIDA ADULTA Em Portugal, sinto-me deslocado no tempo e no espaço, apesar de que, de quando em vez, eu visitado o mesmo em épocas de férias, mas pesava aqui o facto das minhas raízes se encontrarem a milhares de quilómetros. Um dos meus objectivos foi sempre o de continuar os estudos, mas a realidade da vida assim não o permitiu.
  • 6. Com o meu pai já com alguma idade, aposentado e ainda com dois filhos para apoiar no seu crescimento como Homens, a vida torna-se um pouco complicada para ele, pois era o único com rendimentos sustentáveis e sobre o qual pesava a responsabilidade do sustento da família, composta por um agregado de quatro elementos. Com o sentido de responsabilidade apurado tive que arregaçar as mangas e tentar entrar para o mercado de trabalho com o objectivo e espírito de entreajuda, o que consegui com alguma facilidade; mais uma vez valeram os conhecimentos do meu pai. Vindo eu de África e já com alguns conhecimentos de mecânica auto adquiridos na época de férias, consigo emprego num concessionário automóvel com a designação de Auto Monumental do Areeiro, onde fico a trabalhar no departamento de Tuneup (preparação e afinação de veículos de competição) durante aproximadamente dois anos e meio, altura em que sou chamado para o cumprimento do Serviço Militar Obrigatório - finais de 1987. Faço a recruta em Elvas onde em simultâneo e através do exército tiro a carta de pesados com reboque, o que era uma mais-valia para mim, pois dava muito valor a tudo o que conseguia obter e considerava-o como um troféu pelo esforço e empenho dedicado. Depois de terminada a recruta, sou transferido para Santa Margarida, onde sita o Agrupamento Base, o maior centro de aquartelamentos do país. Sou destacado para a 1ª BMI (Brigada Mista Independente), onde cumpro 18 meses de serviço militar e de onde saio com o devido reconhecimento pelos meus préstimos como militar, pela ordem e disciplina, juntando assim ao meu curriculum um diploma de louvor (um dos quatro militares premiados de entre os 400 do batalhão). Estamos no primeiro trimestre de 1989, mais uma página passada, novos desafios se advinham. Depois do cumprimento do serviço militar, eis que torno ao mercado de trabalho, e como já possuía licença de condução para pesados com reboque, e enquanto estava à espera de ser chamado para um concessionário Citroen, empresa para a qual concorri para o lugar de recepcionista, consigo emprego temporário numa empresa de distribuição de combustível em bombas de abastecimento para automóveis. Permaneço dois/três meses. Aqui, adquiro
  • 7. novos conhecimentos de formas e técnicas para o abastecimento, inclusive regras de segurança para o procedimento de descarga. Próximo do terceiro trimestre do ano de 1998, eis que sou chamado pela empresa concessionária de automóveis da marca Citroen, para a qual concorri, onde sou admitido e aí permaneço sensivelmente 10 anos. Faço pela empresa várias formações, como a de recepcionista e mais tarde a de escriturário, tempos que me ficaram na memória gravados como uma fase positiva da minha vida. Eis que quando estou no “auge” digamos assim, de uma vida estável, começa a manifestar-se, entretanto, a patologia de padeço (neuro-muscular), e que me vai marcando ao longo dos tempos através de alguma mobilidade reduzida. Em 1999, nova reviravolta; a firma onde trabalho declara insolvência, tendo eu que regressar ao mercado de emprego. Desta feita e ponderando já um certo grau de incapacidade que possuía, e também no meu futuro, consigo emprego numa clínica de diagnóstico como escriturário, da qual faço parte dos quadros efectivos. Entretanto, com o agravar da minha situação de saúde e visto ter iniciado um processo de baixa por incapacidade temporária, eis que traço um novo objectivo, o de continuar os estudos e para já, tendo como meta a conclusão do 12º ano, com a complementaridade de um curso técnico, podendo assim preencher com este feito mais uma página e um capítulo do livro da minha vida. 14 de Setembro de 2009, o virar da página para o início do tão desejado destino. Matriculado na ESS (Escola Secundária de Sampaio) em Sesimbra, eis- me na presença de mais uma aventura para um somatório de novos conhecimentos e aprendizagens…