2. Capítulo V
Questão de Método
Relembrando:
a etnometodologia é a ciência dos
etnométodos, isto é, o estudo de
como as pessoas constroem os
sentidos de suas ações, daquilo que
garfinkel denomina “raciocínio
sociológico prático”.
3. 1. A postura de “indiferença
etnometodológica”
“Os estudos etnometodológicos sobre as
estruturas formais se destinam ao estudo de
fenômenos como, por exemplo, suas descrições
pelos membros, quaisquer que sejam, abstendo-
se de todo juízo sobre a sua pertinência, seu
valor, sua importância, sua necessidade, sua
“praticalidade”, seu sucesso ou consequência.
Damos a esse modo de proceder o nome de
“indiferença metodológica”. (...) A nossa
indiferença se refere sobretudo ao conjunto
do raciocínio sociológico prático, e esse
raciocínio implica inevitavelmente para nós,
sejam quais forem as suas formas, o domínio da
linguagem natural.(...)” (Garfinkel e SAcks Apud Coulon, p. 82)
4. 2. A provocação
experimental (p. 82,83)
Trust (Confiança) - necessidade de uma
ordem moral como garantia para o bom êxito
das interações;
Breaching (desarrumação) - rupturas
experimentais em jogos de sociedade para
mostrar o pano-de-fundo moral das
atividades comuns;
Crítica aos métodos da sociologia
tradicional, especialmente os quantitativos
5. 3. A contribuição
metodológica de Cicourel
1964, Method and Measurement in Sociology: (p. 83,84,85)
O sociólogo deve esclarecer, primeiramente, a
linguagem que utiliza;
A pesquisa exige uma teoria da instrumentação e uma
teoria dos dados, de modo a distingui-los;
Os fatos da ação social devem ser clarificados antes de
impor-lhes postulados de medida inadequados;
A imposição de procedimentos numéricos exteriores
tanto ao mundo social observável descrito como às
conceitualizações baseadas nessas descrições é
equivocada;
Os sociólogos não atribuem suficiente importância ao
estudo das variáveis subjetivas que contribuem para o
caráter contingente da vida cotidiana;
6. 4. Etnometodologia, etnografia
constitutiva e sociologia qualitativa
Como não produziram uma tecnologia original,
os etnometodólogos usam instrumentos de
pesquisa que tomam emprestados da
etnografia.
A) A etnografia constitutiva (Hugh Mehan);
B) O tracking (Don Zimmerman);
7. A) etnografia constitutiva
Hipótese interacionista - as estruturas sociais são
construções sociais;
Estudo das atividades estruturantes que constroem
os fatos sociais objetivos;
Disponibilidade dos dados consultáveis;
Exaustividade do tratamento dos dados; convergência
entre pesquisadores e participantes sobre a visão
dos acontecimentos; Análise interacional;
Reconhecimento do caráter contextual de todo fato
social;
Abandono das “hipóteses-de-antes-da-ida-ao-campo”;
Descrição - descrever o que os membros fazem,
mostrando os meios que utilizam para organizar sua
vida social em comum;
8. b) tracking (espreita)
“seguir a pista de alguém, caminhar seguindo os
vestígios de alguém.”(Zimmerman apud Coulon, p. 89)
Para se situar como um indivíduo da coletividade, o
pesquisador precisa considerar suas próprias
implicações na estratégia de pesquisa;
Deve compartilhar com os membros uma linguagem
comum, para evitar erros de interpretação; Situar as
descrições dos membros em seu contexto e
considerar seus relatos como instruções de
pesquisa;
Deve ter uma estratégia de ingresso e aplicar um
dispositivo de observação e pesquisa, descrevendo os
acontecimentos repetitivos e as atividades que
constituem as rotinas dos grupos estudados;
9. A etnometodologia é uma
doutrina construtivista que
defende que o segredo da
aglutinação social não reside
nas estatísticas produzidas por
peritos, mas que se desvela, ao
contrário, pela análise dos
etnométodos, isto é, dos
procedimentos que os membros
de uma forma social usam para
produzir e reconhecer seu
mundo, para torná-lo familiar,
aglutinando-o. (p. 92)
10. Capítulo VI
O trabalho de campo
“Todas as teses defendidas na corrente
etnometodológica têm como objeto um
problema social e como demarche a abordagem
qualitativa de campo, segundo procedimentos
geralmente tomados de empréstimo à
etnografia. (...) para cada domínio estudado, os
etnometodólogos põem ênfase nas atividades
interacionais que constituem os fatos sociais.
Os fatos sociais não são coisas, mas
realizações práticas (...)” (p. 93)
educação, sistema judiciário, práticas médicas,
processos organizacionais, pesquisa científica
11. 1. A educação
A) As interações na sala de aula - a aula é uma
organização social, decorrente de uma ordem
instituída. É o trabalho de interação entre
professores e alunos que produz esta organização.
Um aluno competente será aquele capaz de
sintetizar entre o conteúdo acadêmico e as formas
interacionais necessárias para realizar uma
tarefa.
B) Os testes e os exames - A interpretação das
questões de um teste varia entre os aplicadores e
os respondentes. Tratar os resultados de testes
como objetivos dissimula o modo como o aluno
elabora suas respostas, o que é fundamental para
compreender seu raciocínio. A discrepância na
interpretação mascara o conhecimento do aluno.
12. 1. A educação
C) Os orientadores escolares - Cicourel e Kitsuse
mostraram como decisões arbitrárias, com base no
racismo e em preconceitos sócio-econômicos ligados
às suas representações, podiam ser tomadas pelos
orientadores a propósito da passagem para o ensino
superior (seleção social).
D) A profissão de estudante - Para tornar-se
membro, um estudante faz uso de práticas de
filiação a fim de se agregar ao novo grupo,
mostrando-se competente quando consegue
categorizar o mundo da mesma forma que a
comunidade universitária.
13. 2. A delinquência Juvenil
A delinquência juvenil, enquanto fenômeno
social, constitui o objeto de uma construção
social.
As ações dos jovens são documentadas por
policiais, juízes e até pesquisadores e
usadas como evidência para caracterizar
atividades ou comportamentos como ilegais,
perigosos ou suspeitos.
Os futuros comportamentos desses jovens
serão interpretados em função desse
rótulo, confirmando o diagnóstico inicial.
14. 3. A vida de laboratório
A abordagem etnometodológica renova a
problemática da sociologia da ciência.
As descobertas científicas são feitas no
decorrer de uma ordem série de observações
historicizadas, feitas em tempo real e em
uma ordem precisa.
O trabalho científico é objeto de uma
construção localizada; A ciência é uma ação
prática.
Essas práticas são “naturalizadas” no
discurso científico.
15. 4. A burocracia
Teoria moderna da burocracia - Max Weber: a
Administração Pública estabelece sua
função em cima de provas objetivas;
Mas o que confere a uma folha de papel
validade oficial?
Há uma constante negociação para julgar a
validade dos despachos, um efeito recíproco
entre as rotinas e os obstáculos. O caráter
“evidente” de um documento depende da
representação de mundo feita entre o
funcionário e o cliente.
16. Capítulo VI
Críticas e convergências
O caráter radical da etnometodologia não
poderia deixar de lhe atrair a hostilidade da
sociologia estabelecida.
Guerra! - 1968, J.S. Coleman: American
Sociological Review aos Studies. Ápice -
1975, Lewis Coser, Associação Americana de
Sociologia.
17. 1. Um ataque violento
Coser, Congresso de 1975 da AAS: “duas
tendências põem em perigo a Sociologia
americana: a análise quantitativa e a
etnometodologia.” (p. 116)
acusações: a etnometodologia é linguística
demais, psicológica demais, descreve demais
a partir dos sujeitos pesquisados, não é
objetiva, encerra os sujeitos em seu
universo de significações privado, é sectária
e ocupa-se de problemas por demais triviais,
“que excluem os domínios que a sociologia
costuma explorar desde Augusto Comte.” (p.119)
18. 2. Um contra-senso
Réplica de Zimmerman no ano seguinte:
Coser não apresenta nenhuma razão séria para
fazer crer que a sociologia americana esteja em
crise;
É leviano ao afirmar que os objetos da
etnometodologia são trivialidades: “Não cabe a
uma autoridade incerta legislar sobre aquilo que
convém estudar no mundo social.” (p. 121)
Coser não compreendeu a etnometodologia -
redução etnometodológica - “insinua-se que a
etnometodologia aborda essas descrições como se
constituíssem a própria realidade social, isto é
um contra-senso, (...) são traços constitutivos
dos quadros em que são produzidas”.
19. 3. Uma seita?
“A etnometodologia é um movimento intelectual que,
como os outros, nasce na obscuridade e acaba sendo
conhecido por um público mais amplo.”(p. 122)
“A despeito do pretendo esoterismo de sua linguagem,
ela produziu, no decorrer destes últimos anos, diversas
compilações que lhe asseguraram a difusão dos
trabalhos.” (p. 122)
“Nas ciências sociais, a verdade não é revelada, mas
argumentada.” (p. 123)
Ignorar o “mundo real”? (p. 123)
“A etnometodologia, através da análise das atividades
humanas, procura estudar os fenômenos sociais
incorporados em nossos discursos e em nossas ações.” (p.
124)
Desnudar as práticas que estruturam a vida cotidiana -
pela revelação dessas estruturas sociais, os atores
podem decidir mudá-las. (p. 124)
20. 4. Tentativa de síntese
Pierre Bourdieu, 1986, conferência na UC San Diego
- “A ciência social oscila entre duas posições
aparentemente inconciliáveis, o objetivismo e o
subjetivismo” (constructivist structuralism,
structuralist constructivism).
“(...) de um lado, as estruturas objetivas que o
sociólogo constrói no momento objetivista,
descartando as representações subjetivas dos
agentes, são o fundamento das representações
subjetivas e elas constituem as leis estruturais que
pesam sobre as interações; mas, de outro lado, essas
representações devem também ser levadas em conta,
caso se queira compreender em particular as lutas
cotidianas, individuais ou coletivas, que visam
transformar ou conservar essas estruturas.” (Bourdieu apud
coulon, p. 126)
21. 5. Marxismo e
etnometodologia
Tentativas de aproximação (Mehan e Wood,
Zimmerman, Chua, Castoriadis)
etnometodologia - prática de desmistificação e
desobjetivação das categorias reificadas da “atitude
natural”
Marx e Garfinkel - construção permanente da
sociedade por si mesma; esquecimento dessa
construção
Crítica de Sartre ao “Fetichismo da totalidade” de
Kurt Lewin
Castoriadis - sociedade instituinte X sociedade
instituída
Queré - “trabalho de instituição”
22. Conclusão
“A realidade objetiva dos fatos sociais,
enquanto toda a sociedade é produzida
localmente, naturalmente organizada e
reflexivamente descritível, é uma realização
contínua e prática, enquanto esta realidade
objetiva é em toda parte, sempre, apenas, exata
e inteiramente o trabalho dos membros,
constitui o fenômeno fundamental da
sociologia”. (Garfinkel apud coulon, p. 130)
“... a realidade objetiva dos fatos sociais é o
princípio fundamental da sociologia.”
durkheim apud coulon, p. 129