1) O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul concedeu provimento à apelação do autor e julgou parcialmente procedente a ação de indenização por danos morais contra a Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre.
2) A Câmara interpôs Recurso Especial alegando ofensa à súmula 372 do STJ e aos artigos 333 e 535 do CPC.
3) O STJ negou seguimento ao recurso, afirmando que não cabe apreciar ofensa a súmula em sede
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AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 118.179 - RS (2011/0275859-7)
RELATOR : MINISTRO SIDNEI BENETI
AGRAVANTE : CÂMARA DE DIRIGENTES LOJISTAS DE PORTO
ALEGRE CDL
ADVOGADO : LAURA FIGUEIRÓ FERNANDES E OUTRO(S)
AGRAVADO : EDUARDO SILVEIRA PEREIRA
ADVOGADO : LISANDRO GULARTE MORAES E OUTRO(S)
DECISÃO
1.- CÂMARA DE DIRIGENTES LOJISTAS DE PORTO ALEGRE
interpõe Agravo contra Decisão que negou seguimento a Recurso Especial,
fundamentado na alínea a do inciso III do artigo 105 do permissivo constitucional,
interposto contra Acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que lhe foi
desfavorável (Rel. Des. PAULO ROBERTO LESSA FRANZ), assim ementado:
AGRAVO INTERNO. DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU
PROVIMENTO À APELAÇÃO.
Não desmerecida pelas razões deduzidas no agravo interno,
subsiste a decisão que deu provimento à apelação, em
conformidade com o art. 557, caput, do Código de Processo
Civil.
RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO COMINATÓRIA
CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS.
SISTEMA “CREDISCORE”. NATUREZA. BANCO DE DADOS.
SUJEIÇÃO ÀS DISPOSIÇÕES CONSTANTES DO ART. 43 DO
CDC. A elaboração, organização, consulta e manutenção de
bancos de dados sobre consumidores não é proibida pelo
Código de Defesa do Consumidor; ao contrário, é regulada por
este, no art. 43. Hipótese em que o denominado Sistema
Crediscre, colocado à disposição das empresas conveniadas
pela CDL, caracteriza-se como um verdadeiro banco de dados
de hábitos de consumo e pagamento dos consumidores, sujeito,
portanto, às disposições do art. 43 do CDC.
DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. Comprovado o agir ilícito
da demandada, que criou banco de dados com informações
pessoais do autor, sem a devida publicização, inviabilizando os
direitos de amplo acesso às informações pessoais do
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consumidor e de reclamar por eventuais ilegalidades ou
incorreções (art. 43, caput e §3º), gerando, inclusive, provável
restrição de crédito, diante do escore desfavorável,
caracterizado está o dano in re ipsa, exsurgindo, daí, o dever de
indenizar.
QUANTUM INDENIZATÓRIO. ARBITRAMENTO. É cediço
que, na fixação da reparação por dano extrapatrimonial,
incumbe ao julgador, atentando, sobretudo, para as condições
do ofensor, do ofendido e do bem jurídico lesado, e aos
princípios da proporcionalidade e razoabilidade, arbitrar
quantum que se preste à suficiente recomposição dos prejuízos,
sem importar, contudo, enriquecimento sem causa da vítima. Ao
concreto, demonstrada a ilicitude do ato praticado pela ré, e
sopesadas as demais particularidades do caso, entendo
adequada a fixação da verba indenizatória em R$ 10.000,00
(dez mil reais), que deverá ser corrigida monetariamente pelo
IGP-M e acrescida de juros legais, a contar desta decisão.
Sucumbência invertida.
APELAÇÃO PROVIDA. AÇÃO JULGADA PARCIALMENTE
PROCEDENTE.
AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
2.- No caso em exame, o Agravado/autor ajuizou Ação de indenização
por danos morais decorrentes de inscrição em cadastro de risco de operações de
concessão de crédito, julgada improcedente em primeira instância.
O Colegiado estadual, em 26.05.2011, deu provimento à Apelação
interposta pelo Agravado, julgando parcialmente procedente o feito para condenar a
Agravante ao pagamento de indenização por danos morais, arbitrada em R$ 10.000,00
(dez mil reais), corrigido monetariamente pelo IGP-M e acrescido de juros de mora de
12% ao ano.
3.- Nas razões do Recurso Especial alega ofensa à Súmula 372 desta
Corte e aos artigos 333, I e 535 do Código de Processo Civil.
Assevera, em síntese, que os danos morais não restaram comprovados,
pugnando pela redução da verba indenizatória e pela exclusão da multa cominatória
para exibição de documentos.
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3. Superior Tribunal de Justiça
É o relatório.
4.- A irresignação não merece prosperar.
5.- De início, no que se refere à ofensa ao enunciado da Súmula 372
desta Corte, não caberia a este Tribunal apreciá-la em sede de Recurso Especial, uma
vez que o enunciado de súmula não se insere no conceito de lei federal, previsto no
artigo 105, II, a, da Constituição Federal.
Confiram-se, a propósito, os seguintes julgados de casos análogos:
PROCESSUAL CIVIL - RECURSO ESPECIAL - DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL - INOBSERVÂNCIA DAS EXIGÊNCIAS
LEGAIS E REGIMENTAIS - VIOLAÇÃO DE SÚMULA, DE LEI
LOCAL E DE DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL:
DESCABIMENTO DO ESPECIAL - FUNDAMENTOS
SUFICIENTES PARA MANTER O ACÓRDÃO RECORRIDO
NÃO IMPUGNADOS: SÚMULA 283/STF - EXECUÇÃO DE
SENTENÇA - PRESCRIÇÃO - SÚMULA 150/STF.
1. A ausência de cotejo analítico, bem como de similitude das
circunstâncias fáticas e do direito aplicado nos acórdãos
recorrido e paradigmas, impede o conhecimento do recurso
especial pela hipótese da alínea "c" do permissivo
constitucional.
2. Descabe ao STJ apreciar, em sede de recurso especial:
violação a súmula, a lei local e a dispositivo constitucional, ante
os precisos termos do art. 105, III, da CF/88.
3. Ausente a impugnação aos fundamentos suficientes para
manter o acórdão recorrido, o recurso especial não merece ser
conhecido, por lhe faltar interesse recursal.
4. A ação de execução prescreve no mesmo prazo da ação de
conhecimento, nos termos da Súmula 150/STF.
5. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, não
provido.
(REsp 1064046/SP, Rel. Min. ELIANA CALMON, SEGUNDA
TURMA, DJe 03/09/2009);
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO
DE INSTRUMENTO. ART. 461 DO CPC. MULTA. VALOR.
POSSIBILIDADE DE REVISÃO. VIOLAÇÃO A SÚMULA.
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4. Superior Tribunal de Justiça
PREVISÃO INEXISTENTE. ARTIGO 105, III, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça pacificou-se
no sentido de que, em sede de recurso especial, só é admitida a
revisão do valor da multa cominatória na hipótese em que ele
tenha sido fixado em valor irrisório ou abusivo.
2. Enunciado de súmula não se enquadra no conceito de lei
federal para a finalidade prevista no artigo 105, III, "a", da
Constituição Federal.
3. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no Ag 1141484/PR, Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE
NORONHA, QUARTA TURMA, DJe 17/08/2009).
6.- Ademais, quanto à aplicação da multa para exibição de
documentos, constata-se que não há interesse recursal, uma vez que o Tribunal
estadual não condenou a Agravante a tal sanção.
7.- Com relação à suposta violação do artigo 535 do Código de
Processo Civil, nota-se não assistir razão à parte recorrente, tendo em vista que o
Tribunal Estadual expôs, fundamentadamente, as razões que levaram à conclusão do
julgado. Todas as questões postas a debate foram efetivamente decididas, não havendo
que se falar em omissão ou ausência de fundamentação nas decisões, não constando do
Acórdão embargado os defeitos previstos nos citados dispositivos do Estatuto
Processual Civil, mas decisão adversa à pretendida pela parte agravante.
8.- No que concerne à ofensa aos artigos 333, I, do CPC, analisando
os elementos probatórios acostados aos autos, o colegiado estadual concluiu:
Segundo a apelada, o Crediscore não consiste em cadastro
negativo ou positivo do consumidor, mas tão somente em
“ferramenta probabilística”, a fim de constatar, com base em
dados enviados pelas empresas associadas, se a pessoa é
confiável ou não, motivo pelo qual não haveria se falar em
incidência do art. 43 do CDC e, consequentemente, em direito à
prévia notificação e à informação do escore atribuído ao
consumidor e dos critérios utilizados.
Contudo, lhe não assiste razão.
Nos termos da notícia veiculada no jornal da Comarca de Ijuí
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5. Superior Tribunal de Justiça
“O Repórter”, na data de 22/07/09 “o Crediscore tem algumas
características, dentre as quais, de analisar 400 variáveis
comportamentais, bem como analisar o comportamento do
cliente na empresa e no mercado, além de utilizar a base
histórica do SPC e do SPCheque Garantido”, classificando “o
consumidor numa escala que vai de 0 a 100, o que representa
uma estimativa de risco do consumidor tornar-se inadimplente
na empresa”, sendo que “quanto maior o escore, maior o risco”
(fl. 100) [grifei].
Segundo Bruno Miragem, os arquivos de consumo, dos quais são
espécies os bancos de dados e os cadastros de fornecedores,
todos sujeitos às disposições do art. 43 do CDC, “têm como
característica comuns [...] o fato de armazenarem informações
sobre terceiros para uso em operações de consumo”.
Não restam dúvidas, portanto, de que o Sistema Crediscore
caracteriza-se como um verdadeiro “banco de dados sobre
endividamento (hábitos de consumo e pagamento) dos
consumidores”, nos dizeres de Claudia Lima Marques, Antônio
Herman V. Benjamin e Bruno Miragem, alimentado por dados
inclusos pelos associados, dados “históricos” do SPC
“armazenados em 10 anos” e do SPCheque Garantido, além
dos dados comportamentais do cliente, verificados em
operações anteriores e colocado à disposição das empresas
associadas, para uso em operações comerciais, mediante a
realização de escores dos pretensos clientes, razão pela qual
está sujeito às disposições previstas no art. 43 do CDC.
(...)
Veja-se, portanto, que o direito às informações pessoais
relativas ao consumidor incluídas em arquivos de consumo
independe do uso a que se destinam, se privado, público ou
mesmo de uso pessoal do comerciante, não encontrando guarida
a tese da ré de que não permite o acesso do demandante aos
dados do Crediscore, porque o referido sistema não se enquadra
no conceito de banco de dados de consumidores, tratando-se tão
somente de uma mera ferramenta probabilística disponibilizada
às empresas associadas.
Especificamente, sobre a incidência do CDC aos cadastros de
comportamentos dos consumidores, Claudia Lima Marque,
Antônio Herman V. Benjamin e Bruno Miragem alertam que
“Quanto aos bancos de dados sobre endividamento (hábitos de
consumo e pagamento) dos consumidores, são estes também de
vários tipos, hoje potencializados com a internet, a tecnologia
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6. Superior Tribunal de Justiça
de redes de intranet, de grupos de discussão etc., mas a todos
devemos aplicar as regras do CDC.” [grifei].
E necessário consignar que não se está aqui a discutir a
possibilidade ou não de utilização do Sistema Crediscore, mas
tão somente a forma como está sendo usado, ao arrepio do
Código de Defesa do Consumidor. Isso porque, no momento em
que a CDL procede à análise de informações concernentes à
pessoa do consumidor, constantes de sua base de dados, para
chegar a um prognóstico, sem permitir a este acesso às
informações utilizadas e, sobretudo, ao escore a que lhe foi
atribuído, ainda que o resultado não vincule diretamente a
posição a ser tomada pelo estabelecimento conveniado, está
infringindo não só o direito ao amplo acesso às informações
pessoais do consumidor incluídas em bancos de dados (art. 43,
caput), mas também o direito de reclamar por eventuais
incorreções e ilegalidades dos apontamentos (§3º), tratando-se,
na realidade, de um verdadeiro sistema oculto de informações.
(...)
Flagrante, portanto, a ilegalidade da abertura e manutenção de
informações relativas ao autor no Sistema Crediscore, pois em
desacordo com os ditames previstos nos arts. 39, VII, e 43, caput
e §§1º e 3º, do CDC.
(...)
Evidenciado, portanto, o agir ilícito da demandada, que criou
banco de dados com informações pessoais do autor, sem a
devida publicização, inviabilizando os direitos de amplo acesso
às informações concernentes à pessoa do consumidor e de
reclamar por eventuais ilegalidades ou incorreções, gerando,
inclusive, provável restrição de crédito, diante do escore
desfavorável, caracterizado está o dano in re ipsa, o qual se
presume, conforme as mais elementares regras da experiência
comum, prescindindo de prova quanto à ocorrência de prejuízo
concreto, exsurgindo, daí, o dever de indenizar.
9.- Diante disso, verifica-se que ultrapassar os fundamentos do
Acórdão e acolher a tese sustentada pela Agravante, demandariam, inevitavelmente, o
reexame de provas, incidindo o óbice da Súmula 7/STJ.
10.- No que se refere ao pleito de redução da verba indenizatória, não
obstante o grau de subjetivismo que envolve o tema da fixação da indenização, uma
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vez que não existem critérios determinados e fixos para a quantificação do dano moral,
reiteradamente tem-se pronunciado esta Corte no sentido de que a reparação do dano
deve ser fixada em montante que desestimule o ofensor a repetir a falta, sem constituir,
de outro lado, enriquecimento indevido.
Com a apreciação reiterada de casos semelhantes, concluiu-se que a
intervenção desta Corte ficaria limitada aos casos em que o quantum fosse irrisório ou
exagerado, diante do quadro fático delimitado em primeiro e segundo graus de
jurisdição (AgRg no Ag 599.518/SP, Rel. Min. VASCO DELLA GIUSTINA, DJe
28/04/2009; REsp 1101213/RJ, Rel. Min. CASTRO MEIRA, DJe 27/04/2009; REsp
971.976/RN, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe 22/04/2009; EDcl no REsp 351.178/SP, Rel.
Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, DJe 23/03/2009; REsp 401.358/PB, Rel. Min.
CARLOS FERNANDO MATHIAS, DJe 16/03/2009).
11.- Tratando-se de dano moral, cada caso, consideradas as
circunstâncias do fato, as condições do ofensor e do ofendido, a forma e o tipo de
ofensa, bem como suas repercussões no mundo interior e exterior da vítima, cada caso,
repita-se, reveste-se de características que lhe são próprias, o que o faz distinto de
outros. Assim, ainda que, objetivamente, os casos sejam bastante assemelhados, no
aspecto subjetivo são sempre diferentes. Por isso, é muito difícil, nessas situações,
apreciar-se um recurso especial com fundamento na alínea c do permissivo
constitucional. É em razão dessa complexidade que, na 2ª Seção, firmou-se a
orientação de não mais se conhecer de embargos de divergência quando a discrepância
residir em disparidade de valores, em condenações por dano moral, por fatos
objetivamente, na aparência, iguais.
Daí, a dificuldade intransponível de se alterar, em âmbito de Recurso
Especial, a quantificação fixada no Tribunal de origem, a título de reparação. Em
consequência, a 3ª Turma deste Tribunal assentou o entendimento de que somente se
conhece da matéria atinente aos valores fixados pelos Tribunais recorridos quando o
valor for teratológico, isto é, de tal forma elevado que se considere ostensivamente
exorbitante, ou a tal ponto ínfimo, que, em si, objetivamente deponha contra a
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dignidade do ofendido.
Não é o caso dos autos, em que houve a fixação do valor de
indenização por dano moral, em R$ 10.000,00 (dez mil reais), em 26.05.2011, para o
dano consistente na utilização e negativa de acesso aos dados pessoais do Agravado
para formação de cadastro de risco de concessão de crédito ao consumidor,
consideradas as circunstâncias do caso e as condições econômicas das partes.
Assim, não obstante os argumentos apresentados pela parte
Agravante, não se vislumbra, em face da quantia afinal fixada pelo Acórdão recorrido,
razão para provocar a intervenção desta Corte.
12.- Ante o exposto, nos termos do art. 544, § 4º, II, a, do CPC,
nega-se provimento ao Agravo.
Intimem-se.
Brasília (DF), 14 de fevereiro de 2012.
Ministro SIDNEI BENETI
Relator
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