1) O documento descreve os impactos da formação de uma usina hidrelétrica no Cerrado brasileiro, incluindo a insularização do habitat e mudanças na comunidade de lagartos.
2) Espécies de lagartos grandes e dependentes da velocidade para escapar de predadores declinaram, enquanto espécies menores e discretas se tornaram mais abundantes nas ilhas.
3) A seleção natural parece ter favorecido características como pequeno porte, camuflagem e defesas que permitiram algumas espécies
1. Insularização do Cerrado e
Mudanças na Comunidade de
Lagartos na UHE de Serra da
Mesa, Minaçu, GO
Reuber Albuquerque Brandão
Depto. Eng. Florestal
Universidade de Brasília
Foto da Ilha 38 a partir da Ilha 35
2. Apresentação elaborada para a disciplina Manejo de Fauna, do curso de
graduação em Engenharia Florestal, Universidade de Brasília, com
modificações.
Esta apresentação baseia-se nos resultados da Tese de Doutorado
“Monitoramento de Populações de Lagartos no AHE Serra da Mesa,
Minaçu, Goiás”, de Reuber Brandão, apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Ecologia da Universidade de Brasília em 2002.
Todas as fotos são de autoria de Reuber Brandão, exceto as indicadas ao
longo da apresentação.
O uso desta apresentação é vetado sem a autorização expressa de
Reuber Brandão.
3. Localização no
Estado de Goiás
– Serra da Mesa
é um relevante
acidente
geográfico do
estado de Goiás,
facilmente
perceptível
mesmo nesta
escala
4. • A OBRA DA USINA HIDROELÉTRICA DE SERRA DA MESA.
- Fechamento das comportas em Outubro de 1996.
- Início da Operação das turbinas em Março 1998.
- Área inundada de 178.400 ha.
- Lago com 13 setores e formação de 288 ilhas.
Vista do Setor 1 do Lago de Serra da Mesa, onde o
estudo foi conduzido.
5. - Altitudes variando entre 320 a 950 metros, com diversos
morros de altitudes intermediárias
- Alagamento ocorreu até a cota 460.
- Matas, veredas e brejos nos vales.
- Cerrado, campo sujo e cerradão nos topos de morro
(futuras ilhas).
- Quinto maior reservatório do Brasil em área inundada
- Maior reservatório do Brasil em volume de água
- Largura máxima: 10km
- Profundidade máxima: 180m
- Profundidade média: 50m
- Perímetro: 9.000km
6. Inundação, Perda de área e Formação das Ilhas
Vista da Ilha 34, antes do fechamento das
comportas. Notar rio no fundo do vale. Agosto de
1996.
Vista da Ilha 34, início do enchimento, com
primeiras árvores sendo engolidas pelas águas.
Outubro de 1996.
Vista da Ilha 34, três anos após a completa
formação do lago. Agosto de 2001.
7. Espécies de Lagartos que Permanecem em Fragmentos de Vegetação
e em Áreas de Usinas Hidroelétricas:
- São sempre as mais abundantes na região antes do impacto;
- São as espécies de maior porte;
- São as mais generalistas no uso de hábitat, usando inclusive ambientes antrópicos. No
caso dos Cerrados de Serra da Mesa, são os lagartos Ameiva ameiva e Tropidurus
oreadicus.
Ameiva ameiva. Foto: Guarino Colli. Tropidurus oreadicus
8. Foram monitorados oito sítios do setor 1 do lago de Serra da Mesa, os quais iriam se tornar
ilhas. No entanto, algumas delas não se isolaram no final do enchimento.
Morro Área (ha) Vegetação Grides
01 30 Cerrado 3
02 3 Cerradão 1
07 6,9 Pasto, 2
cerrado
23 25,6 Cerradão 5
34 3 Cerrado 1
35 9,4 Cerrado 3
41 6,9 Cerrado 3
42 5,6 Cerrado/ 3
cerradão
Setor 1 do Reservatório.
9. Espécies que declinaram durante o período de monitoramento com armadilhas de
queda (maio 1996 a fevereiro de 1999) eram as mais comuns nas comunidades.
25
Ameiva ameiva: r = -0,530; r2 = 0,281;
20
p = 0,035 (Foto: Guarino Colli).
15
Abundância
10
5
0
Jul/96 Set/96 Nov/96 Jan/97 Mar/97 Mai/97 Jul/97 Set/97 Nov/97 Jan/98 Mar/98 Mai/98 Jul/98 Set/98 Nov/98 Jan/99
Bimestres
40 Cnemidophorus ocellifer: r = -0,498;
r2 = 0,248; p = 0,050
30
Abundância
20
10
0
Jul/96 Set/96 Nov/96 Jan/97 Mar/97 Mai/97 Jul/97 Set/97 Nov/97 Jan/98 Mar/98 Mai/98 Jul/98 Set/98 Nov/98 Jan/99
Bimestres
25
Tropidurus oreadicus: r = -0,668;
20
r2 = 0,446; p= 0,005
15
Abundância
10
5
0
-5
Jul/96 Set/96 Nov/96 Jan/97 Mar/97 Mai/97 Jul/97 Set/97 Nov/97 Jan/98 Mar/98 Mai/98 Jul/98 Set/98 Nov/98 Jan/99
Bimestres
10. 100
90
80
70
60
Antes
Depois
50
40
30
20
10
0
C. ocellifer
T. oreadicus
A. meridionalis
T. montanus
A. chrysolepis
A. ameiva
M. maximiliani
G. amarali
nigropunctata
C. brachystoma
M. frenata
M.
Comparação da abundância das espécies de lagartos de Serra da Mesa entre os 12 primeiros
meses de amostragem e os 12 últimos meses, e todos os sítios. Notar a queda na abundância das
espécies mais comuns.
11. A. ameiva
Classificação baseada nos resíduos ajustados ao tamanho do membro posterior e a
C. ocellifer
variável tamanho isométrico (Size) para Espécies. Taxa de classificação: 87,26%. T. cf. montanus
T. oreadicus
A. chrysolepis
A. meridionalis
M. nigropunctata
0,2 M. frenata
G. geckoides
C. brachystoma
C. modesta
C. ocellata
M. maximiliani
0,1
Membro Posterior
0,0
-0,1
-0,2
7 8 9 10 11 12
Tamanho
12. Classificação baseada nos resíduos ajustados ao tamanho do membro posterior e a variável
tamanho isométrico (Size) para Famílias. Taxa de classificação: 94,85%. Tropiduridae
Teiidae
Polychrotidae
Gekkonidae
0,2 Gymnophtalmidae
Scincidae
0,1
Membro Posterior
0,0
-0,1
-0,2
6,5 7,0 7,5 8,0 8,5 9,0 9,5 10,0 10,5 11,0 11,5 12,0
Tamanho
13. Classificação baseada nos resíduos ajustados ao tamanho do membro posterior e a variável tamanho (Size)
para grupos. Grupo 1: Espécies grandes com membros longos que declinaram durante o estudo; Grupo
2: Espécies pequenas de membros curtos que aumentaram a abundância durante o estudo; Grupo 3: Grupo 1
Espécies arborícolas Grupo 2
0,2 Grupo 3
0,1
Membro posterior
0,0
-0,1
-0,2
6 8 10 12
Tamanho
14. - Cinco Ilhas x cinco Margens em 2001 (três anos após o enchimento)
Registrados 1002 Lagartos, de 14 espécies e seis famílias.
Mudança no padrão de abundância. As espécies Micrablepharus maximiliani, Gymnodactylus amarali, Mabuya
nigropunctata e Coleodactylus brachystoma corresponderam a 78,14% da abundância, enquanto C. ocellifer e
T. oreadicus (dominantes antes do enchimento) corresponderam a 8%. Ameiva ameiva não foi mais
registrado.
250
200
Abundância
150
100
50
0
C. brachystoma
A. chrysolepis
C. ocellata
nigropunctata
C. modesta
C. ocellifer
A. meridionalis
T. cf. montanus
T. oreadicus
P. acutirostris
quadrilineatus
M. frenata
M. maximiliani
G. amarali
M.
T.
15. - Ilhas e margens não diferiram em diversidade ou equitabilidade. Abundância nas ilhas foi maior
Ilhas e margens diferiram em relação à riqueza.
Parcelas Área (ha) Situação Riqueza Abund.
“Ilha” 42 8 Margem 9 45
“Ilha” 41 6,8 Margem 9 51
“Ilha”
8 Margem 8 60
42.2
Borda 1 >1000 Margem 8 56
Borda 2 >1000 Margem 9 53
Ilha 34 6 Ilha 9 129
Ilha 38 3 Ilha 8 163
Ilha 37 2 Ilha 7 97
Ilha 35 15 Ilha 7 114
Ilhota 0,5 Ilha 7 183
16. A abundância de Gymnodactylus amarali, Mabuya nigropunctata, Coleodactylus brachustoma e
Micrablepharus. maximiliani foram significativamente maiores nas ilhas que nas bordas.
180
160
140
120 Borda
100 Ilha
80
60
40
20
0
A. chrysolep is
b rachystoma
C. ocellifer
A. merid io nalis
T. cf. montanus
T. oreadicus
P. acutirostris
qua drilineatus
C. o cellata
nigrop unctata
C. modesta
maximiliani
G. amara li
M . frenata
M.
C.
M.
T.
17. As espécies que aumentaram a densidade nas ilhas eram originalmente menos abundantes nos sítios
antes do enchimento, de tamanho médio a pequeno, com membros curtos (i.e. pouca habilidade de
corrida), sendo por isso espécies discretas, associadas a certos tipos de abrigo ou que possuem
refinadas estratégias de defesa contra predadores.
O discreto Coleodactylus brachystoma é o menor lagarto do Cerrado, com cerca de 2cm de
comprimento do focinho até a cloaca. Além do pequeno tamanho e de viver em ambientes discretos,
este lagarto é um mímico de escorpiões Butídeos, uma estratégia de defesa rara em vertebrados.
Quando ameaçado, dobra a cauda sobre o corpo, apresentando semelhança em forma e coloração aos
segmentos caudais de três espécies de escorpiões encontradas nas mesmas ilhas em Serra da Mesa.
18. A lagartixa Gymnodactylus amarali é uma espécie de
lagarto fortemente associada a cupinzeiros e apresenta
hábitos crepusculares. Desta forma, está livre da maior
parte das aves predadoras. Além de poder perder a
cauda com facilidade, a sua pele se desprende do corpo
(“rasga”) quando agarrada, voltando a crescer
novamente.
O calango-liso Mabuya nigropunctata pertence a um
interessante grupo de lagartos vivíparos. Além de
apresentar escamas lisas e escorregadias fortemente
fixadas sobre a musculatura, que impedem
eficientemente sua captura, é um animal muito
inteligente, capaz de reconhecer e aprender fontes de
risco, como predadores (no caso, pesquisadores).
O pequeno Micrablepharus maximiliani apresenta um interessante
padrão de colorido, onde o corpo é discreto e a cauda é azul
brilhante. Além de atrair ataques de predadores para uma parte
não vital do animal, o azul da cauda ajuda a confundir predadores
visualmente orientados. O lagarto apresenta movimento veloz e
errático no solo, criando “flashes” azuis que aparecem e
desaparecem rapidamente, evitando que predadores projetem a
trajetória do animal.
19. No caso de Serra da Mesa, espécies de maior
porte na comunidade, mais evidentes no
ambiente e que utilizam a velocidade como
forma primária de fuga de predadores, foram
negativamente afetadas pela insularização do
Cerrado. Esse resultado é interessante, pois
estas são as espécies que geralmente
colonizam ambientes alterados pelo homem.
20. A densidade de A comunidade de
predadores nas ilhas lagartos de Serra da
aumentou muito Mesa pode ser separada
durante o enchimento. em Grupos funcionais,
(Possível efeito do fortemente relacionados
adensamento?) à filogenia das espécies.
Predação é mais forte A seleção parecer ter
sobre as espécies mais sido direcionada. A
evidentes (grandes e ecologia das espécies
que confiam na pode ser usada para
velocidade para fugir prever sua resposta a
de predadores) impactos ambientais.
Predação de macho adulto de
Tropidurus oreadicus pelo gavião
Falco sparverius. Foto: Jader
Marinho-Filho