Similar a Um, dois e a multidão: Ofélia Queiroz e seus múltiplos amores com Fernando Pessoa & Companhia - Amor & Afectos - Cascais, Portugal - 28.06.2014
Similar a Um, dois e a multidão: Ofélia Queiroz e seus múltiplos amores com Fernando Pessoa & Companhia - Amor & Afectos - Cascais, Portugal - 28.06.2014(20)
Um, dois e a multidão: Ofélia Queiroz e seus múltiplos amores com Fernando Pessoa & Companhia - Amor & Afectos - Cascais, Portugal - 28.06.2014
2. Amor & Afectos
XXI Cursos Internacionais
de Verão de Cascais
Direcção: Professor José Tengarrinha
Centro Cultural de Cascais
Cascais, Portugal
23 a 28 de Junho de 2014
3. Amor & Diversidade
UM, DOIS & A MULTIDÃO:
Ofélia Queiroz e seus múltiplos amores
com Fernando Pessoa &
Companhia
Prof. Doutor Vincenzo Di Nicola
Centro Cultural de Cascais
Cascais, Portugal
28 de Junho de 2014 – 17.00h
6. Amor & Diversidade
UM, DOIS & A MULTIDÃO:
Ofélia Queiroz e seus múltiplos amores
com Fernando Pessoa &
Companhia
Professor Doutor Vincenzo Di Nicola
Universidade de Montreal
7. Agradecimentos
• ICES – Instituto de Cultura
e de Estudos Sociais
• Prof. José Tengarrinha, ICES
• Dra. Ana Gomes, SPTF –
Sociedade Portuguesa de
Terapia Familiar
• Dra. Maria de Lurdes
Bettencourt, ICES
• Centro Cultural de Cascais,
Carla Pato e Filipa Aguiar
Photo : Arsinée Donoyan
8. Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
Costurar três coisas ...
Biografia e crítica literária
— Fernando Pessoa e Ofélia Queiroz
Psicologia do amor e terapia relacional
Filosofia do evento
14. Fernando
Pessoa
• Em 29 de Novembro de 1935 foi internado no
Hospital São Luis dos Franceses
com diagnóstico de cólico hépatico
• Morreu no dia seguinte, ás 20.30 da noite
30 de Novembro de 1935
25. Ofélia Queiroz
(ou Ophélia Queirós)
Nasceu 14 de Junho de 1900 em Lisboa
Faleceu em 1991
Suas cartas para Fernando foram publicadas em
1996
Duas fases do namoro:
• 1 de Maio a 29 de Novembro de 1920
• 11 de Setembro de 1929 a 11 de Janeiro de 1921
26. Sympósio – Casa Fernando Pessoa – 2012
No encontro entre Pessoa e a psiquiatria,
a psiquiatria tem mais a aprender de
Pessoa do que a psiquiatria pode nos
ensinar sobre Pessoa.
27. Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
“A somática da saudade”
de: Um Estranho Na Família
Hoje sou a saudade imperial
Do que já na distância de mim vi ...
Eu próprio sou aquilo que perdi ...
—Fernando Pessoa
Passos da Cruz. VI
29. “After Fernando”
Depois do Fernando
Escrito em Setembro de 2004 para um concurso de escrever
um romance em 3 dias. Publicado em 2012.
• Um “sonho ficcional” sobre a vida de Ophélia Queiroz
depois da morte do poeta Fernando Pessoa em 1935 quando
ele estava com 47 anos e ela com 35
• Ela sobreviveu por mais de 50 anos, falecendo em 1991
• Sabemos que na vida ela se casou, mas para simplificar
minha conta, eu imagino ela muito velha, vivendo sozinha
com as suas memórias do Fernando
31. “After Fernando”
Depois do Fernando
• Quando um jovem estrangeiro aparece na sua porta em
Lisboa, Ophélia o leva a uma jornada de um “dia perfeito”,
que ela estava tricotando na sua “sala de memórias” com os
poemas e as cartas do quarteto heteronómico de Fernando
Pessoa
33. “After Fernando”
Depois do Fernando
Tarde Norte – Sintra Alberto Caeiro Verão
Anoitecer Oeste – Brasil Ricardo Reis Outono
Madrugada Sul – Africa do Sul Fernando Pessoa Inverno
Amanhecer Leste – Suez Álvaro de Campos Primavera
34. A mãe de Fernando falava com ele em francês
desde a infância
Perdeu o pai com 5 anos
A mãe casou-se de novo
Mudaram de país, de lingua e de cultura
enquanto Fernando era criança de 7 anos
Voltou a Lisboa um jovem de 17 anos
Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
35. Fernando Pessoa —
“Um mutante cultural”
(Um Estranho na Família, 1998;
Sympósio na Casa Fernando Pessoa, 2012)
Um ser limiar, vivendo “na soleira” entre
mundos, línguas, sentimentos e identidades
Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
37. —Fernando Pessoa/Bernardo Soares
O Livro do Desassossego
Lembro-me de repente de quando era
criança, e via, como hoje não posso ver,
a manhã raiar sobre a cidade. Ela então
não raiava para mim, mas para a vida,
porque então eu (não sendo consciente)
era a vida. Via a manhã e tinha alegria;
hoje vejo a manhã, e tenho alegria, e
fico triste. A criança ficou mas
emudeceu.
38. —Fernando Pessoa/Bernardo Soares
O Livro do Desassossego
Sim, outrora eu era ja daqui; hoje, a cada
paisagem, nova para mim que seja,
regresso estrangeiro, hóspede e peregrino
da sua presentação, forasteiro do que
vejo e ouço, velho de mim.
39. —Victor Turner, The Ritual Process (1969)
Os atributos da liminaridade ou das
personae liminares (pessoas que estão num
limiar, na soleira) são necessariamente
ambíguos, uma vez que essa condição e
essas pessoas escapam ou escorregam da
rede de classificações que normalmente
localiza estados e posições intermediária
entre as posições designadas e
organizadoras pela lei, costumes,
convenções e cerimônias. Como tal, seus
atributos ambíguos e indeterminados são
expressos por uma rica variedade de
símbolos nas muitas sociedades que
ritualizam as transições sociais e culturais.
40. Sem a metáfora da memória e história, nós
não podemos imaginar … o que é ser uma
outra pessoa. A metáfora é o agente
recíproco, a força universalizadora que torna
possível imaginar o coração do estranho.
— Cynthia Ozick
Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
41. • Sobre um trilho, tentamos de ser
indivíduos, diferenciando-nos de
nossos pais e famílias e das regras e
conformidades da sociedade
• Sobre um outro trilho, perseguimos o
amor, tentando de nos completar e
cumprir-nos nas relações
com outros
Dois Trilhos paralelos
42. Sobre um trilho, tentamos de ser indivíduos, diferenciando-nos de nossos
pais e famílias e das regras e conformidades da sociedade …
O self, o eu – dois temas
1. “O eu dividido”
2. “O desejo distribuido”
O trilho individual
43. O Eu dividido
Je est un autre.
Eu é um outro.
—Arthur Rimbaud, poeta
44. O self, o eu – dois temas …
1.“O eu dividido”
• RD Laing, The Divided Self (1960)
• Diferenciação, indivíduação X integração –
Carl Jung, Guy Corneau
O Eu dividido
45. O Eu dividido
Nascemos três vezes na nossa vida:
nascemos de nossas mães,
nascemos de nossos pais,
e finalmente nascemos de nosso ser mais profundo.
—Guy Corneau,
Pais ausentes, filhos perdidos
46. O self, o eu – dois temas …
2. “O desejo distribuído”
• Bernardo Soares –
“Cada um de nos é dois …”
• Sigmund Freud –
“Tem seis pessoas na cama …”
O Desejo distribuído
47. O desejo distribuído
Cada um de nós é dois, e quando
duas pessoas se encontram,
se tornam íntimas e estão ligadas,
é extremamente raro que as quatro
possam estar em acordo.
—Fernando Pessoa/Bernardo Soares
O Livro do Desassossego
49. Sobre um outro trilho, perseguimos o amor, tentando de nos
completar e cumprir-nos nas relações com outros …
O Self-em-relação, o self relacional
Como nos preparamos para entrar nas relações com
outros?
1. A escolha do parceiro – diferenciação da família de
origem
2. A capacidade relacional – nivel de adaptação
O Trilho relacional
50. • Seguimos esses trilhos, às vezes em
paralelo, às vezes em conflito,
divergentes e alienados, mas para os
felizes da vida, esses trilhos vêm
juntos para criar vidas cheias,
cumpridas e produtivas
Dois trilhos paralelos
51. • Para isto acontecer, em vez da visão
romântica em que dois sejam um
cumprimentando ao outro, um deve se
cumprir-se a si mesmo para tornar-se
dois
• Isto é o amor: A cena de dois
• E daí, desse encontro, algo mais surge –
não só dois indivíduos, mas uma relação
e mais – o múltiplo: a família, a
comunidade e a sociedade
Amor: A cena de dois
52. —Tony Kushner
A menor unidade humana indivisível
são duas pessoas, não uma;
uma é uma ficção.
Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
53. A matemática da psicologia humana
enfim é essa:
• Somos um ou somos muitos
• Portanto um é uma ficção, pois um se
divide em dois
• Porém esse dois cria uma relação,
fora de si, além da soma de dois,
e cria um terceiro e mais –
muitos, ou o múltiplo
Psicologia relacional
55. 1914 – cem anos atrás …
• Mario de Sá Carneiro chega a Lisboa de Paris
• 8 de Março – o dia triunfal …
• surge Alberto Caiero e em seguinte, rapidamente –
Alvaro de Campos e Ricardo Reis e Fernando Pessoa mesmo,
voltando por assim dizer, para afirmar e confirmar a sua
existência contra a sua não-existência como Alberto Caeiro
• 30 poemas de uma vez!
Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
56. —Ignazio Silone
Nos damos a cada pessoa
o direito de contar sua história
à sua propria maneira.
Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
57. Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
Extremamente curioso o que diz sobre o
seu desdobramento em várias personagens
– e o sentir-se mais elas, às vezes
do que Você próprio.
—Mário de Sá Carneiro
Cartas a Fernando Pessoa.
Lisboa, Edições Ática, 1958, Vol. 1, p. 183
58. Podemos imaginar o dia triunfal na vida de
Fernando Pessoa – 8 de Março de 1914 –
aquela noite quando Alberto Caiero surgiu
numa explosão de criatividade e criação
Esta foi uma ruptura – um evento
que mudou a vida dele
Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
59. Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
Toda a obra de Pessoa é a busca de
identidade perdida.
—Octavio Paz
El Desconocido de Si Mesmo –
Fernando Pessoa. Madrid, Alianza
Editorial, 1983.
61. Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
Que nós vemos das cousas são as cousas.
Por que veríamos nós uma cousa se houvesse outra?
Por que é que ver e ouvir seria iludirmo-nos
Se ver e ouvir são ver e ouvir?
O essenical é saber ver,
Saber ver sem estar a pensar,
Saber ver quando se vê,
E nem pensar quando se vê
Nem ver quando se pensa.
Mas isso (tristes de nós que trazemos a alma vestida!),
Isso exige um estudo profundo,
Uma aprendizagem de desaprender
– Alberto Caiero
62. Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
Quem esta ao sol e fecha os olhos,
Começa a não saber o que é sol
E a pensar muitas cousas cheias de calor.
Mas abre os olhos e vê o sol,
E já não pode pensar em nada,
Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos
Do todos os filósofos e de todos os poetas.
– Alberto Caiero
63. Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
Philosophy has yet to become worthy
of Pessoa.
—Alain Badiou
Handbook of Inaesthetics
A filosofia ainda não é digna de Pessoa.
Ainda não esta em grau de entender
Pessoa.
64. A poesia de Fernando Pessoa abre janelas …
casas … mundos inteiros
E como o evento, ela não pode ser prevista
ou entendida pelos elementos que a constitui
Quem faz um poema abre uma janela.
—Mario Quintana
Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
65. Três aspectos do evento
(segundo Alain Badiou)
Viver uma experiência
Nomear esta experiência “evento”
Ter fidelidade ao evento
Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
66. É precisamente a fidelidade
ao evento que cria um sujeito
Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
67. A fidelidade de Pessoa à sua arte
criou dele um sujeito
Tanto que o evento da sua vida
criou múltiplos sujeitos –
uma verdadeira multidão –
dentro de si
Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
68. Imagina a reação da Ofélia
em saber que o evento da vida do
seu namorado e o que ele valoriza
mais que tudo na vida não seja ela,
nem a família, nem seu trabalho,
mas a sua vocação de poeta
Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
69. Ofélia com Fernando Pessoa & Companhia
Ophélinha: – 1.3.1920. Fernando Pessoa
Meu amorzinho, meu Bébé querido: …
Ai, meu amor, meu Bébé, minha bonequinha, quem te
tivesse aqui! Muitos, muitos, muitos, muitos beijos do
teu, sempre teu, Fernando
19.3.1920, às 9 de manhã. Meu querido amorzinho: …
Adeus, meu anjinho bébé. Cobre-te de beijos cheios de
saudade o teu, sempre, sempre teu, Fernando
70. Ofélia com Fernando Pessoa & Companhia
19/3/1920, Meu Bébé pequinino (a atualmente muito
mau): … Fernando
Meu Bébé, meu Bébézinho querido: … Muitos, muitos
beijos do teu, sempre teu, mas muito abandonado e
desolado 20(?)/3/1920. Fernando
Meu Bébé pequeno e rabino: … Um beijo só durando
todo o tempo que ainda o mundo tem que durar, do teu
sempre, sempre e muito teu Fernando (Nininho).
71. Lisboa, 27 de Novembro de 1920
Fernando
Há já quatro dias que não me aparece ao menos se digna escrever-me.
Sempre a mesma forma de proceder.
Vejo que não faço nada de si, porque compreendo perfeitamente que é
para me aborrecer que assim procede, que me terá mesmo chamado
parva algumas vezes.
Como Fernando não tem motivos para acabar, procede então da forma
que procede. Pois bem eu assim não estou resolvida a continuar.
Não sou o seu ideal, compreendo-o claramente, unicamente o que
lastimo é que só quase ao fim de um ano o Sr. o tenha compreendido.
Porque se gostasse de mim não procedia como procede, pois que não
teria coragem.
Os feitios contrafzem-se. O essencial é gostar-se.
Está a sua vontade feita. Desejo-lhe felicidades
Ofélia
72. Ophelinha:
Quanto a mim …
O amor passou. Mas conservo-lhe uma afeição inalteravel, e
não esquecerei nunca – nunca, creia – nem a sua figurinha
engraçada e os seus modos de pequeninha, nem a sua
ternura, a sua dedicação, a sua indole amoravel. Pode ser
que me engane, e que estas qualidades, que lhe attribúo,
fossam uma illusão minha; mas nem creio que fossem, nem, a
terem sido, seria desprimor para mim que lh’as attribuisse.
Não sei o que quer que lhe devolva – cartas ou que mais. Eu
preferia não lhe devolver nada, e conservar as suas cartinhas
como memoria viva de um passado morto, como todos os
passados; como alguma cousa de commovedor numa vida,
como a minha, em que p progresso nos annos é par do
progresso na infelicidade e na desillusão.
73. Peço que não faça como o gente vulgar, que é sempre
reles; que não me volte a cara quando passe por si, nem tenha
de mim uma recordação em que entre o rancor. Fiquemos, um
perante o outro, como dois conhecidos desde a infancia, que se
amaram um pouco quando meninos, e, embora a vida adulta
sigam outras affeições e outros caminhos, conservam sempre,
num escaninho da alma, a memoria profunda do seu amor
antigo e inutil.
Que isto de “outras affeições” e de “outros caminhos” é
consigo, Ophelinha, e não commigo. O meu destino pertence a
outra Lei, de cuja existencia a Ophelinha nem sabe, e está
subordinado cada vez mais á obediência a Mestres que não
permittem e não perdoam.
Não é necessario que comprehenda isto. Basta que me
convserve com carinho na sua lembrança, como eu,
inalteravelmente, a conservarei na minha.
Fernando
29/XI/1920
74. Ofélia com Fernando Pessoa & Companhia
Pequinina:
Estas palavras são de um individuo, que, aparte ser
P pessoa, se chama preliminaramente
Fernando
14/9/1929
75. Ofélia com Fernando Pessoa & Companhia
Ora a minha Vespa, que alias será vespa
mas não minha …
A minha (?) pequena Vespa gosta realmente de mim? …
Vespa que não é minha …
Queria ir, ao mesmo tempo, á India e a Pombal.
Curiosa mistura, não é verdade? Em todo o caso é só parte
da viagem.
Recorda-se desta geographia, Vespa
vespissima?
Fernando
24/9/1929
76. Exma. Senhora D. Ophelia Queiroz:
Um abjecto e miseravel individuo chamado Fernando Pessoa,
meu particular e querido amigo, encarregou-me de communicar a V.
Ex.a
– considerando que estado mental d’elle o impede de communicar
qualquer coisa, mesmo a uma ervilha secca (exemplo da obediencia e
da disciplina) – que V. Ex.a
está prohibida de:
(1) Pesar menos grammas,
(2) comer pouco,
(3) não dormir nada,
(4) ter febre,
(5) pensar no individuo em questão.
…
Cumprimenta V. Ex.a
Alvaro de Campos
eng. naval
25/9/1929
ABEL
77. Ex.mo
Senhor
Engenheiro Álvaro de Campos
Permite–me que discorde por completo com a primeira parte
da sua carta, porque, nem posso consentir que Va Exa trate o Ex.mo Sr.
Fernando Pessoa, pessoa que muito prezo, por abjecto e miserável
indivíduo nem compreendo que, sendo seu particular e querido amigo
o possa tratar tão desprimorosamente.
Como vê estamos sempre em completa desarmonia, nem podia
deixar de ser, pedindo-lhe por especial fineza, que não volte a
escrever-me.
Quanto às observações que me faz, como foram ditadas pelo
Sr. Fernando Pessoa, farei quanto em mim caiba por lhe ser agradável.
Agradeço o conselho que me dá, mas já que me puxa pela
lingua, deixe-me dizer-lhe que quem eu de boa vontade há muito
tempo teria, não deitado na pia, mas debaixo dum comboio, era Va
Exa
.
Esperando não o tornar a ler, subscreve-se com respeito a
25-9-929
Ofélia Queiroz
78. 9.10.1929
Terrivel Bébé:
Gosto das suas cartas, que são meiguinhas, e tambem gosto
de si, que é meiguinha tambem. E é bonbon, e é vespa, e é mel,
que é das abelhas e nèao das vespas, e tudo está certo, e o Bébé
deve escrever-me sempre, mesmo que eu não escreva, que é
sempre, e eu estou triste, e sou maluco, e ninguem gosta de mim, e
tambem porque é que havia de gostar, e isso mesmo …
… e porque é que a Ophelinha gosta de um meliante e de um
cevado e de um javardo e de um individuo com ventas de contador
de gaz e expressão geral de não estar alli mas na pia da casa ao
lado, exactamente, e enfim, e vou acabar porque estou doido, e
estive sempre, e é da nascença, que é como quem diz desde que
nasci, e eu gostava que a Bébé fôsse uma boneca minha, e eu fazia
como uma crença, despia-a, e o papel acaba aqui mesmo, e isto
parece impossivel ser escripto por um ente humano, mas é escripto
por mim
Fernando
79. Ilusão e realidade,
homem e mulher
Diálogo do discípulo e a mestre:
Vincenzo: Mas o poder é uma ilusão,
professora ...
Mara Selvini Palazzoli: O poder pode ser
uma ilusão mas a luta pelo poder é
uma realidade.
81. —José Saramago
O Ano da Morte de Ricardo Reis
(invertendo Camões)
Aqui o mar acaba
e a terra principia.
Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
82. Saramago queria enterrar Ricardo Reis e o último livro de
poesia incompleta dele. Ele queria enterrar Fernando
Pessoa e a sua obra.
Eu quero dar ainda mais vida a todos os raios que ainda
surgem daquele “baú cheio de gente” – como Antonio
Tabucchi disse – sem fim que é Fernando Pessoa &
Companhia
Aqui o mar acaba e a terra principia.
—José Saramago
“Here, where the sea ends and the earth awaits.”
(… a terra espera)
Pessoa. Psiquiatria. Filosofia
83. Agradecimentos
• ICES – Instituto de Cultura
e de Estudos Sociais
• Prof. José Tengarrinha, ICES
• Dra. Ana Gomes, SPTF –
Sociedade Portuguesa de
Terapia Familiar
• Dra. Maria de Lurdes
Bettencourt, ICES
• Centro Cultural de Cascais,
Carla Pato e Filipa Aguiar
Photo : Arsinée Donoyan
84. Referências Bibliográficas
Badiou, Alain. Handbook of Inaesthetics (trans. Alberto Toscano). Stanford, CA:
Stanford University Press, 2005.
Badiou, Alain. “Manifesto of affirmationism.” lacanian ink, volume 24/25, Spring
2005.
Balso, Judith. Pessoa, Le Passeur Métaphysique. Paris, Éditions du Seuil, 2006.
Tradução por Drew Burk: Pessoa, The Metaphysical Courrier. New York &
Dresden, Atropos Press, 2011.
Bréchon, Robert. Étrange Étranger: Une Biographie de Fernando Pessoa. Paris,
Christian Bourgois. 1996.
Di Nicola, Vincenzo. Um Estrahna na Família: Cultura, Famílias e Terapia.
Tradução por Maria Adriana Veríssimo Veronese. Porto Alegre, Artes Médicas,
1998.
Di Nicola, Vincenzo. “After Fernando.” The Unsecured Present: 3-Day Novels &
Pomes for Pilgrims. New York & Dresden, Atropos Press, 2012.
85. Referências Bibliográficas
Monteiro, George (Ed.). The Man Who Never Was: Essays on Fernando Pessoa.
Providence, RI, Gávea-Brown Publications, 1981.
Nogueira, Manuela e Maria de Conceição Azevedo. Cartas de Amor de Ofélia a
Fernando Pessoa. Lisboa, Assírio & Alvim, 1996.
Paz, Octavio. El Desconocido de Si Mesmo – Fernando Pessoa. Madrid, Alianza
Editorial, 1983.
Pessoa, Fernando. Cartas de Amor. Introdução e seleção de Walmir Ayala. Rio de
Janeiro, Ediouro Publicações.
Sa Carneiro, Mario de. Cartas a Fernando Pessoa. Lisboa, Edições Ática, 1958.
Saraiva, Mário. O Caso Clínico de Fernando Pessoa. Post-fácio do Prof. Doutor
Luís Duarte Santos. Lisboa, Edições Referendo.
Tabucchi, Antonio. Un Baule Pieno di Gente: Scritti su Fernando Pessoa. Milano,
Feltrinelli, 1990.