Em 1972, um píer em Ipanema que inicialmente parecia inadequado acabou atraindo surfistas e criando ótimas ondas, o que transformou o local no ponto do verão, atraindo diversos grupos e criando uma tribo, influenciando os verões futuros da região.
1. Jovens observam o nascer do sol nas Dunas da Gal, também conhecida como Dunas do Barato, em 1º de janeiro de 1972
T
Eurico Dantas/21-3-1972
inha tudo para dar errado: o píer e, especialmente, no mar. Quando a
era uma horrorosa estrutura de corrente vinha dos lados do Leblon,
madeira, aço e ferro enfiada mar encontrava uma barreira formada pe-
adentro, em plena Ipanema, com los pilares e pelas chapas de ferro que
o único propósito de escorar tubos de formavam o emissário submarino, ali
esgoto até alto-mar. Para fixar as pi- em frente à Farme de Amoedo. A onda
lastras, toneladas de areia foram re- então recuava um pouco, como se
tiradas do fundo do mar e espalhadas fosse empurrada para trás, elevando e
na praia formando dunas artificiais. aplanando o fundo de areia, deixando-
Quem passava na calçada da Vieira o na medida para o surfe.
Souto simplesmente não conseguia en- — Era como os corais do Havaí, só que
xergar o mar. Tinha tudo para dar no quintal da nossa casa — explica
errado, mas, no comecinho de 1972, o Marco Telles, o Coyote, editor do site
conjunto formado pelo píer medonho, pierdeipanema.com.br, dedicado exclu-
pelas dunas de araque e por um pu- sivamente às histórias daquela época. —
nhado de surfistas, artistas, desbun- A história do Píer começou nas ondas.
dados, poetas, hippies e malucos de Depois disso, cada onda que vinha
todos os tipos transformou o lugar no era melhor que a outra. Nunca se
point do verão. Aquele seria o Verão tinha visto esquerdas tão perfeitas
do Píer. Ou, dependendo da vontade em Ipanema. Os surfistas — que já se
do freguês, o Verão das Dunas. Tanto queixavam do excesso de forasteiros
faz. O que se sabe é que, de lá pra cá, do Arpoador — foram os primeiros a
Ipanema não parou mais de inventar chegar ao lugar. Depois vieram as
seus verões. menininhas bonitas que sempre vão
Sem o Verão do Píer — o primeiro a atrás deles, os hippies, o cheiro de
criar uma tribo em Ipanema — pro- parafina, a maresia, a paz e o amor, os
vavelmente não existiria o Verão do violões, o incenso, os sovacos ca-
Circo, o Verão da Lata e nem o Verão beludos, os intelectuais, a festa, o
do Apito. É possível até que não exis- pôr do sol e os malucos que cis-
tisse nem o Posto 9 nem o Coqueirão. maram de bater palma para ele. Por
Naquele 1972, havia algo de novo no ar fim, veio Gal Costa.a