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FICHAMENTO SOBRE AS ORIGENS DO PENSAMENTO GREGO, CAPÍTULO IV, JEAN- PIERRE VERNANT 
CAPÍTULO IV - O UNIVERSO ESPIRITUAL DA POLIS 
Constituída entre os séculos VIII e VII a.C, a polis vai originar uma nova forma de vida e de relacionamento entre os homens. A palavra se torna o instrumento de poder máximo no Estado e será divinizada pelos gregos: Peithó, a força de persuasão. No entanto, sua força não emana do cosmos, mas do logos. A palavra será o debate contraditório; a defesa de ideias; a discussão, em que de acordo com a força de cada argumento dos discursos contrários, o público é persuadido. 
As decisões que antes eram tomadas pelo Soberano, passam a ser submetidas a debates que demonstrem todas as consequências de uma decisão. Nasce então o vínculo entre a política e o logos, em que a arte da política é essencialmente a arte da oratória. Historicamente, as pesquisas de Aristóteles só foram possíveis devido à retórica e à sofística que, ao analisarem os discursos vitoriosos nas assembleias e tribunais, pôs a lógica do verdadeiro, característica do saber teórico, em oposição à lógica do verossímil e do provável, própria dos debates. 
Outra característica da polis é a publicidade dada à vida social. A vida de todos se tornou de domínio público, tanto no sentido de se deixar de lado os interesses privados, quanto no sentido de banir os processos secretos. Todo um conjunto de condutas, de processos, de conhecimentos é posto sob o olhar público, sujeitos à crítica e à controvérsia, provocando uma mudança significativa. 
A palavra ganha total força nessa nova sociedade sendo usada como instrumento político, enquanto a escrita enriquece o âmbito intelectual divulgando conhecimentos previamente reservados e se torna comum a todos os cidadãos. Juntamente com os textos de Homero e de Hesíodo, a escrita será a base da paideia grega. 
Mais uma mudança é no âmbito do direito. Leis se tornam mais permanentes e fixas via escrita, aplicáveis a todos da mesma forma, porém superior a todos. A dike realiza-se na lei, que é suscetível à discussão e a modificações, porém não perde sua essência divina. 
Por sua vez, os indivíduos ao fazerem do saber algo público via a escrita, procuram fazer de sua mensagem um bem comum da cidade, acessível a todos, suscetível a debates e julgamentos e por fim, possivelmente aceita e reconhecida por todos como verdade. 
No entanto, não é sem total oposição que a vida social se torna pública. Na política, algumas ações secretas assim tentaram se manter, assim como alguns santuários secretos e oráculos privados continuaram exclusivos de certos magistrados.
Apesar da política ter tomado um caráter racional, não há uma exclusão radical dos antigos processos religiosos do governo. Além disso, seitas, confrarias e mistérios são fundados às margens da cidade de forma hierarquizada. A seleção nessas associações era por meio de várias provas e os eleitos, os epoptas, eram considerados puros e obtinham a certeza de um destino excepcional que alcançariam no além. Seus benefícios permaneciam apenas no campo religioso. 
O estudo dos primeiros Sábios se tratava justamente do mundo religioso e sua missão se torna um tanto quanto paradoxal. Eles expõem ao público uma verdade que é de um outro mundo, e por isso não pertencente à vida comum, sendo assim inacessível a todos. 
Assim, a filosofia nasce com a característica da ambiguidade e que, talvez, nunca tenha conseguido se livrar. Ao mesmo tempo em que ela aparece em seitas, como um segredo, se abriu à vida pública, tornando-se um bem acessível a cada cidadão. 
Mais um traço da polis será o fato de que independente de sua classe, função ou origem, os homens são "semelhantes" entre si. Essa ideologia grega permite que se crie uma sociedade como a polis em que não existe hierarquia e, consequentemente, nem submissão ou domínio. Indiferentemente das diferenças entre os cidadãos no campo social, todos eram iguais no plano político. A partir de então, no século VI, o termo isonomia passa a ser usado com o sentido de que todos os cidadãos possuem igual direito a participação no exercício do poder, enquanto que anteriormente o termo era usado nos círculos aristocráticos definindo que a arché era reservada a um pequeno numero de pessoas, porém partilhada de maneira igual entre os membros dessa elite. 
A democratização também se estendeu para a área militar, que antes era apenas um privilégio dos aristocráticos, provocando uma completa transformação da ética do guerreiro. O herói homérico, o hippeu, era exaltado pela sua façanha individual em combate, enquanto o hoplita deve recusar tal combate sempre em favor do conjunto. A Phylia, o espírito de comunidade, deve sempre estar à frente da Eris, o desejo de vencer o oponente. 
Chega um ponto na história da polis em que todo e qualquer ato individualista, tradicional da aristocracia, é rejeitado, pois tais atos que exaltem as diferenças entre os cidadãos geram sentimentos de inveja e desarmonia que põem em risco a unidade da cidade. O que passa a ser adequado é um estilo de vida reservado, moderado para que as diferenças se tornem mínimas em nome da união dos membros da sociedade em uma espécie de família. 
Assim, o que prevalece na polis é a supremacia da lei e da ordem. A ordem é primeira em relação de poder, regulando o comportamento de todos os indivíduos.
Vernant fala sobre a formação da “polis”, como se deu a sua formação, o seu desenvolvimento e a importância que tem para toda a civilização grega e ocidental. Quando ela foi efetivada, as noções de relação social e interpessoal mudaram. 
Vários agrupamentos começam a construir cidadelas que, aos poucos, vão agrupando pessoas de outros lugares que buscam proteção. Nesta época surgem algumas cidades importantes, como: Atenas, Tebas e Esparta. 
A monarquia começa a dar lugar para uma oligarquia urbana, onde o comércio e o artesanato predominam economicamente, mesmo não havendo uma moeda. 
A polis era onde se exercitava a arte erística, que é esse amor a discussão, a arte da discussão, o amor pela discussão só pelo fato de se discutir. É o que movimentava a polis grega, a controvérsia. Para se ganhar essa disputa precisa-se de persuasão, que precisa necessariamente do exercício da linguagem, do saber falar bem e se expressar para poder persuadir o adversário. 
Esse panorama grego é favorável à consolidação da polis, que é baseada na democracia. Todas as decisões estavam submetidas à arte da oratória, à arte de persuadir. 
Há uma relação muito próxima entre o logos e a política. O logos, discurso, tem o poder de “criar verdades”, por isso foi sempre tão importante para política. A maneira com que se discursa ajuda a eleger certo candidato. Mais uma vez, o panorama grego dá suporte à solidificação da polis, onde todas as decisões eram feitas por meio de debates, o puro uso do logos. 
Com todo esse processo grego, surge vários questionamentos sobre a política, como, por exemplo: “Qual seria a melhor constituição?”; “Por que o governo se adapta a cada região geográfica?” ou até mesmo “Por que a Grécia teria o melhor regime?”. Esta foi a época em que a política se torne objeto de estudo. 
Surge também uma crítica política que se espalha fortemente com a aristocracia divulgada por Xenofonte. Ao mesmo tempo, surgem também as utopias: Platão e outros filósofos imaginaram um sistema diferente, aonde a cidade era leal, sistema que Aristóteles também tentou definir. Resumindo, a partir do momento em que, na vida cotidiana, o logos se torna importante, também se torna alvo que desperta interesse. 
Houve também a aparição da sofística, prática de recrutamento de jovens da elite intelectual, fazendo-os pagar lições sobre retórica, utilizando a idéia de que quem souber persuadir vencerá um debate.
No caminho contrário, o ceticismo deu forças para mostrar que verdade e verossimilhança são distintas: Platão e Aristóteles separam pensamentos falsos dos corretos e criam critérios de verdade. Dentro desse estudo de Platão e Aristóteles, surge o que se chamará, no Ocidente, pela primeira vez, de Filosofia. 
Concluindo, a polis foi o ponto de partida para a evolução e surgimento do pensamento grego (e de praticamente todo o resto do Ocidente). Ela também foi o marco do início da democracia, que Vernant classifica como uma aristocracia guerreira. Porém, todos tinham direito a opinar, desde que não fossem mulheres, crianças, estrangeiros e escravos. Surgia o princípio da democracia, do direito de escolha. 
Referências Bibliográficas: 
- VERNANT, J. P. As origens do pensamento grego. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989 
- http://pt.shvoong.com/humanities/6570-origens-pensamento-grego/

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  • 1. FICHAMENTO SOBRE AS ORIGENS DO PENSAMENTO GREGO, CAPÍTULO IV, JEAN- PIERRE VERNANT CAPÍTULO IV - O UNIVERSO ESPIRITUAL DA POLIS Constituída entre os séculos VIII e VII a.C, a polis vai originar uma nova forma de vida e de relacionamento entre os homens. A palavra se torna o instrumento de poder máximo no Estado e será divinizada pelos gregos: Peithó, a força de persuasão. No entanto, sua força não emana do cosmos, mas do logos. A palavra será o debate contraditório; a defesa de ideias; a discussão, em que de acordo com a força de cada argumento dos discursos contrários, o público é persuadido. As decisões que antes eram tomadas pelo Soberano, passam a ser submetidas a debates que demonstrem todas as consequências de uma decisão. Nasce então o vínculo entre a política e o logos, em que a arte da política é essencialmente a arte da oratória. Historicamente, as pesquisas de Aristóteles só foram possíveis devido à retórica e à sofística que, ao analisarem os discursos vitoriosos nas assembleias e tribunais, pôs a lógica do verdadeiro, característica do saber teórico, em oposição à lógica do verossímil e do provável, própria dos debates. Outra característica da polis é a publicidade dada à vida social. A vida de todos se tornou de domínio público, tanto no sentido de se deixar de lado os interesses privados, quanto no sentido de banir os processos secretos. Todo um conjunto de condutas, de processos, de conhecimentos é posto sob o olhar público, sujeitos à crítica e à controvérsia, provocando uma mudança significativa. A palavra ganha total força nessa nova sociedade sendo usada como instrumento político, enquanto a escrita enriquece o âmbito intelectual divulgando conhecimentos previamente reservados e se torna comum a todos os cidadãos. Juntamente com os textos de Homero e de Hesíodo, a escrita será a base da paideia grega. Mais uma mudança é no âmbito do direito. Leis se tornam mais permanentes e fixas via escrita, aplicáveis a todos da mesma forma, porém superior a todos. A dike realiza-se na lei, que é suscetível à discussão e a modificações, porém não perde sua essência divina. Por sua vez, os indivíduos ao fazerem do saber algo público via a escrita, procuram fazer de sua mensagem um bem comum da cidade, acessível a todos, suscetível a debates e julgamentos e por fim, possivelmente aceita e reconhecida por todos como verdade. No entanto, não é sem total oposição que a vida social se torna pública. Na política, algumas ações secretas assim tentaram se manter, assim como alguns santuários secretos e oráculos privados continuaram exclusivos de certos magistrados.
  • 2. Apesar da política ter tomado um caráter racional, não há uma exclusão radical dos antigos processos religiosos do governo. Além disso, seitas, confrarias e mistérios são fundados às margens da cidade de forma hierarquizada. A seleção nessas associações era por meio de várias provas e os eleitos, os epoptas, eram considerados puros e obtinham a certeza de um destino excepcional que alcançariam no além. Seus benefícios permaneciam apenas no campo religioso. O estudo dos primeiros Sábios se tratava justamente do mundo religioso e sua missão se torna um tanto quanto paradoxal. Eles expõem ao público uma verdade que é de um outro mundo, e por isso não pertencente à vida comum, sendo assim inacessível a todos. Assim, a filosofia nasce com a característica da ambiguidade e que, talvez, nunca tenha conseguido se livrar. Ao mesmo tempo em que ela aparece em seitas, como um segredo, se abriu à vida pública, tornando-se um bem acessível a cada cidadão. Mais um traço da polis será o fato de que independente de sua classe, função ou origem, os homens são "semelhantes" entre si. Essa ideologia grega permite que se crie uma sociedade como a polis em que não existe hierarquia e, consequentemente, nem submissão ou domínio. Indiferentemente das diferenças entre os cidadãos no campo social, todos eram iguais no plano político. A partir de então, no século VI, o termo isonomia passa a ser usado com o sentido de que todos os cidadãos possuem igual direito a participação no exercício do poder, enquanto que anteriormente o termo era usado nos círculos aristocráticos definindo que a arché era reservada a um pequeno numero de pessoas, porém partilhada de maneira igual entre os membros dessa elite. A democratização também se estendeu para a área militar, que antes era apenas um privilégio dos aristocráticos, provocando uma completa transformação da ética do guerreiro. O herói homérico, o hippeu, era exaltado pela sua façanha individual em combate, enquanto o hoplita deve recusar tal combate sempre em favor do conjunto. A Phylia, o espírito de comunidade, deve sempre estar à frente da Eris, o desejo de vencer o oponente. Chega um ponto na história da polis em que todo e qualquer ato individualista, tradicional da aristocracia, é rejeitado, pois tais atos que exaltem as diferenças entre os cidadãos geram sentimentos de inveja e desarmonia que põem em risco a unidade da cidade. O que passa a ser adequado é um estilo de vida reservado, moderado para que as diferenças se tornem mínimas em nome da união dos membros da sociedade em uma espécie de família. Assim, o que prevalece na polis é a supremacia da lei e da ordem. A ordem é primeira em relação de poder, regulando o comportamento de todos os indivíduos.
  • 3. Vernant fala sobre a formação da “polis”, como se deu a sua formação, o seu desenvolvimento e a importância que tem para toda a civilização grega e ocidental. Quando ela foi efetivada, as noções de relação social e interpessoal mudaram. Vários agrupamentos começam a construir cidadelas que, aos poucos, vão agrupando pessoas de outros lugares que buscam proteção. Nesta época surgem algumas cidades importantes, como: Atenas, Tebas e Esparta. A monarquia começa a dar lugar para uma oligarquia urbana, onde o comércio e o artesanato predominam economicamente, mesmo não havendo uma moeda. A polis era onde se exercitava a arte erística, que é esse amor a discussão, a arte da discussão, o amor pela discussão só pelo fato de se discutir. É o que movimentava a polis grega, a controvérsia. Para se ganhar essa disputa precisa-se de persuasão, que precisa necessariamente do exercício da linguagem, do saber falar bem e se expressar para poder persuadir o adversário. Esse panorama grego é favorável à consolidação da polis, que é baseada na democracia. Todas as decisões estavam submetidas à arte da oratória, à arte de persuadir. Há uma relação muito próxima entre o logos e a política. O logos, discurso, tem o poder de “criar verdades”, por isso foi sempre tão importante para política. A maneira com que se discursa ajuda a eleger certo candidato. Mais uma vez, o panorama grego dá suporte à solidificação da polis, onde todas as decisões eram feitas por meio de debates, o puro uso do logos. Com todo esse processo grego, surge vários questionamentos sobre a política, como, por exemplo: “Qual seria a melhor constituição?”; “Por que o governo se adapta a cada região geográfica?” ou até mesmo “Por que a Grécia teria o melhor regime?”. Esta foi a época em que a política se torne objeto de estudo. Surge também uma crítica política que se espalha fortemente com a aristocracia divulgada por Xenofonte. Ao mesmo tempo, surgem também as utopias: Platão e outros filósofos imaginaram um sistema diferente, aonde a cidade era leal, sistema que Aristóteles também tentou definir. Resumindo, a partir do momento em que, na vida cotidiana, o logos se torna importante, também se torna alvo que desperta interesse. Houve também a aparição da sofística, prática de recrutamento de jovens da elite intelectual, fazendo-os pagar lições sobre retórica, utilizando a idéia de que quem souber persuadir vencerá um debate.
  • 4. No caminho contrário, o ceticismo deu forças para mostrar que verdade e verossimilhança são distintas: Platão e Aristóteles separam pensamentos falsos dos corretos e criam critérios de verdade. Dentro desse estudo de Platão e Aristóteles, surge o que se chamará, no Ocidente, pela primeira vez, de Filosofia. Concluindo, a polis foi o ponto de partida para a evolução e surgimento do pensamento grego (e de praticamente todo o resto do Ocidente). Ela também foi o marco do início da democracia, que Vernant classifica como uma aristocracia guerreira. Porém, todos tinham direito a opinar, desde que não fossem mulheres, crianças, estrangeiros e escravos. Surgia o princípio da democracia, do direito de escolha. Referências Bibliográficas: - VERNANT, J. P. As origens do pensamento grego. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989 - http://pt.shvoong.com/humanities/6570-origens-pensamento-grego/