SlideShare una empresa de Scribd logo
1 de 200
Descargar para leer sin conexión
www.iesde.com.br
DIREITODOTRABALHO
OTÁVIO AUGUSTO REIS DE SOUSA
DIREITO DO TRABALHODIREITO DO TRABALHO
Fundação Biblioteca Nacional
ISBN 978-85-387-3244-0
9 7 8 8 5 3 8 7 3 2 4 4 0
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
ADVOCACIA GERAL
IESDE Brasil S.A.
Curitiba
2012
DIREITO
DO TRABALHO
Otávio Augusto Reis de Sousa
5.a
edição
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
__________________________________________________________________________________
S696d
6.ed.
Sousa, Otávio Augusto Reis de
Direito do trabalho / Otávio Augusto Reis de Sousa. - 6.ed. - Curitiba, PR : IESDE
Brasil, 2012.
196p. : 21 cm (PEJ. Advocacia geral)
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-387-3244-0
1. Direito do trabalho - Brasil. I. Título. II. Série.
12-7580.
CDU: 349.2(81)
18.10.12 25.10.12 039985
__________________________________________________________________________________
© 2005-2012 – IESDE Brasil S.A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito dos autores e do
detentor dos direitos autorais.
10/12
Atualizado até outubro de 2012.
Capa: IESDE Brasil S.A.
Imagem da capa: IESDE Brasil S.A.
IESDE Brasil S.A.
Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200
Batel – Curitiba – PR
0800 708 88 88 – www.iesde.com.br
Todos os direitos reservados.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
SUMÁRIO
História do Direito do Trabalho
11	 O vocábulo trabalho
12	 Evolução histórica do trabalho humano
13	 Primeira Revolução Tecnológica
15	 Surgimento do Direito do Trabalho
19	 Direito do Trabalho no Brasil
A Constituição Federal de 1988
23	 Direito Constitucional do Trabalho
23	 Princípios constitucionais
do Direito do Trabalho
24	 Análise descritiva do campo
normativo da CF/88
25	 Direito individual
34	 Direito coletivo
Teoria geral
do Direito do Trabalho
37	 Terminologia da disciplina
37	 Autonomia do Direito do Trabalho
39	 Taxonomia
39	 Relações com outros ramos do Direito
40	 Divisão interna
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
SUMÁRIO
41	 Direito do Trabalho: definição
42	 Fontes do Direito do Trabalho:
conceito, classificações e espécies
45	 Aplicação do Direito do Trabalho
no espaço: a hierarquia das fontes –
o conflito e suas soluções
46	 Interpretação e integração
do Direito do Trabalho
47	 Aplicação do Direito do Trabalho
no tempo e em razão das pessoas
Teoria geral do Direito
do Trabalho (continuação)
51	 Princípios especiais do Direito do Trabalho
52	 Princípios gerais do Direito
e especiais do Direito do Trabalho
55	 Considerações últimas sobre o princípio
da flexibilização do Direito do Trabalho
Contrato individual de trabalho
57	 Relação de trabalho versus relação de emprego
58	 Teorias contratualistas
58	 Teorias anticontratualistas
59	 Caracteres e classificações
do contrato individual de trabalho
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
SUMÁRIO
64	 Regras do contrato por tempo determinado
65	 Rescisão antecipada do contrato
por tempo determinado
66	 Pressupostos do contrato de trabalho
70	 Elementos do contrato de trabalho
72	 Elementos acidentais do contrato
de trabalho: condição e termo
74	 Obrigações decorrentes
do contrato de trabalho
74	 Nulidade e anulabilidade
no Direito do Trabalho
Sujeitos do contrato individual
de trabalho: empregado
79	 O empregado
81	 Empregado rural
83	 Trabalho noturno
83	 Intervalos intrajornada
84	 Salário in natura
86	 Empregado doméstico
(Lei 5.859/72 c/c CF, art. 7.º, parágrafo único)
91	 Estágio (Lei 11.788/2008)
92	 Altos empregados
93	 Empregado em domicílio
94	 Trabalho temporário (Lei 6.019/74)
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
SUMÁRIO
96	 Lei de fomento ao emprego (Lei 9.601/98)
96	 Contrato de Aprendizagem
Empregador
99	 Conceito
104	 Grupo econômico ou grupo de empresas
105	 Sucessão de empregadores
107	 Estado como empregador
108	 Terceirização
Remuneração e salário
113	 Remuneração
114	 Salário
116	 Salário mínimo
118	 Salário profissional
ou piso salarial profissional
118	 Salário normativo
ou piso salarial normativo
119	 Salário contratual
119	 Elementos do complexo remuneratório
120	 Elementos do complexo salarial
(salário lato sensu)
123	 Elementos não integrantes
do complexo remuneratório
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
SUMÁRIO
123	 Princípios de proteção ao salário
127	 Regras legais de proteção
Duração do trabalho
131	 Regras: aspecto ativo
135	 Contrato a tempo parcial
136	 Regras: aspectos ativo e passivo,
intervalos, repouso semanal e férias
Alteração das condições
de trabalho e suspensão
da prestação do trabalho
141	 Alteração contratual
144	 Transferência do empregado
144	 Suspensão e interrupção
da prestação do trabalho
Terminação do
contrato de trabalho
151	 Generalidades
151	 Extinção do contrato de trabalho (caducidade)
152	 Dissolução do contrato de trabalho
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
SUMÁRIO
Obrigações decorrentes
da admissão e da terminação
do contrato de emprego
161	 Admissão do empregado
162	 Indenização por tempo de serviço
e evolução da proteção à relação de emprego:
fundamento jurídico
164	 Indenização nos contratos a termo
165	 Iniciativa do empregador
166	 Indenização adicional
e despedida discriminatória
166	 Procedimentos e direitos
concernentes à terminação do contrato
167	 Estabilidade e garantia de emprego
Normas especiais
de tutela do trabalho
171	 Trabalho da mulher e do menor
174	 Contratos de trabalho especiais
Flexibilização:
terceirização e cooperativas
179	 Flexibilização
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
SUMÁRIO
180	 Terceirização
183	 Cooperativas
Relações coletivas
de trabalho
185	 Relações individuais e coletivas
186	 O modelo sindical na ordem
jurídica trabalhista e na Constituição
188	 Estrutura sindical, conflitos coletivos
e suas soluções
Referências		
Anotações		
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
História do
Direito do Trabalho
Otávio Augusto Reis de Sousa*
O vocábulo trabalho
Dissentem os autores acerca da etimologia do vocábulo trabalho, ora perseguin-
do-a com base em tripalium, “instrumento de tortura, constituído de cavalete de pau
(tres ‘três’ + palu ‘pau’)” (OLIVEIRA, 1994, p. 30), ora a partir do latim trabs, trabis,
“viga, de onde se originou em primeiro lugar um tipo trabare, que deu no castelhano
trabar, etimologicamente obstruir o caminho por meio de uma viga”, conforme lições do
professor Evaristo de Moraes Filho, citado por Irany Ferrari (1998, p. 30).
Certo é que o vocábulo trabalho apresentou, desde o seu nascimento, um sentido
de expiação, de castigo ou de fadiga. O homem, desde o começo dos tempos, teve que
trabalhar como forma de obter os meios necessários à sua subsistência, o que, de certa
forma, explica as acepções que tomou aquele vocábulo. Maria Helena Diniz (1998),
referindo-se ao trabalho à luz da história do Direito, confirma tal percepção ao asseverar
que, “na Grécia antiga, era um castigo”.
Para a Igreja Católica, o trabalho é parte fundamental da existência humana,
consoante se colhe das palavras do sumo pontífice João Paulo II, citado por Irany Fer-
rari (1998, p. 25): “A igreja vai encontrar logo nas primeiras páginas do livro Gênesis a
fonte dessa sua convicção, de que o trabalho constitui uma dimensão fundamental da
existência humana sobre a terra.” É o que se retira inclusive das encíclicas papais desde
a Rerum novarum até a Laborem exercens.
De Plácido e Silva (1987, p. 1.573) conceitua trabalho como: “todo esforço físico,
ou mesmo intelectual, na intenção de realizar ou fazer qualquer coisa”. Poderíamos
adotar esse conceito enquanto gênero, para buscar dentro dele vários sentidos: religioso,
econômico, jurídico, sociológico. Quanto ao aspecto econômico do fenômeno trabalho,
Doutor em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Membro da Academia Nacional
de Direito do Trabalho (ANDT). Professor da Universidade Federal de Sergipe (UFS). Juiz do Trabalho da 20.ª Região.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
DIREITO DO TRABALHO
afigura-se como toda atividade humana destinada à produção de um bem ou serviço, en-
quanto, sob a óptica do Direito do Trabalho, a ênfase se encontra, sem dúvida alguma,
no trabalho subordinado (relação de emprego ou contrato individual de trabalho), em
torno do qual gravita a grande maioria de seus institutos.
Evolução histórica do trabalho humano
Se o trabalho, desde o início dos tempos, esteve associado à ideia de sofrimento,
e se era, ao mesmo tempo, essencial para o atendimento das necessidades do homem
e da sociedade, durante muito tempo, na Antiguidade, o modo de produção reinante
consistiu na exploração forçada do homem pelo homem, pela escravidão. Dos conflitos,
das guerras, surge a escravidão: o vencedor que, inicialmente, privava o vencido da vida,
passa agora a escravizá-lo, reduzi-lo à condição de coisa como forma de se apropriar do
seu trabalho; percebe, então, que o vencido vivo e escravizado apresenta maior utilida-
de, e surge assim a mais ignominiosa condição de exploração do homem já verificada na
história da humanidade. Na expressão de Orlando Gomes (1995, p. 110): “O trabalha-
dor era propriedade viva de outro homem, sobre cujos ombros recaíam os encargos de
produção de riqueza.”
Daí em diante, a escravidão se alastra quer pelas guerras, quer pelo nascimento,
pois os que nasciam de pais escravos em geral preservavam tal condição. A praxe disse-
minada durante a Antiguidade teve na Grécia e em Roma ampla utilização.
O escravo não se apresenta no mundo jurídico como titular de direitos, nem se
lhe reconhece a possibilidade de contrair obrigações: não é sujeito de direito; é, sim,
objeto de direito de outrem. A relação que se mantém não é outra senão de Direito Real
entre o amo (dominus) e o escravo, a coisa (res). Nesse período, portanto, não existe azo
para se falar em Direito do Trabalho, pois o próprio modo de produção das sociedades
da época, lastreado na escravidão, na qual, como ficou dito, o que presta o trabalho
escravo não é reconhecido como sujeito, mas como objeto de direito, afasta tal possibi-
lidade.
Era exíguo, na Grécia e em Roma, o trabalho prestado por homens livres. Não
havia regulamentação que se assemelhasse, em seus contornos, à construção doutri-
nal do Direito Laboral. Daí porque não se nos afigura qualquer referência técnica a
Direito do Trabalho na Antiguidade, não obstante se reconheçam, mesmo em alguns
códigos de então, esparsas disposições sobre o trabalho humano.
Ainda assim, habitualmente se reportam os autores a um contrato de Direito
Romano, a locatio conductio operarum, como antecedente remoto do contrato individual
de trabalho. Acerca do trabalho dos homens livres de então nos fala Orlando Gomes
(2005, p. 110) que
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
13
[...] o Direito Romano o regulou como fruto de um contrato denominado – locatio conduc-
tio. Era um contrato que se realizava quando “se prometia, por certa paga, uma coisa para
fruir, um serviço para prestar, uma obra para fazer”. Este contrato podia apresentar-se sob
três modalidades: a) locatio rei; b) locatio operarum; c) locatio operis faciendi.
A escravidão persiste na história do trabalho do homem mesmo ao longo das
demais fases, embora com âmbito cada vez mais restrito, chegando ao período contem-
porâneo e aos nossos dias; até em nosso país, são por vezes noticiados relatos de sua
prática. De todo modo, em um segundo momento, surge outro modo de produção, a
servidão.
O servo, se cotejado com o escravo, apresenta um grau de liberdade superior. Re-
conhece-se-lhe a titularidade de direitos, o caráter de pessoa, ainda que persista uma série
de limitações que o aproximam do regime da escravidão. Característica marcante da Idade
Média, a servidão seria banida na França no período da Revolução; já na Rússia, persistiu
até quase o século XX. Assim, ao servo se reconhecia a qualidade de pessoa, logo, de
titular de direitos e obrigações, sofrendo entretanto sérias restrições de deslocamento.
A condição de servo era hereditária (passava de pai para filho), e, se lhe era permitido
ser proprietário de bens, o imposto de transmissão da herança solapava o patrimônio
amealhado.
Completando o quadro, os servos encontravam-se sujeitos ao poder político e
militar do senhor feudal, que os podia mobilizar para a guerra.
Com o renascimento das cidades, para as quais se torna crescente a migração de
pessoas, a servidão sofre um impacto. Surge então uma nova forma de organização do
trabalho: as corporações de ofício.
O trabalho não era livre, uma vez que somente se permitia o exercício da profissão
aos que fizessem parte da corporação. Nela se organizavam três níveis hierárquicos pre-
cisos: abaixo, os aprendizes, seguidos dos companheiros, todos submetidos ao mestre.
As corporações foram extintas em 17 de junho de 1791, pela Lei Le Chapelier, que, pre-
conizando a liberdade de trabalho, entendia que elas eram atentatórias aos direitos do
homem e do cidadão. Estamos, então, na Primeira Revolução Industrial.
Primeira Revolução Tecnológica
Os autores usualmente se reportam à Revolução Industrial como precedente ne-
cessário ao surgimento do Direito do Trabalho. Antes de tratarmos especificamente
desse fato, porém, cumpre ressaltar que, ao longo da história, distinguem-se três revolu-
ções na tecnologia, albergáveis sob tal denominação e ligadas à modificação das fontes de
energia utilizadas na indústria.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
DIREITO DO TRABALHO
Nesse sentido, há o magistério de Romita (1997, p. 16):
A observação dos fatos históricos que caracterizam a evolução do capitalismo permite
discernir três revoluções industriais: 1.ª – fins do século XVIII, princípios do século XIX:
proporcionada pela produção de motores a vapor por meio de máquinas; 2.ª – fins do
século XIX, princípios do século XX: desenvolvimento e aplicação do motor elétrico e
do motor a explosão; 3.ª – a partir da Segunda Guerra Mundial (1940 nos Estados Unidos
e 1945 nos demais países): automação por meio de aparelhos eletrônicos. Observa-se sem-
pre a apropriação de fontes energéticas distintas, que ditam as transformações nos meios
de produção, as quais por seu turno vão gerar mudanças na organização do trabalho, com
as consequências sociais conhecidas. Na primeira revolução industrial, o vapor d’água; na
segunda, a eletricidade e o petróleo; na terceira, a eletrônica e a energia atômica.
Sinteticamente, poderíamos conceituar a Revolução Industrial (Primeira Revo-
lução Tecnológica) como um processo de mecanização em inúmeros setores produtivos,
gerando uma substituição da força muscular humana e animal.
Um agrupamento de fatores propiciou a eclosão da Revolução Industrial, dos
quais três foram determinantes: o acúmulo de capitais oriundo do mercantilismo; a
farta mão de obra existente nas cidades, por força do processo migratório, uma vez que
os trabalhadores vislumbravam nas cidades melhores condições de vida e as inovações
tecnológicas, como a máquina a vapor1
, a máquina de fiar (1738) e o tear mecânico
(1784).
A Primeira Revolução Industrial e os efeitos sociais por ela gerados, associados
aos valores vigentes naquele período histórico, serão decisivos para o surgimento do
Direito do Trabalho, pois serão a fonte material2
de toda uma construção jurídica en-
gendrada, para muitos, com uma finalidade específica: proteger os trabalhadores da
situação abjeta e desumana vivenciada por eles.3
1 Noticia Amauri Mascaro Nascimento (1996. p. 16) “que a primeira máquina a vapor saiu das fábricas de Soho, em 1775,
destinando-se a uma mina de carvão. Depois, outra máquina foi feita para mover altos-fornos, em Broseley. Assim, a produção
mecânica do movimento punha-se em substituição à produção hidráulica. As suas aplicações subsequentes foram muitas, ser-
vindo para o abastecimento de águas de Paris, para as empresas industriais da Inglaterra, para as atividades dos moinhos, para a
indústria cerâmica e, também, para a indústria de tecelagem. Na Inglaterra, em 1800, podiam-se contar 11 máquinas a vapor em
Birmingham, 20 em Leeds e 32 em Manchester”.
2 O conceito de fonte material pode ser apreendido a partir das lições de Maria Helena Diniz (1998, p. 573-574): “Fonte material
ou real que aponta a origem do direito, configurando sua gênese, condicionando seu desenvolvimento e determinando o conteúdo
das normas. Fontes materiais ou reais são não só os fatores sociais, que abrangem os históricos, os religiosos, os naturais (clima,
solo, raça, natureza geográfica do território e constituição anatômica e psicológica do homem), os demográficos, os higiênicos,
os políticos, os econômicos e os morais (honestidade, decoro, decência, fidelidade, respeito ao próximo), mas também os valores
de cada época (ordem, segurança, paz social, justiça), dos quais fluem as normas jurídico-positivas”. E prossegue: “Tais fatores
decorrem das convicções, das ideologias e das necessidades de cada povo, em certa época. Atuam como fontes de produção do
direito positivo, pois condicionam o aparecimento e as transformações das normas jurídicas. As fontes materiais, portanto, não
são o direito positivo, mas o conjunto de fatos sociais determinantes do conteúdo do direito e dos valores que o direito procura
realizar fundamentalmente sintetizados no conceito amplo de justiça”.
3 Mais à frente veremos que a proteção consiste em técnica ou quando muito função secundária do Direito do Trabalho.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
15
Surgimento do Direito do Trabalho
A Revolução Industrial causou profundas repercussões na vida econômica e so-
cial. Se o grande contigente de mão de obra foi um dos fatores de eclosão dessa revolu-
ção, como frisamos alhures, a substituição do homem pela máquina era a constante que
desequilibrava. A máquina, ao mesmo tempo em que impulsionava a produção, gerava
desemprego. Vigorava no plano das ideias o liberalismo. O indivíduo era a pedra de to-
que, livre sob todas as formas: liberdade política, liberdade econômica e, o que mais de
perto nos interessa, liberdade para contratar; o ideário poderia ser resumido no célebre
laissez-faire, laissez-passer. A burguesia nascente buscava assegurar-se em face do Estado
antes despótico, e o fazia na medida em que teorizava seu afastamento da Economia e
limitava sua ação à de mero garantidor das liberdades individuais.
Quanto ao trabalho, era reconhecido como livre, sendo qualquer restrição aten-
tatória aos direitos do homem e do cidadão – tanto assim que foram abolidas as cor-
porações de ofício. As partes (empregado e empregador) poderiam, então, contratar da
forma que melhor lhes aprouvesse. Eis a sutileza da construção: qualquer interferência
do Estado se afigurava como ilegítima e violadora das liberdades individuais.
O contigente crescente de mão de obra; a diminuição da demanda das indústrias
por trabalhadores, em face do progressivo aumento da mecanização e da substituição do
homem pela máquina; o idéario liberal que pregava a não intervenção do Estado nas re-
lações econômicas e muito menos nos contratos, acabaram por determinar a incidência
da única lei conhecida pelo mercado: a da oferta e da procura. À medida que aumentava
a demanda por trabalho e diminuía sua oferta, a tarifa (salário) paga decaía de forma
vertiginosa.
Para completar o quadro, era usual a utilização das chamadas “meias-forças”,
ou seja, o trabalho do menor e da mulher, cuja remuneração era ainda inferior à do
trabalhador maior, do sexo masculino. A consequência foi o aviltamento das condições
de trabalho.
As novas fábricas eram ambientes inóspitos, com pouca ou nenhuma ventilação;
as jornadas de trabalho eram de sol a sol, sem quaisquer interrupções anuais ou sema-
nais, e com escassos intervalos intrajornada; acidentes de trabalho eram frequentes, não
existindo qualquer aparato protetivo aos acidentados. Os patamares salariais caíam dia
a dia, e a sociedade bipartia-se em duas classes antagônicas: a burguesia e o proletariado.
Surgem, então, as primeiras revoltas, que se dirigiam quase que de maneira ino-
cente contra o que parecia aos trabalhadores o causador da miséria em que viviam: as
máquinas. A solução pensada era a destruição destas, e com isso retornariam os empre-
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
DIREITO DO TRABALHO
gos e viria a melhoria da sua condição social: eram os ludistas. Com formas diversas, as
crescentes revoltas desestruturavam a produção, atingiam em cheio o lucro e chamavam
a atenção do antes impassível Estado.
Conspurcada a paz das relações de produção, o Estado viu-se forçado a intervir,
e o fez invocando o poder de polícia, uma vez que persistia atado às ideias liberais. As
greves eram violentamente reprimidas, e proibidas as associações de todos os gêneros,
inclusive as de trabalhadores, sendo elevada a proibição a tipo penal.4
A situação de fato,
ainda assim, pouco se alterou.
A situação aterradora do proletariado não passou de todo despercebida à burgue-
sia: existiam vozes que se levantavam, a exemplo do industrial inglês Robert Owen. No
entanto, as primeiras normas de Direito do Trabalho surgiriam mesmo de forma autô-
noma, por concessão dos empregadores, que, desejosos de restaurar a paz no ambien-
te de produção, por vezes concederam algumas das reivindicações dos trabalhadores.
Apenas em momento posterior o Estado se vê impelido a regulamentar as relações de
trabalho; verifica-se aí o chamado movimento ascendente.5
Impendia uma revisão das ideias liberais, para as quais influíram vários aspec-
tos. A Doutrina Social da Igreja exerceu papel determinante no surgimento do Direito
do Trabalho; a visão de solidariedade e sentimento cristão para com os trabalhadores
e a justiça social, todas reveladas nas encíclicas papais desde a Rerum novarum, serão
determinantes para justificar uma nova postura por parte do Estado.
O Manifesto Comunista (1848) irá suscitar, nos trabalhadores, um novo ânimo
pela luta e, na burguesia, a revisão da postura diante da questão social, mormente a
partir dos Congressos da Internacional Socialista e da Revolução Comunista na Rússia
(1917).
Do mesmo modo, será decisiva a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). O es-
forço bélico trazia a necessidade de paz na produção, sob pena de naufragar os Estados
beligerantes. Surge um novo Estado, disposto a intervir no domínio econômico e no âm-
bito contratual. Reconhece-se, agora, que, se as partes (empregado e empregador) são,
no plano formal, iguais, materialmente são diferentes. Percebe-se, para citar Lacordaire,
4 É o que se verifica na Lei contra a Conjura (1799/1800), em que o sindicalismo é tido como movimento criminoso.
5 Reconhece Segadas Vianna (1993, p. 55-56) que, em quase todo o mundo, as normas em Direito do Trabalho tiveram tal
origem, e assim se reporta: “Os movimentos ascendentes, que deram origem às legislações trabalhistas do México, Inglaterra
e França, caracterizavam-se pela sua coexistência com uma história social marcada pela luta de classes, com trabalhadores for-
temente apoiados por suas organizações profissionais, com o espírito de classe bem nítido e com a existência de indústrias ou
atividades produtivas arregimentando grandes massas de trabalhadores”.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
17
que: “Entre o forte e o fraco, entre o rico e o pobre, é a liberdade que escraviza, é a lei
que liberta” (apud VIANNA, 1993, p. 37).
A fórmula encontrada se aparta em absoluto dos princípios do Direito Civil da
época. O Estado reconhece que as partes na relação de trabalho são desiguais economi-
camente: de um lado se encontra a opulência do empregador e do outro a hipossufici-
ência do empregado. A forma de igualar desiguais é desigualando; cria-se, então, uma
outra desigualdade, igual e em sentido inverso, agora jurídica, como forma de restabele-
cer a igualdade substancial entre empregado e empregador.
Busca-se compensar a inferioridade econômica do empregado outorgando-lhe
superioridade jurídica. Surge o princípio da proteção, o Direito do Trabalho e o Estado do
bem-estar (Welfare State). Quebra-se com o princípio da igualdade, alicerce do Direito
Civil, fazendo-se surgir uma nova disciplina jurídica, que dele se aparta, qual seja, o
Direito do Trabalho. O Estado passa a intervir ativamente nas relações de trabalho, edi-
tando normas sobre os seus vários aspectos: salário mínimo, jornada de trabalho, higiene
e segurança no trabalho, dentre outros. Fala-se em dirigismo contratual, e debatem os
autores para adaptar a nova realidade ao arcabouço jurídico conhecido.
A partir do término da Primeira Guerra Mundial, pronuncia-se tendência à in-
ternacionalização do Direito do Trabalho, sendo relevante o Tratado de Versalhes, que
institui a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e sedimenta os princípios bási-
cos do Direito Laboral.
Usualmente, dividem-se em quatro as fases pelas quais passou o Direito do Tra-
balho no mundo, ao longo de sua evolução, com referência necessária à obra de Granizo-
-Rothvoss (OLIVEIRA, 1994, p. 70; MARANHÃO, 1993, p. 18-20): a primeira até 1848
(formação); de 1848 a 1890 (intensificação); de 1890 a 1919 (consolidação) e de 1919 até
os dias de hoje (autonomia).
Durante a primeira fase, surgem, fruto da preocupação do Estado com a questão
social, as primeiras normas de Direito do Trabalho. Destaca-se a Moral and Health Act, de
1802, também conhecida como Lei de Peel, e que teve o berço exatamente na Inglaterra, a
qual tomara a dianteira na Revolução Industrial. A Lei de Peel proibia o trabalho noturno
dos menores, e limitava a jornada a 12 horas por dia.
As primeiras leis a disciplinar matéria relativa ao Direito do Trabalho tiveram
duas preocupações básicas: restringir a utilização do trabalho do menor, fixando idade
para ingresso no mercado de trabalho, e estabelecer um limite máximo para a duração
do trabalho, quer diária (jornada), quer semanal ou anual. A produção legislativa nesse
período era tímida e inorgânica.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
DIREITO DO TRABALHO
Em 1848, inicia-se a segunda fase da evolução do Direito do Trabalho, com a
publicação do Manifesto Comunista. As agitações das massas operárias que se seguiram
na Europa conduzem a uma intensificação do processo legislativo. Data dessa época a
primeira Lei de Seguro Social, de 1883, na França. Em 1884, consagra-se a liberdade de
associação, e resta reduzida a jornada de trabalho para dez horas.
Em 1890, desponta a encíclica Rerum novarum, manifestando ao mundo a preo-
cupação da Igreja com a questão social e preconizando a aplicação dos preceitos cristãos
à relação capital-trabalho. Já existe, então, um corpo relativamente vasto de leis acerca
de Direito do Trabalho. Cria-se em 1890, na Alemanha, uma estrutura judiciária para o
julgamento de dissídios trabalhistas e, em 1917, pela primeira vez na história, passa o
trabalho a ser matéria constitucional, sendo incorporado ao texto da Constituição me-
xicana.
Em 1919, o Tratado de Versalhes cria a Organização Internacional do Trabalho e
sedimenta os princípios universais do Direito do Trabalho. Com a Constituição de Wei-
mar (1919), na Alemanha, alastra-se a constitucionalização do Direito do Trabalho. A
partir de então, desponta o Direito Laboral como disciplina jurídica autônoma, compos-
ta por um corpo de princípios peculiares e dotada de institutos próprios irredutíveis às
formulas clássicas de outros ramos do Direito. Reconhece-se que o trabalho, indissociá-
vel de quem o presta, deve ser garantido como forma de se atingir a dignidade da pessoa
humana, não comportando nessa medida tratamento como simples meio de troca ou
como mercadoria.
A evolução do Direito Laboral entrementes não cessou. Poderíamos mesmo dis-
cernir uma quinta fase do Direito do Trabalho, a da flexibilização ou adaptabilidade, a
principiar com a Revolução Tecnológica (Terceira Revolução Industrial) e a quebra da
relação entre o incremento da produção e a criação de postos de trabalho. Com a Crise
do Petróleo (1970) e com a hegemonia de um único país sobre os demais (notadamente
a partir da queda do Muro de Berlim – 1990), podemos hoje pensar em uma revisão dos
princípios clássicos, uma ruptura com a forma original de proteção: a proliferação
dos contratos por tempo determinado; a retificação do contrato de trabalho; a flexibi-
lização do Direito Laboral; sua desconstitucionalização parcial e rerregulamentação.
Enfim, há uma profunda e completa revisão dogmática a se refletir em ideias como a do
nominado Direito do Trabalho de Crise (NASCIMENTO, 1998, p. 39).6
6 Preferimos, todavia, augurando maior precisão terminológica, utilizar o termo flexibilização ou quando muito adaptabilidade.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
19
Direito do Trabalho no Brasil
Resumo histórico
Apenas em 1888 findou entre nós a escravidão, e com ela a primeira fase da
formação de nosso Direito Laboral. Nesse período, não se pode falar em Direito do
Trabalho. A escassez de mão de obra livre e sua reduzida importância no modelo social
de então justificam em boa medida o vácuo legislativo.
A partir da Abolição da Escravatura (1888), inicia-se a segunda fase de nosso
Direito do Trabalho, que se estenderia até 1930. Com a queda da escravatura, tom-
ba em seguida o regime monárquico, que se alicerçava sobre aquela. O trabalho livre,
pressuposto inafastável do Direito do Trabalho, cresce em importância na teia social,
iniciando-se sua regulamentação. São desse período: a Lei 1.869/22, que criou os Tri-
bunais Rurais, para muitos o antecedente mais longínquo da Justiça do Trabalho no
país; a Lei Elói Chaves (1923), que tratava de Caixas de Pensões e Aposentadorias dos
Ferroviários; e a Lei de Férias (15 dias), de 1925.
A terceira fase do Direito do Trabalho no Brasil se inicia em 1930, com a Revolu-
ção e a Era Vargas. Nesse período, é febril a produção legislativa. Ademais, procede-se à
reunião e à sistematização das normas laborais existentes, sedimentam-se os princípios
norteadores e com eles se desenvolve a autonomia desse novo ramo do Direito entre
nós. A industrialização floresce, e com ela a urgente necessidade de uma disciplina das
relações de trabalho com suas múltiplas vicissitudes. Cria-se a Justiça do Trabalho com
a Constituição de 1934, não obstante, à época, como órgão do Poder Executivo. São
desse período: a primeira Lei de Indenização por Despedida Injusta (1935); Organi-
zação da Justiça do Trabalho (1939); Consolidação das Leis do Trabalho – CLT (1943);
Reconhecimento do Direito de Greve (1946); Repouso Semanal Remunerado (1949);
Gratificação Natalina (1962); Estatuto do Trabalhador Rural (Lei 4.214/66); Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço (1966); Lei de Trabalho Rural (5.859/73).
Observa-se, então, no Brasil, seguindo de resto a tendência iniciada pela Consti-
tuição mexicana (1917), um movimento no sentido de trazer para a Constituição a dis-
ciplina do trabalho subordinado. Entre nós, isso se fará sentir a partir da Carta de 1934
e será ratificado por todas as que lhe são posteriores, notadamente a atual, de 1988.
Se nos detivermos a estabelecer um paralelo entre a evolução do Direito do
Trabalho no Brasil e no mundo, podemos identificar pontos de convergência e divergên-
cia, que deverão ser enfatizados para a compreensão de nosso modelo de tratamento das
relações de trabalho e sua necessária adaptação à nova realidade mundial.
Historicamente, a constante entre os dois sistemas é, sem dúvida, a valorização
do trabalho humano, o reconhecimento de que este é um valor social relevante e digno
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
DIREITO DO TRABALHO
de proteção, na medida em que não se pode apartar o trabalho da pessoa que o presta. A
constitucionalização do Direito Laboral foi seguida de igual sorte no mundo e no Brasil.
Muitas e significativas são, entretanto, as diferenças existentes. Enquanto no
mundo o Direito do Trabalho surgiu por meio de movimentos ascendentes, e suas
primeiras normas foram do tipo coletivas (ao menos se as qualificarmos quanto à ori-
gem), no Brasil verificou-se uma legislação outorgada; os movimentos foram descen-
dentes e a predominância se deu no direito individual.
No resto do mundo o Direito do Trabalho foi fruto de um processo complexo e
longo de maturação da questão social, com a influência decisiva das pressões dos tra-
balhadores, encontrando o Estado justificativa à sua intervenção na Doutrina Social da
Igreja e na própria revisão do ideário liberal já no Brasil, o seu surgimento foi açodado:
as leis se antepuseram muitas vezes aos fatos.
Se no mundo as organizações sindicais tiveram campo amplo para seu desenvol-
vimento e fortalecimento, no Brasil tal não sucedeu, quer pela industrialização tardia,
quer pela legislação outorgada, quer pela própria base de princípios que até hoje norteia
nosso Direito do Trabalho em sede coletiva. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)
de 1943 foi inspirada na Carta de 1937, que negava a oposição capital-trabalho, enfeixa-
va-os em doutrina corporativa e via na greve não um direito, mas uma “manifestação an-
tissocial”. Ainda que fracionada pela Constituição de 1988, é essa mesma base de prin-
cípios que até hoje nos rege, necessitando de uma completa e profunda reestruturação.
O prejuízo às formas autocompositivas é evidente, e estas não prescindem de estruturas
sindicais representativas e fortes, o que não se verificou nem se verifica entre nós.
Cumpre ressaltar que o legislador em manifestações recentes tem buscado for­ta­
lecer a estrutura sindical. Nesse sentido, a lei 11.648/2008, que criou as centrais sindi­cais
e promoveu a alteração do imposto sindical, destinado 10% para as centrais sindicais. To-
davia, as leis se voltam ao fortalecimento do sindicalismo de cúpula (central) esquecendo-
se do sindicalismo de base (sindicatos).
História do Trabalho, do Direito do Trabalho e da Justiça do Trabalho, de Irany Ferrari,
Amauri Mascaro Nascimento e Ives Gandra da Silva Martins Filho, editora LTr.
Direito e Processo do Trabalho, de Otávio Augusto Sousa, editora Forense.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
A Constituição
Federal de 1988
Direito Constitucional do Trabalho
Imprescindível se tratar, em sede de evolução do Direito do Trabalho no Bra-
sil, da Constituição Federal de 1988 (CF/88). Não se pode olvidar que as Constituições
pátrias foram incorporando gradativamente novos institutos de Direito do Trabalho, ou
simplesmente trazendo para seu bojo matérias já tratadas em nível infraconstitucional,
fenômeno representativo do chamado “constitucionalismo social”.
Assim, trouxe o legislador Constituinte de 1988 uma série de inovações à sis-
temática anterior, reforçando um modelo prescritivo e analítico. A matéria laboral se
encontra espraiada em vários dispositivos da aludida norma.
Princípios constitucionais do Direito do Trabalho
O legislador aponta os princípios constitucionais do Direito do Trabalho; aliás,
inobstante não os tenha trazido em disposição expressa, permitiu que se inferisse a exis-
tência deles a partir do artigo 1.º, incisos III (dignidade da pessoa humana) e IV (valores
sociais do trabalho); artigo 170, caput (valorização do trabalho humano e justiça social),
incisos III (função social da propriedade) e VIII (busca do pleno emprego); e artigo 193
(primado do trabalho e justiça social), todos da Carta Magna em vigor.
Em verdade, é possível divisar, a partir da leitura atenta da Constituição, uma
série de outros princípios, como o da igualdade (CF, art. 5.º), que toma forma específica
como a “não discriminação”(SÜSSEKIND, 2004, p. 68) (art. 7.º, XXX, XXXI e XXXII);
continuidade da relação de emprego (art. 7.º, I); irredutibilidade salarial relativa (art. 7.º,
VI); e liberdade sindical (art. 8.º, caput), que irão variar na doutrina quanto ao número,
nomenclatura e amplitude.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
DIREITO DO TRABALHO
Análise descritiva
do campo normativo da CF/88
Pela importância da matéria, faremos a seguir a análise dos principais pon-
tos de conteúdo normativo próprio que se encontram espraiados nos artigos 7.º a 11;
114 da CF; e no artigo 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT).
De modo a possibilitar melhor apreensão do conteúdo, elaboramos um quadro
sinótico de agrupamento da matéria ventilada, pelo critério da preponderância normativa
em nível de Direito Individual e Direito Coletivo.
Quadro sinótico da matéria laboral na CF/88
Direito Individual do Trabalho (art. 7.º)
proteção à relação de emprego (incs. I, II, III, XXI e XXVII);■■
remuneração e salário (incs. IV a X, XII e XXIII);■■
estímulo à democratização das relações de trabalho (incs. XI e arts. 10 e 11) – par-■■
ticipação nos lucros e na gestão;
duração do trabalho (incs. XIII a XVII);■■
reforço ao■■ princípio da igualdade, proteção ao trabalho da mulher e do menor, e me-
didas de discriminação positiva (incs. XVIII, XX, XXX, XXXI, XXXII, XXXIII);
higiene e segurança no trabalho (incs. XXII, XXVIII);■■
prescrição (inc. XXIX);■■
tutela do avulso (inc. XXXIV);■■
trabalho doméstico (parágrafo único);■■
últimas hipóteses: licença-paternidade (inc. XIX) e aposentadoria (inc. XXIV).■■
Direito Coletivo do Trabalho (arts. 8.º a 11, e 114)
estrutura sindical – pilares;■■
unicidade sindical;■■
contribuição sindical obrigatória;■■
poder normativo da Justiça do Trabalho (art. 114,■■ §2.º e 3.º modificados pela EC
45/2004);
liberdade sindical mitigada e monopólio da negociação coletiva;■■
direito de greve (art. 9.º);■■
outras formas de representação dos trabalhadores (arts. 10 e 11).■■
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
25
Feito o necessário agrupamento quanto à matéria, passamos a tecer breves
comentários sobre cada um dos institutos referidos nos artigos acima, para que se possa
fornecer ao estudioso uma visão panorâmica do Direito do Trabalho ou, mais especifica-
mente, do Direito Constitucional do Trabalho.
Direito individual
Em várias passagens, o legislador extraordinário de 1988 inovou em relação à
ordem jurídica pretérita, a principiar pelo caput do artigo 7.º da novel Carta Constitu-
cional. Dispôs o legislador que: “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além
de outros que visem à melhoria de sua condição social”, e elencou de pronto extenso
rol de direitos nos 34 incisos que seguem e em seu parágrafo único. Todavia, ao repor-
tar-se a direitos de trabalhadores urbanos e rurais, procedeu o legislador à equiparação
quanto aos direitos das duas categorias de empregados antes referidas, fulminando de
morte a histórica distinção e exclusão disposta originalmente na Consolidação das Leis
do Trabalho (CLT) em seu artigo 7.º, “b” 1
. Por conseguinte, após o advento da Cons-
tituição, restou prejudicado o citado artigo que não mais se afigura aplicável, sendo
assegurados os mesmos direitos a trabalhadores urbanos e rurais.
Frise-se que não se pode confundir igualdade de direitos com direito a igual regu-
lamentação, ou seja, embora os direitos das duas espécies de empregados sejam os mes-
mos, pode haver diferença quanto à regulamentação destes no nível infraconstitucional;
por exemplo, urbanos e rurais fazem jus a adicional noturno, por aplicação do artigo 7.º,
IX2
, da CF. Todavia, os percentuais podem ser, como de fato são, distintos (20% e 25%,
respectivamente), sem que com isso se incida em vício de inconstitucionalidade.
O inciso I do artigo 7.º da CF revolucionou a proteção à relação de emprego na
medida em que, ao remeter a aludida proteção para lei complementar, direciona no sen-
tido do reconhecimento de que sempre é possível a quebra do liame contratual, norma
esta que se torna incompatível, portanto, com o regime anterior de estabilidade decenal3
que se tornou inaplicável após 5 de outubro de 1988. Preservaram-se como estáveis ape-
nas os que já haviam completado 10 anos na data da promulgação da Constituição e não
eram optantes pelo regime do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
1 Dispõe o referido artigo 7.º, “b”, da CLT que: “Os preceitos constantes da presente Consolidação, salvo quando for, em cada
caso, expressamente determinado em contrário, não se aplicam: b) aos trabalhadores rurais, assim considerados aqueles que,
exercendo funções diretamente ligadas à agricultura e à pecuária, não sejam empregados em atividades que, pelos métodos de
execução dos respectivos trabalhos ou pela finalidade de suas operações, se classifiquem com industriais ou comerciais”.
2 “Remuneração do trabalho noturno superior à do diurno.”
3 A CLT assegurava em seu artigo 492 a chamada estabilidade decenal, ou seja, que o empregado que contasse mais de dez anos
de serviços para o mesmo empregador não poderia ser despedido, regra geral, senão pela prática de justa causa especialmente
qualificada (CLT, art. 493) e através do vetusto inquérito para apuração de falta grave. A norma era aplicável plenamente até o
advento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (Lei 5.107/66), e após esta data apenas para os não optantes pelo FGTS.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
DIREITO DO TRABALHO
Rememore-se que o legislador não regulamentou em definitivo o artigo 7.º, I,
pela edição da lei complementar nele referida, mesmo já tendo decorrido mais de duas
décadas, perdendo a oportunidade de aclarar normativamente relevantes conceitos como
a despedida arbitrária e a despedida sem justa causa, sabidamente distintos e que, por
conta da inércia do legislador, ensejam hoje a mesma consequência, qual seja, a indeni-
zação prevista no artigo 10, I, do ADCT4
.
No seu inciso II do artigo 7.º, a Constituição universalizou o regime do Fundo
de Garantia do Tempo de Serviço. O FGTS, disciplinado basicamente pela Lei 8.036/90,
consiste em depósitos mensais de 8,0%5
da remuneração6
, que tem natureza de salário
diferido, e constitui verdadeiro pecúlio do trabalhador, que adquire direito à utilização
do numerário nas hipóteses do artigo 20 da aludida legislação, sendo a principal a despe-
dida sem justa causa. Em caso de despedida do empregado sem justa causa ou arbitrária,
o valor passou a 40%7
com a Constituição de 1988.
Estava presente na redação original da CLT a chamada indenização de antigui-
dade, ou seja, se na sistemática anterior à Lei 5.107/66 o empregado fosse despedido
sem justa causa, faria jus à indenização equivalente a um salário por ano trabalhado ou
fração igual ou superior a seis meses8
. Com a Lei do FGTS, passou a vigorar opção entre
o regime da Lei 5.107/66 ou a previsão da indenização de antiguidade combinada estabi-
lidade decenal. Na prática, aos poucos foi se abandonando o regime da CLT, substituído
gradativamente pelo FGTS, mas preservada, ao menos do ponto de vista legal, a possibi-
lidade de opção de regime até a Carta de 1988.
Após essa data, não há que se falar mais em opção, isso porque o Constituinte
estendeu genericamente aos trabalhadores o regime agora único de FGTS9
.
Forma complementar de proteção à relação de emprego, o seguro-desemprego (CF,
art. 7.º, II) consiste em instituto que busca assegurar a subsistência do trabalhador vítima
de desemprego involuntário, estando consubstanciado em sistema de quotas mensais
em número variável de três a cinco, conforme o tempo menor ou maior de labor, com os
temperamentos da Lei 7.998/90 e legislação posterior.
Integrante último do rol da proteção constitucional à relação de emprego, o
aviso prévio proporcional (CF, art. 7.º, XXI) trouxe como novidade a proporcionalidade ao
4 Vide o prazo de vigência da alteração de percentuais, à luz da Lei Complementar 110/2001.
5 Vide o prazo de vigência da alteração de percentuais, à luz da Lei Complementar 110/2001.
6 Remuneração é o total de ganhos do empregado, exceto a participação nos lucros.
7 Vide o prazo de vigência da alteração de percentuais, à luz da Lei Complementar 110/2001.
8 Artigo 478, caput, da CLT.
9 Ressalvados os que já possuíam estabilidade em respeito ao direito adquirido.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
27
tempo de serviço. Típico dos contratos por prazo indeterminado, o que, regra geral, se
dá com o contrato de trabalho, houve por bem o constituinte indicar que o comunicado,
uma das dimensões do aviso prévio10
, deve ter por medida a maior ou menor antigui-
dade do obreiro, respeitado um mínimo de 30 dias. Tal dispositivo é regulamentado
pela Lei 12.506/2011, que assim dispõe:
Art 1.º O aviso prévio, de que trata o capítulo VI do Título IV da consolidação das Leis
do trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto – Lei n.º 5.452, de 1.º de maio de 1943, será
concedido na proporção de 30 (trinta) dias aos empregados que contém até 1 (um) ano de
serviço de serviço na mesma empresa.
Parágrafo único. Ao aviso prévio previsto neste artigo serão acrescidos 3 (três) dias por
ano de serviço prestado na mesma empresa, até o máximo de 60 (sessenta) dias, perfa-
zendo um total de até 90 (noventa) dias.
Nos incisos IV e V do artigo 7.º da CF, cogita o legislador dos conceitos de salá-
rio mínimo e piso salarial, introduzindo profundas modificações no primeiro na medida
em que amplia as prestações em que se desdobra o salário mínimo, incluindo novas, a
exemplo do lazer. Além disso, amplia o espectro do instituto ao transformá-lo em salário
de família, pois não se destinaria apenas ao trabalhador, mas também à subsistência da
referida unidade familar. Por fim, de modo a suprimir a utilização do salário mínimo
como parâmetro de indexação da economia, proíbe a sua vinculação à outra finalidade
que não a de especificar o menor valor de retribuição passível de ser pago pelo empre-
gador a qualquer empregado como contraprestação de trabalho (conceito de salário
mínimo). Não se pode olvidar que, sendo piso salarial o menor valor que pode ser pago
pelo empregador aos empregados que pertençam a determinada categoria ou profissão,
os conceitos são essencialmente distintos, pautando-se o primeiro pela generalidade,
aplicável que é a qualquer trabalhador, e o último pela especialidade, incidindo apenas
sobre parcela dos empregados, quais sejam, os que integram uma determinada categoria.
Retira-se dos conceitos a inconstitucionalidade das leis estaduais na medida em que,
afastando-se do conceito de piso salarial, o qual implica especificidade conforme dito
acima, pretenderam trazer valor mínimo de retribuição para o referido estado, violando
a Constituição por penetrar em esfera diversa, qual seja, o inciso IV ao invés do V do
artigo 7.º da CF, que diz ser o salário mínimo nacionalmente unificado.
O legislador consagrou no artigo 7.º, VI, da CF, a ideia, para muitos, do princípio
da irredutibilidade salarial ou, como preferimos, da irredutibilidade salarial relativa, na
medida em que introduz a impossibilidade de diminuição do estipêndio, permitida a
flexibilização por tutela sindical, por meio de acordo ou convenção coletiva.
10 Os elementos do aviso prévio são três: comunicação, decurso do tempo e pagamento.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
DIREITO DO TRABALHO
Assim, fica prejudicada em parte a Lei 4.923/6511
que previa duas hipóteses de
redução de salário, por acordo ou convenção coletiva, hipótese recepcionada e, por auto-
rização da Justiça do Trabalho, esta última fração derrogada pela nova dicção Constitu-
cional.
A norma consagrada no inciso VII do artigo 7.º da CF12
apenas reforça a previsão
abstrata do salário mínimo da qual tratamos acima, na medida em que espanca dúvidas
sobre a aplicação do mínimo mesmo que o empregado não tenha salário com valor fixo.
Rememore-se as formas de estipulação do salário por unidade de tempo, por produção e
por tarefa; podem implicar salário variável, verbi gratia, o comissionista, sendo que, se o
empregado não atinge o valor do mínimo legal, terá direito à complementação paga pelo
empregador, que, por evidente, não poderá se compensar com valores a serem pagos a
posteriori em meses subsequentes, pois isso implicaria transferir ao empregado o risco da
atividade econômica, vedado pelo artigo 2.º da CLT13
.
Cogitou o legislador constitucional da gratificação de Natal, que equivale ao valor
do salário do mês de dezembro, e que se adquire com base nos critérios da Lei 4.090/62
(com as modificações advindas da Lei 4.749/65); à razão de um doze avos por mês tra-
balhado, de modo que, se o obreiro labora durante todo o ano civil, terá acrescido à sua
retribuição o equivalente a um salário por ano. Dizemos gratificação de Natal, embora
a CF de 1988, em flagrante descompasso com a natureza jurídica do instituto, que não é
de salário e sim de gratificação, tenha preferido falar em décimo terceiro salário, ou seja,
em uma das raras hipóteses em que o legislador infraconstitucional foi técnico (a Lei
4.090/62 diz que “institui a gratificação de Natal”), entendeu o Constituinte por utilizar
a linguagem vulgar, com evidente sacrifício ao rigor terminológico.
Preocupou-se o Constituinte, ainda, em estabelecer um sobressalário quando
prestado trabalho em horário noturno. Em verdade, sempre que prestado trabalho em
condição desfavorável, faz jus o empregado a um adicional, v.g., se trabalha em horário
consagrado ao descanso (noturno), se trabalha além da duração ordinária do trabalho
(extraordinário) etc.
Seguindo tal lógica, estabelece o legislador que a remuneração do trabalho
noturno será superior ao diurno (CF, art. 7.º, IX), o que implica reconhecer a obrigato-
riedade de pagamento em tais casos de adicional noturno, que para o trabalhador urbano
encontra previsão no artigo 73 da CLT.
11 Discussão relevante e não pacificada reside na recepção e consequente vigência da Lei 4.923/65 após a CF de 1988, que estatui
limites percentuais máximos para a diminuição do salário e a necessidade de proporcional redução da jornada.
12 Artigo 7.º, VII, da CF: “Garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebam remuneração variável.”
13 Vem a propósito do tema o conceito amplamente aceito em doutrina e jurisprudência de alteridade.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
29
Pendentes de regulamentação as consequências pela retenção dolosa do salário14
. A
CLT engendra amplo sistema de proteção ao salário usualmente repartido pela doutrina
em três formas: proteção contra abusos do empregador; contra os credores do emprega-
dor e contra os credores do empregado. Pretendeu a Constituição redobrar a tutela ao
elevar a proteção ao estipêndio a tipo penal, reconhecendo o crime de retenção dolosa do
salário (CF, art. 7.º, X), intento inalcançado em razão da persistente recusa do legislador
em regulamentar o referido inciso, elencando os componentes do tipo, o que inviabiliza
a aplicação da norma em razão do princípio da tipicidade legal15
.
Esteado na democratização da empresa, trouxe o Constituinte tratamento à
participação nos lucros (PL) ou nos resultados (PR), e participação na gestão da empresa.
Importante alteração foi introduzida pela referida norma ao proceder à desvinculação da
participação nos lucros ou resultados da remuneração, isso porque, em razão da força
atrativa do salário, a jurisprudência se firmou no sentido de que as parcelas habitual-
mente pagas aos empregados se integram ao salário, que funcionaria quase como um
planeta, centro de gravidade, trazendo a si os corpos celestes (parcelas) que orbitarem
a seu redor, ousando desafiar sua capacidade ou força de atração. Com isso, produz-se
um efeito cascata na medida em que, se parcelas pagas com habitualidade se integram
ao salário, e se este serve de base de cálculo de vários outros direitos, com facilidade se
percebe a inegável repercussão patrimonial. O fenômeno não se aplica à participação nos
lucros (ou resultados) por expressa determinação da Constituição, que deliberou sua
desvinculação e consequente afastamento não só do salário – conceito contido – mas da
remuneração – conceito continente –, transformando a participação nos lucros (ou resul-
tados) em verdadeiro satélite que, guiado por força motora própria, mantém-se infenso à
atração gravitacional do “planeta” salário.
Deve-se firmar a distinção entre as duas modalidades, que, embora ensejem os
mesmos efeitos, são constitutivamente distintas. Ocorre que algumas pessoas jurídicas
possuem resultado operacional positivo (produto da diferença entre receita e despesa),
subsumível enquanto lucro e passível de repartição entre seus titulares. Se presta tal
14 Artigo 7.º, X, da CF – “proteção ao salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa”.
15 Fala-nos do princípio em questão o professor Paulo de Souza (1998, p. 121-122): “Por outra parte, o legislador, para fazer
valer o princípio constitucional da reserva legal, formula taxativamente esquemas, modelos, tipos, em que se descreve, com pos-
sível clareza, precisão e brevidade os comportamentos humanos passíveis de repressão penal. Criam-se, assim, os tipos penais:
materialização, concretização do princípio nullum crimen nulla poean sine lege. Não sem razão, afirma-se que o legislador trabalha
com tipos e pensa com tipos. É só delituosa a conduta humana que se lhe amolde rigorosamente. O tipo penal, pois, exerce – pre-
tende exercer – importante função de garantia, já que somente se tem por delituoso o fato, prévia e taxativamente descrito como
tal, numa norma penal; que se ajuste, enfim, àquele esquema abstratamente concebido pelo legislador.” E explica por fim que: “É
por isso que as consequências básicas do princípio ‘não há pena sem lei’ se projetam sobre o tipo legal. Nulla poena sine lege scripta:
exclusão de tipos extralegais, em especial de origem consuetudinário. Nulla poena sine lege stricta: proibição da analogia fundante
ou agravante da pena. Nulla poena sine lege praevia: exclusão de efeito retroativo de tipos novos e agravados.”
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
DIREITO DO TRABALHO
resultado mesmo a enquadramento enquanto fato gerador de tributo específico, inti-
tulado Imposto de Renda (IR). Todavia, não se pode olvidar a existência de pessoas
jurídicas cujo resultado operacional não se presta à repartição ou tampouco serve como
fato gerador do IR, quais sejam, aquelas que, embora exerçam atividade econômica,
apresentam finalidade diversa do lucro (filantrópicas, recreativas16
). Assim, não ficam
as instituições filantrópricas impedidas, por exemplo, de reverter parte do seu resultado
operacional positivo, se houver, em proveito de seus empregados. A participação nos
lucros e resultados tem se demonstrado medida eficaz no aumento da produtividade dos
empregados, restando estimulada pelo novo tratamento lancetado na Constituição.
Distinto é o chamado sistema de cogestão, ou a participação dos empregados na
tomada de decisões e nos rumos da empresa (participação na gestão), que ficou relegada
a hipóteses extraordinárias17
, sendo vedada, portanto, a generalização da medida pelo
legislador infraconstitucional.
O inciso XII do artigo 7.º da CF nos fala em salário-família. A doutrina deixa ine-
quívoca a índole previdenciária do benefício. Nesse sentido o magistério do saudoso
Valentin Carrion (2005, p. 81):
[...] apesar da denominação, não se trata de salário, mas de benefício de caráter previden-
ciário, adiantado pela empresa vinculada ao sistema geral da previdência social, ao empre-
gado (salvo ao doméstico), de acordo com o número de filhos, ou equiparados.
Urge lembrar que a Emenda Constitucional 20/98 limitou o salário-família ao
trabalhador de baixa renda, e que a Lei 8.213/91 fixa os requisitos para pagamento desse
tipo de salário como: atestado de vacinação dos filhos menores; comprovação de frequ-
ência à escola, dentre outros. Em verdade, o salário-família se tornou economicamente
tão insignificante para os que percebem elevado valor salarial, que o Constituinte houve
por bem proceder à limitação acima referida, tendo perdido a oportunidade de extirpar
da Constituição mais um dos penduricalhos ali impropriamente existentes.
O sistema de duração do trabalho foi objeto de preocupação do legislador Consti-
tuinte nos incisos XIII a XVII do tão citado artigo 7.º. Em verdade, inobstante a crítica
de alguns autores18
, falaremos aqui em duração do trabalho para abranger proposita-
damente dois aspectos complementares. A duração do trabalho traz conceito binário:
16 Referimo-nos, por exemplo, ao que a CLT chama de empregador por equiparação (CLT, art. 2.º, §1.º).
17 Hipótese possível seria a ocorrência de estado pré-falimentar e como forma de buscar sua reversão.
18 Ao tratar do tema ao que se dessume da nomenclatura dos capítulos da obra, prefere o professor Amauri Mascaro Nascimento
(2005) a expressão jornada de trabalho. Assim justifica: “A segunda (referindo-se às denominações), duração do trabalho, é consi-
derada extensa demais, porque teria de abranger o estudo do repouso semanal e das férias além de todo descanso.”
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
31
períodos de atividade e repouso, ambos disciplinados pela CF. Estatuíram os incisos
XIII e XIV duas jornadas básicas, uma de oito e outra de seis horas, esta última restrita
aos chamados turnos de revezamento19
. Ademais, foi reduzida com a Carta de 1988 a
duração semanal do trabalho de 48 para 44 horas. Permitiu o legislador a adoção de
sistema de compensação de horas, com escopo de suprir o labor em determinado dia
ou reduzir o número de horas de trabalho-dia, conceito de jornada de trabalho. Por fim,
permitiu a flexibilização por tutela sindical do número de horas trabalhadas em sistema
de revezamento, para diminuir ou acrescer à jornada, desde que respeitada a duração
máxima de 44 horas semanais, regra que se pode inferir até mesmo da posição topográ-
fica dos dispositivos contidos no artigo 7.º em sua repartição e ordenação em incisos.
Repouso semanal20
e férias se encontram contemplados na duração do trabalho em
seu aspecto passivo. Com origens opostas, o primeiro sempre trouxe atrelada vinculação
religiosa, surgindo por interferência da Igreja Católica, vigilante do cumprimento das
obrigações religiosas pelas partes envolvidas na relação de trabalho, o que demandava
interrupção do labor durante o tempo correspondente. As férias, ao reverso, têm origem
profana, como falaremos mais à frente. A expressão preferencialmente aos domingos, pre-
sente na Constituição, há que ser interpretada à luz da legislação posterior, notadamente
a Lei 10.101/2000, artigos 6.º e 6.º-A, ou seja, deve recair em domingo ao menos uma vez
a cada três semanas, nos termos da nova redação da lei 10.101/2000, art.6º e seguintes.
Quanto às férias, urge ressaltar que a Constituição criou o acréscimo de um terço sobre
a remuneração delas, em evidente tentativa de evitar a “venda” de férias ou, tecnica-
mente, a conversão de 10 dos 30 dias de férias em pecúnia21
leia-se, 10/30 = 1/3), tendo,
por lapso de memória, esquecido o legislador de revogar a previsão do artigo 143 da
CLT, permanecendo concomitantes hoje tanto o abono de férias (CLT, art. 143) quanto o
acréscimo Constitucional de um terço (CF, art. 7.º, XVII).
A Constituição tratou, ainda em sede de duração do trabalho, das consequências
da violação da jornada máxima estatuída nos incisos XIII e XIV, qual seja, pagamento de
adicional de hora extrordinária, o que se extrai do inciso XVI do artigo 7.º da CF, com uma
inovação de monta: a majoração do adicional para a prestação de serviço extraordinário
de 20% (redação original da CLT) para 50%22
.
19 O conceito pode ser extraído das lições de Godinho Delgado (2004, p. 883). “Enquadra-se no tipo legal em exame o sistema
de trabalho que coloque o empregado, alternativamente, em cada semana, quinzena ou mês, em contato com as diversas fases do
dia e da noite, cobrindo as 24 horas integrantes da composição dia/noite”.
20 Lei 605/49.
21 Artigo 143 da CLT.
22 A respeito, algumas edições da CLT trazem, em flagrante atecnia, modificados os dispositivos com os percentuais de adicio-
nal de horas extras, v.g., artigo 59, parágrafo 1.º. Vale lembrar que para se alterar uma lei é necessário norma da mesma hierar-
quia, ou seja, a redação da CLT não mudou; apenas o intérprete deve, na aplicação dos dispositivos da CLT, atentar para o limite
mínimo de 50% previsto na Constituição.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
DIREITO DO TRABALHO
Consoantedissemosempassagemanterior,algumasnormasdaConstituiçãoaugu-
raram reforçar o princípio da igualdade, assegurando o mesmo por meio de sua derradeira
parte, qual seja, tratar desigualmente os desiguais. Assim, foram incentivadas medidas de
proteção ao trabalho da mulher e do menor e, em regra, medidas de discriminação posi-
tiva, tudo isso nos incisos XVIII, XX, XXX, XXXI, XXXII e XXXIII, todos integrantes do
artigo 7.º da CF. Por sua importância, foi ampliado o prazo da licença-maternidade23
para
120 dias, facultando elastecimento do prazo em 60 dias pelo programa Empresa Cidadã,
Lei 11.770/2008, caso em que o acréscimo poderá ser deduzido do Imposto de Renda
pela empresa. Em sede de implementação da proteção ao trabalho da mulher, dedica-lhe
a CLT todo o capítulo III do título III. Inexiste, hoje, dúvida sobre o cabimento da licença-
-maternidade para a adotante, ante o disposto no artigo 392-A da CLT.
Questão relevante na jurisprudência24
pertine à estabilidade da gestante, especifi-
camente à fixação do termo inicial. Reside a dúvida na expressão confirmação da gravidez
que, segundo modernamente se entende, prescinde do conhecimento do empregador,
ou seja, é dado objetivo, vinculando a comprovação ao exame médico respectivo. Assim,
irrelevante o conhecimento ou não do empregador, pois se a empregada já se encontrava
gestante à época, gozará da proteção legal25
.
Preocupou-se o legislador em viabilizar o acesso do deficiente ao mercado de
trabalho, cumprindo o princípio normativo indicado no inciso XXXI do artigo 7.º da CF,
notadamente por meio da Lei 7.853/89 e de decreto regulamentar que estabelece que
entre 2 e 5% das vagas em empresas serão preenchidas por portadores de necessidades
especiais26
.
Seguindo a tradição das Constituições brasileiras, permaneceu proibida a distin-
ção entre trabalhadores manuais, técnicos e intelectuais, enquanto categorias, o que não
impede que se estatuam direitos específicos para determinada profissão, por exemplo,
bancários, professores etc.
Nesse sentido, o escólio atual do insuspeito Arnaldo Süssekind (2004, p. 274-275):
23 Não se deve confundir licença-maternidade, que é o direito de a gestante se afastar do trabalho sem prejuízo do salário pelo
período imediatamente anterior e posterior ao parto (CLT, art. 392), contando 120 dias, com a estabilidade da gestante, que é a
proscrição de exercício pelo empregador do direito potestativo de despedida da empregada gestante, da confirmação da gravidez
até cinco meses após o parto (ADCT, art. 10).
24 Gestante. Estabilidade provisória. I. O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao paga-
mento da indenização decorrente da estabilidade (TST, Súmula 244).
25 Segundo a nova redação da Súmula 244 do TST, a estabilidade da gestante não assegura reintegração, apenas salários e van-
tagens do período, exceto se esta se der durante o período estabilitário.
26 A expressão deficiente físico, de nítido cunho pejorativo, vem sendo substituída pela presente, reconhecida pelos psicólogos
como mais indicada.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
33
[...] o que a Constituição proíbe é que os direitos, garantias e benefícios assegurados de
maneira geral ou para determinada categoria distingam entre os trabalhadores manuais
ou técnicos e os intelectuais integrantes do grupo a que se refere a lei.
Normas existem na Constituição que espelha a preocupação do legislador com a
higiene e a segurança no trabalho (CF, art. 7.º, XXII e XXVIII), sendo relevante frisar que
a CLT disciplina as hipóteses de cabimento dos adicionais de periculosidade, (risco à vida
implicando contato com explosivo, inflamável ou energia elétrica) e insalubridade (risco à
saúde)27
. Ausente qualquer regulamentação ao trabalho penoso, o que implica dizer que
inexiste aplicação no momento do adicional de penosidade, cujos contornos devem estar
jungidos ao excessivo esforço físico ou intelectual, de resto a serem delimitados pelo
legislador infraconstitucional quando da futura normatização.
Questão relevante a fixar é a existência de dupla proteção contra o acidente de
trabalho, que se implementa pelo seguro a cargo do INSS, independente da possibilidade
de responsabilização direta do empregador.
Também pendente de regulamentação está a proteção em face da automação (CF,
art. 7.º, XXVII), que não implica apenas a substituição da energia humana ou animal por
energia inanimada, mas também a capacidade de pensar, ou seja, cogita-se da máquina
controlando outra máquina.
A prescrição pode ser conceituada como a perda do direito de ação pela inação do seu
titular, sendo tratada no artigo 7.º, XXIX, da Carta Magna. Pode ser de dois tipos: total
ou parcial; a primeira fulmina por completo o direito de ação, e a última apenas fração
deste.
A prescrição trabalhista foi modificada com a chegada da Constituição de 1988 e
novamente com o advento da Emenda Constitucional 28, de maio de 2000, que unificou
os prazos prescricionais de trabalhadores urbanos e rurais, pondo fim à injustificada
separação do regime anterior. Assim, na redação original da Constituição, vigorava pres-
crição total de dois anos aplicável a urbanos e rurais, e prescrição parcial de cinco anos,
esta última apenas para urbanos. Na sistemática atual, o empregado urbano ou rural
possui prazo de dois anos após o término do contrato para ingressar com ação, contados
do dia do término do contrato, podendo pleitear direitos atinentes aos últimos cinco
anos, contados do dia do ajuizamento da ação.
27 Artigo 189 e seguintes. Exige-se, quando discutida em Juízo a questão, que se realize perícia, sendo hipótese de prova legal,
consoante artigo 195, parágrafo 2.º, da CLT.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
DIREITO DO TRABALHO
Estabeleceu o Constituinte a equiparação do trabalhador avulso28
ao empregado,
que passou a se reportar, na sistemática nova, a todos os direitos.
A aposentadoria não é matéria tipicamente trabalhista, em um ordenamento jurí-
dico que, como o nosso, apresenta a dicotomia entre Direito do Trabalho e Direito Pre-
videnciário. Relevante apenas a análise dos efeitos da aposentadoria sobre o contrato de
trabalho29
.
Após o extenso rol de direitos referido acima, finaliza o legislador com o trato do
doméstico (CF, art. 7.º, parágrafo único). Em relação a ele, e mantendo injustificável tra-
tamento desfavorável à aludida categoria30
, indica o legislador expressamente os incisos
e os consequentes direitos aplicáveis ao doméstico, quais sejam: salário mínimo; irredu-
tibilidade salarial; décimo terceiro salário; repouso semanal remunerado; licença-mater-
nidade e paternidade; aviso prévio; aposentadoria e integração à Previdência Social.
Deixou fora da especificação e de qualquer regulamentação o trato da jornada
de trabalho; ademais, a não proteção do FGTS, que, na legislação infraconstitucio-
nal, é tratado como facultativo. As mais recentes alterações na Lei 5.859/72 (pela Lei
11.324/2006) incorporam como direitos do doméstico a estabilidade da gestante; a veda-
ção de descontos do salário, a exemplo de habilitação, alimentação, vestuário e higiene
pessoal; e as férias de 30 dias.
Direito coletivo
Tratou o legislador, nos artigos de 8.º a 11 da CF, do Direito Coletivo do Trabalho.
A CF fraciona em parte o sistema anterior em matéria de liberdade sindical, ao proceder
relativa desvinculação do sindicato em relação ao Estado. Dizemos relativa, eis que se
tornou despicienda autorização estatal para a existência do sindicato (antiga carta de
reconhecimento sindical), e proibiu a interferência do Estado nos sindicatos, no que foi
28 O avulso é espécie de trabalhador portuário que presta serviços por meio do sindicato ou do órgão gestor de mão de obra.
29 Após longos debates doutrinários e jurisprudenciais, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu em controle concentrado
de constitucionalidade que a aposentadoria não extingue o contrato de trabalho.
30 Vide a previsão do artigo 7.º, “a”, da CLT.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
35
extremamente feliz o Constituinte, mantendo, todavia, o sindicato atrelado ao Estado
ao disciplinar as receitas sindicais, notadamente a contribuição sindical obrigatória e a
contribuição para manutenção do sistema confederativo.
Outrossim, a regra de unicidade sindical revela imprópria interferência do legis-
lador que, a par de limitar os sindicatos em relação ao número (um sindicato por base
territorial), impõe o tamanho da base, que não poderá ser inferior ao município.
Tudo isso nos leva a falar na existência de uma liberdade sindical mitigada.
Outorgou-se ao sindicato monopólio da negociação coletiva, e se assegurou o
direito de greve. Ainda, asseguraram-se outras formas de representação dos trabalha-
dores não sindicais, de que é bom exemplo o artigo 11 da CF. Por fim, reconheceu-se
o direito de participação dos obreiros nos órgãos públicos em que se discutam seus
interesses profissionais ou previdenciários (CF, art. 10). Quanto à aplicação do Direito
Material do Trabalho, reconheceu a Carta Magna a autonomia jurisdicional do Direito
do Trabalho, ao disciplinar, no artigo 114, a competência da Justiça do Trabalho, talha-
da para litígios entre trabalhadores e empregadores, cuja competência restou sensivel-
mente ampliada pelo advento da Emenda 45/2004 (Reforma do Poder Judiciário), que,
afora a ampliação da competência para todas as formas de relação de trabalho, trouxe
novas matérias, a exemplo das multas aplicadas pela fiscalização do trabalho e dos dis-
sídios de legitimidade entre sindicatos. O poder normativo foi mitigado, passando-se a
exigir comum acordo para o ajuizamento dos dissídios coletivos de natureza econômi-
ca, a teor da nova redação do artigo 114, parágrafo 2.º, da CF, ressalvando-se apenas o
dissídio coletivo de greve (CF, art. 114, §3.º).
Direito Constitucional do Trabalho, de Arnaldo Lopes Süssekind, editora Renovar.
Direito e Processo do Trabalho, de Otávio Augusto Sousa, editora Forense.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
Teoria geral do
Direito do Trabalho
Terminologia da disciplina
Sistematizando o que vimos, no momento posterior à Revolução Industrial o
Direito do Trabalho desponta como disciplina autônoma.
A primeira celeuma a enfrentar reside justamente em como denominar a nova
disciplina jurídica. Muitas foram as denominações buscadas. Legislação Industrial, à qual
se pode opor o simples mas contundente fato de que o Direito não se resume à Lei. Afora
isso, ainda se pode objetar à aludida denominação o seu caráter restritivo e equívoco,
haja vista parecer indicar que o novo ramo do Direito aventado pela doutrina regraria­
tão somente relações de trabalho no setor secundário, deixando na marginalidade o pri-
mário, o terciário e o que alguns hoje denominam quaternário. Direito Industrial tam-
bém foi uma expressão utilizada e que se afigura igualmente permeada de imprecisões,
muito mais quando, além da objeção acima indicada quanto a seu caráter restritivo,
possui hoje significação própria, disciplinando as relações afetas à propriedade indus-
trial, marcas, patentes, dentre tantas outras. Direito Operário foi tentada e rechaçada,
quer pela ênfase exagerada em apenas um dos contratantes, quer pelo fato de possuir a
palavra operário, além-fronteiras, sentido peculiar jungido ao trabalho na indústria. Di-
reito Corporativo e Direito Sindical, expressões muito utilizadas por autores italianos, são
hoje superadas. Tentou-se Direito Social, à qual logo se objetou ser social todo o Direito.
Ademais, a expressão foi cunhada com sentido particular – a proteção aos economicamente­
débeis –, que extrapola em muito a matéria do Direito do Trabalho, albergando a proteção
à infância, à velhice, às mulheres. Direito do Trabalho é a denominação consagrada pelo
uso; com ressalvas, todavia, adotamos Direito do Trabalho pela evidente razão de ser, de
todas, a menos equívoca e a que resultou consagrada pelo legislador e pela doutrina.
Autonomia do Direito do Trabalho
Ultrapassada a questão atinente à denominação, ressalta, em determinado
momento histórico (a partir de 1919, com o Tratado de Versalhes), a autonomia desse
novo ramo do Direito. A autonomia pode ser vista sob diversos aspectos, dos quais
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
DIREITO DO TRABALHO
usualmente se enfatiza a autonomia científica, didática, legislativa e jurisdicional.
Desses enfoques, o único que de fato revela a existência de um novo ramo do Direito é
o primeiro, da autonomia científica.
Para que um ramo da ciência jurídica seja tido por autônomo (autonomia
­científica), há de atender a três pressupostos listados por Alfredo Rocco: possuir domínio
amplo, método próprio e princípios gerais comuns.
O Direito do Trabalho busca disciplinar as relações de trabalho subordinadas e even-
tualmente outros tipos de relações de trabalho. Abrange o trabalhador urbano, o rurícola,
o doméstico, afora as várias profissões regulamentadas. Detém, portanto, matéria suficien­
temente vasta, atendendo assim ao primeiro pressuposto listado por Rocco.
Sobre a existência de método próprio, vêm a propósito as lições de Godinho
­Delgado (2004, p. 68), para quem
[...] é também clara a existência de metodologia e métodos próprios ao ramo jurídico
especializado do trabalho. Neste passo, a particularidade justrabalhista é tão ­pronunciada
que o Direito do Trabalho destaca-se pela circunstância de possuir até ­mesmo métodos
próprios de criação jurídica, de geração da própria normatividade trabalhista. É o que se
ressalta, por exemplo, através dos importantes mecanismos de negociação ­coletiva exis-
tentes.
Dos três pressupostos, talvez o mais relevante seja o terceiro. Nos princípios,
ter-se-á a unificação e a sistematização das normas de determinada disciplina jurídica,
­revelando-lhes o sentido latente. Célebre se tornou a classificação do uruguaio Amé-
rico Plá Rodriguez, que elenca os seis princípios basilares do Direito Laboral, a saber:
proteção, consubstanciado em três regras (in dubio pro misero, norma mais favorável e
condição mais benéfica); irrenunciabilidade dos direitos; continuidade da relação de
emprego; primazia da realidade; razoabilidade e boa-fé.
Sem sombra de dúvidas, então, está caracterizada a autonomia científica do Direito
do Trabalho.
Afirma-se, sem sobressaltos, ao lado da autonomia científica, a didática, sendo
­suficiente para atestá-la volver os olhos à extensa doutrina existente sobre Direito La-
boral e à existência de uma cátedra específica para ministrar a disciplina em cursos de
graduação (Lei 2.724/56), afora os cursos de pós-graduação na matéria, seja stricto ou
lato sensu.
Detém o Direito do Trabalho autonomia legislativa, eclodindo de uma preocupa-
ção do legislador em disciplinar as relações de trabalho em seus múltiplos aspectos, de
que são exemplos a CLT, ampla legislação complementar, sem olvidar os artigos 7º a 11
da CF, reservados ao trato das relações de trabalho.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
39
Por derradeiro, a autonomia jurisdicional, nota característica do Direito do Tra-
balho pátrio, que reserva um ramo do Poder Judiciário para dirimir os litígios que de-
corram das relações de trabalho. Condenada por uns, elogiada por outros, certo é que a
Justiça do Trabalho se tem mostrado, de todas, a mais efetiva e célere, ainda que esteja
muito longe de ser ideal.
Taxonomia
Questão que não pode ser ignorada consiste em proceder à localização do Direito
do Trabalho no âmbito da ciência jurídica, ou seja, exercitar a taxonomia.
Desde Ulpiano, busca-se “subdividir” o Direito, tendo em vista a absoluta
­impossibilidade de compreendê-lo senão recorrendo a classificações e subdivisões, e,
mais que isso, tal ­método traz em si a única forma possível de transmitir o conhecimen-
to, desempenhando relevante ­função didática. Pontifica Orlando Gomes (2005, p. 23),
com base no magistério de Ulpiano, que “O Direito Público tem por sujeito o Estado e,
por objeto, o interesse público; ao passo que o Direito Privado tem por sujeito o indiví-
duo e, por objeto, o interesse particular.”
Hodiernamente, busca-se o reconhecimento de uma classificação tripartite do
Direito, em Público, Privado e Social. Data venia, não nos parece que exista, com contor-
nos definidos, o terceiro ramo apontado.
O Direito do Trabalho, em verdade, apresenta, em sua ampla maioria, normas
típicas de Direito Privado. A existência de um corpo de normas de disponibilidade re-
lativa e imperativa não desnatura o que viemos expor: o que qualifica o Direito como
Público não é a pura e simples interferência do Estado, e sim, ainda que tal se verifique,
a visualização do interesse protegido e, em nosso caso, o nítido intuito de proteção a
interesse de particulares. As regras utilizadas na interpretação e aplicação do Direito
do Trabalho haverão de ser cotejadas, atentando-se a essas vicissitudes, mormente sua
pertinência ao Direito Privado.
Relações com outros ramos do Direito
Consequência inelutável da indivisibilidade do fenômeno jurídico é a necessidade
de se rememorar que o Direito do Trabalho se relaciona, então, com todos os outros ­ramos
do Direito. Isso ocorre porque, sendo as classificações apenas fruto da necessidade de
apreensão de um objeto (ciência jurídica), o qual se apresenta excessivamente amplo, e
ante a necessidade de se viabilizar a transmissão do conhecimento, surgem as referidas
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
DIREITO DO TRABALHO
classificações, que não passam, portanto, de categorias ideais. Daí a necessidade, para
minorar os efeitos das classificações, de enfatizar a inter-relação dos diferentes ramos
do Direito.
Nessa medida, o Direito do Trabalho se relaciona com o Direito Civil, do qual
retira as regras gerais do negócio jurídico e da teoria geral dos contratos. Interpenetra o
Direito Comercial, no qual busca o suporte teórico para conceitos como o de empresa, uti-
lizado no artigo 2.º da Norma Consolidada, fora reminiscência com direitos de lá escandi-
dos, como o aviso prévio do antigo Código Comercial de 1850. Trava íntimas relações com
o Direito Constitucional, do qual retira parte de seus princípios, estando na Constituição
Federal de 1988 uma série de postulados básicos do Direito Individual (CF, art. 7.º), Co-
letivo (arts. 8.º a 11), isso afora o reconhecimento da Justiça do Trabalho (art. 114). Com
o Processo do Trabalho se toca na medida em que este é o modo de concreção do Direito
Material do Trabalho. Interliga-se assim também indiretamente com o Processo Civil,
do qual o Processo do Trabalho vai retirar as noções essenciais de competência, partes,
procuradores, além da regra expressa do artigo 769 da CLT. No Direito Internacional,
busca as regras sobre aplicação, recepção e denúncia das convenções, recomendações
e tratados internacionais, tão relevantes em um mundo cada vez mais globalizado. Po-
deríamos prosseguir, mas cremos ter atingido nosso desiderato de demonstrar ao leitor
que, se o Direito e seu objeto são indivisíveis, e as classificações mero ­subterfúgio didá-
tico, o Direito do Trabalho se relaciona com todos os outros ramos da ciência ­jurídica.
Divisão interna
É pertinente fixar, a esta altura, a divisão interna do Direito do Trabalho. Os auto-
res apresentam múltiplas classificações, sendo possível divisar, entrementes, dois grandes
­ramos: Direito Individual do Trabalho e Direito Coletivo do Trabalho. Poderíamos mesmo falar
em subdividir o fenômeno laboral, em sentido estrito, na forma acima proposta.
No Direito Individual, viceja a preocupação com cada uma das relações de traba-
lho verificadas entre empregado e empregador. Estão compreendidos nele o trato dos
sujeitos do contrato de trabalho, seus elementos, alteração, suspensão ou interrupção e
terminação. Ocupa-se, ainda, da duração do trabalho e da remuneração, dentre tantos
­outros temas, voltados, em perspectiva mais específica, para disciplinar cada um dos
ajustes que envolvem as condições de trabalho subordinado.
No Direito Coletivo, temos uma preocupação com a estruturação da representa-
ção dos trabalhadores, sindical e não sindical, daí preferirmos a expressão1
pela sua
1 Muitos autores advogam a utilização de Direito Sindical, como Mascaro Nascimento. Outros preferem Direito Sindical e Coletivo,
como Rodri­gues Pinto (2003).
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
41
­amplitude. Ademais disso, disciplina-se a negociação coletiva e, assim sendo, as for-
mas de ­exercício da autonomia privada coletiva, por meio dos institutos peculiares do
acordo e da convenção coletiva de trabalho; cogita também o Direito Coletivo do direito de
greve. Por conseguinte, seu objeto se desborda além mesmo da esfera de atuação dos
sindicatos e de suas projeções: federações, confederações e centrais sindicais. O foco,
agora, são as relações jurídicas que envolvem o conjunto dos trabalhadores, e somente por via
reflexa cada uma das respectivas relações individuais de emprego, em que, em ­análise apurada,
decompõem-se tal conjunto. Pensa-se, assim, nos trabalhadores não individualmente,
mas em perspectiva de todo, unitária. A classificação adotada é ­didática, na medida
em que permite antecipar uma repartição usualmente adotada em sede de Processo do
Trabalho, qual seja, em relação aos dissídios ou ações: os dissídios individuais de trabalho
e dissídios coletivos de trabalho.
Em sentido amplo, poderíamos, alargando o espectro, pensar em quatro gran-
des sub-ramos. Direito Individual do Trabalho e Direito Coletivo do Trabalho, dos quais
falamos acima, justapostos ao Direito Internacional do Trabalho e ao Direito Público do
­Trabalho. No ­Direito Internacional do Trabalho, temos o estudo das fontes internacio-
nais, notadamente as convenções e recomendações oriundas da Organização Interna-
cional do Trabalho (OIT), além dos tratados internacionais. A crescente mundialização
faz aumentar a preocupação em uniformizar as condições de trabalho, fato sentido des-
de a edição do Tratado de Versalhes, em 1919. Quanto ao Direito Público, temos aqui
as relações que unem o Estado às partes da relação laboral, notadamente o empregador.
Encontram-se abrangidas nesse último sub-ramo as regras atinentes à fiscalização tra-
balhista, penalidades e, regra geral, os conteúdos de ordem pública2
existentes, como
temos, v.g., nas normas de higiene e segurança no trabalho.
Direito do Trabalho: definição
A par dos conceitos empreendidos, urge definir Direito do Trabalho. Usualmente,
são três as formas de se definir: consoante as pessoas, os sujeitos que serão abrangidos por
aquele determinado ramo da ciência do Direito; em atenção à matéria a ser disciplinada, o
objeto da disciplina em questão; ou pela conjugação dos dois critérios anteriores, possi-
bilitando, respectivamente, definições subjetivistas, objetivistas e mistas.
As definições irão variar de acordo com a posição ideológica ou o critério de cada
doutrinador, pelo que nos limitaremos a sugerir nossa definição. Assim, temos que o Di-
reito do Trabalho é o ramo da ciência do Direito formado por um conjunto de princípios
e normas jurídicas que disciplinam as relações entre trabalhadores e empregadores, das
2 Sobre a distinção entre normas de ordem pública e normas ­indisponíveis, conceitos inconfundíveis, ver acima o que falamos
em sede de taxonomia.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
DIREITO DO TRABALHO
associações que conjugam seus respectivos interesses e destes com o Estado, gravitando
sobre o trabalho subordinado e eventualmente sobre outros tipos de relações de labor
(SOUSA, 2002).
Fontes do Direito do Trabalho:
conceito, classificações e espécies
Por apego à etimologia, o conceito de fonte é indicado pela quase totalidade dos
autores como repositórios de onde surge o Direito. A representação visual da nascente de
um rio, embora nada criativa, presta-se a permitir rápida visualização e apreensão da
problemática das fontes.
Múltiplas são as classificações das fontes, sendo as mais relevantes as seguintes:
fonte formal e material; fonte vinculante e não vinculante; fonte autônoma e heterônoma.
Para enfeixarmos, entrementes, todos os problemas possíveis em sede de fontes,
urge a adoção de derradeira classificação por nós proposta, em fontes ordinárias e ex-
traordinárias ou residuais.
Fonte material são os valores da sociedade e os fatos sociais, econômicos, culturais
que fornecem o substrato à elaboração da norma jurídica, enquanto fonte formal é a pró-
pria exteriorização, positivação ou concretização da norma, a maneira como o Direito
formalmente se expressa.
Em Direito do Trabalho, a fonte material que ocasionou sua criação no mundo
foi plural, envolvendo fatos sociais, econômicos e políticos, dentre os quais se destacou
“a pressão exercida sobre o Estado capitalista pela ação reivindicatória dos trabalhado-
res”, conforme lições de Gerard Lyon-Caen, apoiado no particular por Délio Maranhão
(1993, p. 154).
Embora relevante a atuação dos trabalhadores na formação do Direito do Traba-
lho, não nos parece que se possa entender ter sido esse único elemento, isoladamente,
fonte material do Direito do Trabalho, no que ousamos divergir das lições acima trans-
critas, para reconhecer, como o faz a doutrina majoritária, que o conjunto dos acon-
tecimentos do período inaugurado com a primeira Revolução Tecnológica (Revolução
Industrial), estes sim em suas múltiplas repercussões (enquanto conjunto), evidenciam
a fonte material deste ramo da ciência jurídica.
Existem fontes às quais o intérprete ou aplicador do Direito se encontra adstrito,
como ocorre, por exemplo, com a lei e o costume. Diante de outras, o intérprete é livre
para observá-las ou não, o que se presta a firmar o conceito, respectivamente, de fonte
vinculante e fonte não vinculante. Pertencem à última espécie a doutrina e a jurisprudên-
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
43
cia, que, por se enquadrarem no conceito proposto de fonte, detêm tal qualidade, pois
delas surge direito, como veremos à frente.
Ainda se pode falar a partir e dentro das fontes formais, notadamente a partir do
tipo de norma nelas consagrada, em fontes autônomas ou heterônomas. Nas primeiras, tería-
mos aquelas que provêm da vontade de ambas as partes envolvidas na relação de traba-
lho, de que são exemplos o contrato individual de trabalho, o acordo e a convenção coleti-
va. Heterônomas são aquelas que provêm da vontade de apenas uma das partes ou de um
terceiro ­estranho às partes, nas quais se identifica e sobreleva a Lei (sentido formal).
Fontes residuais ou extraordinárias podem ser garimpadas dentre aquelas de que
cogita o artigo 8.º da CLT.
Expliquemo-nos. Se fonte é o repositório de onde surge o Direito, será subsumível
ao referido conceito e, portanto, fonte, qualquer local de onde o Direito possa nascer,
seja tal nascimento corriqueiro, usual (fontes ordinárias), ou excepcional, ipso facto,
incomum (fontes ­extraordinárias), critério que se pauta na frequência de sua utilização.
Assim, empreende-se derradeira classificação, em fontes ordinárias, albergando princípios3
e regras de Direito (norma em sentido estrito) e fontes extraordinárias ou residuais, que
são passíveis de serem ­retiradas em sua maioria do artigo 8.º da CLT, e que seriam: dou-
trina, jurisprudência, analogia, equidade e o Direito Comparado. Identificam-se, assim,
dentro das fontes extraordinárias ou residuais, as formas de integração do Direito.
Ora, se ausente a norma (sentido amplo), existe determinação expressa de perse-
cução nos aludidos institutos da solução para as lides laborais; esses institutos, assim,
hão que ser, a toda evidência, reconhecidos como fontes.
Falemos agora das fontes em espécie.
Lei será, em sentido amplo, sinônimo de norma jurídica, mas, em sentido próprio,
restrito, representa toda norma que passa por um processo formal de elaboração legislativa pre-
visto pelo legislador extraordinário de 1988 em seu artigo 59 e ­seguintes. São enquadráveis no
conceito as emendas à Constituição (cada dia mais numerosas) leis complementares, leis
ordinárias, delegadas e medidas provisórias – emanações que seguem, ­portanto, o pro-
cesso formal previsto na Constituição, o qual se revela uma sucessão preestabelecida de
fases, culminado com sua promulgação, publicação e início de vigência.4
São traços característicos das leis: a generalidade, a abstratividade, a impesso-
alidade e a obrigatoriedade ante a possibilidade de coerção a ela inerente. É pródiga a
atuação da Lei no Direito do Trabalho.
3 O reconhecimento de conteúdo normativo aos princípios aceitos pela doutrina a partir das lições da moderna Filosofia do
Direito implica classi­ficá-los como fontes ordinárias.
4 Vigência, validade e eficácia são conceitos distintos.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
DIREITO DO TRABALHO
Costumes são práticas espontâneas, repetidas e relativamente uniformes que tra-
zem consigo a ideia de obrigatoriedade, ou opinio juris ac necessitatis. Apresenta-se juri-
dicamente como fonte autônoma, sendo dentre todas as fontes uma das mais efetivas,
na medida em que, para que seja costume jurídico, deve a coletividade trazer ínsita a
ideia de que a observância das práticas que constituem seu objeto são dever jurídico;
logo, tais práticas já devem ser do conhecimento das partes, não precisando essa espécie
normativa recorrer, como diversamente ocorre com a lei, ao artificialismo da publicação.
Pode ser secundum legem, praeter legem e contra legem. É de se ressaltar que, em alguns epi-
sódios, a própria norma trabalhista determina a observância do costume, como ocorre
quanto ao rurícola em relação aos intervalos intrajornada (Lei 5.889/73). Frise-se que,
em um país como o nosso, de tradição de Direito Codificado, logo, escrito, o costume
não tem a eficácia derrogatória da lei, podendo ocorrer o desuetudo ou desuso. A lei é vi-
gente e válida, mas tem sua eficácia atingida na medida em que, na prática, deixa de ser
aplicada, haja vista ser substituída na coletividade pelo teor do costume.5
O regulamento, sem adjetivações, não se confunde com o regulamento de em-
presa. Enquanto o primeiro é forma de explicitar o conteúdo da lei para facilitar sua
­execução (de que são exemplos portarias, circulares e ordens de serviço), o último é a
norma interna da empresa.
Os conceitos de convenção e acordo coletivo se encontram apostos na Consolida-
ção, respectivamente no artigo 611, caput, e em seu parágrafo 1.º. Convenção coletiva é
contrato normativo6
intersindical7
com escopo de criar condições de trabalho. O acordo
coletivo tem por diferença específica as partes, que são sindicato de empregados (categoria
profissional) e “empresa ou grupo de empresas”.8
Sentença normativa é aquela prolatada em sede de dissídio coletivo. Especifica-
mente, informa o poder normativo dos tribunais, tratado na Carta Magna em seu artigo
114, parágrafo 2.º. Erige a possibilidade de os tribunais criarem condições de trabalho nas hipó-
teses em que o exercem, hoje mitigado pela Emenda 45/2004 e a exigir comum acordo,aplicá-
veis, por prazo determinado, às categorias envolvidas e na respectiva base territorial.
5 A utilização imprópria do cheque enquanto ­título de crédito espelha a ­problemática: sendo ordem de pagamento à vista, foi
em tempos recentes utilizado largamente como instrumento de obtenção de crédito e pagamento ­parcelado. Nesse sentido, a
­jurisprudência reconhece o costume ­jurídico, como se percebe nas decisões do STJ.
6 O que revela sua natureza jurídica híbrida, misto que é de acordo de vontades (con­tra­to) e veículo de criação de condições de
trabalho (norma).
7 Abrange os sindicatos da categoria profissional (empre­gados) e econômica ­(empre­gadores).
8 Para seguir a expressão do legislador. Deve-se observar a distinção entre pessoa, empresa e estalecimento, que nos permite
separar o sujeito celebrante da convenção ou ­acordo (pessoa) de um objeto d­e direito, que é a empresa.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
45
Contrato individual de trabalho é a “fonte primária”9
do Direito do Trabalho, conse-
quência inelutável do reconhecimento da natureza contratual da relação de trabalho, ou
seja, de que a vontade das partes envolvidas desempenha importante papel na atuação
da norma. Não se cogita aqui senão do fato de que as partes são livres para celebrarem
ou não o ajuste (contrato) de labor que faz incidir a norma trabalhista,10
e assim, a
existência da vontade pode ser aferida na formação do contrato, inobstante o limitado
alcance na determinação do conteúdo da avença.
Aplicação do Direito do Trabalho no espaço:
a hierarquia das fontes – o conflito e suas soluções
Estabelecidas as várias espécies de fontes, há que se fixar a ordem de prevalência
entre elas. Em acordo com a nossa sistemática constitucional e com arrimo na melhor
doutrina, pode-se divisar a seguinte ordem de precedência ou hierarquia entre as fontes
mais citadas pelos autores:
Constituição, inclusive a atividade revisional e de reforma
(emendas constitucionais)
Leis (complementares, ordinárias, delegadas)
Regulamento
Sentença normativa
Convenção coletiva
Acordo coletivo
Costume
Regulamento de empresa
Contrato individual de trabalho
Merece análise, entretanto, a classificação – sugerida por Orlando Gomes (2005) e
repetida por parcela significativa dos autores – que distribui as fontes na forma a seguir:
9 A expressão é de Orlando Gomes (2005, p. 33) para quem “A fonte primária, ou fonte de criação, comum a todo Direito Privado,
é a vontade das partes.”
10 Teoria contratualista moderna.
Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,
mais informações www.iesde.com.br
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História
Direito Trabalho História

Más contenido relacionado

Similar a Direito Trabalho História

LEGISLAÇÃO TRABALHISTA: A Lei na teoria e na prática
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA: A Lei na teoria e na práticaLEGISLAÇÃO TRABALHISTA: A Lei na teoria e na prática
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA: A Lei na teoria e na práticaProjetoSemeandoaLeitura
 
Apostila direito trabalho ana paula e simone 05 (1)
Apostila direito trabalho   ana paula e simone 05 (1)Apostila direito trabalho   ana paula e simone 05 (1)
Apostila direito trabalho ana paula e simone 05 (1)Leonardo Chagas
 
Agestodaseguranadotrabalhocomofontedequalidadedevida 120925031647-phpapp01
Agestodaseguranadotrabalhocomofontedequalidadedevida 120925031647-phpapp01Agestodaseguranadotrabalhocomofontedequalidadedevida 120925031647-phpapp01
Agestodaseguranadotrabalhocomofontedequalidadedevida 120925031647-phpapp01Thais Barreto
 
Manual forense previdenciã¡rio (1)
Manual forense previdenciã¡rio (1)Manual forense previdenciã¡rio (1)
Manual forense previdenciã¡rio (1)Ilídia Direito
 
14 administração de pessoal (direito do trabalho)
14   administração de pessoal (direito do trabalho)14   administração de pessoal (direito do trabalho)
14 administração de pessoal (direito do trabalho)Elizeu Ferro
 
TCC ANDERSON REFORMA TRABALHISTA.pdf
TCC ANDERSON REFORMA TRABALHISTA.pdfTCC ANDERSON REFORMA TRABALHISTA.pdf
TCC ANDERSON REFORMA TRABALHISTA.pdfAndersonSilva863340
 

Similar a Direito Trabalho História (6)

LEGISLAÇÃO TRABALHISTA: A Lei na teoria e na prática
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA: A Lei na teoria e na práticaLEGISLAÇÃO TRABALHISTA: A Lei na teoria e na prática
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA: A Lei na teoria e na prática
 
Apostila direito trabalho ana paula e simone 05 (1)
Apostila direito trabalho   ana paula e simone 05 (1)Apostila direito trabalho   ana paula e simone 05 (1)
Apostila direito trabalho ana paula e simone 05 (1)
 
Agestodaseguranadotrabalhocomofontedequalidadedevida 120925031647-phpapp01
Agestodaseguranadotrabalhocomofontedequalidadedevida 120925031647-phpapp01Agestodaseguranadotrabalhocomofontedequalidadedevida 120925031647-phpapp01
Agestodaseguranadotrabalhocomofontedequalidadedevida 120925031647-phpapp01
 
Manual forense previdenciã¡rio (1)
Manual forense previdenciã¡rio (1)Manual forense previdenciã¡rio (1)
Manual forense previdenciã¡rio (1)
 
14 administração de pessoal (direito do trabalho)
14   administração de pessoal (direito do trabalho)14   administração de pessoal (direito do trabalho)
14 administração de pessoal (direito do trabalho)
 
TCC ANDERSON REFORMA TRABALHISTA.pdf
TCC ANDERSON REFORMA TRABALHISTA.pdfTCC ANDERSON REFORMA TRABALHISTA.pdf
TCC ANDERSON REFORMA TRABALHISTA.pdf
 

Último

Mesoamérica.Astecas,inca,maias , olmecas
Mesoamérica.Astecas,inca,maias , olmecasMesoamérica.Astecas,inca,maias , olmecas
Mesoamérica.Astecas,inca,maias , olmecasRicardo Diniz campos
 
Prática de interpretação de imagens de satélite no QGIS
Prática de interpretação de imagens de satélite no QGISPrática de interpretação de imagens de satélite no QGIS
Prática de interpretação de imagens de satélite no QGISVitor Vieira Vasconcelos
 
Educação São Paulo centro de mídias da SP
Educação São Paulo centro de mídias da SPEducação São Paulo centro de mídias da SP
Educação São Paulo centro de mídias da SPanandatss1
 
Slides Lição 03, Central Gospel, O Arrebatamento, 1Tr24.pptx
Slides Lição 03, Central Gospel, O Arrebatamento, 1Tr24.pptxSlides Lição 03, Central Gospel, O Arrebatamento, 1Tr24.pptx
Slides Lição 03, Central Gospel, O Arrebatamento, 1Tr24.pptxLuizHenriquedeAlmeid6
 
DIA DO INDIO - FLIPBOOK PARA IMPRIMIR.pdf
DIA DO INDIO - FLIPBOOK PARA IMPRIMIR.pdfDIA DO INDIO - FLIPBOOK PARA IMPRIMIR.pdf
DIA DO INDIO - FLIPBOOK PARA IMPRIMIR.pdfIedaGoethe
 
HORA DO CONTO3_BECRE D. CARLOS I_2023_2024
HORA DO CONTO3_BECRE D. CARLOS I_2023_2024HORA DO CONTO3_BECRE D. CARLOS I_2023_2024
HORA DO CONTO3_BECRE D. CARLOS I_2023_2024Sandra Pratas
 
HORA DO CONTO5_BECRE D. CARLOS I_2023_2024
HORA DO CONTO5_BECRE D. CARLOS I_2023_2024HORA DO CONTO5_BECRE D. CARLOS I_2023_2024
HORA DO CONTO5_BECRE D. CARLOS I_2023_2024Sandra Pratas
 
PPT _ Módulo 3_Direito Comercial_2023_2024.pdf
PPT _ Módulo 3_Direito Comercial_2023_2024.pdfPPT _ Módulo 3_Direito Comercial_2023_2024.pdf
PPT _ Módulo 3_Direito Comercial_2023_2024.pdfAnaGonalves804156
 
geografia 7 ano - relevo, altitude, topos do mundo
geografia 7 ano - relevo, altitude, topos do mundogeografia 7 ano - relevo, altitude, topos do mundo
geografia 7 ano - relevo, altitude, topos do mundonialb
 
Bingo da potenciação e radiciação de números inteiros
Bingo da potenciação e radiciação de números inteirosBingo da potenciação e radiciação de números inteiros
Bingo da potenciação e radiciação de números inteirosAntnyoAllysson
 
Atividade com a letra da música Meu Abrigo
Atividade com a letra da música Meu AbrigoAtividade com a letra da música Meu Abrigo
Atividade com a letra da música Meu AbrigoMary Alvarenga
 
02. Informática - Windows 10 apostila completa.pdf
02. Informática - Windows 10 apostila completa.pdf02. Informática - Windows 10 apostila completa.pdf
02. Informática - Windows 10 apostila completa.pdfJorge Andrade
 
Slide de exemplo sobre o Sítio do Pica Pau Amarelo.pptx
Slide de exemplo sobre o Sítio do Pica Pau Amarelo.pptxSlide de exemplo sobre o Sítio do Pica Pau Amarelo.pptx
Slide de exemplo sobre o Sítio do Pica Pau Amarelo.pptxconcelhovdragons
 
Aula - 2º Ano - Cultura e Sociedade - Conceitos-chave
Aula - 2º Ano - Cultura e Sociedade - Conceitos-chaveAula - 2º Ano - Cultura e Sociedade - Conceitos-chave
Aula - 2º Ano - Cultura e Sociedade - Conceitos-chaveaulasgege
 
HORA DO CONTO4_BECRE D. CARLOS I_2023_2024
HORA DO CONTO4_BECRE D. CARLOS I_2023_2024HORA DO CONTO4_BECRE D. CARLOS I_2023_2024
HORA DO CONTO4_BECRE D. CARLOS I_2023_2024Sandra Pratas
 
trabalho wanda rocha ditadura
trabalho wanda rocha ditaduratrabalho wanda rocha ditadura
trabalho wanda rocha ditaduraAdryan Luiz
 
FCEE - Diretrizes - Autismo.pdf para imprimir
FCEE - Diretrizes - Autismo.pdf para imprimirFCEE - Diretrizes - Autismo.pdf para imprimir
FCEE - Diretrizes - Autismo.pdf para imprimirIedaGoethe
 
Aula 13 8º Ano Cap.04 Revolução Francesa.pptx
Aula 13 8º Ano Cap.04 Revolução Francesa.pptxAula 13 8º Ano Cap.04 Revolução Francesa.pptx
Aula 13 8º Ano Cap.04 Revolução Francesa.pptxBiancaNogueira42
 

Último (20)

Mesoamérica.Astecas,inca,maias , olmecas
Mesoamérica.Astecas,inca,maias , olmecasMesoamérica.Astecas,inca,maias , olmecas
Mesoamérica.Astecas,inca,maias , olmecas
 
Prática de interpretação de imagens de satélite no QGIS
Prática de interpretação de imagens de satélite no QGISPrática de interpretação de imagens de satélite no QGIS
Prática de interpretação de imagens de satélite no QGIS
 
XI OLIMPÍADAS DA LÍNGUA PORTUGUESA -
XI OLIMPÍADAS DA LÍNGUA PORTUGUESA      -XI OLIMPÍADAS DA LÍNGUA PORTUGUESA      -
XI OLIMPÍADAS DA LÍNGUA PORTUGUESA -
 
Educação São Paulo centro de mídias da SP
Educação São Paulo centro de mídias da SPEducação São Paulo centro de mídias da SP
Educação São Paulo centro de mídias da SP
 
Slides Lição 03, Central Gospel, O Arrebatamento, 1Tr24.pptx
Slides Lição 03, Central Gospel, O Arrebatamento, 1Tr24.pptxSlides Lição 03, Central Gospel, O Arrebatamento, 1Tr24.pptx
Slides Lição 03, Central Gospel, O Arrebatamento, 1Tr24.pptx
 
DIA DO INDIO - FLIPBOOK PARA IMPRIMIR.pdf
DIA DO INDIO - FLIPBOOK PARA IMPRIMIR.pdfDIA DO INDIO - FLIPBOOK PARA IMPRIMIR.pdf
DIA DO INDIO - FLIPBOOK PARA IMPRIMIR.pdf
 
HORA DO CONTO3_BECRE D. CARLOS I_2023_2024
HORA DO CONTO3_BECRE D. CARLOS I_2023_2024HORA DO CONTO3_BECRE D. CARLOS I_2023_2024
HORA DO CONTO3_BECRE D. CARLOS I_2023_2024
 
HORA DO CONTO5_BECRE D. CARLOS I_2023_2024
HORA DO CONTO5_BECRE D. CARLOS I_2023_2024HORA DO CONTO5_BECRE D. CARLOS I_2023_2024
HORA DO CONTO5_BECRE D. CARLOS I_2023_2024
 
PPT _ Módulo 3_Direito Comercial_2023_2024.pdf
PPT _ Módulo 3_Direito Comercial_2023_2024.pdfPPT _ Módulo 3_Direito Comercial_2023_2024.pdf
PPT _ Módulo 3_Direito Comercial_2023_2024.pdf
 
geografia 7 ano - relevo, altitude, topos do mundo
geografia 7 ano - relevo, altitude, topos do mundogeografia 7 ano - relevo, altitude, topos do mundo
geografia 7 ano - relevo, altitude, topos do mundo
 
Bingo da potenciação e radiciação de números inteiros
Bingo da potenciação e radiciação de números inteirosBingo da potenciação e radiciação de números inteiros
Bingo da potenciação e radiciação de números inteiros
 
Atividade com a letra da música Meu Abrigo
Atividade com a letra da música Meu AbrigoAtividade com a letra da música Meu Abrigo
Atividade com a letra da música Meu Abrigo
 
02. Informática - Windows 10 apostila completa.pdf
02. Informática - Windows 10 apostila completa.pdf02. Informática - Windows 10 apostila completa.pdf
02. Informática - Windows 10 apostila completa.pdf
 
Slide de exemplo sobre o Sítio do Pica Pau Amarelo.pptx
Slide de exemplo sobre o Sítio do Pica Pau Amarelo.pptxSlide de exemplo sobre o Sítio do Pica Pau Amarelo.pptx
Slide de exemplo sobre o Sítio do Pica Pau Amarelo.pptx
 
Aula - 2º Ano - Cultura e Sociedade - Conceitos-chave
Aula - 2º Ano - Cultura e Sociedade - Conceitos-chaveAula - 2º Ano - Cultura e Sociedade - Conceitos-chave
Aula - 2º Ano - Cultura e Sociedade - Conceitos-chave
 
HORA DO CONTO4_BECRE D. CARLOS I_2023_2024
HORA DO CONTO4_BECRE D. CARLOS I_2023_2024HORA DO CONTO4_BECRE D. CARLOS I_2023_2024
HORA DO CONTO4_BECRE D. CARLOS I_2023_2024
 
Orientação Técnico-Pedagógica EMBcae Nº 001, de 16 de abril de 2024
Orientação Técnico-Pedagógica EMBcae Nº 001, de 16 de abril de 2024Orientação Técnico-Pedagógica EMBcae Nº 001, de 16 de abril de 2024
Orientação Técnico-Pedagógica EMBcae Nº 001, de 16 de abril de 2024
 
trabalho wanda rocha ditadura
trabalho wanda rocha ditaduratrabalho wanda rocha ditadura
trabalho wanda rocha ditadura
 
FCEE - Diretrizes - Autismo.pdf para imprimir
FCEE - Diretrizes - Autismo.pdf para imprimirFCEE - Diretrizes - Autismo.pdf para imprimir
FCEE - Diretrizes - Autismo.pdf para imprimir
 
Aula 13 8º Ano Cap.04 Revolução Francesa.pptx
Aula 13 8º Ano Cap.04 Revolução Francesa.pptxAula 13 8º Ano Cap.04 Revolução Francesa.pptx
Aula 13 8º Ano Cap.04 Revolução Francesa.pptx
 

Direito Trabalho História

  • 1. www.iesde.com.br DIREITODOTRABALHO OTÁVIO AUGUSTO REIS DE SOUSA DIREITO DO TRABALHODIREITO DO TRABALHO Fundação Biblioteca Nacional ISBN 978-85-387-3244-0 9 7 8 8 5 3 8 7 3 2 4 4 0 Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 2. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 3. ADVOCACIA GERAL IESDE Brasil S.A. Curitiba 2012 DIREITO DO TRABALHO Otávio Augusto Reis de Sousa 5.a edição Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 4. CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ __________________________________________________________________________________ S696d 6.ed. Sousa, Otávio Augusto Reis de Direito do trabalho / Otávio Augusto Reis de Sousa. - 6.ed. - Curitiba, PR : IESDE Brasil, 2012. 196p. : 21 cm (PEJ. Advocacia geral) Inclui bibliografia ISBN 978-85-387-3244-0 1. Direito do trabalho - Brasil. I. Título. II. Série. 12-7580. CDU: 349.2(81) 18.10.12 25.10.12 039985 __________________________________________________________________________________ © 2005-2012 – IESDE Brasil S.A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito dos autores e do detentor dos direitos autorais. 10/12 Atualizado até outubro de 2012. Capa: IESDE Brasil S.A. Imagem da capa: IESDE Brasil S.A. IESDE Brasil S.A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br Todos os direitos reservados. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 5. SUMÁRIO História do Direito do Trabalho 11 O vocábulo trabalho 12 Evolução histórica do trabalho humano 13 Primeira Revolução Tecnológica 15 Surgimento do Direito do Trabalho 19 Direito do Trabalho no Brasil A Constituição Federal de 1988 23 Direito Constitucional do Trabalho 23 Princípios constitucionais do Direito do Trabalho 24 Análise descritiva do campo normativo da CF/88 25 Direito individual 34 Direito coletivo Teoria geral do Direito do Trabalho 37 Terminologia da disciplina 37 Autonomia do Direito do Trabalho 39 Taxonomia 39 Relações com outros ramos do Direito 40 Divisão interna Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 6. SUMÁRIO 41 Direito do Trabalho: definição 42 Fontes do Direito do Trabalho: conceito, classificações e espécies 45 Aplicação do Direito do Trabalho no espaço: a hierarquia das fontes – o conflito e suas soluções 46 Interpretação e integração do Direito do Trabalho 47 Aplicação do Direito do Trabalho no tempo e em razão das pessoas Teoria geral do Direito do Trabalho (continuação) 51 Princípios especiais do Direito do Trabalho 52 Princípios gerais do Direito e especiais do Direito do Trabalho 55 Considerações últimas sobre o princípio da flexibilização do Direito do Trabalho Contrato individual de trabalho 57 Relação de trabalho versus relação de emprego 58 Teorias contratualistas 58 Teorias anticontratualistas 59 Caracteres e classificações do contrato individual de trabalho Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 7. SUMÁRIO 64 Regras do contrato por tempo determinado 65 Rescisão antecipada do contrato por tempo determinado 66 Pressupostos do contrato de trabalho 70 Elementos do contrato de trabalho 72 Elementos acidentais do contrato de trabalho: condição e termo 74 Obrigações decorrentes do contrato de trabalho 74 Nulidade e anulabilidade no Direito do Trabalho Sujeitos do contrato individual de trabalho: empregado 79 O empregado 81 Empregado rural 83 Trabalho noturno 83 Intervalos intrajornada 84 Salário in natura 86 Empregado doméstico (Lei 5.859/72 c/c CF, art. 7.º, parágrafo único) 91 Estágio (Lei 11.788/2008) 92 Altos empregados 93 Empregado em domicílio 94 Trabalho temporário (Lei 6.019/74) Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 8. SUMÁRIO 96 Lei de fomento ao emprego (Lei 9.601/98) 96 Contrato de Aprendizagem Empregador 99 Conceito 104 Grupo econômico ou grupo de empresas 105 Sucessão de empregadores 107 Estado como empregador 108 Terceirização Remuneração e salário 113 Remuneração 114 Salário 116 Salário mínimo 118 Salário profissional ou piso salarial profissional 118 Salário normativo ou piso salarial normativo 119 Salário contratual 119 Elementos do complexo remuneratório 120 Elementos do complexo salarial (salário lato sensu) 123 Elementos não integrantes do complexo remuneratório Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 9. SUMÁRIO 123 Princípios de proteção ao salário 127 Regras legais de proteção Duração do trabalho 131 Regras: aspecto ativo 135 Contrato a tempo parcial 136 Regras: aspectos ativo e passivo, intervalos, repouso semanal e férias Alteração das condições de trabalho e suspensão da prestação do trabalho 141 Alteração contratual 144 Transferência do empregado 144 Suspensão e interrupção da prestação do trabalho Terminação do contrato de trabalho 151 Generalidades 151 Extinção do contrato de trabalho (caducidade) 152 Dissolução do contrato de trabalho Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 10. SUMÁRIO Obrigações decorrentes da admissão e da terminação do contrato de emprego 161 Admissão do empregado 162 Indenização por tempo de serviço e evolução da proteção à relação de emprego: fundamento jurídico 164 Indenização nos contratos a termo 165 Iniciativa do empregador 166 Indenização adicional e despedida discriminatória 166 Procedimentos e direitos concernentes à terminação do contrato 167 Estabilidade e garantia de emprego Normas especiais de tutela do trabalho 171 Trabalho da mulher e do menor 174 Contratos de trabalho especiais Flexibilização: terceirização e cooperativas 179 Flexibilização Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 11. SUMÁRIO 180 Terceirização 183 Cooperativas Relações coletivas de trabalho 185 Relações individuais e coletivas 186 O modelo sindical na ordem jurídica trabalhista e na Constituição 188 Estrutura sindical, conflitos coletivos e suas soluções Referências Anotações Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 12. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 13. História do Direito do Trabalho Otávio Augusto Reis de Sousa* O vocábulo trabalho Dissentem os autores acerca da etimologia do vocábulo trabalho, ora perseguin- do-a com base em tripalium, “instrumento de tortura, constituído de cavalete de pau (tres ‘três’ + palu ‘pau’)” (OLIVEIRA, 1994, p. 30), ora a partir do latim trabs, trabis, “viga, de onde se originou em primeiro lugar um tipo trabare, que deu no castelhano trabar, etimologicamente obstruir o caminho por meio de uma viga”, conforme lições do professor Evaristo de Moraes Filho, citado por Irany Ferrari (1998, p. 30). Certo é que o vocábulo trabalho apresentou, desde o seu nascimento, um sentido de expiação, de castigo ou de fadiga. O homem, desde o começo dos tempos, teve que trabalhar como forma de obter os meios necessários à sua subsistência, o que, de certa forma, explica as acepções que tomou aquele vocábulo. Maria Helena Diniz (1998), referindo-se ao trabalho à luz da história do Direito, confirma tal percepção ao asseverar que, “na Grécia antiga, era um castigo”. Para a Igreja Católica, o trabalho é parte fundamental da existência humana, consoante se colhe das palavras do sumo pontífice João Paulo II, citado por Irany Fer- rari (1998, p. 25): “A igreja vai encontrar logo nas primeiras páginas do livro Gênesis a fonte dessa sua convicção, de que o trabalho constitui uma dimensão fundamental da existência humana sobre a terra.” É o que se retira inclusive das encíclicas papais desde a Rerum novarum até a Laborem exercens. De Plácido e Silva (1987, p. 1.573) conceitua trabalho como: “todo esforço físico, ou mesmo intelectual, na intenção de realizar ou fazer qualquer coisa”. Poderíamos adotar esse conceito enquanto gênero, para buscar dentro dele vários sentidos: religioso, econômico, jurídico, sociológico. Quanto ao aspecto econômico do fenômeno trabalho, Doutor em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho (ANDT). Professor da Universidade Federal de Sergipe (UFS). Juiz do Trabalho da 20.ª Região. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 14. DIREITO DO TRABALHO afigura-se como toda atividade humana destinada à produção de um bem ou serviço, en- quanto, sob a óptica do Direito do Trabalho, a ênfase se encontra, sem dúvida alguma, no trabalho subordinado (relação de emprego ou contrato individual de trabalho), em torno do qual gravita a grande maioria de seus institutos. Evolução histórica do trabalho humano Se o trabalho, desde o início dos tempos, esteve associado à ideia de sofrimento, e se era, ao mesmo tempo, essencial para o atendimento das necessidades do homem e da sociedade, durante muito tempo, na Antiguidade, o modo de produção reinante consistiu na exploração forçada do homem pelo homem, pela escravidão. Dos conflitos, das guerras, surge a escravidão: o vencedor que, inicialmente, privava o vencido da vida, passa agora a escravizá-lo, reduzi-lo à condição de coisa como forma de se apropriar do seu trabalho; percebe, então, que o vencido vivo e escravizado apresenta maior utilida- de, e surge assim a mais ignominiosa condição de exploração do homem já verificada na história da humanidade. Na expressão de Orlando Gomes (1995, p. 110): “O trabalha- dor era propriedade viva de outro homem, sobre cujos ombros recaíam os encargos de produção de riqueza.” Daí em diante, a escravidão se alastra quer pelas guerras, quer pelo nascimento, pois os que nasciam de pais escravos em geral preservavam tal condição. A praxe disse- minada durante a Antiguidade teve na Grécia e em Roma ampla utilização. O escravo não se apresenta no mundo jurídico como titular de direitos, nem se lhe reconhece a possibilidade de contrair obrigações: não é sujeito de direito; é, sim, objeto de direito de outrem. A relação que se mantém não é outra senão de Direito Real entre o amo (dominus) e o escravo, a coisa (res). Nesse período, portanto, não existe azo para se falar em Direito do Trabalho, pois o próprio modo de produção das sociedades da época, lastreado na escravidão, na qual, como ficou dito, o que presta o trabalho escravo não é reconhecido como sujeito, mas como objeto de direito, afasta tal possibi- lidade. Era exíguo, na Grécia e em Roma, o trabalho prestado por homens livres. Não havia regulamentação que se assemelhasse, em seus contornos, à construção doutri- nal do Direito Laboral. Daí porque não se nos afigura qualquer referência técnica a Direito do Trabalho na Antiguidade, não obstante se reconheçam, mesmo em alguns códigos de então, esparsas disposições sobre o trabalho humano. Ainda assim, habitualmente se reportam os autores a um contrato de Direito Romano, a locatio conductio operarum, como antecedente remoto do contrato individual de trabalho. Acerca do trabalho dos homens livres de então nos fala Orlando Gomes (2005, p. 110) que Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 15. 13 [...] o Direito Romano o regulou como fruto de um contrato denominado – locatio conduc- tio. Era um contrato que se realizava quando “se prometia, por certa paga, uma coisa para fruir, um serviço para prestar, uma obra para fazer”. Este contrato podia apresentar-se sob três modalidades: a) locatio rei; b) locatio operarum; c) locatio operis faciendi. A escravidão persiste na história do trabalho do homem mesmo ao longo das demais fases, embora com âmbito cada vez mais restrito, chegando ao período contem- porâneo e aos nossos dias; até em nosso país, são por vezes noticiados relatos de sua prática. De todo modo, em um segundo momento, surge outro modo de produção, a servidão. O servo, se cotejado com o escravo, apresenta um grau de liberdade superior. Re- conhece-se-lhe a titularidade de direitos, o caráter de pessoa, ainda que persista uma série de limitações que o aproximam do regime da escravidão. Característica marcante da Idade Média, a servidão seria banida na França no período da Revolução; já na Rússia, persistiu até quase o século XX. Assim, ao servo se reconhecia a qualidade de pessoa, logo, de titular de direitos e obrigações, sofrendo entretanto sérias restrições de deslocamento. A condição de servo era hereditária (passava de pai para filho), e, se lhe era permitido ser proprietário de bens, o imposto de transmissão da herança solapava o patrimônio amealhado. Completando o quadro, os servos encontravam-se sujeitos ao poder político e militar do senhor feudal, que os podia mobilizar para a guerra. Com o renascimento das cidades, para as quais se torna crescente a migração de pessoas, a servidão sofre um impacto. Surge então uma nova forma de organização do trabalho: as corporações de ofício. O trabalho não era livre, uma vez que somente se permitia o exercício da profissão aos que fizessem parte da corporação. Nela se organizavam três níveis hierárquicos pre- cisos: abaixo, os aprendizes, seguidos dos companheiros, todos submetidos ao mestre. As corporações foram extintas em 17 de junho de 1791, pela Lei Le Chapelier, que, pre- conizando a liberdade de trabalho, entendia que elas eram atentatórias aos direitos do homem e do cidadão. Estamos, então, na Primeira Revolução Industrial. Primeira Revolução Tecnológica Os autores usualmente se reportam à Revolução Industrial como precedente ne- cessário ao surgimento do Direito do Trabalho. Antes de tratarmos especificamente desse fato, porém, cumpre ressaltar que, ao longo da história, distinguem-se três revolu- ções na tecnologia, albergáveis sob tal denominação e ligadas à modificação das fontes de energia utilizadas na indústria. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 16. DIREITO DO TRABALHO Nesse sentido, há o magistério de Romita (1997, p. 16): A observação dos fatos históricos que caracterizam a evolução do capitalismo permite discernir três revoluções industriais: 1.ª – fins do século XVIII, princípios do século XIX: proporcionada pela produção de motores a vapor por meio de máquinas; 2.ª – fins do século XIX, princípios do século XX: desenvolvimento e aplicação do motor elétrico e do motor a explosão; 3.ª – a partir da Segunda Guerra Mundial (1940 nos Estados Unidos e 1945 nos demais países): automação por meio de aparelhos eletrônicos. Observa-se sem- pre a apropriação de fontes energéticas distintas, que ditam as transformações nos meios de produção, as quais por seu turno vão gerar mudanças na organização do trabalho, com as consequências sociais conhecidas. Na primeira revolução industrial, o vapor d’água; na segunda, a eletricidade e o petróleo; na terceira, a eletrônica e a energia atômica. Sinteticamente, poderíamos conceituar a Revolução Industrial (Primeira Revo- lução Tecnológica) como um processo de mecanização em inúmeros setores produtivos, gerando uma substituição da força muscular humana e animal. Um agrupamento de fatores propiciou a eclosão da Revolução Industrial, dos quais três foram determinantes: o acúmulo de capitais oriundo do mercantilismo; a farta mão de obra existente nas cidades, por força do processo migratório, uma vez que os trabalhadores vislumbravam nas cidades melhores condições de vida e as inovações tecnológicas, como a máquina a vapor1 , a máquina de fiar (1738) e o tear mecânico (1784). A Primeira Revolução Industrial e os efeitos sociais por ela gerados, associados aos valores vigentes naquele período histórico, serão decisivos para o surgimento do Direito do Trabalho, pois serão a fonte material2 de toda uma construção jurídica en- gendrada, para muitos, com uma finalidade específica: proteger os trabalhadores da situação abjeta e desumana vivenciada por eles.3 1 Noticia Amauri Mascaro Nascimento (1996. p. 16) “que a primeira máquina a vapor saiu das fábricas de Soho, em 1775, destinando-se a uma mina de carvão. Depois, outra máquina foi feita para mover altos-fornos, em Broseley. Assim, a produção mecânica do movimento punha-se em substituição à produção hidráulica. As suas aplicações subsequentes foram muitas, ser- vindo para o abastecimento de águas de Paris, para as empresas industriais da Inglaterra, para as atividades dos moinhos, para a indústria cerâmica e, também, para a indústria de tecelagem. Na Inglaterra, em 1800, podiam-se contar 11 máquinas a vapor em Birmingham, 20 em Leeds e 32 em Manchester”. 2 O conceito de fonte material pode ser apreendido a partir das lições de Maria Helena Diniz (1998, p. 573-574): “Fonte material ou real que aponta a origem do direito, configurando sua gênese, condicionando seu desenvolvimento e determinando o conteúdo das normas. Fontes materiais ou reais são não só os fatores sociais, que abrangem os históricos, os religiosos, os naturais (clima, solo, raça, natureza geográfica do território e constituição anatômica e psicológica do homem), os demográficos, os higiênicos, os políticos, os econômicos e os morais (honestidade, decoro, decência, fidelidade, respeito ao próximo), mas também os valores de cada época (ordem, segurança, paz social, justiça), dos quais fluem as normas jurídico-positivas”. E prossegue: “Tais fatores decorrem das convicções, das ideologias e das necessidades de cada povo, em certa época. Atuam como fontes de produção do direito positivo, pois condicionam o aparecimento e as transformações das normas jurídicas. As fontes materiais, portanto, não são o direito positivo, mas o conjunto de fatos sociais determinantes do conteúdo do direito e dos valores que o direito procura realizar fundamentalmente sintetizados no conceito amplo de justiça”. 3 Mais à frente veremos que a proteção consiste em técnica ou quando muito função secundária do Direito do Trabalho. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 17. 15 Surgimento do Direito do Trabalho A Revolução Industrial causou profundas repercussões na vida econômica e so- cial. Se o grande contigente de mão de obra foi um dos fatores de eclosão dessa revolu- ção, como frisamos alhures, a substituição do homem pela máquina era a constante que desequilibrava. A máquina, ao mesmo tempo em que impulsionava a produção, gerava desemprego. Vigorava no plano das ideias o liberalismo. O indivíduo era a pedra de to- que, livre sob todas as formas: liberdade política, liberdade econômica e, o que mais de perto nos interessa, liberdade para contratar; o ideário poderia ser resumido no célebre laissez-faire, laissez-passer. A burguesia nascente buscava assegurar-se em face do Estado antes despótico, e o fazia na medida em que teorizava seu afastamento da Economia e limitava sua ação à de mero garantidor das liberdades individuais. Quanto ao trabalho, era reconhecido como livre, sendo qualquer restrição aten- tatória aos direitos do homem e do cidadão – tanto assim que foram abolidas as cor- porações de ofício. As partes (empregado e empregador) poderiam, então, contratar da forma que melhor lhes aprouvesse. Eis a sutileza da construção: qualquer interferência do Estado se afigurava como ilegítima e violadora das liberdades individuais. O contigente crescente de mão de obra; a diminuição da demanda das indústrias por trabalhadores, em face do progressivo aumento da mecanização e da substituição do homem pela máquina; o idéario liberal que pregava a não intervenção do Estado nas re- lações econômicas e muito menos nos contratos, acabaram por determinar a incidência da única lei conhecida pelo mercado: a da oferta e da procura. À medida que aumentava a demanda por trabalho e diminuía sua oferta, a tarifa (salário) paga decaía de forma vertiginosa. Para completar o quadro, era usual a utilização das chamadas “meias-forças”, ou seja, o trabalho do menor e da mulher, cuja remuneração era ainda inferior à do trabalhador maior, do sexo masculino. A consequência foi o aviltamento das condições de trabalho. As novas fábricas eram ambientes inóspitos, com pouca ou nenhuma ventilação; as jornadas de trabalho eram de sol a sol, sem quaisquer interrupções anuais ou sema- nais, e com escassos intervalos intrajornada; acidentes de trabalho eram frequentes, não existindo qualquer aparato protetivo aos acidentados. Os patamares salariais caíam dia a dia, e a sociedade bipartia-se em duas classes antagônicas: a burguesia e o proletariado. Surgem, então, as primeiras revoltas, que se dirigiam quase que de maneira ino- cente contra o que parecia aos trabalhadores o causador da miséria em que viviam: as máquinas. A solução pensada era a destruição destas, e com isso retornariam os empre- Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 18. DIREITO DO TRABALHO gos e viria a melhoria da sua condição social: eram os ludistas. Com formas diversas, as crescentes revoltas desestruturavam a produção, atingiam em cheio o lucro e chamavam a atenção do antes impassível Estado. Conspurcada a paz das relações de produção, o Estado viu-se forçado a intervir, e o fez invocando o poder de polícia, uma vez que persistia atado às ideias liberais. As greves eram violentamente reprimidas, e proibidas as associações de todos os gêneros, inclusive as de trabalhadores, sendo elevada a proibição a tipo penal.4 A situação de fato, ainda assim, pouco se alterou. A situação aterradora do proletariado não passou de todo despercebida à burgue- sia: existiam vozes que se levantavam, a exemplo do industrial inglês Robert Owen. No entanto, as primeiras normas de Direito do Trabalho surgiriam mesmo de forma autô- noma, por concessão dos empregadores, que, desejosos de restaurar a paz no ambien- te de produção, por vezes concederam algumas das reivindicações dos trabalhadores. Apenas em momento posterior o Estado se vê impelido a regulamentar as relações de trabalho; verifica-se aí o chamado movimento ascendente.5 Impendia uma revisão das ideias liberais, para as quais influíram vários aspec- tos. A Doutrina Social da Igreja exerceu papel determinante no surgimento do Direito do Trabalho; a visão de solidariedade e sentimento cristão para com os trabalhadores e a justiça social, todas reveladas nas encíclicas papais desde a Rerum novarum, serão determinantes para justificar uma nova postura por parte do Estado. O Manifesto Comunista (1848) irá suscitar, nos trabalhadores, um novo ânimo pela luta e, na burguesia, a revisão da postura diante da questão social, mormente a partir dos Congressos da Internacional Socialista e da Revolução Comunista na Rússia (1917). Do mesmo modo, será decisiva a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). O es- forço bélico trazia a necessidade de paz na produção, sob pena de naufragar os Estados beligerantes. Surge um novo Estado, disposto a intervir no domínio econômico e no âm- bito contratual. Reconhece-se, agora, que, se as partes (empregado e empregador) são, no plano formal, iguais, materialmente são diferentes. Percebe-se, para citar Lacordaire, 4 É o que se verifica na Lei contra a Conjura (1799/1800), em que o sindicalismo é tido como movimento criminoso. 5 Reconhece Segadas Vianna (1993, p. 55-56) que, em quase todo o mundo, as normas em Direito do Trabalho tiveram tal origem, e assim se reporta: “Os movimentos ascendentes, que deram origem às legislações trabalhistas do México, Inglaterra e França, caracterizavam-se pela sua coexistência com uma história social marcada pela luta de classes, com trabalhadores for- temente apoiados por suas organizações profissionais, com o espírito de classe bem nítido e com a existência de indústrias ou atividades produtivas arregimentando grandes massas de trabalhadores”. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 19. 17 que: “Entre o forte e o fraco, entre o rico e o pobre, é a liberdade que escraviza, é a lei que liberta” (apud VIANNA, 1993, p. 37). A fórmula encontrada se aparta em absoluto dos princípios do Direito Civil da época. O Estado reconhece que as partes na relação de trabalho são desiguais economi- camente: de um lado se encontra a opulência do empregador e do outro a hipossufici- ência do empregado. A forma de igualar desiguais é desigualando; cria-se, então, uma outra desigualdade, igual e em sentido inverso, agora jurídica, como forma de restabele- cer a igualdade substancial entre empregado e empregador. Busca-se compensar a inferioridade econômica do empregado outorgando-lhe superioridade jurídica. Surge o princípio da proteção, o Direito do Trabalho e o Estado do bem-estar (Welfare State). Quebra-se com o princípio da igualdade, alicerce do Direito Civil, fazendo-se surgir uma nova disciplina jurídica, que dele se aparta, qual seja, o Direito do Trabalho. O Estado passa a intervir ativamente nas relações de trabalho, edi- tando normas sobre os seus vários aspectos: salário mínimo, jornada de trabalho, higiene e segurança no trabalho, dentre outros. Fala-se em dirigismo contratual, e debatem os autores para adaptar a nova realidade ao arcabouço jurídico conhecido. A partir do término da Primeira Guerra Mundial, pronuncia-se tendência à in- ternacionalização do Direito do Trabalho, sendo relevante o Tratado de Versalhes, que institui a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e sedimenta os princípios bási- cos do Direito Laboral. Usualmente, dividem-se em quatro as fases pelas quais passou o Direito do Tra- balho no mundo, ao longo de sua evolução, com referência necessária à obra de Granizo- -Rothvoss (OLIVEIRA, 1994, p. 70; MARANHÃO, 1993, p. 18-20): a primeira até 1848 (formação); de 1848 a 1890 (intensificação); de 1890 a 1919 (consolidação) e de 1919 até os dias de hoje (autonomia). Durante a primeira fase, surgem, fruto da preocupação do Estado com a questão social, as primeiras normas de Direito do Trabalho. Destaca-se a Moral and Health Act, de 1802, também conhecida como Lei de Peel, e que teve o berço exatamente na Inglaterra, a qual tomara a dianteira na Revolução Industrial. A Lei de Peel proibia o trabalho noturno dos menores, e limitava a jornada a 12 horas por dia. As primeiras leis a disciplinar matéria relativa ao Direito do Trabalho tiveram duas preocupações básicas: restringir a utilização do trabalho do menor, fixando idade para ingresso no mercado de trabalho, e estabelecer um limite máximo para a duração do trabalho, quer diária (jornada), quer semanal ou anual. A produção legislativa nesse período era tímida e inorgânica. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 20. DIREITO DO TRABALHO Em 1848, inicia-se a segunda fase da evolução do Direito do Trabalho, com a publicação do Manifesto Comunista. As agitações das massas operárias que se seguiram na Europa conduzem a uma intensificação do processo legislativo. Data dessa época a primeira Lei de Seguro Social, de 1883, na França. Em 1884, consagra-se a liberdade de associação, e resta reduzida a jornada de trabalho para dez horas. Em 1890, desponta a encíclica Rerum novarum, manifestando ao mundo a preo- cupação da Igreja com a questão social e preconizando a aplicação dos preceitos cristãos à relação capital-trabalho. Já existe, então, um corpo relativamente vasto de leis acerca de Direito do Trabalho. Cria-se em 1890, na Alemanha, uma estrutura judiciária para o julgamento de dissídios trabalhistas e, em 1917, pela primeira vez na história, passa o trabalho a ser matéria constitucional, sendo incorporado ao texto da Constituição me- xicana. Em 1919, o Tratado de Versalhes cria a Organização Internacional do Trabalho e sedimenta os princípios universais do Direito do Trabalho. Com a Constituição de Wei- mar (1919), na Alemanha, alastra-se a constitucionalização do Direito do Trabalho. A partir de então, desponta o Direito Laboral como disciplina jurídica autônoma, compos- ta por um corpo de princípios peculiares e dotada de institutos próprios irredutíveis às formulas clássicas de outros ramos do Direito. Reconhece-se que o trabalho, indissociá- vel de quem o presta, deve ser garantido como forma de se atingir a dignidade da pessoa humana, não comportando nessa medida tratamento como simples meio de troca ou como mercadoria. A evolução do Direito Laboral entrementes não cessou. Poderíamos mesmo dis- cernir uma quinta fase do Direito do Trabalho, a da flexibilização ou adaptabilidade, a principiar com a Revolução Tecnológica (Terceira Revolução Industrial) e a quebra da relação entre o incremento da produção e a criação de postos de trabalho. Com a Crise do Petróleo (1970) e com a hegemonia de um único país sobre os demais (notadamente a partir da queda do Muro de Berlim – 1990), podemos hoje pensar em uma revisão dos princípios clássicos, uma ruptura com a forma original de proteção: a proliferação dos contratos por tempo determinado; a retificação do contrato de trabalho; a flexibi- lização do Direito Laboral; sua desconstitucionalização parcial e rerregulamentação. Enfim, há uma profunda e completa revisão dogmática a se refletir em ideias como a do nominado Direito do Trabalho de Crise (NASCIMENTO, 1998, p. 39).6 6 Preferimos, todavia, augurando maior precisão terminológica, utilizar o termo flexibilização ou quando muito adaptabilidade. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 21. 19 Direito do Trabalho no Brasil Resumo histórico Apenas em 1888 findou entre nós a escravidão, e com ela a primeira fase da formação de nosso Direito Laboral. Nesse período, não se pode falar em Direito do Trabalho. A escassez de mão de obra livre e sua reduzida importância no modelo social de então justificam em boa medida o vácuo legislativo. A partir da Abolição da Escravatura (1888), inicia-se a segunda fase de nosso Direito do Trabalho, que se estenderia até 1930. Com a queda da escravatura, tom- ba em seguida o regime monárquico, que se alicerçava sobre aquela. O trabalho livre, pressuposto inafastável do Direito do Trabalho, cresce em importância na teia social, iniciando-se sua regulamentação. São desse período: a Lei 1.869/22, que criou os Tri- bunais Rurais, para muitos o antecedente mais longínquo da Justiça do Trabalho no país; a Lei Elói Chaves (1923), que tratava de Caixas de Pensões e Aposentadorias dos Ferroviários; e a Lei de Férias (15 dias), de 1925. A terceira fase do Direito do Trabalho no Brasil se inicia em 1930, com a Revolu- ção e a Era Vargas. Nesse período, é febril a produção legislativa. Ademais, procede-se à reunião e à sistematização das normas laborais existentes, sedimentam-se os princípios norteadores e com eles se desenvolve a autonomia desse novo ramo do Direito entre nós. A industrialização floresce, e com ela a urgente necessidade de uma disciplina das relações de trabalho com suas múltiplas vicissitudes. Cria-se a Justiça do Trabalho com a Constituição de 1934, não obstante, à época, como órgão do Poder Executivo. São desse período: a primeira Lei de Indenização por Despedida Injusta (1935); Organi- zação da Justiça do Trabalho (1939); Consolidação das Leis do Trabalho – CLT (1943); Reconhecimento do Direito de Greve (1946); Repouso Semanal Remunerado (1949); Gratificação Natalina (1962); Estatuto do Trabalhador Rural (Lei 4.214/66); Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (1966); Lei de Trabalho Rural (5.859/73). Observa-se, então, no Brasil, seguindo de resto a tendência iniciada pela Consti- tuição mexicana (1917), um movimento no sentido de trazer para a Constituição a dis- ciplina do trabalho subordinado. Entre nós, isso se fará sentir a partir da Carta de 1934 e será ratificado por todas as que lhe são posteriores, notadamente a atual, de 1988. Se nos detivermos a estabelecer um paralelo entre a evolução do Direito do Trabalho no Brasil e no mundo, podemos identificar pontos de convergência e divergên- cia, que deverão ser enfatizados para a compreensão de nosso modelo de tratamento das relações de trabalho e sua necessária adaptação à nova realidade mundial. Historicamente, a constante entre os dois sistemas é, sem dúvida, a valorização do trabalho humano, o reconhecimento de que este é um valor social relevante e digno Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 22. DIREITO DO TRABALHO de proteção, na medida em que não se pode apartar o trabalho da pessoa que o presta. A constitucionalização do Direito Laboral foi seguida de igual sorte no mundo e no Brasil. Muitas e significativas são, entretanto, as diferenças existentes. Enquanto no mundo o Direito do Trabalho surgiu por meio de movimentos ascendentes, e suas primeiras normas foram do tipo coletivas (ao menos se as qualificarmos quanto à ori- gem), no Brasil verificou-se uma legislação outorgada; os movimentos foram descen- dentes e a predominância se deu no direito individual. No resto do mundo o Direito do Trabalho foi fruto de um processo complexo e longo de maturação da questão social, com a influência decisiva das pressões dos tra- balhadores, encontrando o Estado justificativa à sua intervenção na Doutrina Social da Igreja e na própria revisão do ideário liberal já no Brasil, o seu surgimento foi açodado: as leis se antepuseram muitas vezes aos fatos. Se no mundo as organizações sindicais tiveram campo amplo para seu desenvol- vimento e fortalecimento, no Brasil tal não sucedeu, quer pela industrialização tardia, quer pela legislação outorgada, quer pela própria base de princípios que até hoje norteia nosso Direito do Trabalho em sede coletiva. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) de 1943 foi inspirada na Carta de 1937, que negava a oposição capital-trabalho, enfeixa- va-os em doutrina corporativa e via na greve não um direito, mas uma “manifestação an- tissocial”. Ainda que fracionada pela Constituição de 1988, é essa mesma base de prin- cípios que até hoje nos rege, necessitando de uma completa e profunda reestruturação. O prejuízo às formas autocompositivas é evidente, e estas não prescindem de estruturas sindicais representativas e fortes, o que não se verificou nem se verifica entre nós. Cumpre ressaltar que o legislador em manifestações recentes tem buscado for­ta­ lecer a estrutura sindical. Nesse sentido, a lei 11.648/2008, que criou as centrais sindi­cais e promoveu a alteração do imposto sindical, destinado 10% para as centrais sindicais. To- davia, as leis se voltam ao fortalecimento do sindicalismo de cúpula (central) esquecendo- se do sindicalismo de base (sindicatos). História do Trabalho, do Direito do Trabalho e da Justiça do Trabalho, de Irany Ferrari, Amauri Mascaro Nascimento e Ives Gandra da Silva Martins Filho, editora LTr. Direito e Processo do Trabalho, de Otávio Augusto Sousa, editora Forense. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 23. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 24. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 25. A Constituição Federal de 1988 Direito Constitucional do Trabalho Imprescindível se tratar, em sede de evolução do Direito do Trabalho no Bra- sil, da Constituição Federal de 1988 (CF/88). Não se pode olvidar que as Constituições pátrias foram incorporando gradativamente novos institutos de Direito do Trabalho, ou simplesmente trazendo para seu bojo matérias já tratadas em nível infraconstitucional, fenômeno representativo do chamado “constitucionalismo social”. Assim, trouxe o legislador Constituinte de 1988 uma série de inovações à sis- temática anterior, reforçando um modelo prescritivo e analítico. A matéria laboral se encontra espraiada em vários dispositivos da aludida norma. Princípios constitucionais do Direito do Trabalho O legislador aponta os princípios constitucionais do Direito do Trabalho; aliás, inobstante não os tenha trazido em disposição expressa, permitiu que se inferisse a exis- tência deles a partir do artigo 1.º, incisos III (dignidade da pessoa humana) e IV (valores sociais do trabalho); artigo 170, caput (valorização do trabalho humano e justiça social), incisos III (função social da propriedade) e VIII (busca do pleno emprego); e artigo 193 (primado do trabalho e justiça social), todos da Carta Magna em vigor. Em verdade, é possível divisar, a partir da leitura atenta da Constituição, uma série de outros princípios, como o da igualdade (CF, art. 5.º), que toma forma específica como a “não discriminação”(SÜSSEKIND, 2004, p. 68) (art. 7.º, XXX, XXXI e XXXII); continuidade da relação de emprego (art. 7.º, I); irredutibilidade salarial relativa (art. 7.º, VI); e liberdade sindical (art. 8.º, caput), que irão variar na doutrina quanto ao número, nomenclatura e amplitude. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 26. DIREITO DO TRABALHO Análise descritiva do campo normativo da CF/88 Pela importância da matéria, faremos a seguir a análise dos principais pon- tos de conteúdo normativo próprio que se encontram espraiados nos artigos 7.º a 11; 114 da CF; e no artigo 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). De modo a possibilitar melhor apreensão do conteúdo, elaboramos um quadro sinótico de agrupamento da matéria ventilada, pelo critério da preponderância normativa em nível de Direito Individual e Direito Coletivo. Quadro sinótico da matéria laboral na CF/88 Direito Individual do Trabalho (art. 7.º) proteção à relação de emprego (incs. I, II, III, XXI e XXVII);■■ remuneração e salário (incs. IV a X, XII e XXIII);■■ estímulo à democratização das relações de trabalho (incs. XI e arts. 10 e 11) – par-■■ ticipação nos lucros e na gestão; duração do trabalho (incs. XIII a XVII);■■ reforço ao■■ princípio da igualdade, proteção ao trabalho da mulher e do menor, e me- didas de discriminação positiva (incs. XVIII, XX, XXX, XXXI, XXXII, XXXIII); higiene e segurança no trabalho (incs. XXII, XXVIII);■■ prescrição (inc. XXIX);■■ tutela do avulso (inc. XXXIV);■■ trabalho doméstico (parágrafo único);■■ últimas hipóteses: licença-paternidade (inc. XIX) e aposentadoria (inc. XXIV).■■ Direito Coletivo do Trabalho (arts. 8.º a 11, e 114) estrutura sindical – pilares;■■ unicidade sindical;■■ contribuição sindical obrigatória;■■ poder normativo da Justiça do Trabalho (art. 114,■■ §2.º e 3.º modificados pela EC 45/2004); liberdade sindical mitigada e monopólio da negociação coletiva;■■ direito de greve (art. 9.º);■■ outras formas de representação dos trabalhadores (arts. 10 e 11).■■ Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 27. 25 Feito o necessário agrupamento quanto à matéria, passamos a tecer breves comentários sobre cada um dos institutos referidos nos artigos acima, para que se possa fornecer ao estudioso uma visão panorâmica do Direito do Trabalho ou, mais especifica- mente, do Direito Constitucional do Trabalho. Direito individual Em várias passagens, o legislador extraordinário de 1988 inovou em relação à ordem jurídica pretérita, a principiar pelo caput do artigo 7.º da novel Carta Constitu- cional. Dispôs o legislador que: “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social”, e elencou de pronto extenso rol de direitos nos 34 incisos que seguem e em seu parágrafo único. Todavia, ao repor- tar-se a direitos de trabalhadores urbanos e rurais, procedeu o legislador à equiparação quanto aos direitos das duas categorias de empregados antes referidas, fulminando de morte a histórica distinção e exclusão disposta originalmente na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) em seu artigo 7.º, “b” 1 . Por conseguinte, após o advento da Cons- tituição, restou prejudicado o citado artigo que não mais se afigura aplicável, sendo assegurados os mesmos direitos a trabalhadores urbanos e rurais. Frise-se que não se pode confundir igualdade de direitos com direito a igual regu- lamentação, ou seja, embora os direitos das duas espécies de empregados sejam os mes- mos, pode haver diferença quanto à regulamentação destes no nível infraconstitucional; por exemplo, urbanos e rurais fazem jus a adicional noturno, por aplicação do artigo 7.º, IX2 , da CF. Todavia, os percentuais podem ser, como de fato são, distintos (20% e 25%, respectivamente), sem que com isso se incida em vício de inconstitucionalidade. O inciso I do artigo 7.º da CF revolucionou a proteção à relação de emprego na medida em que, ao remeter a aludida proteção para lei complementar, direciona no sen- tido do reconhecimento de que sempre é possível a quebra do liame contratual, norma esta que se torna incompatível, portanto, com o regime anterior de estabilidade decenal3 que se tornou inaplicável após 5 de outubro de 1988. Preservaram-se como estáveis ape- nas os que já haviam completado 10 anos na data da promulgação da Constituição e não eram optantes pelo regime do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). 1 Dispõe o referido artigo 7.º, “b”, da CLT que: “Os preceitos constantes da presente Consolidação, salvo quando for, em cada caso, expressamente determinado em contrário, não se aplicam: b) aos trabalhadores rurais, assim considerados aqueles que, exercendo funções diretamente ligadas à agricultura e à pecuária, não sejam empregados em atividades que, pelos métodos de execução dos respectivos trabalhos ou pela finalidade de suas operações, se classifiquem com industriais ou comerciais”. 2 “Remuneração do trabalho noturno superior à do diurno.” 3 A CLT assegurava em seu artigo 492 a chamada estabilidade decenal, ou seja, que o empregado que contasse mais de dez anos de serviços para o mesmo empregador não poderia ser despedido, regra geral, senão pela prática de justa causa especialmente qualificada (CLT, art. 493) e através do vetusto inquérito para apuração de falta grave. A norma era aplicável plenamente até o advento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (Lei 5.107/66), e após esta data apenas para os não optantes pelo FGTS. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 28. DIREITO DO TRABALHO Rememore-se que o legislador não regulamentou em definitivo o artigo 7.º, I, pela edição da lei complementar nele referida, mesmo já tendo decorrido mais de duas décadas, perdendo a oportunidade de aclarar normativamente relevantes conceitos como a despedida arbitrária e a despedida sem justa causa, sabidamente distintos e que, por conta da inércia do legislador, ensejam hoje a mesma consequência, qual seja, a indeni- zação prevista no artigo 10, I, do ADCT4 . No seu inciso II do artigo 7.º, a Constituição universalizou o regime do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. O FGTS, disciplinado basicamente pela Lei 8.036/90, consiste em depósitos mensais de 8,0%5 da remuneração6 , que tem natureza de salário diferido, e constitui verdadeiro pecúlio do trabalhador, que adquire direito à utilização do numerário nas hipóteses do artigo 20 da aludida legislação, sendo a principal a despe- dida sem justa causa. Em caso de despedida do empregado sem justa causa ou arbitrária, o valor passou a 40%7 com a Constituição de 1988. Estava presente na redação original da CLT a chamada indenização de antigui- dade, ou seja, se na sistemática anterior à Lei 5.107/66 o empregado fosse despedido sem justa causa, faria jus à indenização equivalente a um salário por ano trabalhado ou fração igual ou superior a seis meses8 . Com a Lei do FGTS, passou a vigorar opção entre o regime da Lei 5.107/66 ou a previsão da indenização de antiguidade combinada estabi- lidade decenal. Na prática, aos poucos foi se abandonando o regime da CLT, substituído gradativamente pelo FGTS, mas preservada, ao menos do ponto de vista legal, a possibi- lidade de opção de regime até a Carta de 1988. Após essa data, não há que se falar mais em opção, isso porque o Constituinte estendeu genericamente aos trabalhadores o regime agora único de FGTS9 . Forma complementar de proteção à relação de emprego, o seguro-desemprego (CF, art. 7.º, II) consiste em instituto que busca assegurar a subsistência do trabalhador vítima de desemprego involuntário, estando consubstanciado em sistema de quotas mensais em número variável de três a cinco, conforme o tempo menor ou maior de labor, com os temperamentos da Lei 7.998/90 e legislação posterior. Integrante último do rol da proteção constitucional à relação de emprego, o aviso prévio proporcional (CF, art. 7.º, XXI) trouxe como novidade a proporcionalidade ao 4 Vide o prazo de vigência da alteração de percentuais, à luz da Lei Complementar 110/2001. 5 Vide o prazo de vigência da alteração de percentuais, à luz da Lei Complementar 110/2001. 6 Remuneração é o total de ganhos do empregado, exceto a participação nos lucros. 7 Vide o prazo de vigência da alteração de percentuais, à luz da Lei Complementar 110/2001. 8 Artigo 478, caput, da CLT. 9 Ressalvados os que já possuíam estabilidade em respeito ao direito adquirido. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 29. 27 tempo de serviço. Típico dos contratos por prazo indeterminado, o que, regra geral, se dá com o contrato de trabalho, houve por bem o constituinte indicar que o comunicado, uma das dimensões do aviso prévio10 , deve ter por medida a maior ou menor antigui- dade do obreiro, respeitado um mínimo de 30 dias. Tal dispositivo é regulamentado pela Lei 12.506/2011, que assim dispõe: Art 1.º O aviso prévio, de que trata o capítulo VI do Título IV da consolidação das Leis do trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto – Lei n.º 5.452, de 1.º de maio de 1943, será concedido na proporção de 30 (trinta) dias aos empregados que contém até 1 (um) ano de serviço de serviço na mesma empresa. Parágrafo único. Ao aviso prévio previsto neste artigo serão acrescidos 3 (três) dias por ano de serviço prestado na mesma empresa, até o máximo de 60 (sessenta) dias, perfa- zendo um total de até 90 (noventa) dias. Nos incisos IV e V do artigo 7.º da CF, cogita o legislador dos conceitos de salá- rio mínimo e piso salarial, introduzindo profundas modificações no primeiro na medida em que amplia as prestações em que se desdobra o salário mínimo, incluindo novas, a exemplo do lazer. Além disso, amplia o espectro do instituto ao transformá-lo em salário de família, pois não se destinaria apenas ao trabalhador, mas também à subsistência da referida unidade familar. Por fim, de modo a suprimir a utilização do salário mínimo como parâmetro de indexação da economia, proíbe a sua vinculação à outra finalidade que não a de especificar o menor valor de retribuição passível de ser pago pelo empre- gador a qualquer empregado como contraprestação de trabalho (conceito de salário mínimo). Não se pode olvidar que, sendo piso salarial o menor valor que pode ser pago pelo empregador aos empregados que pertençam a determinada categoria ou profissão, os conceitos são essencialmente distintos, pautando-se o primeiro pela generalidade, aplicável que é a qualquer trabalhador, e o último pela especialidade, incidindo apenas sobre parcela dos empregados, quais sejam, os que integram uma determinada categoria. Retira-se dos conceitos a inconstitucionalidade das leis estaduais na medida em que, afastando-se do conceito de piso salarial, o qual implica especificidade conforme dito acima, pretenderam trazer valor mínimo de retribuição para o referido estado, violando a Constituição por penetrar em esfera diversa, qual seja, o inciso IV ao invés do V do artigo 7.º da CF, que diz ser o salário mínimo nacionalmente unificado. O legislador consagrou no artigo 7.º, VI, da CF, a ideia, para muitos, do princípio da irredutibilidade salarial ou, como preferimos, da irredutibilidade salarial relativa, na medida em que introduz a impossibilidade de diminuição do estipêndio, permitida a flexibilização por tutela sindical, por meio de acordo ou convenção coletiva. 10 Os elementos do aviso prévio são três: comunicação, decurso do tempo e pagamento. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 30. DIREITO DO TRABALHO Assim, fica prejudicada em parte a Lei 4.923/6511 que previa duas hipóteses de redução de salário, por acordo ou convenção coletiva, hipótese recepcionada e, por auto- rização da Justiça do Trabalho, esta última fração derrogada pela nova dicção Constitu- cional. A norma consagrada no inciso VII do artigo 7.º da CF12 apenas reforça a previsão abstrata do salário mínimo da qual tratamos acima, na medida em que espanca dúvidas sobre a aplicação do mínimo mesmo que o empregado não tenha salário com valor fixo. Rememore-se as formas de estipulação do salário por unidade de tempo, por produção e por tarefa; podem implicar salário variável, verbi gratia, o comissionista, sendo que, se o empregado não atinge o valor do mínimo legal, terá direito à complementação paga pelo empregador, que, por evidente, não poderá se compensar com valores a serem pagos a posteriori em meses subsequentes, pois isso implicaria transferir ao empregado o risco da atividade econômica, vedado pelo artigo 2.º da CLT13 . Cogitou o legislador constitucional da gratificação de Natal, que equivale ao valor do salário do mês de dezembro, e que se adquire com base nos critérios da Lei 4.090/62 (com as modificações advindas da Lei 4.749/65); à razão de um doze avos por mês tra- balhado, de modo que, se o obreiro labora durante todo o ano civil, terá acrescido à sua retribuição o equivalente a um salário por ano. Dizemos gratificação de Natal, embora a CF de 1988, em flagrante descompasso com a natureza jurídica do instituto, que não é de salário e sim de gratificação, tenha preferido falar em décimo terceiro salário, ou seja, em uma das raras hipóteses em que o legislador infraconstitucional foi técnico (a Lei 4.090/62 diz que “institui a gratificação de Natal”), entendeu o Constituinte por utilizar a linguagem vulgar, com evidente sacrifício ao rigor terminológico. Preocupou-se o Constituinte, ainda, em estabelecer um sobressalário quando prestado trabalho em horário noturno. Em verdade, sempre que prestado trabalho em condição desfavorável, faz jus o empregado a um adicional, v.g., se trabalha em horário consagrado ao descanso (noturno), se trabalha além da duração ordinária do trabalho (extraordinário) etc. Seguindo tal lógica, estabelece o legislador que a remuneração do trabalho noturno será superior ao diurno (CF, art. 7.º, IX), o que implica reconhecer a obrigato- riedade de pagamento em tais casos de adicional noturno, que para o trabalhador urbano encontra previsão no artigo 73 da CLT. 11 Discussão relevante e não pacificada reside na recepção e consequente vigência da Lei 4.923/65 após a CF de 1988, que estatui limites percentuais máximos para a diminuição do salário e a necessidade de proporcional redução da jornada. 12 Artigo 7.º, VII, da CF: “Garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebam remuneração variável.” 13 Vem a propósito do tema o conceito amplamente aceito em doutrina e jurisprudência de alteridade. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 31. 29 Pendentes de regulamentação as consequências pela retenção dolosa do salário14 . A CLT engendra amplo sistema de proteção ao salário usualmente repartido pela doutrina em três formas: proteção contra abusos do empregador; contra os credores do emprega- dor e contra os credores do empregado. Pretendeu a Constituição redobrar a tutela ao elevar a proteção ao estipêndio a tipo penal, reconhecendo o crime de retenção dolosa do salário (CF, art. 7.º, X), intento inalcançado em razão da persistente recusa do legislador em regulamentar o referido inciso, elencando os componentes do tipo, o que inviabiliza a aplicação da norma em razão do princípio da tipicidade legal15 . Esteado na democratização da empresa, trouxe o Constituinte tratamento à participação nos lucros (PL) ou nos resultados (PR), e participação na gestão da empresa. Importante alteração foi introduzida pela referida norma ao proceder à desvinculação da participação nos lucros ou resultados da remuneração, isso porque, em razão da força atrativa do salário, a jurisprudência se firmou no sentido de que as parcelas habitual- mente pagas aos empregados se integram ao salário, que funcionaria quase como um planeta, centro de gravidade, trazendo a si os corpos celestes (parcelas) que orbitarem a seu redor, ousando desafiar sua capacidade ou força de atração. Com isso, produz-se um efeito cascata na medida em que, se parcelas pagas com habitualidade se integram ao salário, e se este serve de base de cálculo de vários outros direitos, com facilidade se percebe a inegável repercussão patrimonial. O fenômeno não se aplica à participação nos lucros (ou resultados) por expressa determinação da Constituição, que deliberou sua desvinculação e consequente afastamento não só do salário – conceito contido – mas da remuneração – conceito continente –, transformando a participação nos lucros (ou resul- tados) em verdadeiro satélite que, guiado por força motora própria, mantém-se infenso à atração gravitacional do “planeta” salário. Deve-se firmar a distinção entre as duas modalidades, que, embora ensejem os mesmos efeitos, são constitutivamente distintas. Ocorre que algumas pessoas jurídicas possuem resultado operacional positivo (produto da diferença entre receita e despesa), subsumível enquanto lucro e passível de repartição entre seus titulares. Se presta tal 14 Artigo 7.º, X, da CF – “proteção ao salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa”. 15 Fala-nos do princípio em questão o professor Paulo de Souza (1998, p. 121-122): “Por outra parte, o legislador, para fazer valer o princípio constitucional da reserva legal, formula taxativamente esquemas, modelos, tipos, em que se descreve, com pos- sível clareza, precisão e brevidade os comportamentos humanos passíveis de repressão penal. Criam-se, assim, os tipos penais: materialização, concretização do princípio nullum crimen nulla poean sine lege. Não sem razão, afirma-se que o legislador trabalha com tipos e pensa com tipos. É só delituosa a conduta humana que se lhe amolde rigorosamente. O tipo penal, pois, exerce – pre- tende exercer – importante função de garantia, já que somente se tem por delituoso o fato, prévia e taxativamente descrito como tal, numa norma penal; que se ajuste, enfim, àquele esquema abstratamente concebido pelo legislador.” E explica por fim que: “É por isso que as consequências básicas do princípio ‘não há pena sem lei’ se projetam sobre o tipo legal. Nulla poena sine lege scripta: exclusão de tipos extralegais, em especial de origem consuetudinário. Nulla poena sine lege stricta: proibição da analogia fundante ou agravante da pena. Nulla poena sine lege praevia: exclusão de efeito retroativo de tipos novos e agravados.” Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 32. DIREITO DO TRABALHO resultado mesmo a enquadramento enquanto fato gerador de tributo específico, inti- tulado Imposto de Renda (IR). Todavia, não se pode olvidar a existência de pessoas jurídicas cujo resultado operacional não se presta à repartição ou tampouco serve como fato gerador do IR, quais sejam, aquelas que, embora exerçam atividade econômica, apresentam finalidade diversa do lucro (filantrópicas, recreativas16 ). Assim, não ficam as instituições filantrópricas impedidas, por exemplo, de reverter parte do seu resultado operacional positivo, se houver, em proveito de seus empregados. A participação nos lucros e resultados tem se demonstrado medida eficaz no aumento da produtividade dos empregados, restando estimulada pelo novo tratamento lancetado na Constituição. Distinto é o chamado sistema de cogestão, ou a participação dos empregados na tomada de decisões e nos rumos da empresa (participação na gestão), que ficou relegada a hipóteses extraordinárias17 , sendo vedada, portanto, a generalização da medida pelo legislador infraconstitucional. O inciso XII do artigo 7.º da CF nos fala em salário-família. A doutrina deixa ine- quívoca a índole previdenciária do benefício. Nesse sentido o magistério do saudoso Valentin Carrion (2005, p. 81): [...] apesar da denominação, não se trata de salário, mas de benefício de caráter previden- ciário, adiantado pela empresa vinculada ao sistema geral da previdência social, ao empre- gado (salvo ao doméstico), de acordo com o número de filhos, ou equiparados. Urge lembrar que a Emenda Constitucional 20/98 limitou o salário-família ao trabalhador de baixa renda, e que a Lei 8.213/91 fixa os requisitos para pagamento desse tipo de salário como: atestado de vacinação dos filhos menores; comprovação de frequ- ência à escola, dentre outros. Em verdade, o salário-família se tornou economicamente tão insignificante para os que percebem elevado valor salarial, que o Constituinte houve por bem proceder à limitação acima referida, tendo perdido a oportunidade de extirpar da Constituição mais um dos penduricalhos ali impropriamente existentes. O sistema de duração do trabalho foi objeto de preocupação do legislador Consti- tuinte nos incisos XIII a XVII do tão citado artigo 7.º. Em verdade, inobstante a crítica de alguns autores18 , falaremos aqui em duração do trabalho para abranger proposita- damente dois aspectos complementares. A duração do trabalho traz conceito binário: 16 Referimo-nos, por exemplo, ao que a CLT chama de empregador por equiparação (CLT, art. 2.º, §1.º). 17 Hipótese possível seria a ocorrência de estado pré-falimentar e como forma de buscar sua reversão. 18 Ao tratar do tema ao que se dessume da nomenclatura dos capítulos da obra, prefere o professor Amauri Mascaro Nascimento (2005) a expressão jornada de trabalho. Assim justifica: “A segunda (referindo-se às denominações), duração do trabalho, é consi- derada extensa demais, porque teria de abranger o estudo do repouso semanal e das férias além de todo descanso.” Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 33. 31 períodos de atividade e repouso, ambos disciplinados pela CF. Estatuíram os incisos XIII e XIV duas jornadas básicas, uma de oito e outra de seis horas, esta última restrita aos chamados turnos de revezamento19 . Ademais, foi reduzida com a Carta de 1988 a duração semanal do trabalho de 48 para 44 horas. Permitiu o legislador a adoção de sistema de compensação de horas, com escopo de suprir o labor em determinado dia ou reduzir o número de horas de trabalho-dia, conceito de jornada de trabalho. Por fim, permitiu a flexibilização por tutela sindical do número de horas trabalhadas em sistema de revezamento, para diminuir ou acrescer à jornada, desde que respeitada a duração máxima de 44 horas semanais, regra que se pode inferir até mesmo da posição topográ- fica dos dispositivos contidos no artigo 7.º em sua repartição e ordenação em incisos. Repouso semanal20 e férias se encontram contemplados na duração do trabalho em seu aspecto passivo. Com origens opostas, o primeiro sempre trouxe atrelada vinculação religiosa, surgindo por interferência da Igreja Católica, vigilante do cumprimento das obrigações religiosas pelas partes envolvidas na relação de trabalho, o que demandava interrupção do labor durante o tempo correspondente. As férias, ao reverso, têm origem profana, como falaremos mais à frente. A expressão preferencialmente aos domingos, pre- sente na Constituição, há que ser interpretada à luz da legislação posterior, notadamente a Lei 10.101/2000, artigos 6.º e 6.º-A, ou seja, deve recair em domingo ao menos uma vez a cada três semanas, nos termos da nova redação da lei 10.101/2000, art.6º e seguintes. Quanto às férias, urge ressaltar que a Constituição criou o acréscimo de um terço sobre a remuneração delas, em evidente tentativa de evitar a “venda” de férias ou, tecnica- mente, a conversão de 10 dos 30 dias de férias em pecúnia21 leia-se, 10/30 = 1/3), tendo, por lapso de memória, esquecido o legislador de revogar a previsão do artigo 143 da CLT, permanecendo concomitantes hoje tanto o abono de férias (CLT, art. 143) quanto o acréscimo Constitucional de um terço (CF, art. 7.º, XVII). A Constituição tratou, ainda em sede de duração do trabalho, das consequências da violação da jornada máxima estatuída nos incisos XIII e XIV, qual seja, pagamento de adicional de hora extrordinária, o que se extrai do inciso XVI do artigo 7.º da CF, com uma inovação de monta: a majoração do adicional para a prestação de serviço extraordinário de 20% (redação original da CLT) para 50%22 . 19 O conceito pode ser extraído das lições de Godinho Delgado (2004, p. 883). “Enquadra-se no tipo legal em exame o sistema de trabalho que coloque o empregado, alternativamente, em cada semana, quinzena ou mês, em contato com as diversas fases do dia e da noite, cobrindo as 24 horas integrantes da composição dia/noite”. 20 Lei 605/49. 21 Artigo 143 da CLT. 22 A respeito, algumas edições da CLT trazem, em flagrante atecnia, modificados os dispositivos com os percentuais de adicio- nal de horas extras, v.g., artigo 59, parágrafo 1.º. Vale lembrar que para se alterar uma lei é necessário norma da mesma hierar- quia, ou seja, a redação da CLT não mudou; apenas o intérprete deve, na aplicação dos dispositivos da CLT, atentar para o limite mínimo de 50% previsto na Constituição. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 34. DIREITO DO TRABALHO Consoantedissemosempassagemanterior,algumasnormasdaConstituiçãoaugu- raram reforçar o princípio da igualdade, assegurando o mesmo por meio de sua derradeira parte, qual seja, tratar desigualmente os desiguais. Assim, foram incentivadas medidas de proteção ao trabalho da mulher e do menor e, em regra, medidas de discriminação posi- tiva, tudo isso nos incisos XVIII, XX, XXX, XXXI, XXXII e XXXIII, todos integrantes do artigo 7.º da CF. Por sua importância, foi ampliado o prazo da licença-maternidade23 para 120 dias, facultando elastecimento do prazo em 60 dias pelo programa Empresa Cidadã, Lei 11.770/2008, caso em que o acréscimo poderá ser deduzido do Imposto de Renda pela empresa. Em sede de implementação da proteção ao trabalho da mulher, dedica-lhe a CLT todo o capítulo III do título III. Inexiste, hoje, dúvida sobre o cabimento da licença- -maternidade para a adotante, ante o disposto no artigo 392-A da CLT. Questão relevante na jurisprudência24 pertine à estabilidade da gestante, especifi- camente à fixação do termo inicial. Reside a dúvida na expressão confirmação da gravidez que, segundo modernamente se entende, prescinde do conhecimento do empregador, ou seja, é dado objetivo, vinculando a comprovação ao exame médico respectivo. Assim, irrelevante o conhecimento ou não do empregador, pois se a empregada já se encontrava gestante à época, gozará da proteção legal25 . Preocupou-se o legislador em viabilizar o acesso do deficiente ao mercado de trabalho, cumprindo o princípio normativo indicado no inciso XXXI do artigo 7.º da CF, notadamente por meio da Lei 7.853/89 e de decreto regulamentar que estabelece que entre 2 e 5% das vagas em empresas serão preenchidas por portadores de necessidades especiais26 . Seguindo a tradição das Constituições brasileiras, permaneceu proibida a distin- ção entre trabalhadores manuais, técnicos e intelectuais, enquanto categorias, o que não impede que se estatuam direitos específicos para determinada profissão, por exemplo, bancários, professores etc. Nesse sentido, o escólio atual do insuspeito Arnaldo Süssekind (2004, p. 274-275): 23 Não se deve confundir licença-maternidade, que é o direito de a gestante se afastar do trabalho sem prejuízo do salário pelo período imediatamente anterior e posterior ao parto (CLT, art. 392), contando 120 dias, com a estabilidade da gestante, que é a proscrição de exercício pelo empregador do direito potestativo de despedida da empregada gestante, da confirmação da gravidez até cinco meses após o parto (ADCT, art. 10). 24 Gestante. Estabilidade provisória. I. O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao paga- mento da indenização decorrente da estabilidade (TST, Súmula 244). 25 Segundo a nova redação da Súmula 244 do TST, a estabilidade da gestante não assegura reintegração, apenas salários e van- tagens do período, exceto se esta se der durante o período estabilitário. 26 A expressão deficiente físico, de nítido cunho pejorativo, vem sendo substituída pela presente, reconhecida pelos psicólogos como mais indicada. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 35. 33 [...] o que a Constituição proíbe é que os direitos, garantias e benefícios assegurados de maneira geral ou para determinada categoria distingam entre os trabalhadores manuais ou técnicos e os intelectuais integrantes do grupo a que se refere a lei. Normas existem na Constituição que espelha a preocupação do legislador com a higiene e a segurança no trabalho (CF, art. 7.º, XXII e XXVIII), sendo relevante frisar que a CLT disciplina as hipóteses de cabimento dos adicionais de periculosidade, (risco à vida implicando contato com explosivo, inflamável ou energia elétrica) e insalubridade (risco à saúde)27 . Ausente qualquer regulamentação ao trabalho penoso, o que implica dizer que inexiste aplicação no momento do adicional de penosidade, cujos contornos devem estar jungidos ao excessivo esforço físico ou intelectual, de resto a serem delimitados pelo legislador infraconstitucional quando da futura normatização. Questão relevante a fixar é a existência de dupla proteção contra o acidente de trabalho, que se implementa pelo seguro a cargo do INSS, independente da possibilidade de responsabilização direta do empregador. Também pendente de regulamentação está a proteção em face da automação (CF, art. 7.º, XXVII), que não implica apenas a substituição da energia humana ou animal por energia inanimada, mas também a capacidade de pensar, ou seja, cogita-se da máquina controlando outra máquina. A prescrição pode ser conceituada como a perda do direito de ação pela inação do seu titular, sendo tratada no artigo 7.º, XXIX, da Carta Magna. Pode ser de dois tipos: total ou parcial; a primeira fulmina por completo o direito de ação, e a última apenas fração deste. A prescrição trabalhista foi modificada com a chegada da Constituição de 1988 e novamente com o advento da Emenda Constitucional 28, de maio de 2000, que unificou os prazos prescricionais de trabalhadores urbanos e rurais, pondo fim à injustificada separação do regime anterior. Assim, na redação original da Constituição, vigorava pres- crição total de dois anos aplicável a urbanos e rurais, e prescrição parcial de cinco anos, esta última apenas para urbanos. Na sistemática atual, o empregado urbano ou rural possui prazo de dois anos após o término do contrato para ingressar com ação, contados do dia do término do contrato, podendo pleitear direitos atinentes aos últimos cinco anos, contados do dia do ajuizamento da ação. 27 Artigo 189 e seguintes. Exige-se, quando discutida em Juízo a questão, que se realize perícia, sendo hipótese de prova legal, consoante artigo 195, parágrafo 2.º, da CLT. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 36. DIREITO DO TRABALHO Estabeleceu o Constituinte a equiparação do trabalhador avulso28 ao empregado, que passou a se reportar, na sistemática nova, a todos os direitos. A aposentadoria não é matéria tipicamente trabalhista, em um ordenamento jurí- dico que, como o nosso, apresenta a dicotomia entre Direito do Trabalho e Direito Pre- videnciário. Relevante apenas a análise dos efeitos da aposentadoria sobre o contrato de trabalho29 . Após o extenso rol de direitos referido acima, finaliza o legislador com o trato do doméstico (CF, art. 7.º, parágrafo único). Em relação a ele, e mantendo injustificável tra- tamento desfavorável à aludida categoria30 , indica o legislador expressamente os incisos e os consequentes direitos aplicáveis ao doméstico, quais sejam: salário mínimo; irredu- tibilidade salarial; décimo terceiro salário; repouso semanal remunerado; licença-mater- nidade e paternidade; aviso prévio; aposentadoria e integração à Previdência Social. Deixou fora da especificação e de qualquer regulamentação o trato da jornada de trabalho; ademais, a não proteção do FGTS, que, na legislação infraconstitucio- nal, é tratado como facultativo. As mais recentes alterações na Lei 5.859/72 (pela Lei 11.324/2006) incorporam como direitos do doméstico a estabilidade da gestante; a veda- ção de descontos do salário, a exemplo de habilitação, alimentação, vestuário e higiene pessoal; e as férias de 30 dias. Direito coletivo Tratou o legislador, nos artigos de 8.º a 11 da CF, do Direito Coletivo do Trabalho. A CF fraciona em parte o sistema anterior em matéria de liberdade sindical, ao proceder relativa desvinculação do sindicato em relação ao Estado. Dizemos relativa, eis que se tornou despicienda autorização estatal para a existência do sindicato (antiga carta de reconhecimento sindical), e proibiu a interferência do Estado nos sindicatos, no que foi 28 O avulso é espécie de trabalhador portuário que presta serviços por meio do sindicato ou do órgão gestor de mão de obra. 29 Após longos debates doutrinários e jurisprudenciais, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu em controle concentrado de constitucionalidade que a aposentadoria não extingue o contrato de trabalho. 30 Vide a previsão do artigo 7.º, “a”, da CLT. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 37. 35 extremamente feliz o Constituinte, mantendo, todavia, o sindicato atrelado ao Estado ao disciplinar as receitas sindicais, notadamente a contribuição sindical obrigatória e a contribuição para manutenção do sistema confederativo. Outrossim, a regra de unicidade sindical revela imprópria interferência do legis- lador que, a par de limitar os sindicatos em relação ao número (um sindicato por base territorial), impõe o tamanho da base, que não poderá ser inferior ao município. Tudo isso nos leva a falar na existência de uma liberdade sindical mitigada. Outorgou-se ao sindicato monopólio da negociação coletiva, e se assegurou o direito de greve. Ainda, asseguraram-se outras formas de representação dos trabalha- dores não sindicais, de que é bom exemplo o artigo 11 da CF. Por fim, reconheceu-se o direito de participação dos obreiros nos órgãos públicos em que se discutam seus interesses profissionais ou previdenciários (CF, art. 10). Quanto à aplicação do Direito Material do Trabalho, reconheceu a Carta Magna a autonomia jurisdicional do Direito do Trabalho, ao disciplinar, no artigo 114, a competência da Justiça do Trabalho, talha- da para litígios entre trabalhadores e empregadores, cuja competência restou sensivel- mente ampliada pelo advento da Emenda 45/2004 (Reforma do Poder Judiciário), que, afora a ampliação da competência para todas as formas de relação de trabalho, trouxe novas matérias, a exemplo das multas aplicadas pela fiscalização do trabalho e dos dis- sídios de legitimidade entre sindicatos. O poder normativo foi mitigado, passando-se a exigir comum acordo para o ajuizamento dos dissídios coletivos de natureza econômi- ca, a teor da nova redação do artigo 114, parágrafo 2.º, da CF, ressalvando-se apenas o dissídio coletivo de greve (CF, art. 114, §3.º). Direito Constitucional do Trabalho, de Arnaldo Lopes Süssekind, editora Renovar. Direito e Processo do Trabalho, de Otávio Augusto Sousa, editora Forense. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 38. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 39. Teoria geral do Direito do Trabalho Terminologia da disciplina Sistematizando o que vimos, no momento posterior à Revolução Industrial o Direito do Trabalho desponta como disciplina autônoma. A primeira celeuma a enfrentar reside justamente em como denominar a nova disciplina jurídica. Muitas foram as denominações buscadas. Legislação Industrial, à qual se pode opor o simples mas contundente fato de que o Direito não se resume à Lei. Afora isso, ainda se pode objetar à aludida denominação o seu caráter restritivo e equívoco, haja vista parecer indicar que o novo ramo do Direito aventado pela doutrina regraria­ tão somente relações de trabalho no setor secundário, deixando na marginalidade o pri- mário, o terciário e o que alguns hoje denominam quaternário. Direito Industrial tam- bém foi uma expressão utilizada e que se afigura igualmente permeada de imprecisões, muito mais quando, além da objeção acima indicada quanto a seu caráter restritivo, possui hoje significação própria, disciplinando as relações afetas à propriedade indus- trial, marcas, patentes, dentre tantas outras. Direito Operário foi tentada e rechaçada, quer pela ênfase exagerada em apenas um dos contratantes, quer pelo fato de possuir a palavra operário, além-fronteiras, sentido peculiar jungido ao trabalho na indústria. Di- reito Corporativo e Direito Sindical, expressões muito utilizadas por autores italianos, são hoje superadas. Tentou-se Direito Social, à qual logo se objetou ser social todo o Direito. Ademais, a expressão foi cunhada com sentido particular – a proteção aos economicamente­ débeis –, que extrapola em muito a matéria do Direito do Trabalho, albergando a proteção à infância, à velhice, às mulheres. Direito do Trabalho é a denominação consagrada pelo uso; com ressalvas, todavia, adotamos Direito do Trabalho pela evidente razão de ser, de todas, a menos equívoca e a que resultou consagrada pelo legislador e pela doutrina. Autonomia do Direito do Trabalho Ultrapassada a questão atinente à denominação, ressalta, em determinado momento histórico (a partir de 1919, com o Tratado de Versalhes), a autonomia desse novo ramo do Direito. A autonomia pode ser vista sob diversos aspectos, dos quais Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 40. DIREITO DO TRABALHO usualmente se enfatiza a autonomia científica, didática, legislativa e jurisdicional. Desses enfoques, o único que de fato revela a existência de um novo ramo do Direito é o primeiro, da autonomia científica. Para que um ramo da ciência jurídica seja tido por autônomo (autonomia ­científica), há de atender a três pressupostos listados por Alfredo Rocco: possuir domínio amplo, método próprio e princípios gerais comuns. O Direito do Trabalho busca disciplinar as relações de trabalho subordinadas e even- tualmente outros tipos de relações de trabalho. Abrange o trabalhador urbano, o rurícola, o doméstico, afora as várias profissões regulamentadas. Detém, portanto, matéria suficien­ temente vasta, atendendo assim ao primeiro pressuposto listado por Rocco. Sobre a existência de método próprio, vêm a propósito as lições de Godinho ­Delgado (2004, p. 68), para quem [...] é também clara a existência de metodologia e métodos próprios ao ramo jurídico especializado do trabalho. Neste passo, a particularidade justrabalhista é tão ­pronunciada que o Direito do Trabalho destaca-se pela circunstância de possuir até ­mesmo métodos próprios de criação jurídica, de geração da própria normatividade trabalhista. É o que se ressalta, por exemplo, através dos importantes mecanismos de negociação ­coletiva exis- tentes. Dos três pressupostos, talvez o mais relevante seja o terceiro. Nos princípios, ter-se-á a unificação e a sistematização das normas de determinada disciplina jurídica, ­revelando-lhes o sentido latente. Célebre se tornou a classificação do uruguaio Amé- rico Plá Rodriguez, que elenca os seis princípios basilares do Direito Laboral, a saber: proteção, consubstanciado em três regras (in dubio pro misero, norma mais favorável e condição mais benéfica); irrenunciabilidade dos direitos; continuidade da relação de emprego; primazia da realidade; razoabilidade e boa-fé. Sem sombra de dúvidas, então, está caracterizada a autonomia científica do Direito do Trabalho. Afirma-se, sem sobressaltos, ao lado da autonomia científica, a didática, sendo ­suficiente para atestá-la volver os olhos à extensa doutrina existente sobre Direito La- boral e à existência de uma cátedra específica para ministrar a disciplina em cursos de graduação (Lei 2.724/56), afora os cursos de pós-graduação na matéria, seja stricto ou lato sensu. Detém o Direito do Trabalho autonomia legislativa, eclodindo de uma preocupa- ção do legislador em disciplinar as relações de trabalho em seus múltiplos aspectos, de que são exemplos a CLT, ampla legislação complementar, sem olvidar os artigos 7º a 11 da CF, reservados ao trato das relações de trabalho. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 41. 39 Por derradeiro, a autonomia jurisdicional, nota característica do Direito do Tra- balho pátrio, que reserva um ramo do Poder Judiciário para dirimir os litígios que de- corram das relações de trabalho. Condenada por uns, elogiada por outros, certo é que a Justiça do Trabalho se tem mostrado, de todas, a mais efetiva e célere, ainda que esteja muito longe de ser ideal. Taxonomia Questão que não pode ser ignorada consiste em proceder à localização do Direito do Trabalho no âmbito da ciência jurídica, ou seja, exercitar a taxonomia. Desde Ulpiano, busca-se “subdividir” o Direito, tendo em vista a absoluta ­impossibilidade de compreendê-lo senão recorrendo a classificações e subdivisões, e, mais que isso, tal ­método traz em si a única forma possível de transmitir o conhecimen- to, desempenhando relevante ­função didática. Pontifica Orlando Gomes (2005, p. 23), com base no magistério de Ulpiano, que “O Direito Público tem por sujeito o Estado e, por objeto, o interesse público; ao passo que o Direito Privado tem por sujeito o indiví- duo e, por objeto, o interesse particular.” Hodiernamente, busca-se o reconhecimento de uma classificação tripartite do Direito, em Público, Privado e Social. Data venia, não nos parece que exista, com contor- nos definidos, o terceiro ramo apontado. O Direito do Trabalho, em verdade, apresenta, em sua ampla maioria, normas típicas de Direito Privado. A existência de um corpo de normas de disponibilidade re- lativa e imperativa não desnatura o que viemos expor: o que qualifica o Direito como Público não é a pura e simples interferência do Estado, e sim, ainda que tal se verifique, a visualização do interesse protegido e, em nosso caso, o nítido intuito de proteção a interesse de particulares. As regras utilizadas na interpretação e aplicação do Direito do Trabalho haverão de ser cotejadas, atentando-se a essas vicissitudes, mormente sua pertinência ao Direito Privado. Relações com outros ramos do Direito Consequência inelutável da indivisibilidade do fenômeno jurídico é a necessidade de se rememorar que o Direito do Trabalho se relaciona, então, com todos os outros ­ramos do Direito. Isso ocorre porque, sendo as classificações apenas fruto da necessidade de apreensão de um objeto (ciência jurídica), o qual se apresenta excessivamente amplo, e ante a necessidade de se viabilizar a transmissão do conhecimento, surgem as referidas Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 42. DIREITO DO TRABALHO classificações, que não passam, portanto, de categorias ideais. Daí a necessidade, para minorar os efeitos das classificações, de enfatizar a inter-relação dos diferentes ramos do Direito. Nessa medida, o Direito do Trabalho se relaciona com o Direito Civil, do qual retira as regras gerais do negócio jurídico e da teoria geral dos contratos. Interpenetra o Direito Comercial, no qual busca o suporte teórico para conceitos como o de empresa, uti- lizado no artigo 2.º da Norma Consolidada, fora reminiscência com direitos de lá escandi- dos, como o aviso prévio do antigo Código Comercial de 1850. Trava íntimas relações com o Direito Constitucional, do qual retira parte de seus princípios, estando na Constituição Federal de 1988 uma série de postulados básicos do Direito Individual (CF, art. 7.º), Co- letivo (arts. 8.º a 11), isso afora o reconhecimento da Justiça do Trabalho (art. 114). Com o Processo do Trabalho se toca na medida em que este é o modo de concreção do Direito Material do Trabalho. Interliga-se assim também indiretamente com o Processo Civil, do qual o Processo do Trabalho vai retirar as noções essenciais de competência, partes, procuradores, além da regra expressa do artigo 769 da CLT. No Direito Internacional, busca as regras sobre aplicação, recepção e denúncia das convenções, recomendações e tratados internacionais, tão relevantes em um mundo cada vez mais globalizado. Po- deríamos prosseguir, mas cremos ter atingido nosso desiderato de demonstrar ao leitor que, se o Direito e seu objeto são indivisíveis, e as classificações mero ­subterfúgio didá- tico, o Direito do Trabalho se relaciona com todos os outros ramos da ciência ­jurídica. Divisão interna É pertinente fixar, a esta altura, a divisão interna do Direito do Trabalho. Os auto- res apresentam múltiplas classificações, sendo possível divisar, entrementes, dois grandes ­ramos: Direito Individual do Trabalho e Direito Coletivo do Trabalho. Poderíamos mesmo falar em subdividir o fenômeno laboral, em sentido estrito, na forma acima proposta. No Direito Individual, viceja a preocupação com cada uma das relações de traba- lho verificadas entre empregado e empregador. Estão compreendidos nele o trato dos sujeitos do contrato de trabalho, seus elementos, alteração, suspensão ou interrupção e terminação. Ocupa-se, ainda, da duração do trabalho e da remuneração, dentre tantos ­outros temas, voltados, em perspectiva mais específica, para disciplinar cada um dos ajustes que envolvem as condições de trabalho subordinado. No Direito Coletivo, temos uma preocupação com a estruturação da representa- ção dos trabalhadores, sindical e não sindical, daí preferirmos a expressão1 pela sua 1 Muitos autores advogam a utilização de Direito Sindical, como Mascaro Nascimento. Outros preferem Direito Sindical e Coletivo, como Rodri­gues Pinto (2003). Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 43. 41 ­amplitude. Ademais disso, disciplina-se a negociação coletiva e, assim sendo, as for- mas de ­exercício da autonomia privada coletiva, por meio dos institutos peculiares do acordo e da convenção coletiva de trabalho; cogita também o Direito Coletivo do direito de greve. Por conseguinte, seu objeto se desborda além mesmo da esfera de atuação dos sindicatos e de suas projeções: federações, confederações e centrais sindicais. O foco, agora, são as relações jurídicas que envolvem o conjunto dos trabalhadores, e somente por via reflexa cada uma das respectivas relações individuais de emprego, em que, em ­análise apurada, decompõem-se tal conjunto. Pensa-se, assim, nos trabalhadores não individualmente, mas em perspectiva de todo, unitária. A classificação adotada é ­didática, na medida em que permite antecipar uma repartição usualmente adotada em sede de Processo do Trabalho, qual seja, em relação aos dissídios ou ações: os dissídios individuais de trabalho e dissídios coletivos de trabalho. Em sentido amplo, poderíamos, alargando o espectro, pensar em quatro gran- des sub-ramos. Direito Individual do Trabalho e Direito Coletivo do Trabalho, dos quais falamos acima, justapostos ao Direito Internacional do Trabalho e ao Direito Público do ­Trabalho. No ­Direito Internacional do Trabalho, temos o estudo das fontes internacio- nais, notadamente as convenções e recomendações oriundas da Organização Interna- cional do Trabalho (OIT), além dos tratados internacionais. A crescente mundialização faz aumentar a preocupação em uniformizar as condições de trabalho, fato sentido des- de a edição do Tratado de Versalhes, em 1919. Quanto ao Direito Público, temos aqui as relações que unem o Estado às partes da relação laboral, notadamente o empregador. Encontram-se abrangidas nesse último sub-ramo as regras atinentes à fiscalização tra- balhista, penalidades e, regra geral, os conteúdos de ordem pública2 existentes, como temos, v.g., nas normas de higiene e segurança no trabalho. Direito do Trabalho: definição A par dos conceitos empreendidos, urge definir Direito do Trabalho. Usualmente, são três as formas de se definir: consoante as pessoas, os sujeitos que serão abrangidos por aquele determinado ramo da ciência do Direito; em atenção à matéria a ser disciplinada, o objeto da disciplina em questão; ou pela conjugação dos dois critérios anteriores, possi- bilitando, respectivamente, definições subjetivistas, objetivistas e mistas. As definições irão variar de acordo com a posição ideológica ou o critério de cada doutrinador, pelo que nos limitaremos a sugerir nossa definição. Assim, temos que o Di- reito do Trabalho é o ramo da ciência do Direito formado por um conjunto de princípios e normas jurídicas que disciplinam as relações entre trabalhadores e empregadores, das 2 Sobre a distinção entre normas de ordem pública e normas ­indisponíveis, conceitos inconfundíveis, ver acima o que falamos em sede de taxonomia. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 44. DIREITO DO TRABALHO associações que conjugam seus respectivos interesses e destes com o Estado, gravitando sobre o trabalho subordinado e eventualmente sobre outros tipos de relações de labor (SOUSA, 2002). Fontes do Direito do Trabalho: conceito, classificações e espécies Por apego à etimologia, o conceito de fonte é indicado pela quase totalidade dos autores como repositórios de onde surge o Direito. A representação visual da nascente de um rio, embora nada criativa, presta-se a permitir rápida visualização e apreensão da problemática das fontes. Múltiplas são as classificações das fontes, sendo as mais relevantes as seguintes: fonte formal e material; fonte vinculante e não vinculante; fonte autônoma e heterônoma. Para enfeixarmos, entrementes, todos os problemas possíveis em sede de fontes, urge a adoção de derradeira classificação por nós proposta, em fontes ordinárias e ex- traordinárias ou residuais. Fonte material são os valores da sociedade e os fatos sociais, econômicos, culturais que fornecem o substrato à elaboração da norma jurídica, enquanto fonte formal é a pró- pria exteriorização, positivação ou concretização da norma, a maneira como o Direito formalmente se expressa. Em Direito do Trabalho, a fonte material que ocasionou sua criação no mundo foi plural, envolvendo fatos sociais, econômicos e políticos, dentre os quais se destacou “a pressão exercida sobre o Estado capitalista pela ação reivindicatória dos trabalhado- res”, conforme lições de Gerard Lyon-Caen, apoiado no particular por Délio Maranhão (1993, p. 154). Embora relevante a atuação dos trabalhadores na formação do Direito do Traba- lho, não nos parece que se possa entender ter sido esse único elemento, isoladamente, fonte material do Direito do Trabalho, no que ousamos divergir das lições acima trans- critas, para reconhecer, como o faz a doutrina majoritária, que o conjunto dos acon- tecimentos do período inaugurado com a primeira Revolução Tecnológica (Revolução Industrial), estes sim em suas múltiplas repercussões (enquanto conjunto), evidenciam a fonte material deste ramo da ciência jurídica. Existem fontes às quais o intérprete ou aplicador do Direito se encontra adstrito, como ocorre, por exemplo, com a lei e o costume. Diante de outras, o intérprete é livre para observá-las ou não, o que se presta a firmar o conceito, respectivamente, de fonte vinculante e fonte não vinculante. Pertencem à última espécie a doutrina e a jurisprudên- Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 45. 43 cia, que, por se enquadrarem no conceito proposto de fonte, detêm tal qualidade, pois delas surge direito, como veremos à frente. Ainda se pode falar a partir e dentro das fontes formais, notadamente a partir do tipo de norma nelas consagrada, em fontes autônomas ou heterônomas. Nas primeiras, tería- mos aquelas que provêm da vontade de ambas as partes envolvidas na relação de traba- lho, de que são exemplos o contrato individual de trabalho, o acordo e a convenção coleti- va. Heterônomas são aquelas que provêm da vontade de apenas uma das partes ou de um terceiro ­estranho às partes, nas quais se identifica e sobreleva a Lei (sentido formal). Fontes residuais ou extraordinárias podem ser garimpadas dentre aquelas de que cogita o artigo 8.º da CLT. Expliquemo-nos. Se fonte é o repositório de onde surge o Direito, será subsumível ao referido conceito e, portanto, fonte, qualquer local de onde o Direito possa nascer, seja tal nascimento corriqueiro, usual (fontes ordinárias), ou excepcional, ipso facto, incomum (fontes ­extraordinárias), critério que se pauta na frequência de sua utilização. Assim, empreende-se derradeira classificação, em fontes ordinárias, albergando princípios3 e regras de Direito (norma em sentido estrito) e fontes extraordinárias ou residuais, que são passíveis de serem ­retiradas em sua maioria do artigo 8.º da CLT, e que seriam: dou- trina, jurisprudência, analogia, equidade e o Direito Comparado. Identificam-se, assim, dentro das fontes extraordinárias ou residuais, as formas de integração do Direito. Ora, se ausente a norma (sentido amplo), existe determinação expressa de perse- cução nos aludidos institutos da solução para as lides laborais; esses institutos, assim, hão que ser, a toda evidência, reconhecidos como fontes. Falemos agora das fontes em espécie. Lei será, em sentido amplo, sinônimo de norma jurídica, mas, em sentido próprio, restrito, representa toda norma que passa por um processo formal de elaboração legislativa pre- visto pelo legislador extraordinário de 1988 em seu artigo 59 e ­seguintes. São enquadráveis no conceito as emendas à Constituição (cada dia mais numerosas) leis complementares, leis ordinárias, delegadas e medidas provisórias – emanações que seguem, ­portanto, o pro- cesso formal previsto na Constituição, o qual se revela uma sucessão preestabelecida de fases, culminado com sua promulgação, publicação e início de vigência.4 São traços característicos das leis: a generalidade, a abstratividade, a impesso- alidade e a obrigatoriedade ante a possibilidade de coerção a ela inerente. É pródiga a atuação da Lei no Direito do Trabalho. 3 O reconhecimento de conteúdo normativo aos princípios aceitos pela doutrina a partir das lições da moderna Filosofia do Direito implica classi­ficá-los como fontes ordinárias. 4 Vigência, validade e eficácia são conceitos distintos. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 46. DIREITO DO TRABALHO Costumes são práticas espontâneas, repetidas e relativamente uniformes que tra- zem consigo a ideia de obrigatoriedade, ou opinio juris ac necessitatis. Apresenta-se juri- dicamente como fonte autônoma, sendo dentre todas as fontes uma das mais efetivas, na medida em que, para que seja costume jurídico, deve a coletividade trazer ínsita a ideia de que a observância das práticas que constituem seu objeto são dever jurídico; logo, tais práticas já devem ser do conhecimento das partes, não precisando essa espécie normativa recorrer, como diversamente ocorre com a lei, ao artificialismo da publicação. Pode ser secundum legem, praeter legem e contra legem. É de se ressaltar que, em alguns epi- sódios, a própria norma trabalhista determina a observância do costume, como ocorre quanto ao rurícola em relação aos intervalos intrajornada (Lei 5.889/73). Frise-se que, em um país como o nosso, de tradição de Direito Codificado, logo, escrito, o costume não tem a eficácia derrogatória da lei, podendo ocorrer o desuetudo ou desuso. A lei é vi- gente e válida, mas tem sua eficácia atingida na medida em que, na prática, deixa de ser aplicada, haja vista ser substituída na coletividade pelo teor do costume.5 O regulamento, sem adjetivações, não se confunde com o regulamento de em- presa. Enquanto o primeiro é forma de explicitar o conteúdo da lei para facilitar sua ­execução (de que são exemplos portarias, circulares e ordens de serviço), o último é a norma interna da empresa. Os conceitos de convenção e acordo coletivo se encontram apostos na Consolida- ção, respectivamente no artigo 611, caput, e em seu parágrafo 1.º. Convenção coletiva é contrato normativo6 intersindical7 com escopo de criar condições de trabalho. O acordo coletivo tem por diferença específica as partes, que são sindicato de empregados (categoria profissional) e “empresa ou grupo de empresas”.8 Sentença normativa é aquela prolatada em sede de dissídio coletivo. Especifica- mente, informa o poder normativo dos tribunais, tratado na Carta Magna em seu artigo 114, parágrafo 2.º. Erige a possibilidade de os tribunais criarem condições de trabalho nas hipó- teses em que o exercem, hoje mitigado pela Emenda 45/2004 e a exigir comum acordo,aplicá- veis, por prazo determinado, às categorias envolvidas e na respectiva base territorial. 5 A utilização imprópria do cheque enquanto ­título de crédito espelha a ­problemática: sendo ordem de pagamento à vista, foi em tempos recentes utilizado largamente como instrumento de obtenção de crédito e pagamento ­parcelado. Nesse sentido, a ­jurisprudência reconhece o costume ­jurídico, como se percebe nas decisões do STJ. 6 O que revela sua natureza jurídica híbrida, misto que é de acordo de vontades (con­tra­to) e veículo de criação de condições de trabalho (norma). 7 Abrange os sindicatos da categoria profissional (empre­gados) e econômica ­(empre­gadores). 8 Para seguir a expressão do legislador. Deve-se observar a distinção entre pessoa, empresa e estalecimento, que nos permite separar o sujeito celebrante da convenção ou ­acordo (pessoa) de um objeto d­e direito, que é a empresa. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
  • 47. 45 Contrato individual de trabalho é a “fonte primária”9 do Direito do Trabalho, conse- quência inelutável do reconhecimento da natureza contratual da relação de trabalho, ou seja, de que a vontade das partes envolvidas desempenha importante papel na atuação da norma. Não se cogita aqui senão do fato de que as partes são livres para celebrarem ou não o ajuste (contrato) de labor que faz incidir a norma trabalhista,10 e assim, a existência da vontade pode ser aferida na formação do contrato, inobstante o limitado alcance na determinação do conteúdo da avença. Aplicação do Direito do Trabalho no espaço: a hierarquia das fontes – o conflito e suas soluções Estabelecidas as várias espécies de fontes, há que se fixar a ordem de prevalência entre elas. Em acordo com a nossa sistemática constitucional e com arrimo na melhor doutrina, pode-se divisar a seguinte ordem de precedência ou hierarquia entre as fontes mais citadas pelos autores: Constituição, inclusive a atividade revisional e de reforma (emendas constitucionais) Leis (complementares, ordinárias, delegadas) Regulamento Sentença normativa Convenção coletiva Acordo coletivo Costume Regulamento de empresa Contrato individual de trabalho Merece análise, entretanto, a classificação – sugerida por Orlando Gomes (2005) e repetida por parcela significativa dos autores – que distribui as fontes na forma a seguir: 9 A expressão é de Orlando Gomes (2005, p. 33) para quem “A fonte primária, ou fonte de criação, comum a todo Direito Privado, é a vontade das partes.” 10 Teoria contratualista moderna. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br