SlideShare una empresa de Scribd logo
1 de 5
Descargar para leer sin conexión
O princípio anarquista
                          de Kropotkine 1 (1913)



        Ao início, a Anarquia apresentou-se como uma simples negação.
A negação do Estado e da acumulação individual de Capital. A negação
de qualquer espécie de autoridade. A negação também das formas
estabelecidas pela sociedade, baseadas nas injustiça, no egoísmo absurdo
e na opressão, assim como na moral comum, derivada do Código romano,
adoptado e santificado pela Igreja cristã. É com base numa luta, envolvida
contra a autoridade, nascida no seio da Internacional, que o partido
anarquista se constituiu como partido revolucionário distinto.
        É evidente que espíritos tão profundos tais como Godwin 2 ,
Proudhon 3 e Bakunine 4 não se podiam limitar a uma simples negação. A
afirmação – a concepção de uma sociedade livre, sem autoridade, a
caminho da conquista do bem-estar material, intelectual e moral – seguia
de bem perto a negação; ela constituía a sua contrapartida. Nos escritos de
Bakunine, assim como nos de Proudhon, e de Stirner 5 , encontramos
considerações profundas sobre os fundamentos históricos da ideia do anti-
autoritarismo, o papel que desempenhou na história, e o papel que irá
desempenhar no futuro desenvolvimento da humanidade.
        «Nenhum Estado» ou «nenhuma autoridade», apesar da sua forma
negativa, estas palavras tinham um sentido profundamente afirmativo. Era
um princípio filosófico e simultaneamente prático, que significava que
todo o conjunto das vidas das sociedades, tudo, - desde as relações
quotidianas entre indivíduos até às grandes relações entre as raças através
dos Oceanos – podia e devia ser reformado e seria de qualquer forma
necessariamente reformado, segundo os grandes princípios da anarquia –
a plena e total liberdade do indivíduo, os agrupamentos naturais e
temporários, a solidariedade – que passaria ao estado de hábito social.
        Eis por que razão a ideia anarquista apareceu como sendo grande,
iluminadora, capaz de mobilizar e de incendiar os melhores espíritos da
época.
        Não tenhamos receio da palavra, ela era filosófica.
        Hoje em dia, rimo-nos da filosofia. Contudo, não nos ríamos dela
no tempo do Dicionário Filosófico de Voltaire 6 , que, colocando a
filosofia ao alcance de todos e convidando toda a gente a adquirir noções
gerais sobre todas as coisas, constituía uma obra revolucionária, cujos
rastos se encontram nos levantamentos dos camponeses, nas grandes




Ana da Palma                        1
cidades de 1793, e no entusiasmo apaixonado dos voluntários da
Revolução. Nessa época, os que nos esfomeavam tinham medo da
filosofia.
        Mas os padres e os homens de negócios, ajudados pelos filósofos
universitários alemães, de linguajar incompreensível, conseguiram
perfeitamente tornar a filosofia inútil, ou pelo menos ridícula. Os padres e
os seus adeptos tanto disseram que a filosofia constituía balelas que os
ateus acabaram por acreditar. Os homens de negócios burgueses – os
oportunistas brancos, azuis e vermelhos – riram tanto do filósofo que os
homens sinceros também se deixaram endrominar. Qual manipulador da
Bolsa, qual Thiers 7 , qual Napoleão, qual Gambetta 8 não o repetiram para
poderem continuar os seus negócios! Assim, a filosofia encontra-se hoje
em dia menosprezada.
        Independentemente do que dizem os padres, os homens de
negócios e aqueles que repetem o que aprenderam, a Anarquia foi
compreendida pelos seus fundadores como uma grande ideia filosófica.
Com efeito, ela é mais que um simples motivo para esta ou outra acção. É
um grande princípio filosófico. É uma vista de conjunto que resulta da
compreensão verdadeira dos factos sociais, do passado histórico da
humanidade, das verdadeiras causas do progresso antigo e moderno.
Umas concepções que não podemos aceitar sem sentir se modificarem
todas as nossas apreciações, grandes ou pequenas, dos grandes fenómenos
sociais, como das pequenas relações entre nós todos na nossa vida
quotidiana.
        Ela é um princípio de luta de todos os dias. E, se é um princípio
poderoso nesta luta, é porque resume as aspirações profundas das massas,
um princípio, falseado pela ciência estadista e espezinhado pelos
opressores, mas sempre vivo e activo, sempre criando o progresso e
contra todos os opressores.
        Exprime uma ideia que, desde sempre, desde que existem
sociedades, procurou modificar as relações mútuas, e um dia irá
transformá-las, desde as relações que se estabelecem entre os homens
fechados na mesma casa, até aqueles que pensam em juntar-se em grupos
internacionais.
        Finalmente, um princípio que requer a reconstrução total da
ciência, física, natural e social.

                                         *
                                      * *




Ana da Palma                         2
Este lado positivo, reconstrutor da Anarquia, não parou de se
desenvolver. E, hoje em dia, a anarquia carregou aos ombros um fardo
ainda maior do que aquele que havia ao início.
        Já não se trata de uma simples luta contra camaradas de oficina
que se atribuíram uma autoridade qualquer num grupo de operários. Já
não se trata de uma simples luta contra os chefes, outrora escolhidos, nem
até uma simples luta contra o patrão, um juiz ou um polícia.
        É tudo isso, com certeza, porque sem a luta de todos os dias – de
que serve chamarmo-nos revolucionários? A ideia e a acção são
inseparáveis, se a ideia teve poder sobre o indivíduo, sem a respectiva
acção a ideia estiola-se.
        Mais ainda é muito mais do que isso. É a luta entre dois grandes
princípios que, desde sempre, estiveram em confronto na sociedade, o
princípio de liberdade e o princípio de coerção: dois princípios que, neste
exacto momento, vão novamente empreender uma luta suprema para
necessariamente chegar a um novo triunfo do princípio libertário.
        Olhai em redor. O que restou de todos os partidos que outrora se
proclamavam eminentemente revolucionários? – Dois partidos apenas
estão presentes: o partido da liberdade e o partido da coerção. Os
anarquistas e, contra eles, todos os outros partidos, independentemente da
sua cor.
        É contra todos esses partidos que os anarquistas são os únicos a
defender a integralidade do princípio da liberdade. Todos os outros
partidos gabam-se de tornar a humanidade feliz mudando ou suavizando a
forma do chicote. Se gritam «fim à corda de cânhamo da forca», é para a
substituir por um cordão de seda, aplicado nas costas. Sem chicote, sem
coerção de qualquer tipo, - sem o chicote do salário e da fome, sem o
chicote do juiz ou do polícia, sem o chicote de qualquer forma de castigo,
- eles não conseguem conceber a sociedade. Apenas nós ousamos afirmar
que o castigo, o polícia, o juiz, a fome e o salário nunca foram e nunca
serão um elemento do progresso; e que, sob um regime que reconhece
estes instrumento de coerção, se há progresso, só pode ser conquistado
contra estes instrumentos e não por eles.
        Eis a luta que iniciamos. E, que jovem coração honesto não ficará
entusiasmado por esta ideia, tomando parte nesta luta e reivindicando-as
contra todas as minorias de opressores, a mais bela parte do homem,
aquela que fez todos os progressos que nos rodeiam e que apesar disto e
por isso mesmo continuam espezinhados!
        Mas não é só isso.




Ana da Palma                        3
Desde que a cisão entre o partido da liberdade e o partido da
coerção se torna mais profunda, este último agarra-se com mais força às
formas moribundas do passado.
        Sabe que tem pela frente um princípio poderoso, capaz de
imprimir uma força irresistível à revolução, se algum dia for bem
percebido pelas massas. E, trabalha para tomar conta de cada uma das
correntes que foram o conjunto da grande corrente revolucionária. Põe a
pata sobre o pensamento comunalista 9 que se anuncia em França e na
Inglaterra. Procura apoderar-se da revolta operária contra o patronato que
se produz no mundo inteiro.
        E, em vez de encontrar nos socialistas, menos avançados que nós,
auxílios, encontramos neles, nestas duas direcções, um hábil adversário,
apoiado em toda a força dos preconceitos adquiridos, que permite desviar
o socialismo por vias travessas e que acabará por apagar até o sentido
socialista do movimento operário, se os trabalhadores não se aperceberem
rapidamente e abandonarem os líderes de opinião actuais.
        O anarquista vê-se portanto forçado a trabalhar sem tréguas e sem
perder tempo em todas estas direcções.
        Deve fazer sobressair a grande parte filosófica do princípio da
Anarquia. Deve aplicá-la à ciência, porque com isso, ajudará a reformular
as ideias: encetará as mentiras da história, da economia social, da filosofia
e ajudará os que já o fazem, por amor pela verdade científica, a impor o
carimbo anarquista ao pensamento do século.
        Deve apoiar a luta e a agitação diária contra os opressores e os
preconceitos, manter o espírito de revolta em todo o lado em que o
homem está oprimido e tem a coragem de se revoltar.
        Tem que desconstruir as sábias maquinações de todos os partidos,
outrora aliados, mas hoje em dia hostis, que trabalham para desviar por
caminhos autoritários os movimentos nascidos da revolta contra a
opressão do Capital e do Estado.
        E, por fim, em todas as direcções há que encontrar, ou adivinhar
pela prática vivencial, as novas formas que os grupos, quer por ofícios,
quer por territórios ou locais, podem tomar numa sociedade livre, liberta
da autoridade dos governos e dos que nos esfomeiam.
        A grandeza da tarefa a cumprir não será a maior inspiração para o
homem com força para lutar? Não será igualmente a melhor maneira para
apreciar cada acontecimento separado que se produz na corrente da
grande luta que devemos apoiar?




Ana da Palma                         4
NOTAS DE TRADUÇÃO

1
  Tradução do livro em francês: Pierre Kropotkine (1913). Le principe anarchiste.
Paris: Les temps nouveaux.. Piotr Alexeyevich Kropotkin (Moscovo 21/12/1842 –
Dimitrov 8/02/1921). Geógrafo russo, escritor, pensador do anarquismo. Membro da
Primeira Internacional. Alguns títulos: A Conquista do Pão; Memórias de um
Revolucionário; Campos, Fábricas e Oficinas; Mutualismo: Um Factor de Evolução.

2
 William Godwin (Cambridgeshire, 3/03/1756 — 7/04/1836). Jornalista inglês, filósofo
político e escritor. Casado com Mary Wollstonecraft, autora de Uma Defesa dos
Direitos da Mulher (1790). Escritor de livros infantis com o pseudónimo Edward
Baldwin. Alguns livros: Inquérito acerca da justiça política; As coisas como elas são
ou As Aventuras de Caleb Williams; The Enquirer; Memoirs of the Author of A
Vindication of the Rights of Woman; Letters of Advice to a Young American; History
of the Commonwealth; Thoughts on Man, his Nature, Productions, and Discoveries;
Interspersed with some particulars respecting the author ; Lives of the Necromancers .

3
   Pierre-Joseph Proudhon (Besançon, 15/01/1809— Passy, 19/01/1865). Tipógrafo,
filósofo político e económico francês. Membro do Parlamento Francês. Um dos mais
influentes teóricos e escritores do anarquismo. Alguns livros: Qu'est-ce que la
propriété? Recherche sur le principe du droit et du gouvernement ; Sistema das
Contradições Econômicas, ou A Filosofia da Miséria; Idée générale de la révolution
au XIXe siècle; Le manuel du spéculateur à la bourse ; De la justice dans la
révolution et dans l'Eglise; La Guerre et la Paix; Do Princípio Federativo; De la
capacité politique des classes ouvrières; Théorie de la propriété; Théorie du
mouvement constitutionnel.

4
  Mikhaïl Aleksandrovitch Bakunine ( 30/05/1814 - Berna 1/07/1876). Revolucionário
teórico do anarquismo com uma ampla reflexão sobre o papel do Estado.
5
  Marx Stirner, pseudónimo de Johann Kaspar Schmidt, (Bayreuth. 25/10/1806 —
Berlim, 26/06/1856). Escritor e filósofo alemão. Um livro: O único e sua propriedade
em 1844.

6
  O dicionário filosófico data de 1764 da autoria de François Marie Arouet, conhecido
por Voltaire (Paris, 21/11/ 1694 — Paris, 30/05/1778). Escritor, ensaísta e filósofo
iluminista francês.

7
 Louis Adolphe Thiers (16/04/ 1797 — 37091877) estadista e historiador francês.
Primeiro ministro sob o reinado de Luís Felipe e presidente da república francesa
durante a 3ª república.
8
 Léon Gambetta ( 2704/ 1838 - 31/12/1882). Político francês. Primeiro-ministro da
França, entre 14 de Novembro de 1881 a 30 de Janeiro de 1882.
9
    «comunalista» relativo ao pensamento da Comuna.




Ana da Palma                               5

Más contenido relacionado

La actualidad más candente

Clastres arqueologia violencia
Clastres arqueologia violenciaClastres arqueologia violencia
Clastres arqueologia violenciatextosantropologia
 
Da Periferia para o Centro - Felipe Corrêa
Da Periferia para o Centro - Felipe CorrêaDa Periferia para o Centro - Felipe Corrêa
Da Periferia para o Centro - Felipe CorrêaBlackBlocRJ
 
Heterotopias anarquistas - Edson Passetti
Heterotopias anarquistas - Edson PassettiHeterotopias anarquistas - Edson Passetti
Heterotopias anarquistas - Edson PassettiBlackBlocRJ
 
Dois anos na Rússia - Emma Goldman
Dois anos na Rússia - Emma GoldmanDois anos na Rússia - Emma Goldman
Dois anos na Rússia - Emma GoldmanBlackBlocRJ
 
O Indivíduo na Sociedade - Emma Goldman
O Indivíduo na Sociedade - Emma GoldmanO Indivíduo na Sociedade - Emma Goldman
O Indivíduo na Sociedade - Emma GoldmanBlackBlocRJ
 
Um Parresiasta no Socialismo Libertário - Edson Passetti
Um Parresiasta no Socialismo Libertário - Edson PassettiUm Parresiasta no Socialismo Libertário - Edson Passetti
Um Parresiasta no Socialismo Libertário - Edson PassettiBlackBlocRJ
 
A Estratégia de Transformação Social em Malatesta - Felipe Corrêa
A Estratégia de Transformação Social em Malatesta - Felipe CorrêaA Estratégia de Transformação Social em Malatesta - Felipe Corrêa
A Estratégia de Transformação Social em Malatesta - Felipe CorrêaBlackBlocRJ
 
Mikhail bakunin - Deus e o Estado
Mikhail bakunin - Deus e o EstadoMikhail bakunin - Deus e o Estado
Mikhail bakunin - Deus e o EstadoWesley Guedes
 
O Pensamento Socialista Libertário de Noam Chomsky - Felipe Corrêa
O Pensamento Socialista Libertário de Noam Chomsky - Felipe CorrêaO Pensamento Socialista Libertário de Noam Chomsky - Felipe Corrêa
O Pensamento Socialista Libertário de Noam Chomsky - Felipe CorrêaBlackBlocRJ
 
Movimentos sociais, Burocratização e Poder Popular Da Teoria à Prática - Feli...
Movimentos sociais, Burocratização e Poder Popular Da Teoria à Prática - Feli...Movimentos sociais, Burocratização e Poder Popular Da Teoria à Prática - Feli...
Movimentos sociais, Burocratização e Poder Popular Da Teoria à Prática - Feli...BlackBlocRJ
 
Criar um Povo Forte - Felipe Corrêa
Criar um Povo Forte - Felipe CorrêaCriar um Povo Forte - Felipe Corrêa
Criar um Povo Forte - Felipe CorrêaBlackBlocRJ
 
Fortalecer nossa Bandeira - Felipe Corrêa
Fortalecer nossa Bandeira - Felipe CorrêaFortalecer nossa Bandeira - Felipe Corrêa
Fortalecer nossa Bandeira - Felipe CorrêaBlackBlocRJ
 
Poder e Anarquia - Edson Passetti
Poder e Anarquia - Edson PassettiPoder e Anarquia - Edson Passetti
Poder e Anarquia - Edson PassettiBlackBlocRJ
 
ERRICO MALATESTA e O ANARQUISMO - Bruno Muniz Reis
ERRICO MALATESTA e O ANARQUISMO - Bruno Muniz ReisERRICO MALATESTA e O ANARQUISMO - Bruno Muniz Reis
ERRICO MALATESTA e O ANARQUISMO - Bruno Muniz ReisBlackBlocRJ
 
Revolucionário ou reformista? Prós e contra do sindicato segundo Errico Malat...
Revolucionário ou reformista? Prós e contra do sindicato segundo Errico Malat...Revolucionário ou reformista? Prós e contra do sindicato segundo Errico Malat...
Revolucionário ou reformista? Prós e contra do sindicato segundo Errico Malat...Thiago Lemos
 
Rosa luxemburgo versao-web
Rosa luxemburgo versao-webRosa luxemburgo versao-web
Rosa luxemburgo versao-webCláudio Rennó
 
Daniel colson a filiação de proudhon
Daniel colson a filiação de proudhonDaniel colson a filiação de proudhon
Daniel colson a filiação de proudhonmoratonoise
 

La actualidad más candente (20)

Clastres arqueologia violencia
Clastres arqueologia violenciaClastres arqueologia violencia
Clastres arqueologia violencia
 
Da Periferia para o Centro - Felipe Corrêa
Da Periferia para o Centro - Felipe CorrêaDa Periferia para o Centro - Felipe Corrêa
Da Periferia para o Centro - Felipe Corrêa
 
Heterotopias anarquistas - Edson Passetti
Heterotopias anarquistas - Edson PassettiHeterotopias anarquistas - Edson Passetti
Heterotopias anarquistas - Edson Passetti
 
Dois anos na Rússia - Emma Goldman
Dois anos na Rússia - Emma GoldmanDois anos na Rússia - Emma Goldman
Dois anos na Rússia - Emma Goldman
 
O Indivíduo na Sociedade - Emma Goldman
O Indivíduo na Sociedade - Emma GoldmanO Indivíduo na Sociedade - Emma Goldman
O Indivíduo na Sociedade - Emma Goldman
 
Um Parresiasta no Socialismo Libertário - Edson Passetti
Um Parresiasta no Socialismo Libertário - Edson PassettiUm Parresiasta no Socialismo Libertário - Edson Passetti
Um Parresiasta no Socialismo Libertário - Edson Passetti
 
A Estratégia de Transformação Social em Malatesta - Felipe Corrêa
A Estratégia de Transformação Social em Malatesta - Felipe CorrêaA Estratégia de Transformação Social em Malatesta - Felipe Corrêa
A Estratégia de Transformação Social em Malatesta - Felipe Corrêa
 
Mikhail bakunin - Deus e o Estado
Mikhail bakunin - Deus e o EstadoMikhail bakunin - Deus e o Estado
Mikhail bakunin - Deus e o Estado
 
O Pensamento Socialista Libertário de Noam Chomsky - Felipe Corrêa
O Pensamento Socialista Libertário de Noam Chomsky - Felipe CorrêaO Pensamento Socialista Libertário de Noam Chomsky - Felipe Corrêa
O Pensamento Socialista Libertário de Noam Chomsky - Felipe Corrêa
 
Movimentos sociais, Burocratização e Poder Popular Da Teoria à Prática - Feli...
Movimentos sociais, Burocratização e Poder Popular Da Teoria à Prática - Feli...Movimentos sociais, Burocratização e Poder Popular Da Teoria à Prática - Feli...
Movimentos sociais, Burocratização e Poder Popular Da Teoria à Prática - Feli...
 
Criar um Povo Forte - Felipe Corrêa
Criar um Povo Forte - Felipe CorrêaCriar um Povo Forte - Felipe Corrêa
Criar um Povo Forte - Felipe Corrêa
 
Fortalecer nossa Bandeira - Felipe Corrêa
Fortalecer nossa Bandeira - Felipe CorrêaFortalecer nossa Bandeira - Felipe Corrêa
Fortalecer nossa Bandeira - Felipe Corrêa
 
Poder e Anarquia - Edson Passetti
Poder e Anarquia - Edson PassettiPoder e Anarquia - Edson Passetti
Poder e Anarquia - Edson Passetti
 
ERRICO MALATESTA e O ANARQUISMO - Bruno Muniz Reis
ERRICO MALATESTA e O ANARQUISMO - Bruno Muniz ReisERRICO MALATESTA e O ANARQUISMO - Bruno Muniz Reis
ERRICO MALATESTA e O ANARQUISMO - Bruno Muniz Reis
 
Anarquismo
AnarquismoAnarquismo
Anarquismo
 
Revolucionário ou reformista? Prós e contra do sindicato segundo Errico Malat...
Revolucionário ou reformista? Prós e contra do sindicato segundo Errico Malat...Revolucionário ou reformista? Prós e contra do sindicato segundo Errico Malat...
Revolucionário ou reformista? Prós e contra do sindicato segundo Errico Malat...
 
978 613-9-60525-5
978 613-9-60525-5978 613-9-60525-5
978 613-9-60525-5
 
Anarquismo
AnarquismoAnarquismo
Anarquismo
 
Rosa luxemburgo versao-web
Rosa luxemburgo versao-webRosa luxemburgo versao-web
Rosa luxemburgo versao-web
 
Daniel colson a filiação de proudhon
Daniel colson a filiação de proudhonDaniel colson a filiação de proudhon
Daniel colson a filiação de proudhon
 

Similar a Pierre kropotkine o princípio anarquista

Nestor makhno a revolução anarquista
Nestor makhno a revolução anarquistaNestor makhno a revolução anarquista
Nestor makhno a revolução anarquistamoratonoise
 
Anarquismo e pedagogia_libertaria
Anarquismo e pedagogia_libertariaAnarquismo e pedagogia_libertaria
Anarquismo e pedagogia_libertariaFabíola Leão
 
Pierre joseph proudhon sobre o princípio da associação
Pierre joseph proudhon sobre o princípio da associaçãoPierre joseph proudhon sobre o princípio da associação
Pierre joseph proudhon sobre o princípio da associaçãomoratonoise
 
Florentino de carvalho dois escritos da imprensa anarquista de são paulo
Florentino de carvalho dois escritos da imprensa anarquista de são pauloFlorentino de carvalho dois escritos da imprensa anarquista de são paulo
Florentino de carvalho dois escritos da imprensa anarquista de são paulomoratonoise
 
Em torno da vigência do socialismo libertário & definições de um companheiro ...
Em torno da vigência do socialismo libertário & definições de um companheiro ...Em torno da vigência do socialismo libertário & definições de um companheiro ...
Em torno da vigência do socialismo libertário & definições de um companheiro ...moratonoise
 
Malatesta e.-anarquismo-e-anarquia
Malatesta e.-anarquismo-e-anarquiaMalatesta e.-anarquismo-e-anarquia
Malatesta e.-anarquismo-e-anarquiamoratonoise
 
anarquismo e anarquia - Errico Malatesta
anarquismo e anarquia - Errico Malatestaanarquismo e anarquia - Errico Malatesta
anarquismo e anarquia - Errico MalatestaBlackBlocRJ
 
Malatesta anarquismo e anarquia
Malatesta anarquismo e anarquiaMalatesta anarquismo e anarquia
Malatesta anarquismo e anarquiamoratonoise
 
Slides Ciências Sociais Unidade I.pdf
Slides Ciências Sociais Unidade I.pdfSlides Ciências Sociais Unidade I.pdf
Slides Ciências Sociais Unidade I.pdfBrendaBorges35
 
Daniel AarãO 150 Anos Manifesto Comunista
Daniel AarãO   150 Anos Manifesto ComunistaDaniel AarãO   150 Anos Manifesto Comunista
Daniel AarãO 150 Anos Manifesto Comunistacarloslyr
 
Errico Malatesta, Revolta e Ética anarquista - Nildo Avelino
Errico Malatesta, Revolta e Ética anarquista - Nildo AvelinoErrico Malatesta, Revolta e Ética anarquista - Nildo Avelino
Errico Malatesta, Revolta e Ética anarquista - Nildo AvelinoBlackBlocRJ
 
As oito Questões sobre o Anarquismo - Noam Chomsky
As oito Questões sobre o Anarquismo - Noam ChomskyAs oito Questões sobre o Anarquismo - Noam Chomsky
As oito Questões sobre o Anarquismo - Noam ChomskyBlackBlocRJ
 
Estatutos secretos da_alianca-programa_e_objeto_da_organizacao_revolucionaria...
Estatutos secretos da_alianca-programa_e_objeto_da_organizacao_revolucionaria...Estatutos secretos da_alianca-programa_e_objeto_da_organizacao_revolucionaria...
Estatutos secretos da_alianca-programa_e_objeto_da_organizacao_revolucionaria...moratonoise
 
Como combater e derrotar o totalitarismo moderno
Como combater e derrotar o totalitarismo modernoComo combater e derrotar o totalitarismo moderno
Como combater e derrotar o totalitarismo modernoFernando Alcoforado
 
Anarquismo e Socialismo Utópico
Anarquismo e Socialismo UtópicoAnarquismo e Socialismo Utópico
Anarquismo e Socialismo UtópicoCarla Brígida
 

Similar a Pierre kropotkine o princípio anarquista (20)

Nestor makhno a revolução anarquista
Nestor makhno a revolução anarquistaNestor makhno a revolução anarquista
Nestor makhno a revolução anarquista
 
Anarquismo e pedagogia_libertaria
Anarquismo e pedagogia_libertariaAnarquismo e pedagogia_libertaria
Anarquismo e pedagogia_libertaria
 
Pierre joseph proudhon sobre o princípio da associação
Pierre joseph proudhon sobre o princípio da associaçãoPierre joseph proudhon sobre o princípio da associação
Pierre joseph proudhon sobre o princípio da associação
 
Florentino de carvalho dois escritos da imprensa anarquista de são paulo
Florentino de carvalho dois escritos da imprensa anarquista de são pauloFlorentino de carvalho dois escritos da imprensa anarquista de são paulo
Florentino de carvalho dois escritos da imprensa anarquista de são paulo
 
Anarquismo
AnarquismoAnarquismo
Anarquismo
 
Coquetel
CoquetelCoquetel
Coquetel
 
Em torno da vigência do socialismo libertário & definições de um companheiro ...
Em torno da vigência do socialismo libertário & definições de um companheiro ...Em torno da vigência do socialismo libertário & definições de um companheiro ...
Em torno da vigência do socialismo libertário & definições de um companheiro ...
 
Malatesta e.-anarquismo-e-anarquia
Malatesta e.-anarquismo-e-anarquiaMalatesta e.-anarquismo-e-anarquia
Malatesta e.-anarquismo-e-anarquia
 
anarquismo e anarquia - Errico Malatesta
anarquismo e anarquia - Errico Malatestaanarquismo e anarquia - Errico Malatesta
anarquismo e anarquia - Errico Malatesta
 
Malatesta anarquismo e anarquia
Malatesta anarquismo e anarquiaMalatesta anarquismo e anarquia
Malatesta anarquismo e anarquia
 
Slides Ciências Sociais Unidade I.pdf
Slides Ciências Sociais Unidade I.pdfSlides Ciências Sociais Unidade I.pdf
Slides Ciências Sociais Unidade I.pdf
 
Iluminismo
IluminismoIluminismo
Iluminismo
 
Daniel AarãO 150 Anos Manifesto Comunista
Daniel AarãO   150 Anos Manifesto ComunistaDaniel AarãO   150 Anos Manifesto Comunista
Daniel AarãO 150 Anos Manifesto Comunista
 
Atentado subversivo 01
Atentado subversivo 01Atentado subversivo 01
Atentado subversivo 01
 
Errico Malatesta, Revolta e Ética anarquista - Nildo Avelino
Errico Malatesta, Revolta e Ética anarquista - Nildo AvelinoErrico Malatesta, Revolta e Ética anarquista - Nildo Avelino
Errico Malatesta, Revolta e Ética anarquista - Nildo Avelino
 
As oito Questões sobre o Anarquismo - Noam Chomsky
As oito Questões sobre o Anarquismo - Noam ChomskyAs oito Questões sobre o Anarquismo - Noam Chomsky
As oito Questões sobre o Anarquismo - Noam Chomsky
 
Estatutos secretos da_alianca-programa_e_objeto_da_organizacao_revolucionaria...
Estatutos secretos da_alianca-programa_e_objeto_da_organizacao_revolucionaria...Estatutos secretos da_alianca-programa_e_objeto_da_organizacao_revolucionaria...
Estatutos secretos da_alianca-programa_e_objeto_da_organizacao_revolucionaria...
 
Como combater e derrotar o totalitarismo moderno
Como combater e derrotar o totalitarismo modernoComo combater e derrotar o totalitarismo moderno
Como combater e derrotar o totalitarismo moderno
 
Conceito espirita de_sociologia_-_manuel_porteiro
Conceito espirita de_sociologia_-_manuel_porteiroConceito espirita de_sociologia_-_manuel_porteiro
Conceito espirita de_sociologia_-_manuel_porteiro
 
Anarquismo e Socialismo Utópico
Anarquismo e Socialismo UtópicoAnarquismo e Socialismo Utópico
Anarquismo e Socialismo Utópico
 

Más de Home

O lar da nakba ou ver as fotografias de Ahlam Shibli
O lar da nakba ou ver as fotografias de Ahlam ShibliO lar da nakba ou ver as fotografias de Ahlam Shibli
O lar da nakba ou ver as fotografias de Ahlam ShibliHome
 
Texto de courbet pt
Texto de courbet ptTexto de courbet pt
Texto de courbet ptHome
 
Dois apontamentos sobre o presente em movimento charles reeve
Dois apontamentos sobre o presente em movimento charles reeveDois apontamentos sobre o presente em movimento charles reeve
Dois apontamentos sobre o presente em movimento charles reeveHome
 
Reflexoes sobre as feias 1
Reflexoes sobre as feias 1Reflexoes sobre as feias 1
Reflexoes sobre as feias 1Home
 
Resultados desde 1975 nac&porto
Resultados desde 1975 nac&portoResultados desde 1975 nac&porto
Resultados desde 1975 nac&portoHome
 
Propostas feias de Paulo Esperança
Propostas feias de Paulo EsperançaPropostas feias de Paulo Esperança
Propostas feias de Paulo EsperançaHome
 
Indice e preambulo ana da palma
Indice e preambulo  ana da palmaIndice e preambulo  ana da palma
Indice e preambulo ana da palmaHome
 
Convite 23 02 12
Convite 23 02 12Convite 23 02 12
Convite 23 02 12Home
 
Mpp 4
Mpp 4Mpp 4
Mpp 4Home
 
Indignacao porto transportes 31agosto2011
Indignacao porto  transportes 31agosto2011Indignacao porto  transportes 31agosto2011
Indignacao porto transportes 31agosto2011Home
 
A manhã de 10 de maio 2011 polícia no es col a
A manhã de 10 de maio 2011 polícia no es col aA manhã de 10 de maio 2011 polícia no es col a
A manhã de 10 de maio 2011 polícia no es col aHome
 
Houtart 2004
Houtart 2004Houtart 2004
Houtart 2004Home
 
Ramonet 2004
Ramonet 2004Ramonet 2004
Ramonet 2004Home
 
Bernard cassen 2004
Bernard cassen 2004Bernard cassen 2004
Bernard cassen 2004Home
 
Frases
FrasesFrases
FrasesHome
 
Amilcar Cabral sobre a língua portuguesa in pires laranjeira
Amilcar Cabral sobre a língua portuguesa in pires laranjeiraAmilcar Cabral sobre a língua portuguesa in pires laranjeira
Amilcar Cabral sobre a língua portuguesa in pires laranjeiraHome
 
1 partie négritude
1 partie négritude1 partie négritude
1 partie négritudeHome
 
Esquema retórica recurso educacional aberto
Esquema retórica recurso  educacional abertoEsquema retórica recurso  educacional aberto
Esquema retórica recurso educacional abertoHome
 
Manual de estilo
Manual de estiloManual de estilo
Manual de estiloHome
 
Fotos wef outubro 2010
Fotos wef outubro 2010Fotos wef outubro 2010
Fotos wef outubro 2010Home
 

Más de Home (20)

O lar da nakba ou ver as fotografias de Ahlam Shibli
O lar da nakba ou ver as fotografias de Ahlam ShibliO lar da nakba ou ver as fotografias de Ahlam Shibli
O lar da nakba ou ver as fotografias de Ahlam Shibli
 
Texto de courbet pt
Texto de courbet ptTexto de courbet pt
Texto de courbet pt
 
Dois apontamentos sobre o presente em movimento charles reeve
Dois apontamentos sobre o presente em movimento charles reeveDois apontamentos sobre o presente em movimento charles reeve
Dois apontamentos sobre o presente em movimento charles reeve
 
Reflexoes sobre as feias 1
Reflexoes sobre as feias 1Reflexoes sobre as feias 1
Reflexoes sobre as feias 1
 
Resultados desde 1975 nac&porto
Resultados desde 1975 nac&portoResultados desde 1975 nac&porto
Resultados desde 1975 nac&porto
 
Propostas feias de Paulo Esperança
Propostas feias de Paulo EsperançaPropostas feias de Paulo Esperança
Propostas feias de Paulo Esperança
 
Indice e preambulo ana da palma
Indice e preambulo  ana da palmaIndice e preambulo  ana da palma
Indice e preambulo ana da palma
 
Convite 23 02 12
Convite 23 02 12Convite 23 02 12
Convite 23 02 12
 
Mpp 4
Mpp 4Mpp 4
Mpp 4
 
Indignacao porto transportes 31agosto2011
Indignacao porto  transportes 31agosto2011Indignacao porto  transportes 31agosto2011
Indignacao porto transportes 31agosto2011
 
A manhã de 10 de maio 2011 polícia no es col a
A manhã de 10 de maio 2011 polícia no es col aA manhã de 10 de maio 2011 polícia no es col a
A manhã de 10 de maio 2011 polícia no es col a
 
Houtart 2004
Houtart 2004Houtart 2004
Houtart 2004
 
Ramonet 2004
Ramonet 2004Ramonet 2004
Ramonet 2004
 
Bernard cassen 2004
Bernard cassen 2004Bernard cassen 2004
Bernard cassen 2004
 
Frases
FrasesFrases
Frases
 
Amilcar Cabral sobre a língua portuguesa in pires laranjeira
Amilcar Cabral sobre a língua portuguesa in pires laranjeiraAmilcar Cabral sobre a língua portuguesa in pires laranjeira
Amilcar Cabral sobre a língua portuguesa in pires laranjeira
 
1 partie négritude
1 partie négritude1 partie négritude
1 partie négritude
 
Esquema retórica recurso educacional aberto
Esquema retórica recurso  educacional abertoEsquema retórica recurso  educacional aberto
Esquema retórica recurso educacional aberto
 
Manual de estilo
Manual de estiloManual de estilo
Manual de estilo
 
Fotos wef outubro 2010
Fotos wef outubro 2010Fotos wef outubro 2010
Fotos wef outubro 2010
 

Pierre kropotkine o princípio anarquista

  • 1. O princípio anarquista de Kropotkine 1 (1913) Ao início, a Anarquia apresentou-se como uma simples negação. A negação do Estado e da acumulação individual de Capital. A negação de qualquer espécie de autoridade. A negação também das formas estabelecidas pela sociedade, baseadas nas injustiça, no egoísmo absurdo e na opressão, assim como na moral comum, derivada do Código romano, adoptado e santificado pela Igreja cristã. É com base numa luta, envolvida contra a autoridade, nascida no seio da Internacional, que o partido anarquista se constituiu como partido revolucionário distinto. É evidente que espíritos tão profundos tais como Godwin 2 , Proudhon 3 e Bakunine 4 não se podiam limitar a uma simples negação. A afirmação – a concepção de uma sociedade livre, sem autoridade, a caminho da conquista do bem-estar material, intelectual e moral – seguia de bem perto a negação; ela constituía a sua contrapartida. Nos escritos de Bakunine, assim como nos de Proudhon, e de Stirner 5 , encontramos considerações profundas sobre os fundamentos históricos da ideia do anti- autoritarismo, o papel que desempenhou na história, e o papel que irá desempenhar no futuro desenvolvimento da humanidade. «Nenhum Estado» ou «nenhuma autoridade», apesar da sua forma negativa, estas palavras tinham um sentido profundamente afirmativo. Era um princípio filosófico e simultaneamente prático, que significava que todo o conjunto das vidas das sociedades, tudo, - desde as relações quotidianas entre indivíduos até às grandes relações entre as raças através dos Oceanos – podia e devia ser reformado e seria de qualquer forma necessariamente reformado, segundo os grandes princípios da anarquia – a plena e total liberdade do indivíduo, os agrupamentos naturais e temporários, a solidariedade – que passaria ao estado de hábito social. Eis por que razão a ideia anarquista apareceu como sendo grande, iluminadora, capaz de mobilizar e de incendiar os melhores espíritos da época. Não tenhamos receio da palavra, ela era filosófica. Hoje em dia, rimo-nos da filosofia. Contudo, não nos ríamos dela no tempo do Dicionário Filosófico de Voltaire 6 , que, colocando a filosofia ao alcance de todos e convidando toda a gente a adquirir noções gerais sobre todas as coisas, constituía uma obra revolucionária, cujos rastos se encontram nos levantamentos dos camponeses, nas grandes Ana da Palma 1
  • 2. cidades de 1793, e no entusiasmo apaixonado dos voluntários da Revolução. Nessa época, os que nos esfomeavam tinham medo da filosofia. Mas os padres e os homens de negócios, ajudados pelos filósofos universitários alemães, de linguajar incompreensível, conseguiram perfeitamente tornar a filosofia inútil, ou pelo menos ridícula. Os padres e os seus adeptos tanto disseram que a filosofia constituía balelas que os ateus acabaram por acreditar. Os homens de negócios burgueses – os oportunistas brancos, azuis e vermelhos – riram tanto do filósofo que os homens sinceros também se deixaram endrominar. Qual manipulador da Bolsa, qual Thiers 7 , qual Napoleão, qual Gambetta 8 não o repetiram para poderem continuar os seus negócios! Assim, a filosofia encontra-se hoje em dia menosprezada. Independentemente do que dizem os padres, os homens de negócios e aqueles que repetem o que aprenderam, a Anarquia foi compreendida pelos seus fundadores como uma grande ideia filosófica. Com efeito, ela é mais que um simples motivo para esta ou outra acção. É um grande princípio filosófico. É uma vista de conjunto que resulta da compreensão verdadeira dos factos sociais, do passado histórico da humanidade, das verdadeiras causas do progresso antigo e moderno. Umas concepções que não podemos aceitar sem sentir se modificarem todas as nossas apreciações, grandes ou pequenas, dos grandes fenómenos sociais, como das pequenas relações entre nós todos na nossa vida quotidiana. Ela é um princípio de luta de todos os dias. E, se é um princípio poderoso nesta luta, é porque resume as aspirações profundas das massas, um princípio, falseado pela ciência estadista e espezinhado pelos opressores, mas sempre vivo e activo, sempre criando o progresso e contra todos os opressores. Exprime uma ideia que, desde sempre, desde que existem sociedades, procurou modificar as relações mútuas, e um dia irá transformá-las, desde as relações que se estabelecem entre os homens fechados na mesma casa, até aqueles que pensam em juntar-se em grupos internacionais. Finalmente, um princípio que requer a reconstrução total da ciência, física, natural e social. * * * Ana da Palma 2
  • 3. Este lado positivo, reconstrutor da Anarquia, não parou de se desenvolver. E, hoje em dia, a anarquia carregou aos ombros um fardo ainda maior do que aquele que havia ao início. Já não se trata de uma simples luta contra camaradas de oficina que se atribuíram uma autoridade qualquer num grupo de operários. Já não se trata de uma simples luta contra os chefes, outrora escolhidos, nem até uma simples luta contra o patrão, um juiz ou um polícia. É tudo isso, com certeza, porque sem a luta de todos os dias – de que serve chamarmo-nos revolucionários? A ideia e a acção são inseparáveis, se a ideia teve poder sobre o indivíduo, sem a respectiva acção a ideia estiola-se. Mais ainda é muito mais do que isso. É a luta entre dois grandes princípios que, desde sempre, estiveram em confronto na sociedade, o princípio de liberdade e o princípio de coerção: dois princípios que, neste exacto momento, vão novamente empreender uma luta suprema para necessariamente chegar a um novo triunfo do princípio libertário. Olhai em redor. O que restou de todos os partidos que outrora se proclamavam eminentemente revolucionários? – Dois partidos apenas estão presentes: o partido da liberdade e o partido da coerção. Os anarquistas e, contra eles, todos os outros partidos, independentemente da sua cor. É contra todos esses partidos que os anarquistas são os únicos a defender a integralidade do princípio da liberdade. Todos os outros partidos gabam-se de tornar a humanidade feliz mudando ou suavizando a forma do chicote. Se gritam «fim à corda de cânhamo da forca», é para a substituir por um cordão de seda, aplicado nas costas. Sem chicote, sem coerção de qualquer tipo, - sem o chicote do salário e da fome, sem o chicote do juiz ou do polícia, sem o chicote de qualquer forma de castigo, - eles não conseguem conceber a sociedade. Apenas nós ousamos afirmar que o castigo, o polícia, o juiz, a fome e o salário nunca foram e nunca serão um elemento do progresso; e que, sob um regime que reconhece estes instrumento de coerção, se há progresso, só pode ser conquistado contra estes instrumentos e não por eles. Eis a luta que iniciamos. E, que jovem coração honesto não ficará entusiasmado por esta ideia, tomando parte nesta luta e reivindicando-as contra todas as minorias de opressores, a mais bela parte do homem, aquela que fez todos os progressos que nos rodeiam e que apesar disto e por isso mesmo continuam espezinhados! Mas não é só isso. Ana da Palma 3
  • 4. Desde que a cisão entre o partido da liberdade e o partido da coerção se torna mais profunda, este último agarra-se com mais força às formas moribundas do passado. Sabe que tem pela frente um princípio poderoso, capaz de imprimir uma força irresistível à revolução, se algum dia for bem percebido pelas massas. E, trabalha para tomar conta de cada uma das correntes que foram o conjunto da grande corrente revolucionária. Põe a pata sobre o pensamento comunalista 9 que se anuncia em França e na Inglaterra. Procura apoderar-se da revolta operária contra o patronato que se produz no mundo inteiro. E, em vez de encontrar nos socialistas, menos avançados que nós, auxílios, encontramos neles, nestas duas direcções, um hábil adversário, apoiado em toda a força dos preconceitos adquiridos, que permite desviar o socialismo por vias travessas e que acabará por apagar até o sentido socialista do movimento operário, se os trabalhadores não se aperceberem rapidamente e abandonarem os líderes de opinião actuais. O anarquista vê-se portanto forçado a trabalhar sem tréguas e sem perder tempo em todas estas direcções. Deve fazer sobressair a grande parte filosófica do princípio da Anarquia. Deve aplicá-la à ciência, porque com isso, ajudará a reformular as ideias: encetará as mentiras da história, da economia social, da filosofia e ajudará os que já o fazem, por amor pela verdade científica, a impor o carimbo anarquista ao pensamento do século. Deve apoiar a luta e a agitação diária contra os opressores e os preconceitos, manter o espírito de revolta em todo o lado em que o homem está oprimido e tem a coragem de se revoltar. Tem que desconstruir as sábias maquinações de todos os partidos, outrora aliados, mas hoje em dia hostis, que trabalham para desviar por caminhos autoritários os movimentos nascidos da revolta contra a opressão do Capital e do Estado. E, por fim, em todas as direcções há que encontrar, ou adivinhar pela prática vivencial, as novas formas que os grupos, quer por ofícios, quer por territórios ou locais, podem tomar numa sociedade livre, liberta da autoridade dos governos e dos que nos esfomeiam. A grandeza da tarefa a cumprir não será a maior inspiração para o homem com força para lutar? Não será igualmente a melhor maneira para apreciar cada acontecimento separado que se produz na corrente da grande luta que devemos apoiar? Ana da Palma 4
  • 5. NOTAS DE TRADUÇÃO 1 Tradução do livro em francês: Pierre Kropotkine (1913). Le principe anarchiste. Paris: Les temps nouveaux.. Piotr Alexeyevich Kropotkin (Moscovo 21/12/1842 – Dimitrov 8/02/1921). Geógrafo russo, escritor, pensador do anarquismo. Membro da Primeira Internacional. Alguns títulos: A Conquista do Pão; Memórias de um Revolucionário; Campos, Fábricas e Oficinas; Mutualismo: Um Factor de Evolução. 2 William Godwin (Cambridgeshire, 3/03/1756 — 7/04/1836). Jornalista inglês, filósofo político e escritor. Casado com Mary Wollstonecraft, autora de Uma Defesa dos Direitos da Mulher (1790). Escritor de livros infantis com o pseudónimo Edward Baldwin. Alguns livros: Inquérito acerca da justiça política; As coisas como elas são ou As Aventuras de Caleb Williams; The Enquirer; Memoirs of the Author of A Vindication of the Rights of Woman; Letters of Advice to a Young American; History of the Commonwealth; Thoughts on Man, his Nature, Productions, and Discoveries; Interspersed with some particulars respecting the author ; Lives of the Necromancers . 3 Pierre-Joseph Proudhon (Besançon, 15/01/1809— Passy, 19/01/1865). Tipógrafo, filósofo político e económico francês. Membro do Parlamento Francês. Um dos mais influentes teóricos e escritores do anarquismo. Alguns livros: Qu'est-ce que la propriété? Recherche sur le principe du droit et du gouvernement ; Sistema das Contradições Econômicas, ou A Filosofia da Miséria; Idée générale de la révolution au XIXe siècle; Le manuel du spéculateur à la bourse ; De la justice dans la révolution et dans l'Eglise; La Guerre et la Paix; Do Princípio Federativo; De la capacité politique des classes ouvrières; Théorie de la propriété; Théorie du mouvement constitutionnel. 4 Mikhaïl Aleksandrovitch Bakunine ( 30/05/1814 - Berna 1/07/1876). Revolucionário teórico do anarquismo com uma ampla reflexão sobre o papel do Estado. 5 Marx Stirner, pseudónimo de Johann Kaspar Schmidt, (Bayreuth. 25/10/1806 — Berlim, 26/06/1856). Escritor e filósofo alemão. Um livro: O único e sua propriedade em 1844. 6 O dicionário filosófico data de 1764 da autoria de François Marie Arouet, conhecido por Voltaire (Paris, 21/11/ 1694 — Paris, 30/05/1778). Escritor, ensaísta e filósofo iluminista francês. 7 Louis Adolphe Thiers (16/04/ 1797 — 37091877) estadista e historiador francês. Primeiro ministro sob o reinado de Luís Felipe e presidente da república francesa durante a 3ª república. 8 Léon Gambetta ( 2704/ 1838 - 31/12/1882). Político francês. Primeiro-ministro da França, entre 14 de Novembro de 1881 a 30 de Janeiro de 1882. 9 «comunalista» relativo ao pensamento da Comuna. Ana da Palma 5