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Edição em 92 tópicos da versão preliminar integral do livro de Augusto de
Franco (2011), FLUZZ: Vida humana e convivência social nos novos mundos
altamente conectados do terceiro milênio




                               19
                  (Corresponde à introdução do Capítulo 2,
                     intitulado Inumeráveis interworlds)




E naquele instante ele viu o planeta inteiro: cada vila, cada cidade,
cada metrópole, os lugares desertos e os lugares plantados.
Todas as formas que se chocavam em sua visão traziam
relacionamentos específicos de elementos interiores e exteriores.
Ele via as estruturas da sociedade imperial refletidas
nas estruturas físicas de seus planetas e de suas comunidades.
Como um gigantesco desdobramento dentro dele,
ele via nessa revelação o que ela devia ser:
uma janela para as partes invisíveis da sociedade.
Percebendo isso, notou que todo sistema devia possuir tal janela.
Mesmo o sistema representado por ele mesmo e o universo.
Começou a perscrutar as janelas, como um voyeur cósmico.
Frank Herbert em Os filhos de Duna (1976)
Muitos mundos, isso mesmo. Não existe um mundo que se possa
      dizer o mundo, a não ser por efeito de hierarquização.

      Pensar e falar do mundo é tentar impingir um só mundo. Pois os
      mundos são muitos. Um só mundo é uma invenção do broadcasting.
      Broadcasting – um para muitos – é, obviamente, centralização, quer
      dizer, hierarquia. Tirem as TVs e as rádios, os jornais e revistas, as
      agências de notícias, talvez o cinema e não sobrará mais um só
      mundo. Sem o broadcasting já teremos múltiplos mundos: cada qual
      configurado pelas nossas conexões. Com a internet esses mundos se
      multiplicam velozmente, mas não por difusão e sim por interconexão.
      Desse ponto de vista, interconnected networks (internet) é, na
      verdade, interconnected worlds. E fluzz é o vento que varre esses
      inumeráveis interworlds.

      No mundo hierárquico, não há interface para fluzz. Mas quando fluzz
      for do regime dos múltiplos mundos interconectados, esses mundos
      serão os novos Highly Connected Worlds do terceiro milênio.




Pense em um mundo sem TV e rádio, sem jornais e revistas, sem agências
de notícias, sem editoras e distribuidoras de livros de domínio privado e
sem cinema. Não, não estamos propondo uma volta à Idade Média.
Teremos telefone, Internet, redes P2P, redes Mesh e qualquer mídia
(sobretudo interativa) não baseada no padrão um-para-muitos (incluído
spaming). Neste caso não haverá mais um (mesmo) mundo para todos.
Sem o broadcasting esvai-se a ilusão de um mesmo mundo para todos em
termos sociais. Ficará claro que cada um tem o seu (próprio) mundo (em
termos sociais). Mas ninguém estará aprisionado no seu mundo, pois
poderá se conectar com outros mundos (os mundos das outras pessoas).
Teremos uma rede de mundos: muitos mundos interconectados. Quanto
maior a interatividade de uma rede de mundos, mais-fluzz ele – o mundo
social configurado por essa rede – será.




                                     2
Mas... atenção! Quanto mais-fluzz for um mundo, menor (não em termos
geográficos ou populacionais e sim em termos sociais) ele será. Mundos
grandes, nesse sentido, quer dizer, com altos graus de separação, são
mundos menos-fluzz. A interatividade reduz o tamanho do mundo e isso
não é uma função do número de seus elementos (pessoas e aglomerados
de pessoas) e sim dos seus graus de distribuição e conectividade.

Onde fluzz está mais “ativo”, os mundos se           contraem. Há um
amassamento. Small-world networks são efeitos        de crunching (um
neologismo cunhado a partir da palavra crunch).

Não havendo um mundo isolado dos demais, o tamanho do mundo de cada
um será função do “vento” (fluzz) que varre seus interworlds. Os
interworlds serão inumeráveis; portanto, a rigor, o mundo de cada um é,
potencialmente, uma série de inumeráveis mundos em interação. Sim, tudo
depende da interatividade. O que significa dizer que não depende da
capacidade ou do esforço de cada um de se fazer ver por muitos. Assim,
nos novos Highly Connected Worlds, gente famosa (poderosa, rica, super
certificada ou titulada, admirada por qualquer outra qualidade intrínseca
massivamente reconhecida ou atribuída externamente à interação), tende a
não ser mais tão relevante. Com isso vai também por água abaixo essa
desastrosa idéia de sucesso, que predominou nos séculos passados,
baseada na capacidade de alguém de se destacar dos demais.

Impelido por fluzz, ninguém se deixará desvalorizar facilmente no circo
global montado para selecionar (e apresentar apenas) algumas atrações e
para polarizar sobre elas a atenção dos demais. Cada qual pode ser a
atração no seu próprio mundo e nos mundos conectados a esse mundo.
Uma aldeia global montada para subordinar os vários mundos a apenas
alguns, dando a impressão de que só estes últimos existem, está com os
dias contados. Teremos inumeráveis aldeias globais.




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  • 1. Em pílulas Edição em 92 tópicos da versão preliminar integral do livro de Augusto de Franco (2011), FLUZZ: Vida humana e convivência social nos novos mundos altamente conectados do terceiro milênio 19 (Corresponde à introdução do Capítulo 2, intitulado Inumeráveis interworlds) E naquele instante ele viu o planeta inteiro: cada vila, cada cidade, cada metrópole, os lugares desertos e os lugares plantados. Todas as formas que se chocavam em sua visão traziam relacionamentos específicos de elementos interiores e exteriores. Ele via as estruturas da sociedade imperial refletidas nas estruturas físicas de seus planetas e de suas comunidades. Como um gigantesco desdobramento dentro dele, ele via nessa revelação o que ela devia ser: uma janela para as partes invisíveis da sociedade. Percebendo isso, notou que todo sistema devia possuir tal janela. Mesmo o sistema representado por ele mesmo e o universo. Começou a perscrutar as janelas, como um voyeur cósmico. Frank Herbert em Os filhos de Duna (1976)
  • 2. Muitos mundos, isso mesmo. Não existe um mundo que se possa dizer o mundo, a não ser por efeito de hierarquização. Pensar e falar do mundo é tentar impingir um só mundo. Pois os mundos são muitos. Um só mundo é uma invenção do broadcasting. Broadcasting – um para muitos – é, obviamente, centralização, quer dizer, hierarquia. Tirem as TVs e as rádios, os jornais e revistas, as agências de notícias, talvez o cinema e não sobrará mais um só mundo. Sem o broadcasting já teremos múltiplos mundos: cada qual configurado pelas nossas conexões. Com a internet esses mundos se multiplicam velozmente, mas não por difusão e sim por interconexão. Desse ponto de vista, interconnected networks (internet) é, na verdade, interconnected worlds. E fluzz é o vento que varre esses inumeráveis interworlds. No mundo hierárquico, não há interface para fluzz. Mas quando fluzz for do regime dos múltiplos mundos interconectados, esses mundos serão os novos Highly Connected Worlds do terceiro milênio. Pense em um mundo sem TV e rádio, sem jornais e revistas, sem agências de notícias, sem editoras e distribuidoras de livros de domínio privado e sem cinema. Não, não estamos propondo uma volta à Idade Média. Teremos telefone, Internet, redes P2P, redes Mesh e qualquer mídia (sobretudo interativa) não baseada no padrão um-para-muitos (incluído spaming). Neste caso não haverá mais um (mesmo) mundo para todos. Sem o broadcasting esvai-se a ilusão de um mesmo mundo para todos em termos sociais. Ficará claro que cada um tem o seu (próprio) mundo (em termos sociais). Mas ninguém estará aprisionado no seu mundo, pois poderá se conectar com outros mundos (os mundos das outras pessoas). Teremos uma rede de mundos: muitos mundos interconectados. Quanto maior a interatividade de uma rede de mundos, mais-fluzz ele – o mundo social configurado por essa rede – será. 2
  • 3. Mas... atenção! Quanto mais-fluzz for um mundo, menor (não em termos geográficos ou populacionais e sim em termos sociais) ele será. Mundos grandes, nesse sentido, quer dizer, com altos graus de separação, são mundos menos-fluzz. A interatividade reduz o tamanho do mundo e isso não é uma função do número de seus elementos (pessoas e aglomerados de pessoas) e sim dos seus graus de distribuição e conectividade. Onde fluzz está mais “ativo”, os mundos se contraem. Há um amassamento. Small-world networks são efeitos de crunching (um neologismo cunhado a partir da palavra crunch). Não havendo um mundo isolado dos demais, o tamanho do mundo de cada um será função do “vento” (fluzz) que varre seus interworlds. Os interworlds serão inumeráveis; portanto, a rigor, o mundo de cada um é, potencialmente, uma série de inumeráveis mundos em interação. Sim, tudo depende da interatividade. O que significa dizer que não depende da capacidade ou do esforço de cada um de se fazer ver por muitos. Assim, nos novos Highly Connected Worlds, gente famosa (poderosa, rica, super certificada ou titulada, admirada por qualquer outra qualidade intrínseca massivamente reconhecida ou atribuída externamente à interação), tende a não ser mais tão relevante. Com isso vai também por água abaixo essa desastrosa idéia de sucesso, que predominou nos séculos passados, baseada na capacidade de alguém de se destacar dos demais. Impelido por fluzz, ninguém se deixará desvalorizar facilmente no circo global montado para selecionar (e apresentar apenas) algumas atrações e para polarizar sobre elas a atenção dos demais. Cada qual pode ser a atração no seu próprio mundo e nos mundos conectados a esse mundo. Uma aldeia global montada para subordinar os vários mundos a apenas alguns, dando a impressão de que só estes últimos existem, está com os dias contados. Teremos inumeráveis aldeias globais. 3