Merleau-Ponty argumenta que o tempo não é uma sucessão de momentos presentes, mas uma dimensão do ser. O passado e o futuro não estão nas coisas em si, mas são dados sentido pelo sujeito por meio da intencionalidade. A temporalidade emerge da interseção entre o sujeito e o mundo no presente vivido.
3. De onde parte Merleau-Ponty:
O “Cogito” e a intencionalidade na fenomenologia
O “cogito” cartesiano: “Penso, logo existo.”
- consciência de si mesmo: isolada do mundo, presa à
subjetividade
- ideias: impressões internas correspondentes a sensações
advindas de coisas exteriores
- representação: acesso indireto aos objetos
- problema: correspondência representação-representado
5. Intencionalidade husserliana:
- consciência é “consciência de” alguma coisa
- intenção: pensamento em ação, direcionado a algo
- intencionalidade: conceito que define o ato de revelação
que ocorre entre o sujeito/observador e os objetos para si
e para outros => “explodir em direção a”
- consequência: a fenomenologia retoma a possibilidade do
ser humano de buscar a verdade, dando uma nova
alternativa que visa solucionar o problema da
correspondência representação-representado; diluição da
separação entre o mundo exterior (transcendência) que
está “fora” do sujeito e a própria interioridade do sujeito
(imanência) => ambas as esferas se encontram no fenômeno
7. Fenomenologia:
- fenômeno: Husserl funda o duplo
sentido de transcendência e
imanência quando faz do objeto da
fenomenologia, o que ele chama de
“fenômeno puro” (a percepção da
percepção, ou seja, o ato de
pensar o que está sendo
percebido). A reflexão
transcendental não reflete sobre o
pensamento, mas sobre o “pensar”; - método: compreender as coisas em si
não reflete sobre o percebido, mas mesmas
sobre o “perceber”
- desconstrução do pensamento
cartesiano: não é um sujeito que
determina as causas e efeitos de fatos
externos observados
- presença: a maneira de um objeto
“aparecer” faz parte do modo de “ser”
deste objeto => na fenomenologia, não
existe nada que se “presente” que não
seja “real” / acesso direto aos objetos
8. Merleau-Ponty:
“A primeira verdade é
‘Eu penso’, mas sob a
condição de que por isso
se entenda ‘eu sou para
mim’ estando no mundo
[... ...] O interior e o
exterior são
inseparáveis. O mundo
está inteiro dentro de
mim e eu estou inteiro
fora de mim.”
(Fenomenologia da Percepção,
2006, p. 546)
9. A percepção do tempo
Na percepção do senso comum: o tempo “passa”...
O rio de Merleau-Ponty
10. Sujeito
parado
na
margem
do rio
NASCENTE: Futuro
(águas que estão por vir)
Observador – Posição 1:
FOZ: Passado
(águas que já passaram)
NASCENTE: Passado
(águas que já passaram)
)
Observador – Posição 2:
Sujeito
navegando no
rio
FOZ: Futuro
(águas que estão por vir)
11. Nos desenhos apresentados,
o que de fato é passado e o que é futuro?
Nascente ou Foz?
No mundo, tudo está sempre presente.
- totalidade: o tempo em si não é uma sucessão de
“agoras”; o tempo absoluto é eterno
- posicionamento do observador: recorte espaçotemporal => abertura dos horizontes de passado e futuro
- ser temporal: percepção da ausência que temos dos
“presentes” que não estão presentes
- o tempo se apresenta para nós “em ação” e não como
um ser
12. Merleau-Ponty:
““Esta mesa traz traços
de minha vida passada,
inscrevi nela as minhas
iniciais, nela fiz manchas
de tinta. Mas por si
mesmos estes traços não
remetem ao passado: eles
são presentes; e, se
encontro ali signos de
algum acontecimento
‘anterior’, é porque tenho,
por outras vias, o sentido
do passado, é porque
trago em mim essa
significação.” (Fenomenologia
da Percepção, 2006, p. 553)
13. O passado e o futuro não estão
“nas” coisas; somos nós que
damos o significado, o sentido
de passado ou futuro, pelo modo
como percebemos as coisas,
pela intencionalidade específica
com que nos dirigimos a elas.
14. O tempo como dimensão do nosso
ser
Suponhamos os seguintes eventos...
Evento A: minha
conclusão de
curso do I grau
Evento C: Brasil
penta-campeão
na Copa de 2002
Evento B: queda
do muro de Berlim
15. recorte espaço-temporal: “ruptura” racional para
ordenar fatos em sucessão, de acordo com a percepção
de um sujeito, sua intencionalidade num instante:
Evento A
Evento C
Evento B
passado
futuro
Linha cronológica
Instante 1
- no
- no
- no
- no
instante
instante
instante
instante
Instante 2
Instante 3
Instante 4
1, para mim, todos os eventos estão no futuro;
2, para mim, o evento A está no passado e os demais, no futuro
3, para mim, os eventos A e B estão no passado e C, no futuro
4, para mim, todos os eventos estão no passado.
16. Que relação tem entre si (somente por si mesmos), a minha
conclusão de curso do I grau, a queda do muro de Berlim e o
Brasil penta-campeão?
No mundo, sem ter a mim como elemento que os “costura”,
todos os eventos estão sempre presentes. Sou eu que lhes dou
o sentido de passado ou futuro, da maneira como os ordeno na
minha história.
O fato de um evento passar de futuro para presente e de
presente para passado não está no evento;
não faz parte de determinado evento pertencer a um
ponto fixo numa linha cronológica temporal.
17. Merleau-Ponty faz uma analogia, descrevendo como uma
paisagem “passa” pela visão de um observador dentro de um
vagão de um trem:
18. O observador sabe que não é a paisagem que está se movendo; a
paisagem é fixa, imóvel (sempre presente no mundo). Porém, o
observador tem a “sensação” (a rigor, a “percepção”) de que uma
paisagem está ficando para trás (passado), tão logo surge uma nova
paisagem à frente (futuro).
19. É o sujeito, o observador que introduz a perspectiva, a
direção, a intenção, o sentido de passado, presente e
futuro, segundo a sua percepção.
No tempo em si, não existe nada que já não contenha em
si, todo o seu passado, presente e futuro.
Faz parte do ser do tempo, o escoar.
Nós nos situamos no tempo; quando
inserimos a nossa intencionalidade,
inserimos o presente no mundo. É a
partir do presente que explodimos
vetores em direção a um passado ou a
um porvir.
20. Futuro de S
Temporalidade
S
Passado de S
Passado de S
S
Futuro de S
S
S
Sujeito
Presente de S
Intencionalidade de S
É no presente que se faz a intersecção entre ser e consciência.
21. A consciência temporal enquanto ser
- a semente e a árvore: ato e potência se revelam
com o “passar do tempo”
- a consciência não consiste na semente “ou” na
árvore, mas na semente “e” na árvore; a consciência
consiste na temporalidade deste ser que é o
movimento de deixar-de-ser-para-vir-a-ser.
- distensão: a semente não é a causa da árvore; ela,
de certo modo, já é a árvore.
22. O presente, a
presença
Podemos questionar:
Se algo somente existe
quando um sujeito lhe dá
um sentido, então, antes
de existir o homem, não
existia o mundo?
23. As eras pré-históricas (pré-humanidade)
existem no nosso passado porque nós lhes
damos este sentido e construímos significações
para tal.
E só conseguimos lhes dar esse sentido no
“presente”.
É no presente que se dá a síntese sujeitomundo.
26. A TEMPORALIDADE EM MERLEAU-PONTY
Por Clio Francesca Tricarico
Apresentação elaborada com base no
Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Filosofia
Orientador: Prof. Dr. Hélio Salles Gentil
Universidade São Judas Tadeu
São Paulo - 2008