Este documento resume as informações sobre Leishmaniose, incluindo: (1) a classificação taxonômica do parasita Leishmania sp., (2) seu ciclo de vida entre o vetor flebotomíneo e o hospedeiro mamífero, e (3) os principais tipos de leishmaniose no homem e seus respectivos métodos de diagnóstico e tratamento.
3. Leishmaniose: Aspectos históricos e sociais
• Doença benigna ou mortal, na forma cutânea deixa cicatrizes grandes
(“botão do oriente”), doença conhecida na America do Sul antes da
chegada dos espanhóis
• Agente etiológico descrito primeiramente por Borovsky em 1898 em um
paciente no Usbequistão
• Leishman e Donovan (1903) descreveram o parasita independentemente em um caso de calazar da Índia
• Ross (quem descreveu o cíclo de vida do plasmódio) batizou o parasita
em 1903 Leishmania donovani, e Wright denominou um parasita vindo de
uma criança da Armênia (forma cutânea) Leishmania tropica
4. • Em 1909, Lindenberg, Paranhos & Carini demonstraram a presença dos
parasitos em lesões de pacientes brasileiros, Gaspar Vianna denominouos Leishmania braziliensis e detectou em 1912 a ação curativa do tártaro
emético
• Em 1987, Lainson e Shaw sugerem um novo subgênero de Leishmania:
o subgênero Viannia, que inclui espécies das Americas
8. Formas promastigotas metacíclicas regurgitadas por mosquitos
são depositadas na dermis, onde são fagocitados por macrófagos
• Vetores (Diptera, Phlebotomidae: Lutzomiya, Phlebotomus), no
território brasileiro: Lutzomiya longipalpis, L. wellcomei e outros
9. Promastigotas dentro do fagolisossomo se transformam em
amastigotas, que se multiplicam no macrófago. A célula
hospedeira é rompida liberando amastigotas que são fagocitados
por outros macrófagos
MΦ
10. Macrófagos infectados com Leishmanias do subgênero
Viannia (espécies das Américas) contém menos
parasitas
em vários vacúolos parasitóforos (ajuda no diagnóstico
por microscopia)
MΦ
Subgênero Leishmania
MΦ
Subgênero Viannia
12. Após ingestão, amastigotas se transformam em promastigotas
e se multiplicam dentro de uma membrana formada pelo vetor
Trato digestivo
Membrana peritrófica
13. Promastigotas se desenvolvem para paramastigotas
que aderem em pontos diferentes no trato digestivo
(critério da localização: subgenênero de Leishmania),
a proliferação é estimulada se a fêmea ingere sucos
vegetais
14. Após 3-5 dias, promastigotas metacíclicos migram ativamente
para partes anteriores do tubo digestivo
Assim, o parasita parece interferir ativamente com a
capacidade de ingestão do hospedeiro mosquito! A
saliva do flebotomíneo é muito importante para a
infecciosidade da Leishmania
Somente promastigotas metacíclicos são infecciosos
para os hospedeiro vertebrado!
15. Patogenia e interação parasita-hospedeiro
Após deposição de promastigotas na pele complemento
liga à superfície do parasita mas a clivagem de C3b em iC3b
não permite ligação do complexo lítico
C3b
iC3b
16. Proteína gp63 cliva o fator do complemento C3b para iC3b.
Complemento ajuda na aderência das promastigotas
nos macrófagos (receptor principal CR3). Interação de LPGs
e gp63 com fibronectina também ocorre. Esta via de internalização
não leva a produção radicais de oxigênio ou NO (“silent entry”)
Receptor de complemento
R3 c1)
C a
(M
iC3b
CR1
MΦ
17. Porque uma célula profissional do sistema fagocitário não
consegue eliminar um parasita dentro do fagossomo?
1. A sinalização para ativação do macrófago está impedido
por ação de LPG: Tradução de sinais, mobilização de cálcio,
ativação de Proteina kinase C.
MΦ
18. 2. Indução de resposta disfuncional: inibição da produção de
radicais de OH e NO
Falha na apresentação em MHC2 após estimulação com IFN
γ
Fosfoglicanos bloqueiam produção de IL-12
IFN γ
?
MΦ
19. 3. Proteina tirosina quinases também são bloqueados
Secreção de EF1α da Leishmania
para o citossol
Ativação de SHP-1
(uma Phosphotirosina
fosfatase)
Inativação da
Fosfotirosinaquinase:
reação atenuada a IFN γ
MΦ
20. A espécie infectante é importante para o fenótipo da
patologia desenvolvida em indivíduos imunocompetentes
(Leishmanias que ocorrem no Brasil)
A expressão diferencial ou presença/ausência de genes
provavelmente causa as diferenças nas patologias observadas
21. Os diferentes tipos de Leishmaniose na clínica
• Visceral ou Calazar ( L. donovani, L. infantum , no Brasil
causada por L. chagasi ):
- Enfermidade crônica
- Caracterizada por:
• febre irregular e de longa duração
• hepatoesplenomegalia
• linfoadenopatia
• Anemia com leucopenia
• Hipergamaglobulinemia
• Emagrecimento
• Edema
• Caquexia e morte se não for tratado, dentro de 2 anos
22. - Formas clínicas calazar: assintomática,
oligossintomática, aguda e crônica
23. •Tegumentaria:
a) Cutânea:
- Infecção confinada na derme, com epidermis ulcerada
- Velho mundo, L. tropica, L. major e L. aethiopica
- Novo mundo, leishmanias do complexo mexicana e
braziliensis
- no Brasil:
L. braziliensis, L. guyanensis
L. chagasi, L. lainsoni
25. b) Muco-cutânea:
- Infecção na derme (ulceras), invasão de mucosa e
destruição da cartilagem
- No novo mundo: L. braziliensis, L. guyanensis, L.
mexicana (“espundia”), no Sudão/Etiópia L. major, L. tropica
26.
27.
28. c) Cutânea difusa:
- Infecção confinada na derme, formando nódulos não
ulcerados. Disseminação por todo o corpo
- Associado a deficiência imunológica do paciente
- Novo mundo, L. pifanoi, L. amazonensis
- Velho mundo, L. aethiopica
29. Responsável pela patologia é o estado imunológico do hospedeiro
predominância de resposta celular (Th1) leva a imunidade e cura,
resposta humoral (Th2) leva às formas crônicas
IFNγ, TNFα, IL-2
Th1
I
MHC
MΦ
II
Células T helper
Th2
IL 4-6, IL-10, TGFβ
indução da atividade
policlonal de células B
30. No modelo L. major e camundongo
Br Med Bull. 2006 Jul 17;75-76:115-30
31. Quais são os motivos
patologia da infecção?
para
tanta
diversidade
da
- Na forma cutânea, há uma inflamação ativa. Células
dentríticas apresentam antígenos em MHC2 e expressam
ICAM-1. Ativação de Th1 por IFNγ e TNFβ resulta no
recrutamento de células T CD8+ para a região infectada. Cura.
- Na forma mucocutânea, pouco envolvimento ou destruição
de células Langerhans, mas há apresentação em MHC2 e
células com ICAM1, mas TH1 e Th2 estão ativados. IL10
promove o decréscimo da apresentação de antígenos e de
produção de IFNγ. Pode ter hiperprodução de IL1, TNFα e
ICAM1, resultado é um estado pró-inflamatório e destruição
sucessiva de tecido.
32. - Na forma visceral , não há resposta Th1 e nem aumento
de atividade Th2. Fatores parecem ser do próprio
macrófago infectado. Possivelmente, lipofosfoglicanos da
Leishmania estão envolvidos.
34. Diagnóstico
Leishmaniose Tegumentaria
• Clínico
Caraterísticas da lesão e dados epidemiológicos
• Laboratorial
- Exame direto de esfregaços corados (Romanowsky, Giemsa ou
Leishman)
- Exame histológico
- Cultura
- Inóculo em animais
- PCR (reação em cadeia da polimerase, permite a identificação da
espécie infectante)
• Importante para exclusão de tuberculose cutânea,
hanseníase,
infecções por fungos, úlcera tropical, neoplasmas
35. Diagnóstico
Leishmaniose Tegumentaria
• Imunológicos
- Teste de Montenegro (teste da resposta contra formas
promastigostas mortas do parasita, resposta celular)
- Reação de imunofluorescência indireta (RIFI) (resposta
humoral)
- Hemaglutinação indireta
36. Diagnóstico
Leishmaniose visceral ( Calazar)
• Clínico:
sintomas baixa recorrente, envolvimento linfohepático,
- Febre
esplenomegalia, caquexia e dados epidemiológicos
• Laboratorial:
1. Exames Parasitológicos
a) Demonstração direta do parasita
Esfregaços corados com Giemsa ou Leishman de:
- Material obtido por punção de medula óssea, fígado ou baço
- Biopsia (menos eficiente ~ 50%)
37. - Fase aguda 80-90% de positividade
- Fase sub-clínica 10%
- Co-infectados com HIV recomendado exame de medula
óssea
- Aspirado esplênico 100 %, sangue periférica 30%
b) Isolamento em cultivo in vitro
Aspirado ou biopsia
LIT, MEM, Schneider’s e Evans (Meio monofásico) a 26ºC
Exame microscópico
( 2x semana/4 semanas)
38. c ) Isolamento em cultivo in vivo
• Inoculação em animais
- Hamsters ou camundongos isogênicos (BALB/c)
- Cepas dermatotrópicas: pata ou tocinho dos animais
(positivo após 2 a 4 semanas)
- Cepas vicerotrópicas via intraperitoneal (positivo após 6 meses)
- Recomendado para o isolamento do parasita nas formas subclínicas
• Xenodiagnóstico
- Flebótomos
- Usado em pacientes com AIDS portadores de Leishmaniose
visceral
39. 2. Testes Imunológicos
a) Teste de Montenegro
b) Testes serológicos
•Antígenos (parasitas inteiros, inativados)
- Reação de aglutinação direta
Cave: Reatividade cruzada com Chagas e tuberculose
Visualiza títulos até de 1:51.200
Leishmaniose visceral título > 1:1.600 (sensibilidade
100%) no Brasil o título > 1:6.400
c) Detecção do antigeno rK39 na urina
40. 3. Análise do DNA de material recolhido
a) Por reação em cadeia da polimerase (PCR)
Usa oligonucleotídeos espécie-específicos do DNA dos
minicírculos do DNA do cinetoplasto
100% sensível e mais específico que sorologia
b) Possibilita discriminação de espécies
41. Tratamento Leishmaniose Tegumentaria
1. Quimioterapia
• Antimoniais
Tártaro emético
antimonial trivalente
Glucantime (antimoniato de N-metil-glucamina)
antimonial pentavalente
Pentostan (estibogluconato de sodio)
- antimonial pentavalente
- inibe glicolise e síntese
- administração intramuscular ou
intravenosa absorção rápida
42. - Excreção rápida e pela urina, vida media 24 horas
- Droga recomendada para os três tipos de leishmaniose
Glucose
Glucose 6-phosphate
Fructose 6-phosphate
Pentose
Phosphate Pathway
Fructose 1,6-bisphosphate
Dihydroxyacetone
Glyceraldehyde 3-phosphate
Phosphate
1,3-Diphosphoglycerate
3-Phosphoglycerate
2- Phosphoglycerate
Phophoenolpyruvate
*
PK
Pyruvate
Acetyl- CoA
Krebs
Cycle
Antimoniais
43. • Pentamidina
- liga ao DNA, inibindo a replicação
- Inibe a dihidrofolate reductase, interfere
com o metabolismo de poliaminas
- Administração intramuscular
- Excretado lentamente, é seqüestrado nos
tecidos (tem uso profilático contra tripanossomiase)
- Produz hipo- ou hiperglicemia
44. •Anfotericina B
- lipofílico
- Liga a esterois (ergosterol) da membrana
formando poros. Funciona como um ionóforo
- 2-5% excretado na urina
- 90% ligado a proteínas do plasma
- Meia vida 18 horas
45. Continuação tratamento Leishmaniose Tegumentaria
2. Imunoterapia
Leishvacin® seriado
Leishvacin® associado ao BCG
Leishvacin® seriado associado ao BCG
Leishvacin® associado ao BCG com Glucantime ®
Interferon gamma humano recombinante (Rhifn-γ)
anti-IL10-receptor
48. Medidas de prevenção
• Identificação de focos de Leishmania (animais
infectados em proximidade a domicílios:
silvestres e domésticos: erradicação
• Imunização em massa de cachorros (Leishvaccin)
• Vacinas para seres humanos?
• Componentes da saliva de Phlebotomíneos como vacina?
49. Ecologia dos Phlebotomíneos:
Desenvolvimento e comportamento
• 40-70 ovos por desova, agrupados em lugares
humidos, eclodem depois 6-17 dias
• Larvas se nutrem de matéria orgânica por
mais 15-70 dias, depois pupa (7-14 dias)
• Adultos são ativos no crepúsculo ou a noite,
durante o dia permanecem em lugares
tranquilos: tocas, arvores ocas, currais,
moradias
• Não sobrevivem bem em ambientes que não
tenham pelo menos um mes T acima de 20°C
52. Medidas de prevenção
• Uso de repelentes, telas de proteção
• Borrifação frequente de ambientes
• Tratamento de sintomáticos e
assintomáticos em regiões com alta
incidência de flebotomíneos
• Tratamento/exterminação de animais
domesticos infectados
55. Literatura:
L. Rey: Parasitologia
Markell´s & Voge´s Medical Parasitology
Links interessantes:
http://www.hhmi.ucla.edu/parasite_course/Default.htm
http://www.genedb.org/genedb/leish/index.jsp
http://www.leishmaniasis.info/
Uma revisão muito interessante:
Br Med Bull. 2006 Jul 17;75-76:115-30
56. 1. Cita uma espécie de cada Leishmania causadora para
leishmaniose cutânea, mucocutânea e visceral, que ocorre no
Brasil.
2. Associe as formas amastigota, paramastigota e promastigota
metacíclico de Leishmania aos seus habitats (célula/tecido) de
ocorrência.
3. No humano, em qual tipo de célula ocorre a proliferação de
Leishmania?
4. Explique as diferenças morfológicas entre o processos da
infecção do humano por Anopheles/Plasmodium e
Flebotomíneo/Leishmania
5. O que é necessário para se infectar acidentalmente no
tratamento odontológico de um portador de Leishmania
braziliensis com lesão nos lábios?