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SOCIOLOGIA DA CIÊNCIA




 CIÊNCIA PATO
   Segue firme e forte!
   Desafiar aquilo que está estabelecido é ato costumeiro

   – e essencial – da ciência. Na prática, porém,

   há o desafio de separar especulações banais de ideias

   que – apesar de posteriormente se mostrarem corretas

   – são inicialmente difíceis de justificar de modo claro.

   Na década de 1950, em palestra memorável, um prêmio

   Nobel cunhou o termo ciência patológica para denominar

   certos tipos de afirmações incoerentes. Além de citar

   exemplos, aquele renomado cientista estabeleceu ‘regras’

   que mostram como teorias, resultados ou novos
   ‘fenômenos’ disparatados acabam ganhando adeptos

   e popularidade na comunidade científica,

   antes de serem provados falsos. Aqui, apresentaremos

   exemplos antigos e recentes de ciência patológica

   na física, bem como reflexões sobre esse aspecto

   sociológico da prática científica.

   Nick Stone
   Universidade de Oxford (Reino Unido)
   e Laboratório Nacional Oak Ridge (Estados Unidos)




2 6 • CiênCia Hoje • vol . 46 • nº 272
SOCIOLOGIA DA CIÊNCIA




LÓGICA...




                      A
                                        ciência é baseada na experimen­    o problema de como lidar com ideias dissidentes
                                        tação, com a teoria desempe­       e com o desafio de separar especulações e afir­
                                        nhando papel na produção de        mações incoerentes – que aqui denomino ‘dra­
                                        um quadro composto, consisten­     gões’, criatura mítica, atrativa, mas perigosa – de
                                        te com o máximo de resultados      outras que, apesar de posteriormente se mostra­
                                        possível. Novas ideias, experi­    rem corretas, sejam inicialmente difíceis de jus­
                                        mentos e resultados são julgados   tificar de modo claro.
                      com base no cenário aceito em dado momento.              Na década de 1950, o norte­americano Irving
                          É essencial, caso se queira que o entendimen­    Langmuir (1881­1957), prêmio Nobel de Quími­
                      to de um assunto seja ampliado, que o cenário        ca de 1932, fez palestra memorável em que
                      aceito seja desafiado de modo inovador e tantas      cunhou o termo ciência patológica para “a ciên­
                      vezes quanto possível. Está também claro que         cia de coisas que não são bem assim”. Ele consi­
                      novas ideias – às vezes, parecendo inicialmente      derou vários exemplos dessas ideias e estabele­
   ilustrações lula




                      ir contra o cenário aceito – devam ser levadas à     ceu ‘regras’ por meio das quais essas especula­
                      frente e consideradas por seus méritos.              ções ganham apoio, por curto período de tempo,
                          Na prática, porém, a ciência tem que enfrentar   antes de serem postas de lado.                      


                                                                                             julho de 20 10 • CiênCia Hoje • 2 7
SOCIOLOGIA DA CIÊNCIA




raioS N                                                          Uma questão preocupava Wood: a alegada precisão [do
                                                              experimento] não parecia consistente com os tamanhos de
O exemplo mais antigo de ciência patológica dado por Lang­    certas aberturas pelas quais passava o suposto feixe, bem
muir foi o do fenômeno dos raios N, ‘descobertos’ pelo fí­    como com a largura deste último. Para esses questionamen­
sico francês René Blondlot (1849­1930), em 1903. Esses        tos, a resposta da equipe de Blondlot era: “Sim, eles não
raios eram emitidos por certos corpos e, em um quarto         obedecem a regras normais, e isso é o que é interessante
escuro, podiam aumentar levemente a visibilidade de ob­       neles”.
jetos, como uma folha de papel em branco, postos perto           Depois de uma demonstração ter sido finalizada, Wood
do emissor. Um gerador de raios N era um tubo de ferro,       perguntou – como se estivesse elocubrando algo – se alguns
contendo um fio aquecido, com uma abertura, coberta por       dos resultados poderiam ser repetidos. A sala foi escureci­
uma camada bem espessa de alumínio, opaca à luz.              da, e logo que o experimento recomeçou, Wood removeu o
   Muitos artigos foram publicados sobre o tema no pri­       prisma do equipamento, sem que ninguém notasse.
meiro ano depois da descoberta, alguns corroborando o            O experimento mostrou, mesmo sem o prisma, resultados
fenômeno; outros discordavam da existência dele. Foi um       similares. Quando Wood contou o que havia feito, os raios
período de grande atividade na física, com intensa pesqui­    N sofreram morte súbita.
sa sobre radioatividade e raios X.
   Pouco depois do anúncio dos raios N, o físico norte­ame­
ricano Robert Wood (1868­1955) foi escolhido por um
grupo europeu para visitar o laboratório de Blondlot. Lá,
                                                              regraS de LaNgmuir
mostraram a ele o equipamento no qual os raios N estavam      Langmuir deu outros exemplos, incluindo a chamada ‘po­
sendo estudados. Entre os aparelhos, estava um espectrô­      liágua’, que poderia tornar os oceanos um tipo de xarope
metro dotado de um grande prisma de alumínio.                 denso. Ele sugeriu que há características comuns nas ideias
                                                              ‘patológicas’ – nas quais, por sinal, os proponentes realmen­
                                                              te acreditam.
                                                                  As regras de Langmuir: i) o fenômeno era causado por
                                                              estímulo fraco e independente da intensidade deste último;
                                                              ii) o fenômeno era difícil de ser medido, com resultados
                                                              pouco acima dos níveis detectáveis; iii) era alegada grande
                                                              precisão nas medidas realizadas; iv) teorias ‘extraordinárias’
                                                              eram lançadas para explicar o fenômeno; v) alegava­se que
                                                              as críticas aos resultados eram feitas com base em justifi­
                                                              cativas ad hoc – ou seja, sem compreensão objetiva e isen­
                                                              ta da realidade.




2 8 • CiênCia Hoje • vol . 46 • nº 272
SOCIOLOGIA DA CIÊNCIA




a bomba de háfNio
Com exceção da fusão a frio, que chamou a atenção da co­
munidade científica em 1989, dois outros exemplos menos
familiares que obedecem, de modo marcante, às regras de
Langmuir vieram à atenção deste autor nos últimos anos.
O primeiro, a bomba de háfnio, foi recentemente tema de
livro de divulgação científica e de discussão importante em
comitê do senado norte­americano. O segundo, o caso do
desaparecimento da atividade alfa, não chegou a ganhar
manchetes, mas teve alguma repercussão em jornais, pu­
blicações de divulgação científica e mesmo periódicos
científicos.
   O háfnio 178m (178mHf) é um elemento químico cuja soma
de prótons e nêutrons em seu núcleo é igual a 178 – o ‘m’,
no caso, significa que ele é metaestável, ou seja, permane­
                                                               Gráfico com os dados sobre o experimento
ce em estado excitado, com energia cerca de 2,5 milhões
                                                               com o háfnio 178m em laboratório na Suíça
de elétrons­volt (MeV) acima do estado fundamental (ou
normal). Um átomo de háfnio 178m tem uma vida média
de 32 anos. Em termos das energias com que lidamos no          temas aqui tratados, os artigos científicos originais estão




                                                                                                                                   KettNer, K. u.; BeCKer, H. W.; streiDer, F.; rOlFs, C. JOurNal OF PHysiCs G v. 32, P. 489 (2006)
dia a dia, milhões de elétrons­volt são ínfimos, impercep­     listados em ‘Sugestões para leitura’.
tíveis, mas na escala atômica é energia considerável.              Mais tarde, publicações deram ‘evidências’ similares
   O título sensacionalista ‘a bomba de háfnio’ foi dado em    – porém, parciais – para o aumento da taxa de emissão
função de 1 g desse elemento – caso os 2,5 MeV por átomo       em outros ‘degraus’ da cascata, mas nenhuma evidência
pudessem ser emitidos de uma só vez – ser equivalente a        foi vista para a emissão simultânea de toda a sequência
cerca de 200 kg de um explosivo normal, ou seja, a uma pe­     de raios gama. Quando Collins foi perguntado como isso
quena bomba nuclear. Por outro lado, a emissão dessa ener­     provava alguma coisa, ele respondeu que a evidência de
gia, feita lenta e controladamente, poderia ter muitos usos.   apenas uma transição (de um ‘degrau’, na cascata de sequên­
   A afirmação de que haviam sido achadas evidências para      cias) era suficiente para demonstrar que o disparo de toda
‘disparar’ a energia do háfnio 178m foi feita em 1999 por      a sequência havia ocorrido.
um grupo da Universidade do Texas (Estados Unidos) lide­           As ideias de Collins sobre a possibilidade de obtenção
rado pelo físico Carl Collins. No caso do háfnio 178m, o       de um ‘gatilho’ para disparar a energia do háfnio 178m
decaimento (ou seja, a emissão de energia) ocorre normal­      foram levadas a sério e receberam apoio da Darpa (sigla,
mente pela emissão, em cascata, de uma sequência de raios      em inglês, para Agência de Pesquisa em Defesa dos Estados
gama. O grupo de Collins, no entanto, alegou que, na pre­      Unidos). Artigos apareceram em periódicos científicos de
sença de raios X com características daqueles produzidos       alto prestígio, e, pouco depois, foi dado ao grupo tempo
por aparelhos de radiografia odontológica, a taxa de decai­    extra para que seus membros seguissem com as pesquisas
mento para certos ‘degraus’ dessa cascata aumentava em         nos mais bem equipados (e caros) laboratórios internacio­
até 6,5% – para o leitor interessado em se aprofundar nos      nais no Japão e na Suíça.
                                                                   Se havia algo extraordinariamente novo, esses novos
                                                               laboratórios queriam fazer parte do jogo – e as afirmações
                                                               nesse sentido eram incisivas. As tentativas de outros grupos
                                                               de checar relatórios nem sempre foram bem recebidas.
                                                               Quando experimentos independentes davam resultados
                                                               negativos e ganhavam repercussão, eles eram ignorados.
                                                                   Os estudos sobre o háfnio 178m passaram de um fenô­
                                                               meno básico para estudos sobre os tempos relaciona­
                                                               dos a seu decaimento. Exemplo de dados coletados no SLS
                                                               (sigla, em inglês, para Fonte de Luz da Suíça) é mostrado
                                                               na figura acima. A parte superior da figura exibe a taxa de
                                                               decaimento do háfnio 178m, já incluindo o erro experimen­
                                                               tal. Em baixo, está a intensidade dos feixes de raios X – na
                                                               metade esquerda o feixe está desligado; na direita, ligado.
                                                                   No artigo, que inclui esse gráfico, os autores afirmam
                                                               basicamente que, ligada a fonte de raios X, havia súbito 


                                                                                              julho de 20 10 • CiênCia Hoje • 29
SOCIOLOGIA DA CIÊNCIA




crescimento na taxa de decaimento do háfnio (parte direi­
ta da curva de cima do gráfico). A análise dos dados mostrou
                                                               deSaparecimeNto
que há realmente acréscimo, porém diminuto. Mas essa
alteração – que é menos da metade da incerteza inerente
                                                               da atividade aLfa
às medidas – não permite concluir que haja o surgimento        Em 2006, na conclusão de artigo publicado em respeitado
de qualquer efeito, como foi afirmado no artigo.               periódico de física, um grupo de astrofísicos liderados por
   Presente como observador em um experimento no SLS,          Claus Rolfs defendeu que elementos radioativos encapsu­
o autor deste artigo sugeriu a Collins, em um encontro, que    lados em metal – sendo o conjunto resfriado a temperaturas
ele dedicasse tempo para melhorar a qualidade das evidên­      abaixo de 1 kelvin, ou seja, 272 graus celsius negativos –
cias de seus dados, usando um feixe de raios X mais favo­      teriam sua meia­vida diminuída bruscamente. Por exemplo,
rável, produzido no então mais moderno laboratório do          em condições semelhantes (4 kelvin), o elemento químico
gênero. Collins nem mesmo discordou ou, pelo menos,            polônio 210, segundo a equipe de Rolfs, teria sua meia­vida
discutiu a questão; ele simples e abruptamente encerrou o      alterada de 138 dias para apenas 0,5 dia – meia­vida é o
encontro. Depois me foi dito, em termos não muito precisos,    tempo necessário para que metade dos núcleos radioativos
que levantar aquelas dúvidas era inaceitável, e que minha      de uma amostra sofra decaimento radioativo, ou seja, emi­
conexão com o experimento havia chegado ao fim.                ta energia na forma de radiação.
   Nos 10 anos seguintes, os experimentos com o háfnio            Um dos problemas com o artigo é que os autores não se
178m continuaram. No entanto, em vários laboratórios do        preocuparam em saber se estudos experimentais de emissão
mundo dotados de feixes de raios X com potência muito          alfa haviam sido feitos a temperaturas tão baixas. Além
superior àquela originalmente usada na experiência inicial,    disso, a teoria invocada era bizarra, pois desafiava princípios
nenhum sinal muito superior ao erro experimental foi ob­       da física quântica atômica, a mais apropriada para tratar os
servado.                                                       resultados do experimento.
   Descrita em sua totalidade, a história desse fenômeno          No entanto, os resultados daquela equipe de astrofísicos
obedece a cada uma das regras de Langmuir. Então, o dra­       não foram desafiados pelos pareceristas do artigo, e grupos
gão da bomba de háfnio está morto? Sim, mas isso se deu        experimentais começaram a tentar fazer medidas para testar
só no ano passado.                                             as notáveis previsões do grupo. Um dos primeiros experimen­
                                                               tos afirmava ter achado evidências consistentes com os re­
                                                               sultados do grupo de Rolfs, porém de menor intensidade.
                                                                  A equipe de Rolfs havia ignorado que grupos experimen­
                                                               tais haviam feito medidas semelhantes abaixo dos milésimos
                                                               de kelvin nos últimos 40, 50 anos. Por exemplo, experimen­
                                                               tos feitos por um grupo liderado pelo autor deste artigo
                                                               mostraram que as previsões de diminuição da vida­média
                                                               dos emissores de radiação alfa eram totalmente incompatí­
                                                               veis com as previsões feitas por Rolfs e colegas. Nosso
                                                               grupo publicou artigo que mostrava que aquelas previsões
                                                               sensacionais estavam erradas por um fator enorme – cerca
                                                               de um milhão à temperatura de 1 k e 10 bilhões a tempe­
                                                               raturas ainda mais baixas. Nossos resultados parecem ter
                                                               sido significantes para tombar mais esse dragão (ver ‘Total­
                                                               mente incompatíveis’).




30 • CiênCia Hoje • vol . 46 • nº 272
totalmente incompatíveis.                     Relatamos aqui, de modo conciso e simplificado, resultados de experimentos
   feitos pelo grupo do autor deste artigo para testar as previsões feitas por Rolfs e colegas sobre o ‘desaparecimento’ das emis-
   sões alfa sob baixas temperaturas. Por exemplo, para o radônio 224 (vida-média 3,66 dias, quando encapsulado por ferro), Rolfs
   e colegas alegavam que esse tempo cairia para menos de 5 s à temperatura de 1K e que abaixo disso nem seria possível fazer
   um experimento. Fizemos esses experimentos por vários dias a temperaturas inferiores a 20 milésimos de kelvin (20 milikel-
   vin) e nada foi notado. Para o actínio 227 (vida-média de 21,8 anos no ferro), mantido a 1K ou temperatura menor, a amostra
   decairia em cerca de 18 dias. Novamente, nosso experimento, feito ao longo de meses, com a amostra mantida a aproximada-
   mente 8 milikelvin, mostrou que as previsões do grupo de Rolfs eram totalmente incompatíveis.
        O autor é inglês, graduado e doutorado em física pela Universidade Oxford (Inglaterra), com pós-doutorado na Universida-
   de de Berkeley (Estados Unidos). Foi pesquisador do Laboratório Clarendon, em Oxford, por 30 anos, aplicando técnicas de
   temperaturas ultrabaixas para o estudo de estruturas nucleares. Atualmente, trabalha no Laboratório Nacional Oak Ridge
   (Estados Unidos), onde mantém vários projetos em andamento, bem como no Centro Europeu de Pesquisas Nucleares (CERN).



  Foi relatado que Rolfs, em tentativa de revide, teria                Dragões têm a característica de que eles frequentemente
mantido que “as fontes de Stone não são propriamente em             aparecem quando especialistas em uma área tentam expli­
metal”, apesar das múltiplas evidências em contrário.               car o que eles ‘veem’ em outro campo no qual lhes falta
  Simplesmente, um caso emblemático da quinta lei de                experiência.
Langmuir.                                                               A natureza humana pode enganar, e cientistas são tão
                                                                    humanos quanto qualquer outra pessoa. Cientistas não são
                                                                    insensíveis às tentações de fama e fortuna, especialmente
por que Surgem                                                      se um novo conceito revolucionário parece estar ao alcan­
                                                                    ce de suas mãos. Essas influências podem facilmente levar
oS dragõeS?                                                         a publicações prematuras e a exageros para tornar mais
                                                                    sensacionais novos resultados.
Langmuir foi cuidadoso em sua descrição da ciência pato­               ‘Dragões’ finalmente acabam morrendo, mas pode ser
lógica ao ressaltar que os criadores de ‘dragões’ não eram          preciso tempo valioso e grande desperdício de esforços para
necessariamente desonestos, mas poderiam acreditar ver­             matá­los. Hoje, com laboratórios dispendiosos e intensa
dadeiramente que suas ideias, seus experimentos e suas              competição para o uso deles, o velho adágio ‘repita, repita,
interpretações eram completamente científicos. Desonesti­           repita’, para evitar conclusões errôneas, é frequentemente
dade profunda é outra – e mais rara – ocorrência. Mas o             difícil de satisfazer. Mas isso não significa que deveríamos
desenrolar dos fatos inevitavelmente acabou mostrando que           automaticamente descartar ideias independentes em relação
os proponentes do ‘dragão’ haviam sido seletivos em suas            a experimentos, pois isso seria a rota para a estagnação.
apresentações de dados (caso dos raios gama do háfnio);                Enquanto pareceristas, consultores e colegas agem como
estavam desejosos de encontrar razões para descartar dados          caixas de ressonância para testar ideias à medida que elas sur­
que não concordavam com suas ideias; queriam aceitar                gem, a responsabilidade para uma ciência vigorosa está fun­
métodos teóricos incompletos para impulsionar suas cren­            damentalmente depositada no cientista, como indivíduo. n
ças (decaimento alfa mais veloz).


                                                                      Sugestões para leitura

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                                                                        underworld. New york: Nation Books (2007).
                                                                      COlliNs, C. B. et al. Physical Review Letters, v. 89, p. 695 (1999).
                                                                      COlliNs, C. B. et al. Laser Physics, v. 14, p. 154 (2004).
                                                                      KettNer, K. u.; BeCKer, H. W.; streiDer, F.; rOlFs, C. Journal of Physics G,
                                                                        v. 32, p. 489 (2006).
                                                                      raiOla, F. et al. European Journal of Physics A, v. 32, p. 51 (2007).
                                                                      stONe, N. J.; stONe, J. r.; liNDrOOs, M.; riCHarDs, P.; vesKOviC, M.;
                                                                        WilliaMs, D. a. Nuclear Physics A, v. 793, p. 1 (2007).

                                                                      Na internet:
                                                                      irving langmuir (em português e inglês):
                                                                      http://pt.wikipedia.org/wiki/irving_langmuir
                                                                      http://nobelprize.org/nobel_prizes/chemistry/laureates/1932/index.html
                                                                      Palestra de langmuir sobre ciência patológica (em inglês):
                                                                      http://www.cs.princeton.edu/~ken/langmuir/langmuir.htm
                                                                      Controvérsia sobre a bomba de háfnio (em inglês):
                                                                      http://en.wikipedia.org/wiki/induced_gamma_emission:_Hafnium_controversy



                                                                                                        julho de 20 10 • CiênCia Hoje • 3 1

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Ciência Patológica

  • 1. SOCIOLOGIA DA CIÊNCIA CIÊNCIA PATO Segue firme e forte! Desafiar aquilo que está estabelecido é ato costumeiro – e essencial – da ciência. Na prática, porém, há o desafio de separar especulações banais de ideias que – apesar de posteriormente se mostrarem corretas – são inicialmente difíceis de justificar de modo claro. Na década de 1950, em palestra memorável, um prêmio Nobel cunhou o termo ciência patológica para denominar certos tipos de afirmações incoerentes. Além de citar exemplos, aquele renomado cientista estabeleceu ‘regras’ que mostram como teorias, resultados ou novos ‘fenômenos’ disparatados acabam ganhando adeptos e popularidade na comunidade científica, antes de serem provados falsos. Aqui, apresentaremos exemplos antigos e recentes de ciência patológica na física, bem como reflexões sobre esse aspecto sociológico da prática científica. Nick Stone Universidade de Oxford (Reino Unido) e Laboratório Nacional Oak Ridge (Estados Unidos) 2 6 • CiênCia Hoje • vol . 46 • nº 272
  • 2. SOCIOLOGIA DA CIÊNCIA LÓGICA... A ciência é baseada na experimen­ o problema de como lidar com ideias dissidentes tação, com a teoria desempe­ e com o desafio de separar especulações e afir­ nhando papel na produção de mações incoerentes – que aqui denomino ‘dra­ um quadro composto, consisten­ gões’, criatura mítica, atrativa, mas perigosa – de te com o máximo de resultados outras que, apesar de posteriormente se mostra­ possível. Novas ideias, experi­ rem corretas, sejam inicialmente difíceis de jus­ mentos e resultados são julgados tificar de modo claro. com base no cenário aceito em dado momento. Na década de 1950, o norte­americano Irving É essencial, caso se queira que o entendimen­ Langmuir (1881­1957), prêmio Nobel de Quími­ to de um assunto seja ampliado, que o cenário ca de 1932, fez palestra memorável em que aceito seja desafiado de modo inovador e tantas cunhou o termo ciência patológica para “a ciên­ vezes quanto possível. Está também claro que cia de coisas que não são bem assim”. Ele consi­ novas ideias – às vezes, parecendo inicialmente derou vários exemplos dessas ideias e estabele­ ilustrações lula ir contra o cenário aceito – devam ser levadas à ceu ‘regras’ por meio das quais essas especula­ frente e consideradas por seus méritos. ções ganham apoio, por curto período de tempo, Na prática, porém, a ciência tem que enfrentar antes de serem postas de lado.  julho de 20 10 • CiênCia Hoje • 2 7
  • 3. SOCIOLOGIA DA CIÊNCIA raioS N Uma questão preocupava Wood: a alegada precisão [do experimento] não parecia consistente com os tamanhos de O exemplo mais antigo de ciência patológica dado por Lang­ certas aberturas pelas quais passava o suposto feixe, bem muir foi o do fenômeno dos raios N, ‘descobertos’ pelo fí­ como com a largura deste último. Para esses questionamen­ sico francês René Blondlot (1849­1930), em 1903. Esses tos, a resposta da equipe de Blondlot era: “Sim, eles não raios eram emitidos por certos corpos e, em um quarto obedecem a regras normais, e isso é o que é interessante escuro, podiam aumentar levemente a visibilidade de ob­ neles”. jetos, como uma folha de papel em branco, postos perto Depois de uma demonstração ter sido finalizada, Wood do emissor. Um gerador de raios N era um tubo de ferro, perguntou – como se estivesse elocubrando algo – se alguns contendo um fio aquecido, com uma abertura, coberta por dos resultados poderiam ser repetidos. A sala foi escureci­ uma camada bem espessa de alumínio, opaca à luz. da, e logo que o experimento recomeçou, Wood removeu o Muitos artigos foram publicados sobre o tema no pri­ prisma do equipamento, sem que ninguém notasse. meiro ano depois da descoberta, alguns corroborando o O experimento mostrou, mesmo sem o prisma, resultados fenômeno; outros discordavam da existência dele. Foi um similares. Quando Wood contou o que havia feito, os raios período de grande atividade na física, com intensa pesqui­ N sofreram morte súbita. sa sobre radioatividade e raios X. Pouco depois do anúncio dos raios N, o físico norte­ame­ ricano Robert Wood (1868­1955) foi escolhido por um grupo europeu para visitar o laboratório de Blondlot. Lá, regraS de LaNgmuir mostraram a ele o equipamento no qual os raios N estavam Langmuir deu outros exemplos, incluindo a chamada ‘po­ sendo estudados. Entre os aparelhos, estava um espectrô­ liágua’, que poderia tornar os oceanos um tipo de xarope metro dotado de um grande prisma de alumínio. denso. Ele sugeriu que há características comuns nas ideias ‘patológicas’ – nas quais, por sinal, os proponentes realmen­ te acreditam. As regras de Langmuir: i) o fenômeno era causado por estímulo fraco e independente da intensidade deste último; ii) o fenômeno era difícil de ser medido, com resultados pouco acima dos níveis detectáveis; iii) era alegada grande precisão nas medidas realizadas; iv) teorias ‘extraordinárias’ eram lançadas para explicar o fenômeno; v) alegava­se que as críticas aos resultados eram feitas com base em justifi­ cativas ad hoc – ou seja, sem compreensão objetiva e isen­ ta da realidade. 2 8 • CiênCia Hoje • vol . 46 • nº 272
  • 4. SOCIOLOGIA DA CIÊNCIA a bomba de háfNio Com exceção da fusão a frio, que chamou a atenção da co­ munidade científica em 1989, dois outros exemplos menos familiares que obedecem, de modo marcante, às regras de Langmuir vieram à atenção deste autor nos últimos anos. O primeiro, a bomba de háfnio, foi recentemente tema de livro de divulgação científica e de discussão importante em comitê do senado norte­americano. O segundo, o caso do desaparecimento da atividade alfa, não chegou a ganhar manchetes, mas teve alguma repercussão em jornais, pu­ blicações de divulgação científica e mesmo periódicos científicos. O háfnio 178m (178mHf) é um elemento químico cuja soma de prótons e nêutrons em seu núcleo é igual a 178 – o ‘m’, no caso, significa que ele é metaestável, ou seja, permane­ Gráfico com os dados sobre o experimento ce em estado excitado, com energia cerca de 2,5 milhões com o háfnio 178m em laboratório na Suíça de elétrons­volt (MeV) acima do estado fundamental (ou normal). Um átomo de háfnio 178m tem uma vida média de 32 anos. Em termos das energias com que lidamos no temas aqui tratados, os artigos científicos originais estão KettNer, K. u.; BeCKer, H. W.; streiDer, F.; rOlFs, C. JOurNal OF PHysiCs G v. 32, P. 489 (2006) dia a dia, milhões de elétrons­volt são ínfimos, impercep­ listados em ‘Sugestões para leitura’. tíveis, mas na escala atômica é energia considerável. Mais tarde, publicações deram ‘evidências’ similares O título sensacionalista ‘a bomba de háfnio’ foi dado em – porém, parciais – para o aumento da taxa de emissão função de 1 g desse elemento – caso os 2,5 MeV por átomo em outros ‘degraus’ da cascata, mas nenhuma evidência pudessem ser emitidos de uma só vez – ser equivalente a foi vista para a emissão simultânea de toda a sequência cerca de 200 kg de um explosivo normal, ou seja, a uma pe­ de raios gama. Quando Collins foi perguntado como isso quena bomba nuclear. Por outro lado, a emissão dessa ener­ provava alguma coisa, ele respondeu que a evidência de gia, feita lenta e controladamente, poderia ter muitos usos. apenas uma transição (de um ‘degrau’, na cascata de sequên­ A afirmação de que haviam sido achadas evidências para cias) era suficiente para demonstrar que o disparo de toda ‘disparar’ a energia do háfnio 178m foi feita em 1999 por a sequência havia ocorrido. um grupo da Universidade do Texas (Estados Unidos) lide­ As ideias de Collins sobre a possibilidade de obtenção rado pelo físico Carl Collins. No caso do háfnio 178m, o de um ‘gatilho’ para disparar a energia do háfnio 178m decaimento (ou seja, a emissão de energia) ocorre normal­ foram levadas a sério e receberam apoio da Darpa (sigla, mente pela emissão, em cascata, de uma sequência de raios em inglês, para Agência de Pesquisa em Defesa dos Estados gama. O grupo de Collins, no entanto, alegou que, na pre­ Unidos). Artigos apareceram em periódicos científicos de sença de raios X com características daqueles produzidos alto prestígio, e, pouco depois, foi dado ao grupo tempo por aparelhos de radiografia odontológica, a taxa de decai­ extra para que seus membros seguissem com as pesquisas mento para certos ‘degraus’ dessa cascata aumentava em nos mais bem equipados (e caros) laboratórios internacio­ até 6,5% – para o leitor interessado em se aprofundar nos nais no Japão e na Suíça. Se havia algo extraordinariamente novo, esses novos laboratórios queriam fazer parte do jogo – e as afirmações nesse sentido eram incisivas. As tentativas de outros grupos de checar relatórios nem sempre foram bem recebidas. Quando experimentos independentes davam resultados negativos e ganhavam repercussão, eles eram ignorados. Os estudos sobre o háfnio 178m passaram de um fenô­ meno básico para estudos sobre os tempos relaciona­ dos a seu decaimento. Exemplo de dados coletados no SLS (sigla, em inglês, para Fonte de Luz da Suíça) é mostrado na figura acima. A parte superior da figura exibe a taxa de decaimento do háfnio 178m, já incluindo o erro experimen­ tal. Em baixo, está a intensidade dos feixes de raios X – na metade esquerda o feixe está desligado; na direita, ligado. No artigo, que inclui esse gráfico, os autores afirmam basicamente que, ligada a fonte de raios X, havia súbito  julho de 20 10 • CiênCia Hoje • 29
  • 5. SOCIOLOGIA DA CIÊNCIA crescimento na taxa de decaimento do háfnio (parte direi­ ta da curva de cima do gráfico). A análise dos dados mostrou deSaparecimeNto que há realmente acréscimo, porém diminuto. Mas essa alteração – que é menos da metade da incerteza inerente da atividade aLfa às medidas – não permite concluir que haja o surgimento Em 2006, na conclusão de artigo publicado em respeitado de qualquer efeito, como foi afirmado no artigo. periódico de física, um grupo de astrofísicos liderados por Presente como observador em um experimento no SLS, Claus Rolfs defendeu que elementos radioativos encapsu­ o autor deste artigo sugeriu a Collins, em um encontro, que lados em metal – sendo o conjunto resfriado a temperaturas ele dedicasse tempo para melhorar a qualidade das evidên­ abaixo de 1 kelvin, ou seja, 272 graus celsius negativos – cias de seus dados, usando um feixe de raios X mais favo­ teriam sua meia­vida diminuída bruscamente. Por exemplo, rável, produzido no então mais moderno laboratório do em condições semelhantes (4 kelvin), o elemento químico gênero. Collins nem mesmo discordou ou, pelo menos, polônio 210, segundo a equipe de Rolfs, teria sua meia­vida discutiu a questão; ele simples e abruptamente encerrou o alterada de 138 dias para apenas 0,5 dia – meia­vida é o encontro. Depois me foi dito, em termos não muito precisos, tempo necessário para que metade dos núcleos radioativos que levantar aquelas dúvidas era inaceitável, e que minha de uma amostra sofra decaimento radioativo, ou seja, emi­ conexão com o experimento havia chegado ao fim. ta energia na forma de radiação. Nos 10 anos seguintes, os experimentos com o háfnio Um dos problemas com o artigo é que os autores não se 178m continuaram. No entanto, em vários laboratórios do preocuparam em saber se estudos experimentais de emissão mundo dotados de feixes de raios X com potência muito alfa haviam sido feitos a temperaturas tão baixas. Além superior àquela originalmente usada na experiência inicial, disso, a teoria invocada era bizarra, pois desafiava princípios nenhum sinal muito superior ao erro experimental foi ob­ da física quântica atômica, a mais apropriada para tratar os servado. resultados do experimento. Descrita em sua totalidade, a história desse fenômeno No entanto, os resultados daquela equipe de astrofísicos obedece a cada uma das regras de Langmuir. Então, o dra­ não foram desafiados pelos pareceristas do artigo, e grupos gão da bomba de háfnio está morto? Sim, mas isso se deu experimentais começaram a tentar fazer medidas para testar só no ano passado. as notáveis previsões do grupo. Um dos primeiros experimen­ tos afirmava ter achado evidências consistentes com os re­ sultados do grupo de Rolfs, porém de menor intensidade. A equipe de Rolfs havia ignorado que grupos experimen­ tais haviam feito medidas semelhantes abaixo dos milésimos de kelvin nos últimos 40, 50 anos. Por exemplo, experimen­ tos feitos por um grupo liderado pelo autor deste artigo mostraram que as previsões de diminuição da vida­média dos emissores de radiação alfa eram totalmente incompatí­ veis com as previsões feitas por Rolfs e colegas. Nosso grupo publicou artigo que mostrava que aquelas previsões sensacionais estavam erradas por um fator enorme – cerca de um milhão à temperatura de 1 k e 10 bilhões a tempe­ raturas ainda mais baixas. Nossos resultados parecem ter sido significantes para tombar mais esse dragão (ver ‘Total­ mente incompatíveis’). 30 • CiênCia Hoje • vol . 46 • nº 272
  • 6. totalmente incompatíveis. Relatamos aqui, de modo conciso e simplificado, resultados de experimentos feitos pelo grupo do autor deste artigo para testar as previsões feitas por Rolfs e colegas sobre o ‘desaparecimento’ das emis- sões alfa sob baixas temperaturas. Por exemplo, para o radônio 224 (vida-média 3,66 dias, quando encapsulado por ferro), Rolfs e colegas alegavam que esse tempo cairia para menos de 5 s à temperatura de 1K e que abaixo disso nem seria possível fazer um experimento. Fizemos esses experimentos por vários dias a temperaturas inferiores a 20 milésimos de kelvin (20 milikel- vin) e nada foi notado. Para o actínio 227 (vida-média de 21,8 anos no ferro), mantido a 1K ou temperatura menor, a amostra decairia em cerca de 18 dias. Novamente, nosso experimento, feito ao longo de meses, com a amostra mantida a aproximada- mente 8 milikelvin, mostrou que as previsões do grupo de Rolfs eram totalmente incompatíveis. O autor é inglês, graduado e doutorado em física pela Universidade Oxford (Inglaterra), com pós-doutorado na Universida- de de Berkeley (Estados Unidos). Foi pesquisador do Laboratório Clarendon, em Oxford, por 30 anos, aplicando técnicas de temperaturas ultrabaixas para o estudo de estruturas nucleares. Atualmente, trabalha no Laboratório Nacional Oak Ridge (Estados Unidos), onde mantém vários projetos em andamento, bem como no Centro Europeu de Pesquisas Nucleares (CERN). Foi relatado que Rolfs, em tentativa de revide, teria Dragões têm a característica de que eles frequentemente mantido que “as fontes de Stone não são propriamente em aparecem quando especialistas em uma área tentam expli­ metal”, apesar das múltiplas evidências em contrário. car o que eles ‘veem’ em outro campo no qual lhes falta Simplesmente, um caso emblemático da quinta lei de experiência. Langmuir. A natureza humana pode enganar, e cientistas são tão humanos quanto qualquer outra pessoa. Cientistas não são insensíveis às tentações de fama e fortuna, especialmente por que Surgem se um novo conceito revolucionário parece estar ao alcan­ ce de suas mãos. Essas influências podem facilmente levar oS dragõeS? a publicações prematuras e a exageros para tornar mais sensacionais novos resultados. Langmuir foi cuidadoso em sua descrição da ciência pato­ ‘Dragões’ finalmente acabam morrendo, mas pode ser lógica ao ressaltar que os criadores de ‘dragões’ não eram preciso tempo valioso e grande desperdício de esforços para necessariamente desonestos, mas poderiam acreditar ver­ matá­los. Hoje, com laboratórios dispendiosos e intensa dadeiramente que suas ideias, seus experimentos e suas competição para o uso deles, o velho adágio ‘repita, repita, interpretações eram completamente científicos. Desonesti­ repita’, para evitar conclusões errôneas, é frequentemente dade profunda é outra – e mais rara – ocorrência. Mas o difícil de satisfazer. Mas isso não significa que deveríamos desenrolar dos fatos inevitavelmente acabou mostrando que automaticamente descartar ideias independentes em relação os proponentes do ‘dragão’ haviam sido seletivos em suas a experimentos, pois isso seria a rota para a estagnação. apresentações de dados (caso dos raios gama do háfnio); Enquanto pareceristas, consultores e colegas agem como estavam desejosos de encontrar razões para descartar dados caixas de ressonância para testar ideias à medida que elas sur­ que não concordavam com suas ideias; queriam aceitar gem, a responsabilidade para uma ciência vigorosa está fun­ métodos teóricos incompletos para impulsionar suas cren­ damentalmente depositada no cientista, como indivíduo. n ças (decaimento alfa mais veloz). Sugestões para leitura WeiNBerGer, s. Imaginary weapons: a journey through the Pentagon’s scientific underworld. New york: Nation Books (2007). COlliNs, C. B. et al. Physical Review Letters, v. 89, p. 695 (1999). COlliNs, C. B. et al. Laser Physics, v. 14, p. 154 (2004). KettNer, K. u.; BeCKer, H. W.; streiDer, F.; rOlFs, C. Journal of Physics G, v. 32, p. 489 (2006). raiOla, F. et al. European Journal of Physics A, v. 32, p. 51 (2007). stONe, N. J.; stONe, J. r.; liNDrOOs, M.; riCHarDs, P.; vesKOviC, M.; WilliaMs, D. a. Nuclear Physics A, v. 793, p. 1 (2007). Na internet: irving langmuir (em português e inglês): http://pt.wikipedia.org/wiki/irving_langmuir http://nobelprize.org/nobel_prizes/chemistry/laureates/1932/index.html Palestra de langmuir sobre ciência patológica (em inglês): http://www.cs.princeton.edu/~ken/langmuir/langmuir.htm Controvérsia sobre a bomba de háfnio (em inglês): http://en.wikipedia.org/wiki/induced_gamma_emission:_Hafnium_controversy julho de 20 10 • CiênCia Hoje • 3 1