1. 1
IMPUGNAÇÃO OU RÉPLICA NO PROCESSO DO TRABALHO
http://jus.uol.com.br/revista/texto/17219
Publicado em 08/2010
André Araújo Molina
A Justiça do Trabalho tem concedido às partes a oportunidade para impugnar a
contestação, mas sem fixar seu objeto, conteúdo, prazo e consequências jurídicas.
1. Introdução
O objetivo do presente artigo é pesquisar acerca do instituto da impugnação à
contestação (ou réplica) no processo do trabalho. O itinerário de investigação
reclama a existência de várias hipóteses a serem estudadas. Primeiro é saber se há o
instituto no processo do trabalho, visto que a CLT é omissa no particular, para
depois avançar no questionamento da aplicação subsidiária do processo comum, na
hipótese. Qual é o objeto da réplica no processo do trabalho? Qual o conteúdo,
forma e prazo? Quais as consequências da omissão da parte que não impugna a
contestação e documentos?
As respostas a todas essas questões serão dadas ao longo dos tópicos e o resultado da
investigação, longe de ter objetivo apenas acadêmico, tem uma implicação
eminentemente prática, na medida em que os Tribunais trabalhistas têm concedido
às partes a oportunidade para impugnação, mas sem fixar seu objeto, conteúdo,
prazo e consequências jurídicas. Por não estar prevista na CLT, a impugnação não
encontrou na doutrina especializada tratamento científico algum. [01]
Uma depuração de ordem semântica precisa ser realizada. Para os autores de direito
processual civil, impugnação e réplica são conceitos que não se confundem.
Enquanto a oportunidade para o autor manifestar-se quanto aos documentos recebe o
epíteto de impugnação, de outro giro quando há necessidade de manifestação quanto
à contestação, quanto às preliminares e ao mérito, fala-se em réplica. Entretanto,
para os limites desse texto, os dois termos serão utilizados como sinônimos, na
medida em que no processo do trabalho são apresentadas no mesmo prazo e no
mesmo instrumento.
2. A estrutura do processo do trabalho
O Direito do Trabalho é um dos ramos autônomos mais recentes da ciência jurídica,
na medida em que apenas com a Constituição mexicana de 1917 e alemã de 1919
(Weimar), secundadas pelo Tratado de Versalhes de 1919 e a criação da OIT
também no mesmo ano é que esse ramo especializado ganhou autonomia legislativa.
2. 2
No Brasil, as leis esparsas das décadas de 30 e 40 do século passado, que traziam
episodicamente dispositivos de proteção aos trabalhadores, foram consolidadas por
interferência do Governo Vargas, pelo veículo do Decreto-Lei n. 5.452 de 1943, que
se convencionou chamar de Consolidação das Leis do Trabalho, vigente até hoje,
com o necessário acréscimo de outros dispositivos, tanto no momento de sua
compilação como nas alterações legislativas posteriores. A CLT contém dispositivos
que tratam de direito material do trabalho, como aqueles dos artigos 2º ao 510,
direito administrativo, dos artigos 626 a 735, e de direito processual do trabalho,
identificável nos artigos 763 a 910, com a ressalva de que em outros dispositivos
também há regras processuais – por exemplo aquela para fixação de competência do
artigo 651 da CLT.
E a estrutura do direito processual do trabalho pode ser resumida em várias fases,
conforme a sequência da própria Consolidação, quais sejam: 1) organização da
Justiça do Trabalho; 2) competência; 3) atos, termos, prazos processuais e nulidades;
4) partes e procuradores; 5) ação trabalhista, decomposta nas fases postulatória, de
respostas do réu, provas, audiência e sentença; 6) recursos trabalhistas e 7) execução
trabalhista. Não há na redação originária da CLT disposição alguma que faça
referência ao instituto da impugnação ou réplica, embora no contemporâneo Código
de Processo Civil de 1939 já existisse. [02] A grande questão é saber se a omissão é
proposital, com a exclusão do instituto do processo especializado, ou se deverá haver
integração, nos termos do artigo 769 da CLT, aplicando-se o processo comum como
fonte subsidiária.
A resposta, unânime na doutrina e na jurisprudência, parece estar em sede
constitucional, mais especificamente no princípio processual máximo que é o devido
processo legal [03], tanto em sua vertente formal quanto substancial, decomposto nos
dois princípios do direito ao contraditório e à ampla defesa. Ao mesmo tempo em
que são os princípios constitucionais citados que garantem o direito à impugnação,
são as normas do processo civil que os instrumentalizam, aplicando-se ao processo
do trabalho.
A nosso ver, o ponto nodal que gera toda a discussão objeto desse texto é a confusão
que os julgadores fazem, e na esteira deles, os demais operadores jurídicos, de não
saber distinguir texto de lei de norma jurídica. São conceitos elementares que não
podem ser negligenciados. Para um maior esclarecimento, faremos um desvio de
rota, a fim de, depurados esses conceitos, retomarmos as hipóteses de pesquisa com
maior precisão e racionalidade, caminhando para uma conclusão científica.
Em sede de teoria geral do direito é lição primordial que cabe ao legislador eleger
entre os fatos sociais aqueles relevantes para o direito, de modo a imputar-lhes
consequências jurídicas, transmudando-os em fatos jurídicos. Em palavras outras, é
o legislador quem constrói o sistema de direito positivo, cujos elementos são os
textos ou dispositivos. Ao contrário do que ordinariamente se pensa entre os
operadores, não são os textos de lei que são aplicados pelo intérprete aos casos
concretos, mas o resultado da interpretação elaborada por este. O sistema de direito
3. 3
positivo é o objeto de análise do intérprete, quer jurista quer julgador, de modo que
a norma jurídica é o resultado dessa interpretação, cujas normas podem tanto ocupar
a estrutura de princípios como de regras. Aquelas, as normas, é que são aplicáveis
aos casos concretos, formando o conjunto delas o sistema da ciência do direito –
metasistema descritivo. [04]
Um segundo passo é reconhecer, com HUMBERTO ÁVILA, que em alguns casos
há norma, mas não dispositivo isolado que lhe sirva de suporte (v. g., princípio da
segurança jurídica - artigo 5º, § 1º, da CF/88), como também poderá haver
dispositivo sem qualquer norma que seja construída a partir dele. Também é válido
que diversas normas são construídas a partir de um único dispositivo – exemplo é a
declaração de inconstitucionalidade parcial sem redução de texto, quando o Supremo
Tribunal Federal reconhece a existência de várias normas construídas a partir de um
único dispositivo, mas declara que apenas uma delas está conforme a Constituição.
Por fim, uma única norma é construída a partir da conjunção de dois ou mais
dispositivos. [05] "E o que isso quer dizer? Significa que não há correspondência
biunívoca entre dispositivo e norma – isto é, onde houver um não terá
obrigatoriamente de haver o outro". [06]
Em enquadramento prático, o direito processual do trabalho (o resultado da
interpretação, aquele que é efetivamente aplicado pelo julgador), não é construído
pelo intérprete apenas a partir dos dispositivos previstos na CLT, mas também,
quando em casos de omissão e compatibilidade (artigo 769 da CLT), dos
dispositivos constantes do direito processual comum, tal como Código de Processo
Civil e leis esparsas, quiçá, na fase de execução, pela Lei 6.830 de 1980 (artigo 889
da CLT).
E não há possibilidade de ser diferente, na medida em que o ordenamento de direito
positivo (objeto) pode ser incompleto, incoerente e contraditório, conforme as
vicissitudes do processo legislativo, mas o conjunto da interpretação (cujos
elementos são as normas jurídicas) não pode ostentar os mesmos inconvenientes.
Deve o novo conjunto ocupar a estrutura de sistema, com suas premissas de
ordenação e unidade. [07] O que garante os predicados de ordenação e unidade ao
sistema são os mecanismos intrasistêmicos para solução de antinomias e
preenchimento de lacunas (integração). Para as últimas, o direito processual do
trabalho, na fase de conhecimento, recomenda a aplicação do processo civil comum,
invocando-se, de outro lado, para os casos de antinomias, os mecanismos do artigo
2º da LICC.
Em síntese introdutória, o processo do trabalho não é coincidente com os
dispositivos previstos apenas na Consolidação, mas o sistema processual trabalhista
é construído a partir de normas pressupostas também do direito processual civil,
sempre que atendidos os requisitos da omissão e da compatibilidade (artigo 769 da
CLT). E os dois requisitos são preenchidos, com folga, quanto ao tema da
impugnação ou réplica.
4. 4
3. Objeto, forma, conteúdo e prazo da impugnação no processo do trabalho
Por exercício de lógica formal, quanto ao tema da impugnação ou réplica no
processo do trabalho, somente duas situações são possíveis: 1) ou não há a existência
do instituto, diante da omissão da CLT quanto ao procedimento ordinário; ou 2) há a
integração com as disposições do processo civil, admitindo-se a réplica, com atenção
ao procedimento do CPC quanto ao seu objeto, forma, conteúdo e prazo. A nosso
sentir a segunda opção é a recomendada pelos princípios constitucionais do devido
processo legal, ampla defesa e contraditório, tanto também pela construção da norma
jurídica completa a partir de dispositivos legais que, necessariamente, não se
encontram dentro do mesmo código. Acresce-se a tudo isso que, pragmaticamente,
todos os Tribunais trabalhistas do país concedem, em audiência ou fora dela, prazo
para o autor ofertar a sua impugnação ou réplica quanto à contestação e documentos,
sem fixar seu objeto, forma, conteúdo, prazo e consequência, decidindo casualmente
as questões recorridas, de forma bastante empírica, vacilante e, no mais das vezes,
contraditória.
Embora a oportunidade para impugnação no processo do trabalho encontre sua
sustentação na aplicação subsidiária do direito processual comum, há na Justiça
Especializada um dogma de que apenas os documentos juntados pela contestação é
que devem ser objeto de manifestação do autor, cerceando-lhe o direito de produção
de réplica quando ao cerne da defesa. [08] [09] E o dogma tanto se manteve que
empolgou no ano de 2000 o legislador, mesmo regulando de forma incompleta a
questão, a prever que só os documentos devem ser objeto de impugnação no
procedimento sumaríssimo (artigo 852-H, § 1º, da CLT, com redação dada pela Lei
n. 9.957), nada prescrevendo quanto ao procedimento ordinário.
Os principais argumentos para construção do dogma, todos insustentáveis e que
serão desafiados nos tópicos, são a omissão da CLT, a simplicidade do processo do
trabalho, a concentração dos atos processuais e a celeridade.
São objetos de impugnação no processo do trabalho: I - as preliminares do artigo
301 do CPC, tanto na espécie de pressupostos processuais quanto de condições da
ação, por determinação do artigo 327 do mesmo diploma; II – as arguições das
prejudiciais de mérito de prescrição e decadência; III – os fatos novos alegados na
contestação, impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor, na forma
do artigo 326 do CPC; IV – os documentos que acompanham a defesa, a teor do
artigo 372 do digesto processual comum.
Não está previsto em qualquer dispositivo do Código de Processo Civil que o autor
terá oportunidade para manifestar-se quanto à contestação, em caso de arguição de
prescrição ou decadência pela defesa, mas essa necessidade encontra residência no
direito material, na medida em que é na réplica a primeira oportunidade para que o
autor traga ao conhecimento do magistrado os fatos suspensivos e/ou interruptivos
da prescrição (artigos 197 a 204 do CC/2002). E não haveria como fazê-lo já na
petição inicial, pois poderia ocorrer de o réu renunciar à prescrição (artigo 191 do
5. 5
CC/2002), tornando-se a alegação prévia inútil e genérica, na medida em que não
saberia o autor qual é o prazo prescricional a ser arguido em contestação.
A impugnação, a depender do procedimento adotado pelo magistrado, pode ser
verbal ou escrita. No procedimento sumaríssimo, quando a audiência é sempre una,
a impugnação é feita oralmente, após a apresentação da defesa (artigo 852-H da
CLT). No procedimento ordinário, se a audiência for una, a réplica também é feita
na forma oral, mas quando a audiência é suspensa após a tentativa de conciliação e
oferta das respostas do réu, há concessão de prazo e a forma deve ser escrita.
Quanto ao prazo para impugnar, se for feita oralmente, será de 20 minutos, tanto no
procedimento sumaríssimo quanto no ordinário, por aplicação analógica do prazo
para contestação oral (artigo 847 da CLT). Se houver suspensão da audiência com
oferta de impugnação posterior e por escrito, os artigos 326, 327, 372 e 390 do CPC
recomendam o prazo de 10 dias, em relação a quaisquer dos objetos da réplica.
Na sua réplica o autor apenas poderá atacar os fatos novos articulados pelo réu, mas
não poderá ele articular fatos novos, manobra processual que teria natureza jurídica
de emenda à inicial, para a qual necessitaria de autorização da defesa (artigo 264 do
CPC). Poderá, contudo, apresentar documentos novos, para contrapor aos fatos da
defesa (artigos 326 e 327 do CPC), quando será dada vista à defesa por 05 dias para
manifestação exclusivamente quanto aos documentos (artigo 398 do CPC).
E há necessidade de a impugnação ser específica, apontando quais os fatos que o
postulante ataca, bem como quais os documentos e as razões de sua negativa. A
impugnação genérica assemelha-se à contestação genérica, para a qual a legislação
processual imputa os efeitos de não-contestação (do artigo 302 do CPC). Só haverá
necessidade de prova quanto aos fatos controvertidos, quando da posterior audiência
de instrução. E a litis contestatio não se forma apenas com a apresentação da inicial
e da defesa, como defende alguns [10], mas com a impugnação do autor quanto aos
fatos novos trazidos com a defesa, impeditivos, modificativos ou extintivos do seu
direito, sobre os quais também precisa haver resistência. Se o autor concorda,
expressamente ou tacitamente, com os fatos e documentos juntados com a
contestação, não haverá lide, por via reflexa necessidade de instrução (artigos 334,
II, e 372, in fine, do CPC).
Existem oportunidades, minoritárias na praxe processual, em que não há a
necessidade de impugnação do autor. E isso se dá quando a contestação não alegar
nenhuma questão nova (preliminares, prescrição ou decadência, juntar documentos
ou alegar fatos impeditivos, modificativos ou extintivos), mas restringir-se a negar
os fatos articulados na contestação – oferecendo defesa direta de mérito ou mesmo
quando se der a revelia e o seu efeito de julgamento preliminar (artigo 330, II, do
CPC). [11] [12]
4. Consequências da ausência de impugnação
6. 6
No tópico em referência analisaremos quais são as consequências jurídicas caso o
autor não ofereça sua impugnação ou réplica no prazo legal, bem assim quando
ofertá-la de forma incompleta e genérica, quando, de resto, possuem o mesmo efeito.
Embora no processo do trabalho existam aqueles que defendem que apenas se
tornam incontroversos os fatos alegados pelo autor e não-contestados pelo réu, em
análise literal do artigo 302, in fine, do CPC [13], entendemos que o artigo 334, II,
alarga a sanção para ambas as partes litigantes, tanto é que dispõe que são
incontroversos os fatos afirmados por uma e não contestados pela parte contrária. Se
quisesse que a aplicação fosse restrita, teria dito o legislador que não dependem de
prova os fatos articulados pelo autor e não contestados pelo réu (o que, com efeito,
já tinha dito nos artigos 302 e 330 do CPC, não havendo razão para a repetição no
artigo 334).
Ao contrário do que defende a jurisprudência trabalhista [14], talvez impregnada da
ideia de proteção, princípio confinado ao direito material do trabalho, entendemos,
conforme ANTONIO CARLOS MARCATO [15], que o inciso II do artigo 334 do
CPC tem aplicação para ambas as partes, seja autor seja réu. Não é só da defesa o
ônus da manifestação quanto aos fatos constitutivos articulados na inicial, mas
também do autor quanto aos impeditivos, modificativos e extintivos articulados na
defesa. No processo do trabalho, existem vozes, como MANOEL ANTONIO
TEIXEIRA FILHO [16], que, mesmo não se manifestando diretamente quanto aos
efeitos da falta de réplica, dizem que o ônus da impugnação específica pertence a
ambas as partes.
Se o fato A (constitutivo) for articulado na inicial, incumbe à defesa sobre ele se
manifestar. Se não o fizer, haverá presunção de veracidade e dispensa de instrução.
Mas se houver negativa da defesa, incumbirá ao autor a prova das suas alegações, na
esteira dos artigos 818 da CLT c/c 333, I, do CPC. O raciocínio é o mesmíssimo
quando se trata da defesa. Se o réu alegar o fato novo B (extintivo), incumbe ao
autor replicá-lo, sob pena de confissão. Se e somente se houver resistência do autor,
é que haverá lide quanto ao ponto e necessidade de instrução, ainda que o ônus da
prova do fato B fique com o réu, conforme os mesmos dispositivos citados linhas
acima, da CLT e do CPC.
A questão é bastante simples, mas gera o entendimento equivocado de que não há
nenhuma consequência se o autor deixar de replicar os fatos novos da defesa. [17] E
essa posição se dá por duas razões, a nosso sentir: pela identificação da figura do
autor da ação com a do trabalhador, reclamando proteção, por isso há benevolência
com as omissões praticadas por esse, quando não há o mesmo tratamento em caso de
a defesa deixar de manifestar-se precisamente quanto aos fatos da inicial. E não se
trata de simplicidade no primeiro caso, na medida em que referido princípio é caro
ao direito processual do trabalho e não apenas à figura do acionante, trabalhador,
diga-se. A segunda razão é a confusão que se faz entre dispositivo e norma jurídica.
Calha, aqui, a aplicação dos conceitos refinados no segundo tópico, com a
consequente construção da norma jurídica completa pelo intérprete, na medida em
7. 7
que tanto a hipótese quanto à sanção para a omissão do réu encontram-se no mesmo
texto do artigo 302 do CPC, enquanto que nos casos de manifestação do autor,
quando da réplica, as hipóteses encontram-se nos artigos 326 e 327 do CPC, mas as
sanções apenas no inciso II do artigo 334 do mesmo diploma. Compreendendo a
questão pelo posicionamento epistemológico da teoria do direito, a controvérsia
desaparece [18] e, ao mesmo tempo, com o devido respeito, expõe o equívoco no qual
laboram diversos. [19]
Outro exemplo é salutar para demonstrar a confusão da jurisprudência entre
dispositivo e norma jurídica, entendendo-se que o que se aplica aos casos concretos
é aquele e não essa. Embora a CLT seja omissa tanto quanto à necessidade de réplica
no que toca aos fatos novos articulados em defesa quanto aos documentos ofertados,
há consenso de que sobre os fatos não há necessidade de manifestação, até porque a
mora não geraria sanção, mas quanto aos documentos a omissão importa em
confissão como verdadeiros. [20] E essa posição contraditória se dá porque enxergam
apenas os dispositivos e não as normas. Enquanto no mesmo artigo 372 do CPC está
prevista a hipótese e a sanção para o caso de não-impugnação dos documentos (a
mesma ideia aplicada ao artigo 302, quanto à hipótese - necessidade de impugnação
especificada, e sanção - presunção dos fatos articulados na inicial), a jurisprudência
trabalhista aplica, mas quando a hipótese e a sanção encontram-se em dispositivos
diversos, como no caso da réplica aos fatos novos (artigos 326 e 334, II, do CPC), há
a tendência a não aplicá-la e defender-se que a omissão não geraria sanção. [21]
Se o autor não se manifestar, ou mesmo confessar expressamente os fatos novos da
defesa, conforme artigos 348 e 349 do CPC, dispensa-se a prova oral quanto ao fato
então incontroverso. [22] No processo do trabalho, MANOEL ANTONIO TEIXEIRA
FILHO entende da mesma forma que estamos a defender. [23]
E a posição que defendemos encontra ressonância da doutrina processual comum, na
linha de WAMBIER, CORREIA DE ALMEIDA e TALAMINI, para quem:
Se o réu, na contestação, se utilizar da defesa de mérito indireta, reconhecendo o fato
constitutivo do direito do autor, mas alegando outros, que sejam impeditivos,
modificativos ou extintivos do direito do autor, este será ouvido, no prazo de dez
dias, sendo-lhe facultada a produção de prova documental. Nessa hipótese, a
manifestação do autor, também denominada "réplica" ocorre para tornar litigiosas as
alegações do réu, pois se trata de fatos novos. Vale dizer, quando réu apenas nega os
fatos narrados pelo autor, somente isso já os torna litigiosos; mas, se o réu alega
fatos novos, é mister a manifestação do autor para que se tornem litigiosos. Caso o
autor silencie, o ônus da prova dos fatos alegados pelo réu, que, em princípio, lhe
tocaria (art. 333,II), desaparece, porque é desnecessária a prova acerca de fatos
incontroversos (art. 334, III). [24]
Leciona JOEL DIAS FIGUEIRA JÚNIOR: "Deixando o autor fluir em branco o
prazo decendial, fica o réu dispensado de fazer prova a respeito dos fatos novos
alegados e que foram opostos na contestação, posto que desnecessária a produção
probatória acerca de questões incontroversas". [25]
8. 8
No mesmo sentido é a conclusão de CLITO FORNACIARI JÚNIOR:
Todavia, o silêncio do autor sobre o fato extintivo deduzido pelo réu implica o
mesmo efeito que se tem a partir do silêncio do réu acerca do fato constitutivo do
direito do autor. O fato torna-se incontroverso e não precisa ser provado. A previsão
de direito de manifestação ao autor sobre o fato novo, não fora para lhe trazer efeito
negativo diante do silêncio, seria inócua e até quebraria o princípio da igualdade,
isso porque, até esse instante, as partes falaram nos autos igual número de vezes, de
modo que a nova oportunidade conferida ao autor não é de ser vista como uma
simples homenagem, mas um ônus processual, que carrega efeitos, se não for
atendido. [26]
CALMON DE PASSOS dizia que há "um ônus de impugnação atribuído ao réu, no
tocante aos fatos alegados pelo autor, em sua inicial, como igual ônus cabe ao autor
quanto aos fatos extintivos e impeditivos postos pelo réu em sua contestação,
quando sobre eles tiver de se manifestar (art. 326)." [27]
A Comissão de Juristas encarregada da redação do Anteprojeto do Código de
Processo Civil (PLS n. 166/2010) perdeu a oportunidade de colocar fim à discussão,
positivando as consequências da parte autora que não impugna a contestação. O
artigo 326 do CPC atual foi repetido integralmente na proposta do novel artigo 348,
ficando a cargo da doutrina e da jurisprudência definir, por interpretação, as sanções
processuais para o autor que não replica temporalmente a contestação, nada obstante
ressalvamos que as consequências da não-impugnação do autor já se encontram
previstas dentro do sistema de direito positivo, mas em outros dispositivos alheios ao
artigo 326, in casu o inciso II do artigo 334 do CPC (consequente da norma jurídica
completa) – sendo, por isso, que a comissão de jurista manteve intacta a redação
antiga para a futura.
As providências processuais arroladas, ao invés de formalizar em demasia o
processo do trabalho – a contragosto de sua natureza eminentemente instrumental e
simples, bem ao contrário acaba por dar-lhe maior efetividade e também segurança
às partes litigantes, dispensando-se as provas de fatos incontroversos, com isso
reduzindo o tempo gasto com audiências instrutórias e dilações inúteis, antecipando-
se a data para o julgamento de fundo, realizando o direito material da parte que tem
razão. [28] Não se pode admitir, em qualquer ramo da ciência processual, que a
pretexto do princípio da simplicidade, se sacrifique o direito das partes ao
procedimento adequado, seguro, racional, célere e eficiente, princípios também
decorrentes do devido processo legal.
ENRICO TULLIO LIEBMAN, elogiando a contribuição legislativa brasileira e
portuguesa para a ciência processual, com a fase do saneamento do processo, dentro
da qual se concede prazo para réplica e fixam-se os pontos controvertidos e que
serão objeto de prova, extirpando-se do objeto aqueles incontroversos, leciona que:
Razões várias tornam, pois, conveniente assegurar, tanto quanto possível, que não se
dê início ao conhecimento do mérito da controvérsia, senão depois de abrir e
9. 9
desembaraçar o caminho por meio da depuração, do saneamento do processo, isto
é, pela eliminação de todas as falhas, defeitos ou dúvidas que poderiam invalidá-lo.
Estas considerações tornam-se ainda mais decisivas num processo oral, em que a
instrução e a decisão do mérito devem ser feitas na audiência. A audiência, para
permitir um atento e sereno conhecimento da causa, deve ser quanto mais possível
contínua e destinar-se ao estudo de um objeto delimitado e homogêneo. [29]
Não se trata de garantir apenas ao réu o devido processo legal, penalizando o autor
com a excessiva procedimentalização do processo do trabalho, quanto mais em um
ramo em que vigora o jus postulandi e a simplicidade dos atos. A figura do autor, no
mais das vezes identificada com a do trabalhador, também ganhará com a escorreita
aplicação das ideias alhures, na medida em que terá assegurado o acesso ao amplo
contraditório, com o conhecimento dos fatos articulados na defesa, com impugnação
de preliminares, alegação de causas suspensivas ou interruptivas da prescrição,
assim como ciência de todos os fatos novos articulados na defesa, garantindo-lhe a
plenitude da prova quando da audiência designada para instrução processual, com
racionalidade e segurança jurídica. [30]
Não há violação à concentração dos atos processuais e celeridade com a admissão da
impugnação, nos limites propostos no trabalho, na medida em que já há a concessão
de prazo para impugnação aos documentos, segundo firme jurisprudência
trabalhista, quando, com algumas linhas a mais e no mesmo prazo, deverá o laborista
replicar os fatos novos articulados na defesa. Haverá sim homenagem à
concentração e celeridade, com a correta delimitação dos pontos objeto de prova.
Também não há violação à simplicidade do processo, pelo menos na forma como
entendemos esse princípio. Simplicidade não se traduz em salvo conduto para as
partes requerem ser delimitação das causas de pedir e pedido, juntarem documentos
em qualquer fase processual, produzir provas inúteis ou protelatórias. Simplicidade é
a mínima atenção ao procedimento, coerência nas alegações, produção de provas
úteis e específicas quanto ao objeto de prova, manifestação das partes e do juiz com
concisão, clareza, linguagem simples e acessível, perdendo o menor tempo possível
com os atos úteis e necessários, para concentração na concessão do direito material e
execução.
5. Conclusões
- O processo do trabalho é regulado, primordialmente, pela CLT, na qual não há
referência alguma ao instrumento processual da impugnação ou réplica, com a
ressalva de que, a partir da Lei n. 9.957 de 2000, foi criada a impugnação aos
documentos em sede de procedimento sumaríssimo apenas (artigo 852-H, § 1º, da
CLT).
- Com a omissão, duas soluções são possíveis: 1) ou não se admite o cabimento no
processo do trabalho, sequer quanto aos documentos; ou 2) vislumbra-se a aplicação
10. 10
subsidiária do CPC, em face da omissão e compatibilidade que exige o artigo
769/CLT, bem como os princípios constitucionais do devido processo legal,
contraditório e ampla defesa, instrumentalizados pela regras processuais comuns.
- Admitida a integração, haverá no procedimento ordinário trabalhista os remédios
processuais da impugnação ou réplica para manifestação quanto: I - as preliminares
do artigo 301 do CPC; II – as argüições das prejudiciais de prescrição e decadência;
III – os fatos novos alegados na contestação, impeditivos, modificativos ou
extintivos do direito do autor; IV – os documentos que acompanham a defesa.
- A forma é a verbal ou escrita, conforme se trate de audiência una ou suspensão
para prosseguimento de instrução, bem assim o prazo de 20 minutos ou 10 dias, num
e noutro caso, respectivamente.
- A impugnação precisa manifestar-se precisamente sobre os fatos e documentos,
apontando eventuais vícios e as razões da alegação, ainda que sucintamente.
- O escoamento do prazo para impugnar ou a impugnação genérica importam em
confissão do autor, dispensando-se a prova oral dos fatos então incontroversos.
- A observância do procedimento de impugnação, ao contrário de violar os vetores
da simplicidade, informalidade e concentração do processo do trabalho, acaba por
dar maior racionalidade e segurança ao procedimento, garantindo-se às partes o
acesso à ordem jurídica justa, ao devido processo legal e, para o órgão judicial,
efetividade, com a dispensa das provas inúteis, sobre fatos incontroversos,
antecipando-se a data para a prolação da sentença, desobstruindo a pauta de
instrução para novas ações, destarte, realizando o direito material da parte que tem
razão no menor tempo possível.
- São duas as razões que levam a jurisprudência trabalhista a admitir como dogma a
possibilidade de impugnação aos documentos, mas não aos fatos novos da defesa: a
pré-compreensão de que o autor da ação é sempre o trabalhador, por isso não pode o
procedimento ser dificultado, quando o princípio da proteção está confinado ao
direito material do trabalho apenas e nem sempre o autor é o trabalhador. A segunda
razão, a mais decisiva, é a de que os intérpretes não enxerguem a norma jurídica a
ser aplicada ao caso concreto, mas apenas o dispositivo de lei. Tanto isso é verdade
que a defesa genérica é apenada com confissão (artigo 302, in fine, do CPC),
contudo a impugnação genérica não, pois não enxergam a sanção que está apenas no
artigo 334, II, do CPC.
Notas
1. Realizamos uma pesquisa nas obras especializadas e nenhuma delas trata do
tema da impugnação no processo do trabalho. Por todos: BEZERRA LEITE,
Carlos Henrique. Curso de Direito Processual do Trabalho. 2ª ed. São
11. 11
Paulo: LTr, 2004. CAMPOS BATALHA, Wilson de Souza. Tratado de
Direito Judiciário do Trabalho. 3ª ed. 2 vol.São Paulo: LTr, 1995.
CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho.
Legislação complementar e jurisprudência. 31ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
SAAD, Eduardo Gabriel; SAAD, José Eduardo Duarte; CASTELLO
BRANCO, Ana Maria Saad. Direito Processual do Trabalho. Teoria e
Prática. 4ª ed. São Paulo: LTr, 2004. GIGLIO, Wagner D. Direito Processual
do Trabalho. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002. OLIVEIRA, Francisco
Antonio de. Manual de Processo do Trabalho. 3ª ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005. MARTINS, Sergio Pinto. Direito Processual do Trabalho.
Doutrina e prática forense. 17ª ed. São Paulo: Atlas, 2002. SARAIVA,
Renato. Curso de Direito Processual do Trabalho. 4ª ed. São Paulo:
Método, 2007. TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Curso de Direito
Processual do Trabalho. São Paulo: LTr, 2009, 3 vol.
2. "Art. 294. No despacho saneador, o juiz: (...) II – mandará ouvir o autor,
dentro em três (3) dias, permitindo-lhe que junte prova contrária, quando na
contestação, reconhecido o fato em que se fundou, outro se lhe opuser,
extintivo do pedido;" (Decreto-Lei n. 1.608 de 1939). Vale também referir que
desde o Regulamento n. 737 de 1850, primeira lei nacional que visava regular
o processo comercial, dando concretude ao Código Comercial do mesmo ano,
já se fazia referência à oportunidade para o autor oferecer réplica.
3. "O princípio fundamental do processo civil, que entendemos como a base
sobre a qual todos os outros se sustentam, é o do devido processo legal,
expressão oriunda da inglesa due process of law. Em nosso parecer, bastaria a
norma constitucional haver adotado o princípio do due process of law para
que daí decorressem todas as conseqüências processuais que garantiriam aos
litigantes o direito a um processo e a uma sentença justa. É, por assim dizer, o
gênero do qual todos os demais princípios constitucionais do processo são
espécies." (NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do Processo Civil na
Constituição Federal. 8ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 60).
4. Para EROS ROBERTO GRAU "o texto normativo não se completa no sentido
nele impresso pelo legislador. A ‘completude’ do texto somente é atingida
quando o sentido por ele expressado é produzido, como nova forma de
expressão, pelo intérprete. Mas o ‘sentido expressado pelo texto’ já é algo
novo, distinto do texto. É a norma. (...) as normas resultam da interpretação,
que se pode descrever como um processo intelectivo através do qual, partindo
de fórmulas linguísticas contidas nos textos, enunciados, preceitos,
disposições, alcançamos a determinação de um conteúdo normativo. O
intérprete desvencilha a norma de seu invólucro (o texto); neste sentido, ele
‘produz a norma" (Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do
direito. 4ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 30/31).
5. A norma jurídica completa, necessariamente, deve ser formada por um
antecedente (ou hipótese normativa) e um conseqüente (ou sanção) – "dado
fato F, deve-ser a consequencia C". Esse é um trabalho do intérprete,
dificultado, às vezes, por não encontrar no mesmo artigo de lei ou dispositivo
as hipóteses de fatos e as sanções decorrentes. Seria o caso do artigo 114 da
12. 12
CF/88 que descreve a hipótese, mas não traz a sanção em caso de
descumprimento. As sanções estão nos artigos 113, 122 e 485, II, do CPC.
Enfim, a norma jurídica completa que regula a competência da Justiça do
Trabalho pode ser assim enunciada: "Compete à Justiça do Trabalho processar
e julgar as ações que tenham como causa de pedir a relação de trabalho, sob
pena de, proposta perante outro ramo do Poder Judiciário, ser remetida de
ofício, com anulação dos atos decisórios, para o juízo competente; ser objeto
de conflito de competência, com reconhecimento de nulidade dos atos
decisórios; ser objeto de ação rescisória, com anulação da sentença, mesmo
que já transitada em julgado a decisão proferida pelo juiz absolutamente
incompetente".
6. ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. Da definição à aplicação dos
princípios jurídicos. 7ª ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 30/31. No mesmo
sentido: CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário. Linguagem e
Método. 2ª ed. São Paulo: Noeses, 2008. GUERRA FILHO, Willis Santiago.
Teoria da Ciência Jurídica. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. KELSEN,
Hans. Teoria Pura do Direito. 6ª ed. Trad. João Baptista Machado. São
Paulo: Martins Fontes, 1999. Vale referir, quanto a este último autor, que
embora partilhasse da mesma distinção entre o texto e o resultado da sua
interpretação, entre direito positivo e ciência do direito, para ele, os textos
eram as normas jurídicas e o resultado da interpretação eram as proposições
jurídicas, essas últimas integrantes da ciência do direito.
7. Para se evitar a abertura de discussão quanto à temas paralelos ao objeto do
artigo, vale apenas ressalvar que, modernamente, visando dar maior
racionalidade ao direito, passa a ser tarefa do jurista, quando constrói as
normas jurídicas a partir de determinado direito positivo, ordena-las dentro de
um conjunto, depurando as antinomias e as lacunas, quando o conjunto das
normas jurídicas (resultado da interpretação) passa a ocupar a estrutura de
sistema, assim considerado como uma unidade, um conjunto de elementos
ordenados entre si, segundo princípios próprios, sobre determinado ramo do
conhecimento (Kant). Para aprofundamento: CANARIS, Claus-Wilhelm.
Pensamento Sistemático e Conceito de Sistema na Ciência do Direito. 4ª
ed. Trad. A. Menezes Cordeiro. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2008.
8. "PROCESSO DO TRABALHO. RÉPLICA. PRESUNÇÃO DE
VERACIDADE DAS AFIRMAÇÕES DO CONTESTANTE.
INEXISTÊNCIA. 1. Por falta de previsão legal, o autor da ação trabalhista
não tem a obrigação de impugnar especificamente os fatos narrados na peça
contestatória, cabendo-lhe apenas manifestar sua concordância ou não com os
documentos apresentados pelo réu. 2. Assim, ainda que o autor não se
manifeste sobre fatos impeditivos, extintivos ou modificativos relatados pelo
réu em sua contestação, caberá a este último prová-los, na forma do art. 818
da CLT." (TRT 24ª Região – Tribunal Pleno – RO 0117000-
25.2003.5.24.0001 – Rel. Juiz Amaury Rodrigues Pinto Júnior – DO/MS nº
6331 de 21.09.2004, pág. 33).
9. "Se o autor não for ouvido no prazo assinalado pelo art. 326, a sentença será
tida como nula, por ofensiva ao princípio do contraditório. A nulidade ficará
13. 13
preclusa, porém, se o processo prosseguir, sem sentença imediata, e o autor
não alegar a nulidade na primeira fala que proferir nos autos (CPC, art. 245)."
(THEODORO JUNIOR, Humberto. Código de Processo Civil Anotado. 9ª
ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 224).
10. "MANIFESTAÇÃO DO AUTOR SOBRE OS DOCUMENTOS JUNTADOS
PELA DEFESA. INEXISTÊNCIA DO DEVER DE IMPUGNAÇÃO
ESPECÍFICA. A falta de impugnação específica pelo autor, em sua
manifestação sobre os documentos juntados com a defesa, não tem o condão
de tornar incontroverso o fato e confessa a parte, porquanto dita manifestação
sequer é considerada réplica no processo do trabalho, tal como consta no
artigo 302 do CPC, que resulta na confissão ficta quanto aos fatos não
impugnados. Os limites da litiscontestação são definidos, exclusivamente,
pela petição inicial e pela contestação." (TRT 4ª Região – 2ª T. – RO
0027800-74.2009.5.04.0511 – Rel. Des. Denise Pacheco – DEJT 30.03.2010).
11. "Réplica é a resposta do autor à contestação do réu. Toda vez que o
demandado, em sua contestação, tiver suscitado alguma questão nova, deverá
ser aberta oportunidade para que o autor se manifeste sobre a mesma, o que
vem previsto nos arts. 326 e 327 do CPC. É de se notar que haverá espaço
para a réplica apenas e tão-somente nas hipóteses em que o demandado tenha
suscitado alguma questão nova em sua defesa. Assim é que, limitando-se o réu
a negar o fato constitutivo do direito do autor, não haverá réplica, por absoluta
desnecessidade." (CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito
Processual Civil. 10ª ed. vol. 1. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 347).
12. A réplica é a manifestação do autor sobre a contestação do réu. A matéria
objeto da réplica é restrita à parte da contestação em que o réu argüiu
preliminares ou fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
Caso o réu tenha contestado apenas o mérito stricto sensu, não há réplica,
devendo prosseguir o processo sem manifestação do autor sobre a contestação
(NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de
Processo Civil Comentado. 9ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p.
522).
13. "São incontroversos os fatos alegados pelo autor e não contestados pelo réu,
adquirindo a presunção de veracidade (arts. 302 e 319, CPC). O fato poderá
tornar-se incontroverso quando for aceito tácita (art. 302, CPC) ou
expressamente pela parte (arts. 348 e 349, CPC)." (OLIVEIRA, Francisco
Antonio de. A Prova no Processo do Trabalho. 3ª ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2004, p. 38/39).
14. Não há no Direito Processual do Trabalho a existência da figura da réplica, de
forma que, se o autor da ação deixa de se manifestar sobre os termos da
defesa, na prática, isso nenhum efeito pode provocar. Inteligência do art. 848
da CLT. Não se aplica ao Processo do Trabalho a regra contida no art. 326 do
CPC, porque incompatível com os princípios de celeridade e concentração dos
atos. (TRT 15ª Região – 5ª T. – Processo 0197900-38.1998.5.15.0092 – Rel.
Juiz Wilson Pocidonio da Silva – DOESP 06.11.2001, p. 22).
15. "Saliente-se, ainda, em outro plano, que a dispensa de novas provas cogitada
pelo art. 334, II, pode beneficiar tanto o autor quanto ao réu, pois não se
14. 14
restringe aos fatos alegados na petição inicial, alcançando diversamente
todo e qualquer fato relevante aduzido ao longo do processo (pense-se em fato
modificativo, impeditivo ou extintivo do direito do autor, alegado na
contestação e confessado na réplica)." (Código de Processo Civil
Interpretado. São Paulo: Atlas, 2004, p. 1012).
16. "(...) entendemos que o CPC vigente atribuiu reciprocamente às partes o ônus
de impugnar, com precisão, os fatos alegados pela adversa, sempre que
tenham de manifestar-se a propósito deles. No processo do trabalho esse ônus,
não raro, produz efeitos extremamente contundentes, quanto mais não seja
para o réu que aduz, de maneira oral, em audiência, a sua resposta (CLT, art.
845)." (Curso de Direito Processual do Trabalho. São Paulo: LTr, 2009,
vol. 2, p. 930).
17. Vide nota 15, supra.
18. Seria de se enunciar a norma jurídica completa – construída pelo intérprete a
partir dos dispositivos dos artigos 326, 327, 334 e 372 do CPC e aplicável aos
casos concretos – nos seguintes termos: "Se a defesa alegar preliminares ou
fatos novos, assim considerados aqueles impeditivos, modificativos ou
extintivos do direito do autor, bem assim juntar documentos, deverá o autor
manifestar-se no prazo de 10 dias, podendo juntar também documentos novos,
sob pena de se considerar incontroversos os fatos e verdadeiros os
documentos, dispensando-se a dilação probatória".
19. "Não se aplica ao Processo do Trabalho a regra contida no art. 326 do CPC,
porque incompatível com os princípios de celeridade e concentração dos atos.
Ainda que assim não fosse, mesmo no Processo Civil, quando o réu,
reconhece o fato em que se fundou a ação, lhe opõe outro, impeditivo,
modificativo ou extintivo do direito do autor, apenas obriga ao juízo que este
último possa ser ouvido no prazo de 10 (dez) dias. Não há, mesmo no
Processo Civil, qualquer efeito caso o autor, dentro deste prazo nada diga, não
havendo presunção de veracidade do quanto foi alegado em defesa pelo seu
silêncio. Ao contrário, em regra, o juiz deverá fixar os pontos controvertidos e
determinar as provas a serem produzidas (art. 331 do CPC). Por isso, a
legislação processual trabalhista determina que, terminada a defesa, seguir-se-
á com a instrução do processo (art. 848 da CLT), claro que se outra
providência não for necessária." (TRT 15ª Região – 5ª Turma – Processo n.
0197900-38.1998.5.15.0092 – Rel. Juiz Wilson Pocidonio da Silva – DOESP
06.11.2001, p. 22).
20. DOCUMENTOS. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO. ARTIGO 372 DO
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS.
Apresentados com a defesa documentos para corroborar as alegações da
Reclamada e a parte contrária se mantém inerte quanto a estes, tem-se por
corolário a presunção da sua veracidade, fazendo-se prova contra quem foram
produzidos, assim como, para o mister para qual foram produzidos, conforme
disposição inserta no artigo 372 do Código de Processo Civil, eliminando-se a
necessidade jurídica de produção de outras provas em relação à referida
matéria. Aplicação do artigo 400, I, do Digesto Processual Civil. (TRT 23ª R.
15. 15
– RO 00511.2006.004.23.00-5 – 2ª Turma - Rel. Juiz Conv. Bruno Weiler –
DJE 18.12.2006).
21. PROCESSO DO TRABALHO. RÉPLICA. PRESUNÇÃO DE
VERACIDADE DAS AFIRMAÇÕES DO CONTESTANTE.
INEXISTÊNCIA. 1. Por falta de previsão legal, o autor da ação trabalhista
não tem a obrigação de impugnar especificamente os fatos narrados na peça
contestatória, cabendo-lhe apenas manifestar sua concordância ou não com os
documentos apresentados pelo réu. 2. Assim, ainda que o autor não se
manifeste sobre fatos impeditivos, extintivos ou modificativos relatados pelo
réu em sua contestação, caberá a este último prová-los, na forma do art. 818
da CLT.(TRT 24ª Região – Tribunal Pleno – RO 0117000-25.2003.5.24.0001
– Rel. Juiz Amaury Rodrigues Pinto Júnior – DO/MS Nº 6331 de 21.09.2004,
pág. 33). Vide, também, nota 20, supra.
22. LUIZ GUILHERME MARINONI e SÉRGIO CRUZ ARENHART, com
apoio em doutrina germânica, lecionam que: "É sabido que a confissão
(Geständnis), no direito alemão, é um instituto que exclui a necessidade da
prova, tendo ela sido equiparada, no que diz respeito aos seus efeitos, ao
instituto da não contestação (Nichtbestreinten). Não é por outra razão que
Rosenberg afirma que ‘o efeito da confissão consiste em que o fato admitido
não necessita de prova e deve ser considerado pelo magistrado como
verdadeiro na sentença, ainda que ele não esteja convencido de sua
veracidade’. Portanto, diante do art. 334, II, a confissão deve ser vista como
uma circunstância determinante da dispensa de prova do fato pela parte
contrária (art. 334, II, CPC) e a presunção de veracidade (quase absoluta)
sobre o fato confessado. Note-se, porém, que a tese de que a confissão
dispensa prova sobre fato confessado não se choca com a idéia de que o juiz
pode chegar a uma conclusão distinta da que decorre da confissão." (Prova.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 115/116).
23. "(...) os fatos narrados por uma das partes e confessados pela outra não
dependem de prova, a teor do inciso II do art. 334 do CPC. A dicção legal,
quanto a isso, é absolutamente lógica, pois o pressuposto da prova quanto aos
fatos é que, em relação a eles, haja controvérsia; se, todavia, a parte admite a
veracidade do fato, que é contrário ao seu interesse e favorável ao adversário,
resta caracterizada a confissão (CPC, art. 348), sendo, assim, desnecessária
qualquer outra prova a respeito." (Op. Cit., p. 929).
24. WAMBIER, Luiz Rodrigues; CORREIA DE ALMEIDA, Flávio Renato;
TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil. 4ª ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, vol. 1, 2002, p. 476.
25. FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Comentários ao Código de Processo Civil.
2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 4º vol., II tomo, 2006, página 457.
26. FORNACIARI JÚNIOR, Clito. Veracidade dos Fatos: o Ônus da Réplica
para o Autor. Editora Magister, Porto Alegre. Data de inserção: 27.08.09.
Disponível em: www.editoramagister.com/doutrina. Acesso: 02.08.2010.
27. CALMON DE PASSOS, José Joaquim. Comentários ao Código de Processo
Civil. Rio de Janeiro: Forense, vol. 3, 1983, p. 274.
16. 16
28. Chegando CALMON DE PASSOS a referir a um princípio processual da
impugnação específica. "O princípio é salutar, e sua admissibilidade, em
termos mais rigorosos que os vigentes no direito anterior, será arma poderosa
contra a chicana e o desnecessário e desmoralizante retardamento dos
processos." (Idem).
29. LIEBMAN, Enrico Tullio. Estudos sobre o Processo Civil Brasileiro. São
Paulo: Bestbook, 2004, p. 74.
30. Um exemplo corriqueiro pode aclarar o que estamos a defender. Poder-se-ia
imaginar a situação em que o autor da reclamação alega que trabalhava 10
horas por dia, por conseguinte pede horas extras. A contestação, sem negar o
labor em sobrejornada, bem assim não juntando documentos (cartões de
ponto), contesta o pedido ao argumento que o autor é gerente geral do
estabelecimento, encontrando-se fora do regime de controle (artigo 62 da
CLT). Se o autor não tiver prazo para réplica, como faz a jurisprudência
ortodoxa em casos tais, sequer terá conhecimento que as suas testemunhas
devem concentrar-se no fato de ser ou não gerente geral, ainda que o ônus
continue com a defesa (fato impeditivo – artigo 333, II, do CPC). Se não tiver
réplica, o autor provavelmente trará testemunhas para prova de que trabalhava
10 horas por dia, quando o ponto objeto de prova será outro. A não concessão
de oportunidade para réplica, ao invés de privilegiar a simplicidade do
processo do trabalho, protegendo o hipossuficiente, no exemplo, acaba por
violar o direito do autor de participação ativa no contraditório e na ampla
produção de prova, dialogando legitimamente durante o procedimento para a
construção da solução ideal. (Cf. LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo
procedimento. Trad. Maria da Conceição Corte-Real. Brasília: Editora UnB,
1980).
Sobre o autor
André Araújo Molina
Mestrando em Direito pela PUC/SP. Especialista em Direito do Trabalho e em
Direito Processual Civil. Diretor e Professor da Escola Superior da
Magistratura Trabalhista da 23ª Região. Bacharel em Direito pela UFMT. Juiz
do Trabalho na 23ª Região.
Como citar este texto: NBR 6023:2002 ABNT
MOLINA, André Araújo. Impugnação ou réplica no processo do trabalho. Jus
Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2605, 19 ago. 2010. Disponível em:
<http://jus.uol.com.br/revista/texto/17219>. Acesso em: 23 nov. 2010.