Beginners Guide to TikTok for Search - Rachel Pearson - We are Tilt __ Bright...
O que comemos e com quem: símbolos sociais da alimentação
1. “VOCÊ TEM FOME DE QUÊ?”
O ato de comer tem determinado instintivamente as nossas primeiras atitudes
desde o momento em que a vida se faz, portanto não poderíamos deixar de atentar
para o fato de que ele se reveste de significados muito maiores que simplesmente
suprir nosso corpo físico da energia necessária para se manter.
Mesmo entre os animais o “momento da refeição” é também um momento de
reafirmação das posições hierárquicas no grupo, a exemplo dos leões onde, mesmo
que a caçada seja feita pelas leoas, existe uma ordem na divisão da mesma, sendo
que o leão macho, líder do grupo, é o primeiro a comer. Depois, nessa ordem, as
fêmeas mais fortes, as mais fracas e os filhotes. Não se pode dizer que não há
agressividade na hora de dividir a comida – as leoas chegam a lutar entre si pelo
direito de comer primeiro. (Revista Superinteressante Edição 212 A abril/2005)
Se os animais mantêm praticamente inalterado seu comportamento em
relação à comensalidade, nós Humanos, ao contrário, alteramos com o tempo os
sentidos que atribuímos aos atos da partilha dos alimentos e nossas relações à
mesa, sendo que estes sentidos nos ajudam a organizar as regras e a hierarquia
social.
Se aceitarmos que esta distinção entre homens e animais se faz
especialmente pela possibilidade da adequação dos “sentidos que atribuímos aos
atos de partilha” considerando mudanças sociais, culturais, enfim do ambiente e das
pessoas à seu tempo, poderíamos supor que traços ancestrais de simbolismos
mantidos “à mesa” nos reportam a fatores de dominação, de inclusão e exclusão
social, grupal ou familiar. Se os animais ainda que por instinto mantêm inalterados
comportamentos que na divisão da presa denotam a sua posição no grupo naquele
momento, poderia caber a nós, portanto, avaliarmos se nos humanos alguns destes
fatores se apresentam ainda hoje pouco ou nada alterados desde os primórdios e
sempre estariam de certa maneira ligados a rituais de dominação daqueles que
detinham ou buscavam a ascensão sobre determinado grupo ou indivíduos ou até
mesmo a manutenção do seu “status” gerando barreiras que impediriam ou
dificultariam a mobilidade entre as diversas camadas sociais.
2. Portanto está aí um aspecto social de fundamental importância que é a
relação que temos com aqueles que “sentam à mesa” conosco, quando consciente
ou inconscientemente buscamos demonstrar e distinguir nossa posição na
sociedade, por meio do quê, onde e com quem comemos. Por certo que temos ali a
preocupação com o sustento do corpo, mas nossa mesa é posta de necessidades
muito além das dietéticas, estando sobretudo nos momentos do comer, também
oportunidades de reafirmarmos nossa posição social, oportunidades de ascensão e
de geração de alianças e influências.
A importância que damos não somente ao que comemos, mas
primordialmente com quem comemos pode-se observar pelo próprio significado da
palavra COMPANHEIRO (como no francês compagnon e no inglês companion)
provém de cum panem, “os que compartilham o pão”. Desde um simples cafezinho
que se oferece a um convidado ou um banquete medieval onde as grandes alianças
eram feitas e a distribuição dos lugares à mesa e dos pratos que eram servidos a
cada comensal denotavam sua distinção social, podemos observar traços culturais
onde os alimentos se transubstanciam em algo muito maior que a matéria que os
compõe, se tornando em símbolos de integração, hierarquia, identificação cultural,
histórica, como se estivéssemos comendo cultura, historia, afeto, sensações de ser
transportado para o prazeroso – desejável, a busca do alimento como compensação
de nossas incontáveis necessidades.
Mesmo que em tempos atuais esta procura pelas relações de afinidade à
mesa se torne muito mais importante que a posição social e a “modernidade” traga
então relações por convergência de gosto sem a pretensão de gerar relações
duradouras e diferenciação hierárquica; que a ascensão ao grupo social esteja muito
mais associada ao “bom gosto” do que fincada somente no poder financeiro,
permitindo que o “plebeu” venha a desfrutar, momentaneamente, da mesa dos
“senhores” e sentir-se participante de um estrato social “distinto”, mesmo assim a
Influência daquele que dá o banquete ainda esta culturalmente enraizada e o poder
de inclusão e exclusão que a gastronomia tem é fortemente sentido e usado de
maneira deliberada ou instintiva como homens ou animais que somos.
Referências
3. Carneiro Henrique S. - COMIDA E SOCIEDADE: SIGNIFICADOS SOCIAIS NA
HISTÓRIA DA ALIMENTAÇÃO - História: Questões & Debates, Curitiba, n. 42, p. 71-
80, 2005. Editora UFPR.
Corsi Rita – Antropologia e história da Gastronomia - UniFMU Faculdades
metropolitanas Unidas 2006