1.
CENTRO UNIVERSITÁRIO
“BARÃO DE MAUÁ”
Departamento de História e Geografia
Dialogus
Revista das Graduações em Licenciatura em
História e Geografia
ISSN 1808-4656
Dialogus Ribeirão Preto v.1, n.2 p.1-404 2006
2.
CENTRO UNIVERSITÁRIO “BARÃO DE MAUÁ”
Reitor
Prof. João Alberto de Andrade Velloso
Vice-reitor
Profa. Elizabeth Maria Cristina Pincerno Fávaro
Pró-Reitora de Acompanhamento e Registro Acadêmico
Profa. Ms. Maria Célia Pressinatto
Pró - Reitoria de Pós - Graduação, Extensão e Práticas Investigativas
Profa. Dra Joyce Maria W. Gabrielli
Pró Reitor Acadêmico
Prof. Esp. Dacio Leandro Campos
Pró-Reitor de Ensino
Prof. Esp. Silvio José Cecchi
Diretores de Ensino
Prof. Ms Marcelo Zini e Walter de Paula
Pró - Reitoria Administrativa
Sr. Paulo Sérgio C. Zucoloto
Coordenadora das Graduações em Geografia e História
Profa. Ms. Lílian Rodrigues de Oliveira Rosa
Comissão Pedagógica
Profa. Dulce Aparecida Trindade do Val, Profa. Dra. Dulce Maria Pamplona Guimarães,
Profa. Sara Maria Campos Soriani
Comissão Editorial
Prof. Ms. Humberto Perinelli Neto, Prof. Ms. Marcos Antonio Gomes Silvestre
Profª. Ms. Lílian Rodrigues de Oliveira Rosa
Conselho Editorial
Antônio Carlos Lopes Petean (CEUBM)
Antonio Aparecido de Souza (CEUBM)
Beatriz Ribeiro Soares (IG/UFU)
Cenira Maria Lupinacci Cunha (PUC/MG)
Charlei Aparecido da Silva (CEUBM)
Dulce Maria P. Guimarães (Unesp/Franca)
Edvaldo Cesar Moretti (UFMS)
Fábio Augusto Pacano (CEUBM)
Francisco Sergio B. Ladeira (IG/UNICAMP)
Hector Benoit (IFCH/Unicamp)
Ivan Aparecido Manoel (Unesp/Franca)
Publicação Anual/Publication
Solicita-se permuta/Exchange desired
Dialogus
Rua Laguna, n.241, Jardim Macedo/Paulista
CEP: 14.090-060 – Ribeirão Preto / SP
Dialogus (Departamento de História e Geografia – Centro Universitário “Barão de Mauá”) Ribeirão Preto, SP – Brasil, 2006.
2006, 2 – 2
ISSN 1808-4656
Capa: – Torre da antiga fábrica da Companhia Cervejaria Antarctica, Ribeirão Preto (SP), 2006. Arquivo Pessoal de Jaime Rodrigo Marques da Silva.
Jorge Luis Silva Brito (IG/UFU)
José Luís V. Almeida (Unesp/S.J.Rio Preto)
Leila Morato de Azevedo (CEUBM)
Lélio Luiz de Oliveira (Unesp/Franca)
Maria Lúcia Lamounier (Unesp/Araraquara)
Nei Oliveira de Mendonça (CEUBM)
Renato L. Marcondes (FEA/USP/Ribeira Preto)
Ronildo Alves dos Santos (CEUBM)
Silvio Reinod Costa (CEUBM)
Vera Lucia Abrão (CEUBM)
3.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.1-404, 2006. 3
Apresentação
Muitas são as expressões que indicam persistência,
continuidade e enfrentamento: “trocar o passo”, “seguir em frente” e
“levar adiante”, por exemplo. Pois bem, movidos por estas e por tantas
outras expressões próprias em sinalizar a ação humana frente à vida - a
despeito das dificuldades e obstáculos que ela contém - é que nos
dedicamos a tornar realidade mais um número da revista Dialogus.
Seguimos assim os diálogos.
A publicação deste número vem dotada de desafios. Tratou-se
de repetir as virtudes presentes no primeiro número. Ao mesmo, nos foi
imposto a interminável intenção de corrigir equívocos e aprimorar parte
daquilo que havia sido realizado. Nesta combinação fluída e desigual de
acertos e erros é que a temperança humana normalmente é testada.
Amparados num exame critico constante é que nos esforçamos para
praticar do melhor modo possível este tour de force.
Por fim, salientamos que a ocasião é especial, pois este
segundo número celebra o sesquicentenário da cidade de Ribeirão
Preto. Todavia, celebrar envolveu a seleção e divulgação de diferentes
reflexões, igualmente responsáveis por destacar temas pertinentes em
torno dos homens e mulheres que viveram e vivem neste lugar. Celebrar
foi neste periódico, portanto, um verbo cuja conjugação esteve
empregada com o ato de lembrar e de destacar.
Os esforços foram feitos, resta desejar ao leitor que aproveite
estes novos diálogos.
Comissão Editorial
4.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.1-404, 2006. 5
Apresentação do segundo volume
A revista Dialogus no seu segundo número traz o dossiê
“Ribeirão Preto”, a propósito da comemoração do seu sesquicentenário.
A opção temática e o número de artigos revelam a forte tendência de
inserção nas questões locais que as pesquisas e estudos realizados nos
cursos do Centro Universitário possuem.
A revista consolida-se e aperfeiçoa-se em inúmeros aspectos da
técnica de montagem, tanto no que diz respeito à elaboração da capa, a
diagramação como no que se refere a sua divulgação na Internet por um
link no site do Centro Universitário.
Não se pode deixar de observar que o número de artigos
escritos por alunos, em co-autoria ou individualmente, registrou uma
ampliação significante.
O trabalho inicial da revista é de autoria da Profa. Dra. Vera L.
S. Pessôa que honrou essa Instituição com sua conferência na abertura
da X Semana de História e Geografia.
Os artigos que versam sobre Ribeirão Preto voltam-se a
questões atuais polêmicas, como a do patrimônio, no meio ambiente da
habitação e do transporte coletivo. Tratam de assuntos históricos
clássicos, como da escravidão e do café, e mais recentes, como da
cana-de-açúcar e da participação política feminina.
Os demais artigos discutem pontos instigantes da Educação,
Epistemologia, Meio Ambiente, Turismo e da área da História.
Encerrando a publicação é apresentada uma resenha referente à obra do
professor Paul Singer que discorre sobre o capitalismo.
Destaque deve ser dado para o afinco do trabalho da
coordenação do curso de História e Geografia, e dos responsáveis pela
elaboração da revista Dialogus.
Reitoria do Centro Universitário “Barão de Mauá”
5.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.1-404, 2006. 7
SUMÁRIO/CONTENTS
Conferência/Conference
Pesquisa e conhecimento: construindo os “saberes”...
Research and knowledge: constructing “to know them”…
Vera Lúcia Salazar PESSÔA p.15
Dossiê "Ribeirão Preto"/Special "Ribeirão Preto"
Patrimônio cultural: reflexões para o sesquicentenário
de Ribeirão Preto
Cultural patrimony: reflections for the one hundred fifty years of
Ribeirão Preto
Lilian Rodrigues de Oliveira ROSA
Nainora Maria Barbosa de FREITAS p.31
Políticas públicas de habitação popular: os papéis da
companhia habitacional regional de Ribeirão Preto –
cohab rp no desenvolvimento urbano
Public politics of popular habitation: the papers of regional
company habitacional of Ribeirão Preto – COHAB RP in the
urban development
Silvia Aparecida de Sousa FERNANDES p.43
A bacia hidrográfica como unidade territorial para o
planejamento e gestão ambiental: estudo da bacia
hidrográfica do ribeirão Preto no município de Ribeirão
Preto - SP
The water basin as territorial unit for the planning and ambient
management: study of the hidrográphic basin of the ribeirão Preto
in the city of Ribeirão Preto - SP
Gabriel Vendruscolo de FREITAS
p.65
6.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.1-404, 2006. 8
Análise sobre o funcionamento do sistema de
transporte coletivo urbano de Ribeirão Preto-SP
Analysis on the functioning of the system of urban collective
transport of Ribeirão Preto-SP
André BARIONI p.85
O cultivo canavieiro na região de Ribeirão Preto:
história, modernização e tecnologia – 1940/1970
The sugar cane culture in the region of Ribeirão Preto: history,
modernization and technology - 1940/1970
Rodrigo de Andrade CALSANI p.101
A participação política feminina - apontamentos sobre
Ribeirão Preto
The participation feminine politics - notes on Ribeirão Preto
Paulo GARDE p.115
A saga de Ribeirão Preto na Belle Époque caipira:
modernidade e urbanização na Primeira República
The saga of Ribeirão Preto in the Belle Époque caipira: modernity
and urbanization in the First Republic
José Evaldo de Mello DOIN
Rodrigo Ribeiro PAZIANI
Josué Peroni CUELLO p.135
População escrava de Ribeirão Preto de 1870 a 1888
Enslaved population of Ribeirão Preto of 1870 the 1888
Osmar DAVID JUNIIOR p.161
7.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.1-404, 2006. 9
Artigos/Articles
Educação/Education
Políticas Públicas, Movimentos Sociais Rurais e
Processo Educacional: a ação política e pedagógica da
escola em movimento
Public Politicals, Social Rural Movements and Educational
Process: the political and pedagogic action in the school in
movement
Paulo Eduardo Vasconcelos de Paula LOPES p.179
Epistemologia/Epistemology
As expressões da barbárie no naturalismo político
The expressions of the barbarity in the naturalism politician
Luiz Rufino dos SANTOS JUNIOR p.199
Incursões pela Bélle Époque Caipira: proposta de uma
prática de História da Cidade e do Urbanismo
Incursions for Bélle Époque Caipira: proposal practical of history
of the city and the urbanism
Humberto PERINELLI NETO
José Evaldo de Mello DOIN
Fábio Augusto PACANO p.213
“Todos os caminhos me encaminham pra você”:
possibilidades interpretativas de objetos de
importância a posteriori
“All the ways direct me to you”: possibilities of interpretation
especifcs objects in history
Rafael Cardoso de MELLO
Rodrigo de Andrade CALSANI
Tiago Silva GIORGIANNI p.239
8.
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A construção do pensamento geográfico e os novos
caminhos da geografia humana no mundo globalizado
The construction of the geographic thought and the new ways of
geography human being in the global world
Marcos Antônio Silvestre GOMES p.261
Geografia/Geography
A proposta de um desenvolvimento rural sustentável
como oportunidade para o Brasil
The proposal of a sustainable agricultural development as chance
for Brazil
Tatiana de Souza Leite GARCIA
David George FRANCIS p.273
A complexidade da questão ambiental e a necessidade
de conservação do patrimônio ambiental global e local
The complexity of the ambient question and the necessity of
conservation of the global and local ambient patrimony
Marcos Antônio Silvestre GOMES
Viviane Caetano Ferreira GOMES p.301
Entendimento sobre a atividade turística nos Planos
Plurianuais dos quadriênios compreendidos entre
1996 e 2007
Agreement on the tourist activity in the Plurianuais Plans of the
quadriênios understood between 1996 and 2007
Antonio Aparecido de SOUZA p.315
9.
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História/History
Xangô e Dante na terra de Macunaíma: a questão negra
após a Escravidão
Xangô and Dante in Macunaima‟s Land: the afro-american
question in the São Paulo State
Lucas Augusto ROSA p.337
Os nossos heróis: onde estão?
Our heroes: where they are?
Bruno Lourencini PUGA p.351
Sexualidade Feminina na América Portuguesa
Feminine sexuality in Portuguese America
Jorge Luiz de FRANÇA p.365
Resenha/Review
SINGER, Paul. O capitalismo: sua evolução, sua lógica
e sua dinâmica. São Paulo: Moderna, 2005.
Paulo Eduardo Vasconcelos de Paula LOPES
André BARIONI p.385
Índice de assuntos ...................................................... p.393
Subjetc Index ............................................................... p.395
Índice de autores/Authors index .................................. p.397
Normas para apresentação de original ...................... p.399
11.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 15
PESQUISA E CONHECIMENTO: CONSTRUINDO OS
“SABERES”...*
Vera Lúcia Salazar PESSÔA**
RESUMO: A produção do conhecimento resulta de uma reflexão crítica,
a partir de um problema. A busca de resposta para este questionamento,
o domínio do referencial teórico e dos procedimentos metodológicos,
expressos nos resultados obtidos, são condições essenciais para o
pesquisador. O objetivo do presente trabalho é mostrar a importância da
pesquisa para a construção e divulgação do conhecimento científico.
PALAVRAS-CHAVE: pesquisa; conhecimento científico;
interdisciplinaridade.
Introdução
A busca pelo conhecimento é uma constante no ser humano. É
por meio dele que aprendemos a desvendar a realidade do mundo. Esse
conhecimento pode ser adquirido por leituras em livros, mapas, meios de
comunicação, conversas com amigos e parentes, observação do
cotidiano, pesquisa. Cada forma escolhida nos proporciona um
* O conteúdo deste texto foi objeto de palestra proferida pela referida professora, por
conta do lançamento deste segundo número da revista Dialogus e em decorrência das
atividades da X Semana de História e Geografia do Centro Universitário “Barão de
Mauá”, Ribeirão Preto (SP). Registram-se os agradecimentos da autora ao Prof. Dr.
Gláucio José Marafon pela leitura e sugestões que contribuíram para a construção deste
texto.
** Professora do Programa de Pós-Graduação em Geografia/Mestrado/Doutorado do
Instituto de Geografia/UFU. E-mail: vs.pessoa@terra.com.br
12.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 16
aprendizado novo. Entretanto, o caminho percorrido para obter este
aprendizado será de acordo com o objetivo estabelecido.
No caso específico de obter conhecimento por meio da pesquisa
científica, para que se possa divulgá-lo, há um caminho a percorrer. O
ponto de partida é a formulação de um problema “quando pode ser
resolvido com conhecimentos já produzidos ou com aqueles factíveis de
serem produzidos” (GUIMARÃES, 2002, p. 20). Uma vez cumpridas as
etapas, ao apresentar os resultados finais, a pesquisa estará
contribuindo para que o conhecimento seja divulgado.
Assim, o objetivo desse trabalho é mostrar a importância da
pesquisa para a construção e divulgação do conhecimento. Para cumprir
o objetivo proposto, o trabalho está organizado em quatro seções, além
da Introdução e Considerações Finais. A primeira, faz uma breve
reflexão sobre senso comum e senso crítico, considerando o senso
crítico como fundamento para o desenvolvimento da pesquisa. Na
segunda seção, mostramos que ciência e pesquisa são uma tarefa de
reflexão. Na terceira seção, discutiremos o papel da interdisciplinaridade
na pesquisa. Na quarta seção, faremos uma abordagem sobre a
universidade e a importância da pesquisa para a construção do
conhecimento.
A questão do saber: diferenciando senso comum e senso
crítico
As características que distinguem o homem dos demais seres
são o querer descobrir algo novo, a curiosidade, a capacidade de
conhecer o mundo em que vive e ter consciência de suas sensações e
seus desejos. Nesse sentido, o homem procura conhecer, de diversas
formas, o mundo que o rodeia. Essas formas de conhecimento podem
ser adquiridas por meio da observação, das crenças, dos romances, dos
filósofos e até mesmo da autoridade (GIL, 1999). Utlizando-se das idéias
do referido autor, perguntamos: como adquirir estes conhecimentos?
13.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 17
Com relação à observação, usando os sentidos, o homem
recebe e interpreta as informações do mundo exterior. Assim, quando
olha para o céu e vê nuvens escuras, sabe que vai chover. É um
conhecimento simples, mas tem seu significado.
As crenças também constituem fonte de conhecimento. Dentre
elas, podemos destacar as crenças religiosas e populares. As
benzeduras, as rezas, muito comuns entre pessoas mais velhas, as
pajelanças para curar doenças, ilustram as crenças religiosas. Saber
escolher a lua para plantar, para cortar madeira é um exemplo de
sabedoria popular.
Outra fonte de conhecimento são os romances. Qualquer que
seja sua natureza (ficção, histórico...), podem proporcionar informações
importantes sobre os sentimentos, as motivações, as pessoas, a história
dos lugares. Como exemplos, podemos citar: “Os Sertões” (Euclides da
Cunha) que nos possibilita conhecer as características físicas de parte
do sertão nordestino na história de Canudos. Na leitura de “A Viagem de
Téo” (Catherine Clément), o leitor adquire conhecimento sobre as
religiões, acompanhando Téo em sua viagem pelo mundo. Em “O Mundo
de Sofia” (Jostein Gaarder), temos uma aula de filosofia, acompanhando
as inquietações da personagem. Por meio das leituras, portanto, há
sempre algo para aprender.
Há também uma fonte conhecimento derivada da autoridade
(GIL, 1999) que é repassada pelos pais, professores, governantes,
líderes partidários, jornalistas, escritores. A visão de mundo, as normas e
procedimentos dessas “autoridades” acabam sendo verdadeiras à
medida que a sociedade as reconhecem como sua prática.
Por último, os filósofos também proporcionam importantes
elementos para compreender o mundo. Os ensinamentos dos filósofos
têm grande validade para proporcionar um adequado conhecimento do
mundo porque se fundamentam em procedimentos racional e
especulativo (GIL, 1999).
Entretanto, essas formas de conhecimento, por estarem
baseadas na observação casual dos fatos, podem incorrer em equívocos
14.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 18
porque a observação é subjetiva, não satisfazendo, portanto, aos
espíritos mais críticos. Esses conhecimentos estão no nível do Senso
Comum ou Bom Senso, ou seja, o “conhecimento do mundo real e
imaginário por meio de um conjunto de opiniões, hábitos e formas de
pensamento assistematicamente estruturado, utilizado diariamente pelos
indivíduos como forma de orientação para suas vidas” (SEABRA, 2001,
p.15).
Assim, quando o conhecimento dos fatos exige algumas
interpretações, surgem os questionamentos para fundamentar o Senso
Crítico. Nessa linha de pensamento, retomando as idéias de Seabra
(2001, p.16) dizemos que “para compreender a realidade, o Senso
Crítico busca sua essência, seu verdadeiro significado. E sua explicação
pode ser encontrada pelo emprego da ciência”. Portanto, a partir da
necessidade de obter conhecimentos mais científicos do que aqueles
oriundos do Senso Comum, desenvolveu-se a ciência. E perguntamos:
por que surge a ciência?
A ciência e a pesquisa: uma tarefa de reflexão
A ciência surge para proporcionar respostas mais seguras aos
problemas levantados, demonstrar a verdade dos fatos e possibilitar sua
aplicação prática. Entre os pesquisadores, mesmo procurando entender
a ciência por ângulos diferentes, há um consenso de que a pesquisa
científica caminha para um objetivo que é demonstrar a verdade dos
fatos, conforme já destacado. Portanto, “fazer pesquisa é desenvolver
um conjunto de atividades orientadas para a aquisição de determinado
conhecimento” (SEABRA, 2001, p.19).
Nesse sentido, as descobertas, dependendo do nível de
profundidade, causam impactos e, muitas vezes, a aceitação dos
resultados pela sociedade não é fácil. Exemplos, hoje (2006), são os
transgênicos, a clonagem de seres humanos. Outros, apenas de “riscos”,
15.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 19
surgem como “esperança”. Exemplos são as pesquisas com células-
tronco, alguns tipos de transplantes de órgãos.
Para que a pesquisa seja considerada científica, a
sistematização dos dados, o uso de métodos e das técnicas apropriadas
é importante. Ao fazer uma pesquisa, o pesquisador pode levantar
algumas questões:
1. Sobre o que quero pesquisar? (O tema/o problema).
2. Por que quero pesquisar este assunto? (A Justificativa/ A
Relevância).
3. Para que pesquisar? (Os Objetivos: geral e específicos).
4. O que a comunidade científica já sabe sobre este assunto?
(Revisão de Literatura/Referencial Teórico/Fundamentação Teórica).
5. Como vou conseguir as informações, os dados? (A
Metodologia da Pesquisa/ Os Procedimentos Metodológicos).
6. Como vou analisar as informações, os dados obtidos? (A
Análise dos Dados/ A Estatística).
7. Quanto tempo vou demorar para concluir a pesquisa?
(Cronograma).
Ao elaborar estas questões, estamos pensando no projeto de
pesquisa, isto é, um conjunto de passos sistematizados que nos levará a
buscar respostas para as inquietações propostas. Portanto, para se
elaborar um projeto é necessário [...] considerar criticamente os limites e
as possibilidades do contexto de trabalho, definindo os princípios
norteadores da ação, determinando o que queremos conseguir,
estabelecendo caminhos e etapas para o trabalho e avaliando
continuamente o processo e os resultados (RIOS, 2002, p.75).
Esta elaboração vai exigir do pesquisador muita leitura e
reflexão para encontrar a(s) resposta(s) porque fazer pesquisa é
espionar, observar paciente e atentamente durante dias e horas a fio,
como se aguarda de tocaia o momento do ataque. A investigação exige
olhos atentos e mãos sempre prontas para fazer anotações. A cada fato
16.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 20
novo uma espiada, e mais uma anotação. Falar somente o suficiente.
Ouvir e observar o máximo. É a regra (SEABRA, 2001, p.11).
Ao nos inserir no mundo da pesquisa é importante refletir sobre
as perguntas de Garcia (2003, p.21) em seu artigo “Para quem
investigamos - para quem escrevemos: reflexões sobre a
responsabilidade social do pesquisador”. No referido trabalho, a autora
pergunta:
- Pesquisamos para a academia e para as agências de fomento
ou para as escolas onde a complexidade da realidade desafia a cada dia
a competência docente?
- Pesquisamos para ganhar pontos nos relatórios internos e
externos, para publicar e vender livros, para adquirir/consolidar prestígio,
ou nossa pesquisa é parte de nosso compromisso político com a luta
pela transformação da sociedade?
- Escrevemos para nossos pares ou para as professoras que
estão na sala de aula?
- Quem, afinal, se beneficia com as nossas pesquisas e os
nossos escritos?
- Com que projeto de sociedade nossas pesquisas estão
comprometidas e a que projeto de sociedade nossas pesquisas se
opõem ou simplesmente, nos pretendemos neutros?
- Afinal, de onde falamos, para quem falamos e o que
pretendemos com nossas falas?
- Existe em nós uma preocupação em ampliar o nosso auditório
ou nos interessa apenas uma platéia seleta de iniciados? (grifos do
autor).
Os questionamentos levantados pela autora nos faz refletir
sobre a responsabilidade do pesquisador quando se propõe a
desenvolver um trabalho. Ao apresentar os resultados à sociedade, a
pesquisa torna-se um importante instrumento de disseminação do
conhecimento e lhe permitirá:
17.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 21
- compreender a realidade na qual está inserido e se posicionar
criticamente frente a ela;
- propor a transformação da sociedade porque é parte de seu
compromisso político;
- propor discussões e até mesmo soluções para o problema que
originou sua pesquisa;
- fazer com que suas idéias e conclusões sejam ouvidas por um
número significativo de pessoas.
Para que estas metas sejam alcançadas, o pesquisador deverá
dominar bem aquilo que faz, ou seja, o conteúdo e as técnicas (RIOS,
2002). No domínio do conteúdo, o método de interpretação da realidade
é importante porque está relacionado à concepção de mundo do
pesquisador, sua visão da realidade, da ciência, do movimento[...]
Refere-se a posturas filosóficas, ao posicionamento quanto às questões
da lógica[...], à ideologia e à posição política do cientista. O método é [...]
o arcabouço estrutural sobre o qual repousa qualquer conhecimento
científico (MORAES; COSTA, 1984, p.27).
O método de pesquisa é importante e representa o conjunto de
técnicas utilizadas em qualquer estudo que se faça necessário. O
método de pesquisa, portanto, relaciona-se mais aos problemas
operacionais da pesquisa que a seus fundamentos filosóficos [...] A
utilização de um método de pesquisa não implica diretamente
posicionamentos políticos ou concepções existenciais do pesquisador,
resultando muito mais das demandas do objeto tratado e dos recursos
técnicos de que dispõe (MORAES; COSTA, 1984, p.27).
Assim, o pesquisador, ao mostrar o domínio do conteúdo, das
técnicas de pesquisa e método de interpretação (visão de mundo),
divulga os resultados obtidos que podem contribuir para a compreensão
dos fatos e, através da sua disseminação, possibilitar a transformação da
realidade.
18.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 22
A interdisciplinaridade: uma prática importante na construção
do conhecimento
A discussão sobre pesquisa e conhecimento pressupõe não só
o trabalho na mesma área de atuação do pesquisador como também a
noção de interdisciplinaridade, ou seja, a integração de diferentes
disciplinas com tal disposição de saberes em que diferentes disciplinas
se fundiriam num único saber mais abrangente (VEIGA-NETO, 2002).
Nesse sentido, a interdisciplinaridade de conhecimentos é importante
para o desenvolvimento das pesquisas. Somada à interdisciplinaridade,
está a multidisciplinaridade. Tanto o sujeito coletivo (grupo) quanto o
sujeito uno (pesquisador individual) podem pesquisar utilizando a
perspectiva interdisciplinar, multidisciplinar, como interinstitucional.
Assim, a interdisciplinaridade
[...] seria um caminho para superar a compartimentalização do saber e
a dicotomização do conhecimento e a acentuada especialização,
caracterizadores da Ciência Moderna, sendo que essa superação
apenas é possível e fecunda a partir de um trabalho em equipe, onde
se forma uma espécie de sujeito coletivo (GUIMARÃES, 2002, p.15).
Essa afirmativa reforçar a importância de envolver docentes e
discentes de áreas afins que estejam em consonância com a temática da
pesquisa, mesmo tendo a convicção de que a praxis interdisciplinar não
é tarefa fácil porque cada área do conhecimento, de acordo com sua
especificidade, utilizará estratégias diversificadas no trabalho de
cooperação (NÓBREGA, 2002). Ainda nessa mesma linha de raciocínio,
Domingos Sobrinho (2002, p.56) diz que “não se rompe com a
fragmentação herdada do cartesianismo, nem se assume a
complexidade da produção dos fenômenos que nos rodeiam”. Entretanto,
para que os resultados possam atingir seus objetivos, os pesquisadores
19.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 23
precisam superar essas diferenças para realizar a tarefa de formar
futuros profissionais.
A universidade e a pesquisa: uma parceria necessária
Produzir ciência, produzir pesquisa (científica), ou seja, produzir
conhecimento é uma tarefa das Universidades. Isto porque a
Universidade é uma agência formadora da ciência e da tecnologia, assim
como configura um lugar de produção do imaginário coletivo, capaz de
articular, prática e simbolicamente, a sociedade política e a sociedade
civil. Encontramos na Universidade o lugar necessário e adequado para
desenvolver a atividade científica, da pesquisa científica entendida como
o processo criativo que visa a produção do conhecimento (TAVARES
DOS SANTOS, [199 -), p.178).
A partir desse raciocínio, a Universidade se estrutura no tripé:
ensino, pesquisa e extensão. No que tange à pesquisa, os professores,
na sua maioria, têm que dedicar parte de sua carga horária a esta
atividade, muitas vezes, aprovadas em financiamentos internos e
externos. Entretanto, a Universidade, principalmente a pública, tem
enfrentado uma crise (aqui considerada financeira). Esta crise, conforme
afirma Santos (2004, p.19), “por via da descapitalização é um fenômeno
global, ainda que sejam significativamente diferentes as suas
conseqüências no centro, na periferia e na semiperiferia do sistema
mundial”.
Nas Universidades, os Programas de Pós-Graduação Stricto
Sensu, de Iniciação Científica, os trabalhos de conclusão de curso
(TCC), as pesquisas de caráter individual e interdisciplinar dos
professores, financiadas pelos órgãos de fomento (CNPq, Fundações
Estaduais), têm contribuído para esse crescimento. Nesse sentido,
retomando as idéias de Tavares do Santos ([199-], p.186), acerca do
papel que a Universidade desempenha no contexto científico, vemos que
a Universidade não pode deixar de ser o lugar da inovação, de busca da
20.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 24
produção de um saber original e da descoberta científica, lugar da
revolução do conhecimento científico, da inovação cultural e da rebelião
cultural. Ao formar cidadãos para o tempo futuro, também a Universidade
propicia imaginar como resolver as práticas do relacionamento com o
outro e como resolver os sistemas do pensamento.
Com base nessas reflexões, o papel que a Universidade exerce
como lócus do conhecimento, do saber mostra que a produção desse
conhecimento dever ser feita com ética e competência pelo pesquisador.
Isto o torna comprometido com uma sociedade mais justa e democrática,
em que “saber e poder tenham equivalência enquanto elementos de
interferência no real e organização de relações de solidariedade, e não
de dominação, entre os homens” (RIOS, 2002, p.65). No mundo atual,
vivemos uma crise de ética e de competência. Superar isto é um grande
desafio para todos nós, mais do que pesquisadores, cidadãos
comprometidos com o social.
Considerações Finais
A partir das considerações feitas, podemos afirmar que o
processo de produção do conhecimento científico é produto de uma
reflexão crítica e é também uma atividade transformadora, quer da
realidade, quer da sociedade, produto desse conhecimento. Por meio do
conhecimento, o homem saberá exercer seu papel de cidadão, com ética
e competência, na sociedade em que está inserido. O saber crítico-
metodológico será seu suporte.
Esse conhecimento (científico), conforme já destacado, é
adquirido por meio do rigor da pesquisa porque, ao propor o problema,
somos levados a buscar no referencial teórico e nos procedimentos
metodológicos as respostas procuradas. Ao elaborar o trabalho, estamos
construindo esse conhecimento que deverá ser usado em benefício da
sociedade.
21.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 25
PESSÔA, Vera Lúcia Salazar. Research and knowledge:
constructing “to know them”… Dialogus. Ribeirão Preto, v.1, n.2, 2006,
p.15-27.
ABSTRACT: The goal of this work is to show how important research is
to building and spreading scientific knowledge, which is produced from a
critical thought on a given problem. In the process of production, both
looking for answers and mastering theoretical background and
methodological procedures are conditions, expressed in the results,
essential to the researcher.
KEYWORDS: research; scientific knowledge; interdisciplinarity.
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24.
Dossiê "Ribeirão Preto"/
Special "Ribeirão Preto"
25.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 31
PATRIMÔNIO CULTURAL: REFLEXÕES PARA O
SESQUICENTENÁRIO DE RIBEIRÃO PRETO
Lilian Rodrigues de Oliveira ROSA*
Nainora Maria Barbosa de FREITAS**
RESUMO: A preservação do patrimônio é elemento de segurança contra
toda forma de uniformização dos povos em um único modelo cultural. O
momento de comemoração do sesquicentenário de Ribeirão Preto
revela-se importante para a reflexão sobre o processo de construção
destrutiva vivida pelo município, justificado pela falta de
comprometimento da população com as práticas preservacionistas e
agravado pela falta de uma política patrimonial pública amplamente
consolidada.
PALAVRAS-CHAVE: patrimônio cultural; cidadania; Ribeirão Preto.
Os estudos e discussões sobre patrimônio cultural tornam-se
cada vez mais freqüentes no meio acadêmico. Tomado como um tema
que carece de uma abordagem multidisciplinar, geógrafos, historiadores,
antropólogos, sociólogos, turismólogos, arquitetos, pedagogos, entre
outros, debruçam-se sobre a teia de variáveis apresentadas pela
complexa questão do patrimônio cultural, envolvendo as relações entre o
homem e o meio, o conceito de paisagem, a discussão sobre história e
* Licenciada em Geografia e em História. Mestre em História pela FHDSS/UNESP.
Coordenadora dos cursos de Geografia e História do Centro Universitário “Barão de
Mauá”, Ribeirão Preto (SP).
** Historiadora. Mestre em História pela FHDSS/UNESP e Doutoranda em História pela
mesma instituição. Docente do Centro Universitário “Barão de Mauá”, Ribeirão Preto
(SP).
26.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 32
memória, sobre identidade cultural, relações socioeconômicas, qualidade
de vida e educação.
A própria amálgama entre os vocábulos e as variações de
definição sofridas pelos dois conceitos amplia ainda mais a dificuldade
de sua compreensão. O vocábulo cultura, de origem inglesa, é
resultante da síntese dos termos Kultur (vocábulo germânico do século
XVIII que definia os aspectos espirituais de uma comunidade) e
Civilization (vocábulo francês referente às realizações materiais de um
povo). A própria definição da UNESCO para o conceito de cultura, revela
indícios da origem do vocábulo:
[...] conjunto de características distintas, espirituais e materiais,
intelectuais e afetivas, que caracterizam uma sociedade ou um grupo
social [...] engloba, além das artes e letras, os modos de viver, os
direitos fundamentais dos seres humanos, os sistemas de valor, as
tradições e as crenças. (GAMARRA apud BELTRÃO, 2002)
A palavra patrimônio tem sua origem relacionada à herança
familiar, geralmente ligada aos bens materiais de uma sociedade estável.
Será na França do século XVIII que o termo patrimônio assumiu a
definição de conjunto de bens culturais de uma nação protegidos por lei,
dentro do contexto de discussão dos elementos necessários para a
consolidação do Estado-nação. Nessa fase, surgiram iniciativas relativas
a sua permanência e conservação, quando D. João V, de Portugal,
mandou inventariar o patrimônio edificado do reino para evitar sua
descaracterização, enquanto na Inglaterra realizavam-se os primeiros
estudos sobre técnicas de restauração. (BASTOS, 2004). Quanto à
institucionalização1 da preservação do patrimônio a primeira iniciativa
ocorreu a partir de 1837, quando foi criada a Comissão dos Monumentos
1 Entendemos por institucionalização da preservação do patrimônio cultural a criação
dentro do organograma do Estado-nação de órgãos governamentais cuja função
específica é cuida dessa temática nos limites territoriais do país.
27.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 33
Históricos, responsável pelos estudos dos remanescentes da antiguidade
na França.
Dentre outras ações de preservação destaca-se a da Igreja
Católica que, detentora de um rico patrimônio, já adotava algumas
medidas preventivas para a guarda deste acervo desde o Renascimento:
As sucessivas lições de Roma em favor da preservação de
monumentos e documentos sob a guarda da igreja mostram a
importância do papel eclesiástico na conservação dos bens de valor
artístico e histórico. O papa Paulo II, em 1460, proibiu a alienação dos
bens preciosos da igreja, sem licença da Santa Sé. Os Papas Eugênio
IV, Pio II e Sisto IV proibiram a exportação de estatuas antigas. Paulo
III nomeou um superintendente das antiguidades romanas. Leão XIII
providenciou a guarda dos arquivos paroquiais e bibliotecas. Pio X
chamou atenção para a importância e significado dos monumentos e
documentos históricos e artísticos, enquanto Pio XI criou, em 1923,
uma comissão permanente para a conservação do acervo dos bens
eclesiásticos. Também os arcebispos brasileiros, em 1915, no Concílio
Plenário da América latina, fizeram advertências severas, no sentido
de impedir prejuízos e descaracterização do patrimônio da Igreja.
(PIRES, 1994, p.17).
Motivados pela destruição provocada pela 1a. Grande Guerra
Mundial, ocorre em Atenas, Grécia, em 1931, a I Conferência
Internacional para conservação de monumentos históricos, gerando a
conhecida Carta de Atenas, marco para a construção de diretrizes
internacionais para a restauração do patrimônio edificado. Após a 2a.
Guerra Mundial, a ONU reconheceu o patrimônio cultural como frágil e
precioso. A partir de então, acadêmicos passaram a discutir a
necessidade de preservação do patrimônio como forma de propiciar às
nações a possibilidade de construir sua própria identidade,
manifestando-a não apenas nos bens imóveis, representados pelos
grandes monumentos tão caros à memória oficial e protegidos por leis e
instituições governamentais, mas também pelo patrimônio edificado sem
tanta expressão arquitetônica, mas de grande importância histórica,
28.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 34
como testemunho do modus vivendi do camponês, do operário e de
outros tantos trabalhadores (BURKE, 1992). Nas décadas de 1980 e
1990, ampliou-se essa discussão alargando as fronteiras do patrimônio,
redefinindo seus conteúdos e abrindo amplo espaço para o início da
valorização dos elementos imateriais, provocando um outro olhar sobre o
patrimônio como um fator de memória das sociedades.
No Brasil, em meio às remodelações urbanas do início do século
XX, quando o estilo arquitetônico era o ecletismo, caracterizado pela
mistura de estilos, com grande valorização do neoclassicismo, ocorrem
as primeiras manifestações de preocupação com a preservação do
patrimônio edificado, influenciadas pelo pensamento europeu. Nessa
fase surgem propostas de valorização da cultura nacional e dos bens
culturais, antecedendo a Semana de Arte Moderna. A partir desse
momento o patrimônio passa a ser encarado como a representação
material da nação, carregado do ideário nacionalista, portanto repleto de
simbolismo, valorizando-se o estilo neocolonial, em oposição ao
ecletismo, repudiando-se a simples importação de estilos. (BASTOS,
1992).
No governo Vargas o início da institucionalização da
preservação das referências culturais ocorreu com a criação da
Inspetoria de Monumentos Nacionais (1934) do Serviço de Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional – SPHAN (1937), substituído mais tarde
pelo Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN .
Mesmo com a criação dos conselhos estaduais e municipais de
preservação, a partir dos anos 60, fato que demonstra o aumento da
participação da sociedade civil, a institucionalização ainda ficou evidente,
já que foi destinada ao Estado a responsabilidade quase absoluta de
preservação dos bens culturais do país. Com problemas de verba, com
uma equipe pequena e falta de um amplo inventário dos bens de valor
histórico e cultural, o Estado acaba por se preocupar prioritariamente
com os grandes conjuntos arquitetônicos, ou as manifestações culturais
de maior evidência nacional e não atua de maneira fiscalizadora no
espaço dos municípios.
29.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 35
Essa mentalidade, que permanece até os dias de hoje no Brasil,
reflete o distanciamento da população em relação à necessidade de
salvaguarda do patrimônio histórico. Boa parte dos bens culturais do país
está espalhada por pequenos municípios que não passaram pelo
processo de inventário e tombamento do IPHAN e, sem fiscalização do
poder executivo municipal, perdem paulatinamente suas referências
culturais, num irreversível processo de descaracterização da identidade
cultural brasileira.
Dessa forma, a preservação do patrimônio é elemento essencial
de segurança contra toda forma de uniformização dos povos em um
único modelo cultural. Processo agravado pela mundialização do
capitalismo (Del Plata, 1997), que restringe a transmissão de geração
para geração da herança cultural. Tal fato também impede a constante
recriação e reconstrução da identidade das comunidades e grupos em
função do seu próprio ambiente, de suas relações com o meio e com sua
história, dificultando a sedimentação de um sentimento de continuidade,
que garanta a promoção do respeito à diversidade cultural e à
criatividade por meio da convivência com o outro nas várias paisagens
construídas pelo gênio humano.
Dentro desse contexto de complexas relações entre a
necessidade de preservação do patrimônio cultural como elemento
essencial de qualidade de vida e a falta de políticas públicas municipais
consolidadas para implantar ações de preservação de acordo com as
diretrizes internacionalmente aceitas, se faz necessária uma reflexão
sobre essa temática em Ribeirão Preto.
Em 19 de junho de 2006, Ribeirão comemora os 150 anos da
conclusão do processo de doação de terras para o patrimônio de São
Sebastião, ação que originou o que viria a ser o atual núcleo urbano. Do
pequeno povoado em torno de uma capela, rodeado por fazendas de
gado e de policultura para subsistência em meados do século XIX,
(LAGES, 1996) a economia ribeiropretana cresceu e se transformou na
mais representativa região produtora de café das primeiras décadas do
século XX, quando recebeu a alcunha de “capital do café”.
30.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 36
Nessa fase, a cidade tinha efetiva participação, tanto
economicamente, quanto politicamente, na estrutura de poder permeada
pela chamada política do “Café com leite”, quando foi palco da atuação
de alguns dos mais poderosos cafeicultores paulistas, os coronéis, numa
economia forjada pelo trabalho do escravo, substituído posteriormente
pelo imigrante (WALKER, 2000).
Com a crise da cafeicultura veio também a crise de identidade. A
cidade passou por várias tentativas de recuperação do seu prestígio
nacional, intitulando-se a “capital do chope”, a “capital da cultura” e, mais
recentemente, a “capital do agronegócio”. Essa necessidade de
capitanear, se reverte em situações potencialmente desastrosas do
ponto de vista da história como a forma científica da memória coletiva: a
cristalização do período áureo do café como o único foro de interesse
para a preservação do patrimônio, imbuído da intenção de resgate do
poder perdido por uma parcela da população, ou de outro lado, o
absoluto esquecimento das raízes históricas, como no Fausto, de
Goethe, (GOETHE, 1982) em que parece imprescindível destruir o velho
para construir a sociedade contemporânea.
Pensar patrimônio cultural quando Ribeirão Preto celebra o seu
sesquicentenário suscita uma série de reflexões acerca de questões
cruciais para o desenvolvimento urbano, a qualidade de vida, a
identidade e a participação política. Contudo, discutir a importância da
preservação da memória, tanto na dimensão material quanto imaterial,
dos vários grupos formadores de uma comunidade, envolve
primordialmente o orgulho que esses grupos têm da sua própria
identidade, o nível de conhecimento e conscientização sobre a
importância da valorização do patrimônio cultural para a sua própria
existência como cidadão, por meio da atuação sobre a memória,
trabalhando e mobilizando a mediação da afetividade, de forma que
invoque o passado fazendo-o vibrar como se fosse presente [...]
defendendo o ser humano do traumatismo da existência, como um
dispositivo de segurança (CHOAY, 1992, p.11-60).
31.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 37
Contudo, a destruição construtiva, embutida de forma virulenta
no corpo social ocidental a partir da Revolução Industrial e consolidada
quase como uma tradição com a mundialização do capitalismo, faz com
que as ações em prol da preservação do patrimônio cultural pareçam
elementos desconexos de grupos saudosistas compostos por uma elite
acadêmica que defende a idéia de preservação como necessária à
consolidação da identidade cultural e como um remédio, por vezes
amargo, em particular para os interesses econômicos, para a doença
social que provoca a perda progressiva das raízes históricas,
responsável pela modernização fáustica e pelo conseqüente
esquecimento coletivo, cujo resultado é o cidadão que não mais
reconhece sua imagem na paisagem, quebrando os vínculos afetivos,
tão necessários à prática da cidadania.
Nesse contexto, em particular quando se trata de patrimônio
edificado e arqueológico, se de um lado estão os acadêmicos, do outro
estão os proprietários, que reivindicam o direito a dispor livremente dos
seus bens, contra o que determina a constituição brasileira que privilegia
o interesse público em relação ao privado, no que se refere ao
patrimônio cultural. O peso dessas reivindicações não raro vem
temperado por uma combinação poderosa: interesses econômicos e
políticos eleitoreiros. Mesmo existindo um consenso em favor da
preservação, por vezes com ares de pesar pelo patrimônio perdido, este
sentimento é rapidamente suplantado pelo interesse imediatista do viver
o hoje sem restrições, mesmo que isso tenha como conseqüência a
perda da face de humanidade no meio da multidão. Esse consenso
esbarra e, em alguns casos, compactua, consciente ou
inconscientemente com:
[...] uma política cultural que idolatra a memória sob uma única
memória oficial irremediavelmente comprometida com as formas
presentes de dominação, herdadas de um passado ignorado. Fadada
à repetição e impedida de renovação (CHAUÍ, 1992, p.37).
32.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 38
Ao assumir tal postura a gestão pública do patrimônio torna-se
cúmplice do status quo, impedindo a aplicação do que prevê o artigo 216
da Constituição de 1988:
Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material
e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de
referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos
formadores da sociedade brasileira [...].
A valorização do patrimônio sintetiza a necessidade de
conservação e restauração, mas esbarra nos valores do sistema
capitalista. O destino das políticas públicas e a valorização do patrimônio
não caminham dissociados. A comunidade é o destino, o patrimônio é de
todos os cidadãos. Apreender a amplitude de que cuidar do patrimônio é
tarefa da população significa entender o papel do cidadão na
comunidade à qual pertence.
Ocupar para preservar não significa transformar em museus ou
em centros culturais todos os edifícios tombados. A valorização do
patrimônio cultural e a elaboração de projetos educativos envolvendo a
comunidade escolar permite em longo prazo olhar o patrimônio como um
instrumento de desenvolvimento local, enriquecendo a dinamicidade na
re-criação da guarda da memória.
A educação patrimonial consiste num movimento permanente de
mudança e transformação para com a comunidade que é iniciada numa
alfabetização cultural, capaz de capacitar o cidadão para compreender
sua identidade cultural e apropriar-se do seu patrimônio individual e
coletivo, estabelecendo um procedimento de preservação e identificação
cultural.
A interação com este mundo social é que permite avançar com a
percepção do universo por outro prisma, buscando a essência da
identidade do cidadão. Um dos caminhos para essa busca é realização
de ações educativas voltadas para a população freqüentadora de
instituições de memória como museus, arquivos históricos e centros de
documentação.
33.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 39
Nos museus, a educação patrimonial permite o enriquecimento
da troca de experiências entre o público e a equipe educacional. Os
museus, de maneira geral, estão direcionando os projetos de educação
patrimonial para o público escolar. Com a aplicação de políticas públicas
adequadas cresce a inserção da comunidade na construção da memória
cultural.
A inserção de projetos educativos patrimoniais pelos cursos de
ensino superior tem contribuído para integrar o jovem numa proposta de
alfabetização cultural. A rejeição de alguns jovens em interagir e por
outro lado a adesão de outros revela que o caminho é longo e cheio de
obstáculos.
Os programas curriculares das áreas da História e Geografia no
ensino médio e fundamental buscam priorizar a interação do jovem com
o estudo de novos temas com pesquisas que incluem a cultura, as
idéias, os valores cotidianos, ritos, festas, hábitos alimentares, o espaço,
as diferentes formas que os vários grupos sociais tem criado para se
comunicar. A espacialização dos problemas culturais que buscam
integrar o jovem com a educação cultural tem priorizado estágios em
museus, arquivos, centros culturais atraindo um número ainda pequeno
de jovens universitários como mediadores e educadores culturais. A
democratização desse processo depende em parte da recepção dos
projetos educativos que inserem o estudante universitário no cenário da
comunicação patrimonial.
A experiência revela que jovens ao participarem de projetos
educativos acabam inseridos na educação cultural, desenvolvendo
habilidades capazes de identificar na vida cotidiana o valor da própria
cultura.
Nos museus o objetivo da educação é criar possibilidades para
a comunicação, informação, aprendizado e conseqüentemente a
construção da cidadania (STUDART, 2004). Dentro desse aspecto, em
Ribeirão Preto são desenvolvidos projetos de estágio pelo poder público
em parceria com universidades, que trabalham com o acervo de museus
identificando e catalogando peças de acervo, em bibliotecas,
34.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 40
identificando e catalogando livros raros, em arquivos com fotografias,
monitorias, entre outras atividades que jovens estagiários voluntários ou
remunerados estão desenvolvendo junto aos museus, arquivos e casas
de cultura do município. Contudo, essas ações, muitas vezes
descontínuas estão longe de representar uma sólida e eficaz política
patrimonial.
Independentemente das escolhas políticas institucionais que
vem sendo feitas ao longo desses 150 anos (e antes deles), a
construção da identidade cultural do ribeiropretano vêm sendo
sedimentada paulatinamente. Não a identidade forjada artificialmente
pela ação dos sujeitos políticos que detêm o poder econômico e do
Estado e, muitas vezes, almejam uma cultura monolítica, mas a
identidade que respeita a diversidade cultural tocada pelo som da viola,
contada nos causos do caipira, vivida pela herança africana, lembrada
pelos sobrenomes imigrantes e alinhavada pelos vários ciclos
socioeconômicos vivenciados pela cidade, gerando bens culturais
materiais e imateriais diversos.
Esse processo deveria estar sendo acompanhado pelo
amadurecimento da reflexão e dos projetos de educação patrimonial e
conseqüente compreensão, por parte do ribeiropretano, da importância
das suas raízes como parte integrante da sua experiência cultural,
imprescindível na formação do cidadão comprometido com a sua história
e, portanto, coma comunidade a qual pertence.
ROSA, Lílian Rodrigues de Oliveira; FREITAS, Nainôra Maria Barbosa.
Cultural patrimony: reflections for the sesquicentenário of Ribeirão Preto.
Dialogus. Ribeirão Preto, v.1, n.2, 2006, p. 31-42.
ABSTRACT: The preservation of the patrimony is element of security
against all form of uniformization of the peoples in an only cultural model.
The moment of commemoration of the 150 years of Ribeirão Preto shows
important for the reflection on the process of destructive construction
35.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 41
lived by the city, justified for the lack of comprometimento of the
population with the preservation practical and aggravated by the lack of
one widely consolidated public patrimonial politics.
KEYWORDS: cultural patrimony; citizenship; Ribeirão Preto.
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DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 43
POLÍTICAS PÚBLICAS DE HABITAÇÃO POPULAR:
OS PAPÉIS DA COMPANHIA HABITACIONAL
REGIONAL DE RIBEIRÃO PRETO – COHAB RP NO
DESENVOLVIMENTO URBANO*
Silvia Aparecida de Sousa FERNANDES**
RESUMO: Buscamos neste artigo analisar a relação existente entre as
políticas públicas de habitação popular formuladas pelo Governo Federal
no período 1964-2004 e a política desenvolvida nos municípios através
da atuação da Companhia Habitacional Regional de Ribeirão Preto –
Cohab RP. Essa empresa, vinculada ao governo municipal, tem
cumprido o papel de articuladora entre os níveis de governo, no que se
refere aos trâmites para a obtenção de recursos voltados às políticas de
habitação, mesmo após a crise do sistema SFH/BNH.
PALAVRAS-CHAVE: Ribeirão Preto; desenvolvimento urbano;
habitação popular; companhia habitacional.
Introdução
A Companhia Habitacional Regional de Ribeirão Preto – Cohab
RP foi criada em 20 de novembro de 1969, pela Lei nº 2301, e tem o
município de Ribeirão Preto como acionista majoritário, com 52,79% das
* Este texto está baseado numa parte da Tese de Doutorado defendida pela autora na
FCL/UNESP/Araraquara e intitulada “Política habitacional no interior do estado
de São Paulo: a territorialização das Companhias Habitacionais”.
** Geógrafa. Mestre em Geografia pela FCT/UNESP/Presidente Prudente e Doutora em
Sociologia pela FCL/UNESP/Araraquara. Docente do Centro Universitário “Barão de
Mauá”, Ribeirão Preto (SP).
38.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 44
ações. Possui, ao todo, 21 municípios e 17 pessoas físicas compondo o
quadro de acionistas da empresa. Além de Ribeirão Preto, destacam-se
Sertãozinho e Orlândia, com 6,81% e 5,10% das ações,
respectivamente2. Essa empresa foi criada para cumprir o papel de
agente promotor junto ao Banco Nacional da Habitação, atendendo às
determinações do Sistema Financeiro da Habitação. No período 1969-
2004 implementou 249 projetos e entregou 73.488 unidades, número
bastante expressivo.3 O município de Ribeirão Preto concentra um terço
da produção: 28.291 unidades, distribuídas em 60 conjuntos
habitacionais, o que permite pensarmos a relação entre a atuação dessa
companhia e o desenvolvimento urbano.
Para entender a relação entre a criação da empresa, seu perfil
de atuação e a articulação de interesses entre os níveis de poder político
faremos um breve histórico das políticas públicas de habitação popular
no Brasil no período analisado, para na seção seguinte analisarmos a
produção dessa companhia e sua relação com o poder local.
Políticas habitacionais no Brasil: breve contextualização
As políticas habitacionais no Brasil podem ser agrupadas por
período, segundo suas características, agentes promotores, instância
decisória e origem dos recursos. Neste artigo apresentaremos as
políticas engendradas pelo governo federal no período 1964-2004, já que
2 Além dos municípios de Ribeirão Preto, Sertãozinho e Orlândia, fazem parte do grupo
de municípios acionistas: Altinópolis, Batatais, Brodowski, Cajuru, Cravinhos, Dumont,
Guará; Igaparava, Ituverava; Jardinópolis, Miguelópolis, Pontal, Sales de Oliveira, São
Joaquim da Barra, Santa Rosa de Viterbo, Santo Antonio da Alegria, Serrana e
Taquaritinga. Destes, destacamos Altinópolis, São Joaquim da Barra e Pontal, com mais
de 3% das ações. Os demais têm participação percentual próximo a 1%
3 Quando comparada às demais companhias que atuam no interior do estado de São
Paulo (Cohab Bandeirante, Campinas, Bauru, Companhia Regional de Habitação de
Interesse Social – Crhis, com sede em Araçatuba) é a empresa que com maior número
de projetos realizados e unidades entregues.
39.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 45
em 1964 a criação do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) e Banco
Nacional da Habitação (BNH) representou um marco nas políticas
federais de habitação popular. Nesse período, a formulação e
implementação das políticas de desenvolvimento urbano no país
passaram por várias modificações, quanto aos órgãos decisores e
promotores das políticas, intensidade de produção e grupos de
destinação de recursos.
Enquanto no período 1964-1986, predominam as políticas
formuladas pelo BNH, momento em que as Companhias Habitacionais
foram criadas para cumprirem o papel de agentes promotores do SFH, o
período seguinte 1986-2004 caracteriza-se pela reformulação das
políticas habitacionais no país, com a redução dos financiamentos
federais, reestruturação do SFH e estímulo à criação de agências
estaduais que cumpram o papel de agentes promotores, desempenhado
no período anterior pelas Cohabs, ocupando quase que totalmente o
lugar dessas empresas na produção de habitação social. Quando se
trata da atuação da esfera federal de governo na formulação,
regulamentação e implementação de tais políticas, temos assistido
desde a segunda metade dos anos 1980, a um processo de
descentralização, repassa-se aos estados e municípios papéis antes
cumpridos no âmbito federal.
Muitos autores avaliaram a atuação do BNH no período 1964-
1986 (MARICATO, 1987, 2001; RODRIGUES, 1989; VALLADARES,
1980, 1983) e apontaram a incapacidade desse órgão em solucionar o
problema da moradia para as famílias de baixa renda. Outros
demonstraram que, desde os primórdios da habitação popular como
política social, a preocupação central não é resolver o problema da
moradia das classes populares, mas controlar as insatisfações dos
moradores das cidades, além de garantir a implantação de um modelo
de desenvolvimento capitalista altamente excludente (BONDUKI, 1998;
OLIVEIRA, 1982; SACHS, 1999).
Ribeiro e Azevedo (1996, p.15-16) apontam cinco grandes eixos
temáticos desenvolvidos pelas pesquisas sobre o tema habitação no
40.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 46
Brasil. O primeiro grupo, a partir da segunda metade da década de 1970
abordava os aspectos macroeconômicos. O segundo eixo preocupava-se
com os aspectos técnicos da construção, buscando desvendar as
relações de trabalho e as dimensões técnicas e econômicas da indústria
da construção. O terceiro grupo discutia a construção popular e o padrão
periférico de crescimento urbano. O quarto grupo discutia a política
habitacional, no qual podemos inserir as recentes discussões acerca do
processo de descentralização das políticas habitacionais, e o quinto eixo
temático abordava a produção capitalista da moradia. Trazemos essa
classificação com um objetivo didático, pois é bastante comum a
presença de questões pontuadas por vários desses eixos temáticos nas
análises sobre o tema habitação popular no Brasil. Acrescentaríamos,
ainda, a essa classificação, um sexto eixo temático: a discussão sobre a
participação dos movimentos populares na definição das políticas
públicas de habitação, os que abordam a participação social e o
envolvimento dos movimentos populares na conquista pela moradia, o
que remete aos temas processo construtivo e autogestão, alicerçados
numa concepção de processo participativo e constituição de cidadania.
Para Valladares (1983), é possível distinguir-se quatro períodos
da produção habitacional do BNH, de acordo com a organização do
banco e das funções que cumpriu. Na primeira fase, de 1964 a 1967,
ocorreram a implantação e a estruturação do BNH como órgão central do
SFH. Na segunda fase, de 1967 a 1971, ocorreu a ampliação das
funções do banco para desenvolvimento urbano e a criação de
programas específicos para saneamento, como o Plano Nacional de
Saneamento (Planasa). Na terceira fase, 1971 a 1979 (mais longa que
os períodos anteriores), a transformação do BNH em banco de segunda
linha e a estruturação de uma rede de agentes públicos e privados que
intermediavam a relação entre o mutuário e o banco, permitiu a
ampliação da oferta de unidades habitacionais e consolidação das
políticas de desenvolvimento urbano. Nesse momento tiveram grande
importância na definição do perfil de atuação do banco os programas
Comunidade Urbana para Recuperação Acelerada (CURA) e o Planhap.
41.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 47
A partir de 1979, tem-se a quarta fase de atuação do BNH, com o
lançamento de programas voltados à população de baixa renda, como o
Programa de Erradicação de Habitação Subintegrada (Promorar),
destinado à urbanização de favelas e autoconstrução assistida e o
Programa Nacional de Autoconstrução Assistida, o João-de-Barro.
Podemos concluir que o BNH, embora apresentasse entre seus
objetivos atender aos segmentos de menores rendimentos no mercado
habitacional, esteve longe de alcançá-lo, devido a problemas de ordem
estrutural e conjuntural. Ao assumir, logo no início de sua atuação, a
função de desenvolvimento urbano, redirecionar constantemente os
recursos a serem aplicados para o mercado médio e desvincular o
sistema de amortização do sistema de reajuste do saldo devedor do
financiamento (problemas estruturais), aliado aos cenários de inflação,
arrochos salariais e grupos de interesses, acabou distanciando-se da
política a que se propôs. A contribuição significativa da política formulada
no período pós 1964 é, contudo, a consolidação da concepção de casa
própria e unifamiliar como modelo de moradia no país.
Após o BNH, o acesso à moradia para a população de baixa
renda ficou ainda mais difícil. Para Ribeiro e Azevedo (1996, p. 23), nos
anos 1990 o “sonho da casa própria” termina, inclusive para a maioria da
classe média. Isso porque, num contexto de reforma institucional do
Estado desenvolvimentista e de crescimento econômico nos anos 1980 e
1990, bastante inferiores ao apresentado na década de 1970, foi
impossível retomar as atividades imobiliárias de maneira similar ao
período de expansão do SFH.
As companhias habitacionais, concebidas como agentes
promotores do Banco Nacional de Habitação têm uma atuação
compatível com as políticas emanadas desse órgão e, posteriormente,
com as definidas por outras instâncias do Governo Federal, como o
Conselho Curador do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e o
Ministério das Cidades. Assim, vivenciam uma crise iniciada na década
de 1980, embora a extinção do banco não levou ao encerramento das
atividades dessas companhias, e sim promoveu a reestruturação das
42.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 48
mesmas. Um dos objetivos deste trabalho é apontar as estratégias
utilizadas pela Cohab Ribeirão Preto para se manter financeira e
politicamente viável na década de 1990, com parcos recursos a serem
investidos.
Podemos dizer que, no período que vai de 1985 a 1994,
assistimos no Brasil a um processo de desarticulação da política de
habitação popular, com tentativas frustradas de formulação de um novo
modelo de política, devido à crise de arrecadação do FGTS, que
resultaram na formação de um grande saldo negativo na arrecadação
líquida (chamada de rombo do FGTS). No Governo Itamar Franco (1992-
1994), a opção foi por priorizar a conclusão das obras em execução e
projetos já aprovados no governo anterior pelo Plano de Ação Imediata
para Habitação (PAIH). Houve a criação de dois novos programas: o
Habitar Brasil e o Morar Município4, com recursos oriundos do Imposto
Provisório sobre Movimentações Financeiras (IPMF), buscando
implementar outra fonte de captação de recursos.
Apenas em 1995 é que são retomados os financiamentos de
habitação popular com recursos oriundos do FGTS, com os programas
Pró-moradia, Carta de Crédito do FGTS e saneamento. Estes programas
trazem uma inovação na comercialização das unidades habitacionais: a
Caixa Econômica Federal financia até 85% do valor do imóvel e quem
efetiva o projeto é o mutuário, seja através da aquisição do imóvel pronto
(novo ou usado) ou sua construção, quando é proprietário de um lote.
Para realizar a transação imobiliária, é concedida carta de intenção de
crédito. Além dessas mudanças de cunho organizacional e da aplicação
dos recursos, novas instâncias do poder decisório foram instituídas, com
a existência de um colegiado (o Conselho Curador do FGTS) que têm
por objetivo definir as diretrizes da política e alocar recursos.
Os caminhos seguidos pela política habitacional no Brasil, nas
últimas décadas, não foram capazes de assegurar, através das ações
implementadas ou das tentativas de elaboração de um novo modelo
4 Programas existentes até 2005, mas que em 2003 receberam nova roupagem e
designação.
43.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 49
estatal de produção de moradias, a construção ideológica que estava
sendo formulada desde a década de 1940. Ao contrário, busca-se
substituir o “sonho da casa própria”, que representava a estabilidade e a
segurança do abrigo, pelo “sonho de consumo dos serviços
educacionais”, que possam garantir a (ilusão da) ascensão social,
entendida como o acesso a bens de consumo (duráveis ou não).
Nesse contexto, parte da provisão de habitações no mercado,
entendidas como atribuições do Estado durante o período
desenvolvimentista, será oferecida por empresas privadas de construção
civil, que implementam conjuntos habitacionais não institucionais,
localizados também na periferia das cidades, constituídos por unidades
habitacionais unifamiliares ou edifícios com até quatro pavimentos,
destinados ao mercado de renda média.
A atuação da Cohab-RP
Desde a entrega do primeiro conjunto habitacional pela Cohab-
RP em Ribeirão Preto em 1973, o Castelo Branco I com 181 unidades, a
produção de habitação popular por essa empresa tem sido significativa.
Mesmo nos momentos de crise do BNH ou na década de 1990, quando
houve significativa redução da produção das Cohabs, manteve a entrega
de unidades, exceto nos anos de 1975 e 1999, o que denota a grande
dinamicidade da empresa. Uma das características que auxiliou no
desenho desse perfil de atuação, foi a produção em parcerias,
significativa na década de 1990.
O município de Ribeirão Preto concentra um terço da produção:
28.291 unidades, distribuídas em 60 conjuntos habitacionais, o que
representa 38,50% do total de unidades entregues (Apêndice 1). O
município de Sertãozinho vem em seguida, com 5,38% e 3.953 casas.
Além desses, apenas Mococa conta com percentual superior a 3%
(3,25%) e os demais municípios atendidos apresentam percentual
inferior.
44.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 50
Temos como característica da produção da Cohab Ribeirão
Preto, a realização de projetos com pequeno número de unidades,
distribuída por um conjunto de municípios com pequena população
urbana. Essa pulverização da produção com mais de um projeto
implementado no mesmo município corresponde à articulação desta
empresa com o poder local, atendendo aos interesses da administração
municipal e cumprindo o papel de suporte à reprodução da força de
trabalho, numa região caracterizada pela agroindústria sucroalcooleira a
partir dos anos 1970. Cumpre, portanto, os objetivos da política
habitacional desenvolvida pelo BNH desde 1964, auxiliando na
acumulação capitalista.
A construção de unidades habitacionais, em pequenas cidades,
auxilia no processo de reprodução da força de trabalho e na
permanência da população nesses núcleos locais, que desempenham
poucas funções urbanas e se caracterizam economicamente pela
exploração da atividade agrícola, abrigando um contingente de
trabalhadores rurais, expulsos do campo, e que hoje se fixam em
pequenas cidades. (BERNADELLI, 2004, p. 336).
Com uma atuação dirigida principalmente às regiões Norte e
Nordeste do estado, a territorialização da Cohab Ribeirão Preto
evidencia o atendimento a municípios com pequena população e com a
implementação de poucas unidades, principalmente ao se afastar do
município sede. A produção de maior número de projetos e unidades
entregues em municípios com pequena população urbana, que não
apresentam o perfil das cidades médias, como Jaboticabal, Mococa,
Batatais, Olímpia, São Joaquim da Barra, Igarapava e Fernandópolis,
pode ser entendida a partir da articulação com as administrações
municipais e o papel desempenhado por esses municípios na economia
regional como já destacado.
A produção no município de Sertãozinho, por outro lado, pode
ser explicada pela concentração industrial do município, além da
proximidade físico-territorial e a participação como acionista da Cohab
Ribeirão Preto. É possível apontar que o governo local de Ribeirão Preto,
45.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 51
ao distribuir o capital da empresa por vários municípios acionistas, sem,
contudo, perder as atribuições e o poder político como acionista
majoritário, fez uso de uma estratégia política que possibilitou a criação
de fortes vínculos desses municípios à Cohab Ribeirão Preto. Assegura,
dessa maneira, uma área de atuação à empresa e oferece, em
contrapartida, ao município com pequena população urbana, o aparato
técnico para o atendimento à demanda por habitação social.
Nos primeiros anos de atuação dessa companhia, os projetos
implementados delineiam esse perfil, ou seja, privilegiaram o
atendimento aos municípios acionistas. Dos 33 projetos entregues entre
1972 e 1979, apenas 5 não se dirigiram aos municípios acionistas. Dos
conjuntos habitacionais entregues nesse período, apenas os que foram
implementados em Ribeirão Preto apresentam grande número de
unidades, considerados em seu conjunto. É o caso do Jardim Castelo
Branco, realizado em 3 fases que, somadas, totalizam 992 unidades. É
característica dos anos 1980 a produção de conjuntos com número
superior a 1000 unidades habitacionais, em geral casas térreas e
implementadas apenas no município sede5. Para os demais municípios
permanece a realização de projetos menores, considerados mais fáceis
de serem implantados, do ponto de vista técnico, pois exigem menores
áreas, reduzindo os investimentos da prefeitura municipal na doação do
terreno e instalação de infra-estrutura. Atendem também a uma
população mais reduzida, adequando-se às demandas das pequenas
cidades6.
Assim como as demais companhias do interior do estado de
São Paulo, o início da década de 1980 é o período mais dinâmico da
Cohab Ribeirão Preto, em números de projetos realizados e unidades
habitacionais entregues. Em apenas 3 anos, entre 1980 e 1982, foram
5 Temos como exemplo os conjuntos habitacionais Quintino Facci II, Antonio Marincek,
Adelino Simioni I e II e o Avelino Alves Palma.
6 Conforme entrevista realizada na Cohab Ribeirão Preto, os projetos menores têm
menores custos de implantação e são mais viáveis tecnicamente, pois facilitam os
processos de implantação, fiscalização e comercialização das unidades.
46.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 52
implementados 100 conjuntos habitacionais, atendendo a 75 municípios.
Destaca-se também, o ano de 1994, com 21 projetos totalizando 8.028
unidades entregues, o que representa 10,92% do total da população da
empresa.
Destacamos os anos de 1981-1986 e 1987/1994, com 40% e
36% do total de unidades entregues, respectivamente. Há uma
significativa queda no período seguinte, 1995-2004, com 7% do total.
(Gráfico 1). Lembramos que, no mesmo período, outras Cohabs não
tiveram qualquer nova incorporação, em decorrência da impossibilidade
de obtenção de recursos junto ao FGTS (FERNANDES, 2005).
GRÁFICO 1
Cohab Ribeirão Preto
Produção por período de atuação, segundo o
número de unidades 1970-2004
Fonte: Pesquisa de campo
Apesar da crise do Sistema Financeiro da Habitação e a
redução nos financiamentos federais, na segunda metade da década de
1990, a produção da Cohab-RP foi assegurada pela vinculação dessa
companhia à administração municipal de Ribeirão Preto, na realização
de projetos de regularização fundiária e intervenção em favelas (Tabela
1), além das parcerias com a CDHU e iniciativa privada, que contaram
1% 16%
40%
36%
7% 1970 – 1974
1975 – 1980
1981 – 1986
1987 – 1994
1995 – 2004
47.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 53
com financiamento pela Caixa Econômica Federal, através do programa
Carta de Crédito Associativo.
TABELA 1
Cohab Ribeirão Preto – Lotes urbanizados – 2004
Nº MUNICÍPIO NOME DO
LOTEAMENTO
Nº DE
UNIDADES
ANO DE
ENTREGA
01 Ribeirão Preto Jd. Florestan
Fernandes
1541 1995/1996
02 Ribeirão Preto Jd. Diva Tarlá de
Carvalho
1853 1995
03 Ribeirão Preto Jd. Parque dos
Flamboyans
1391 1997
04 Ribeirão Preto Jd. Parque dos
Servidores
1883 1997
05 Sertãozinho Jd. Luiz Carlos Zequim 394 1997
06 Ribeirão Preto Jd. Ipiranga 227 1997
07 Franca Jd. Panorama 71 1996
08 Ribeirão Preto Jd. Oreste Lopes de
Camargo
904 1994
09 Ribeirão Preto Jd. Heitor Rigon 1756 1994
10 Ribeirão Preto Jd. Léo Gomes de
Moraes
30 2004
TOTAL 10050
Fonte: Pesquisa de campo, Cohab-RP
Mesmo com as dificuldades impostas pelo Governo Federal às
Cohabs, na obtenção de recursos para o financiamento habitacional, a
partir de 1993, as parcerias com o capital privado e administração
municipal têm possibilitado à Cohab Ribeirão Preto manter sua
produção.
48.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 54
Essa empresa também realizou projetos em parceria com a
CDHU, para construção de unidades habitacionais em mutirão. É o caso
do Jardim Paiva, implementado na cidade de Ribeirão Preto a partir de
1992, em 4 etapas.
O comércio de lotes urbanizados, em projetos de iniciativa de
empresas construtoras privadas em que a Cohab participa apenas com a
sua “carteira de clientes”7 na fase de comercialização dos imóveis,
também tem sido uma estratégia utilizada pela Cohab Ribeirão Preto nos
anos recentes. A Tabela 1 evidencia que, a partir de 1995, a venda de
lotes urbanizados em que a total responsabilidade pelo empreendimento
é do incorporador imobiliário, neste caso a empresa construtora,
assegura uma produção significativa. Nesses projetos, a Cohab exerce o
papel de corretor imobiliário, realizando um cadastro dos interessados na
aquisição dos lotes urbanizados, com renda familiar mensal a partir de 2
salários mínimos, e posterior comercialização. Recebe, por isso, uma
taxa de administração cujo percentual é negociado em cada
empreendimento. Para cumprir tal atribuição foi necessário que a
empresa passasse por uma reestruturação interna, criando um setor
responsável por parcerias, que junto com o setor de projetos técnicos
viabiliza, essas realizações. Cabe ressaltar que, apesar dessas
tentativas, esses projetos não garantem grande volume de recursos à
Cohab, a ponto de impedirem a vulnerabilidade financeira da empresa.
Nesses projetos, fica bastante evidente o comprometimento das
Companhias Habitacionais junto às administrações municipais,
garantindo visibilidade aos projetos do poder público municipal, após a
extinção do BNH.
7 Conforme entrevista realizada na Cohab Ribeirão Preto, em 15 de setembro de 2004.
(RESTINO, 2004).
49.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 55
Considerações Finais
Embora as Cohabs sejam criadas com estatuto semelhante e
visando ao mesmo objetivo, isto é, atender aos municípios no provimento
de unidades habitacionais, é possível afirmar que, em sua
territorialização, lançam mão de diversas estratégias políticas que
resultaram em uma re-regionalização do estado de São Paulo, não
seguindo a região administrativa, que parece ter orientado a criação das
companhias no estado, mas a sua própria articulação de interesses.
A maneira como as Companhias Habitacionais foram
constituídas atrela-as a dois níveis de poder decisório: o Governo
Federal, que define as diretrizes e os recursos para habitação popular, e
o executivo municipal, em particular dos municípios acionistas das
empresas, pois nomeiam o presidente. Dessa forma, a Cohab liga-se
diretamente à administração pública local, apesar de não ter o estatuto
de autarquia municipal e sim de empresa de economia mista. Com isso,
o privilegiamento dos interesses do município sede no encaminhamento
dos projetos e na realização dos empreendimentos.
Assim, consideramos em nossa análise a variável “municípios
acionistas” como indicativa da articulação de interesses entre as
diretrizes da empresa e a prefeitura municipal, na definição dos projetos
realizados.
É na primeira metade da década de 1980 que se concentra o
maior número de projetos e unidades implementadas pela Cohab RP.
Isso decorre, a nosso ver, de dois fatores: i) a entrega de conjuntos
iniciados na década de 1970; ii) a existência de programas alternativos
veiculados pelo BNH, que visavam à ampliação da oferta de unidades de
habitação social mediante a redução do custo final do projeto e tiveram,
por conseqüência, a redução da área construída e da qualidade do
imóvel, além da ênfase aos projetos de construção por mutirão ou
autoconstrução. Isso se constitui num paradoxo da política federal de
habitação, no momento em que se evidenciam os sinais de crise do
sistema de financiamento do Banco Nacional de Habitação e inúmeras
50.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 56
críticas lhe são dirigidas por privilegiar investimentos em obras de
desenvolvimento e saneamento urbano.
Consideramos importante ressaltar que, apesar de uma
produção mais significativa nos anos destacados, o que marca a atuação
da Cohab Ribeirão Preto é o caráter contínuo das atividades, com a
entrega de pelo menos um conjunto habitacional por ano, mesmo nos
períodos de crise do Sistema Financeiro da Habitação.
O perfil de atuação da Cohab Ribeirão Preto é revelador e nos
auxilia a construir a seguinte tese: se por um lado, as Companhias
Habitacionais são dependentes de políticas e recursos definidos pela
instância federal de poder, por outro, estabelecem estratégias de
atuação permeadas pela articulação de interesses entre o poder local e
os representantes do setor privado.
Assim, apesar do delineamento da política federal de
descentralização das políticas habitacionais e exclusão das Companhias
Habitacionais do processo de implementação de projetos com recursos
federais, em vigor desde a década de 1990, com o objetivo de inviabilizar
política e financeiramente a atuação dessas companhias, assiste-se, a
partir da segunda metade dessa década, a um novo arranjo político, com
a incorporação de novos passos ao minueto da política habitacional
brasileira, em que as Cohabs buscam novos parceiros na realização de
seus projetos e reafirmam seu papel nas políticas de desenvolvimento
local.
Dentre as estratégias utilizadas pela Cohab Ribeirão Preto, que
corroboram essa afirmação, destacamos: i) o fortalecimento da
articulação com as administrações municipais na definição de políticas
locais de habitação popular em que a companhia participe como agente
promotor, definindo parcerias com empresas construtoras privadas.
Nesse caso, as Cohabs participam com os conhecimentos técnicos
adquiridos na definição da demanda, comercialização das unidades e
administração do contrato. ii) parcerias estabelecidas diretamente com o
poder público municipal, em projetos emergenciais como a regularização
fundiária e a intervenção em favelas, ou através de programas federais,
51.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 57
como o Programa de Arrendamento Residencial. Este programa, que
inova a política habitacional no período analisado neste artigo, com a
oferta de imóveis para arrendamento, oferecendo a opção de compra do
imóvel após o final do contrato tem possibilitado novos empreendimentos
para as Cohabs Bauru, Campinas e Ribeirão Preto, em parceria com as
administrações municipais, uma vez que os recursos do programa são
dirigidos aos municípios e não às Cohabs. iii) reestruturação
administrativa, com a redução do número de funcionários das empresas
e tentativa de redução da inadimplência, visando à redução do déficit
fiscal. Esta estratégia objetiva, por um lado, a viabilidade financeira da
empresa, e, por outro lado, garantir a permanência dos seus papéis
político-institucionais.
A partir desses apontamentos, é possível dizer que mesmo com
as diretrizes de descentralização da política habitacional, estabelecidas
pelo Governo Federal, desde a segunda metade da década de 1980, que
incluem a proposta de encerramento das atividades das Cohabs
enquanto agentes promotores há a manutenção dos papéis dessas
empresas, quando vinculadas diretamente ao poder local, apesar da
redução dos empreendimentos realizados. Na concepção dos órgãos
centrais, essas companhias foram criadas para atuar como agentes
financeiros e promotores do BNH e suas funções deveriam ser
encerradas junto com o banco. As medidas tomadas durante o Governo
de Fernando Henrique Cardoso tanto com a aprovação da Lei 10.150, de
22 de dezembro de 2000, que contribuiu com essa política na medida em
que permitiu a quitação dos financiamentos dos contratos cobertos pelo
FCVS, assinados até 31 de dezembro de 1987, e a incapacitação das
Cohabs na obtenção de recursos do FGTS, em 1993, apontam nessa
direção.
Essa perspectiva nos leva a concluir: se, por um lado, as
Companhias Habitacionais são dependentes de políticas e recursos
definidos pela instância federal de poder, o que as tornam vulneráveis às
políticas engendradas nessa esfera do poder decisório, por outro,
estabelecem estratégias de atuação permeadas pela articulação de
52.
DIALOGUS, Ribeirão Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 58
interesses com o poder local, visando à perpetuação de seu papel
institucional e de sua existência como empresas. Destarte, com a política
federal de descentralização das políticas sociais e exclusão das
Companhias Habitacionais como agentes promotores e financeiros, em
vigor desde a década de 1990, assiste-se à configuração de um novo
arranjo político, em que a Cohab Ribeirão Preto busca novos parceiros
na realização de seus projetos e reafirma seu papel nas políticas de
desenvolvimento local.
FERNANDES, Silvia Aparecida de Sousa. Public politics of popular
habitation: the papers of regional company habitacional of Ribeirão Preto
– COHAB RP in the urban development. Dialogus. Ribeirão Preto, v.1,
n.2, 2006, p.43-63.
ABSTRACT: We search in this article to analyze the existing relation
enters the public politics of popular habitation formulated by the Federal
Government in the period the 1964-2004 and politics developed in the
cities through the performance of Regional the Habitacional Company of
Ribeirão Preto - Cohab RP. This company, tied with the municipal
government, has fulfilled the articuladora paper enters the government
levels, as for the proceedings for the attainment of resources directed to
the habitation politics, exactly after the crisis of system SFH/BNH.
KEYWORDS: Ribeirão Preto; urban development; popular habitation;
habitacional company.
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APÊNDICES:
Apêndice 1: Cohab Ribeirão Preto – Produção por município – 2004
Nº MUNICÍPIO Nº DE
CONJUNTOS
% TOTAL
UNIDADES
%
01 Altair 02 0,80 108 0,15
02 Altinópolis 03 1,20 338 0,46
03 Americana 02 0,80 944 1,29
04 Araraquara 01 0,40 500 0,69
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da Alegria
67 São Carlos 03 1,20 1590 2,16
68 São Joaquim
da Barra
03 1,20 1463 1,99
69 São Simão 04 1,60 697 0,94
70 Serrana 02 0,80 398 0,54
71 Sertãozinho 09 3,60 3953 5,37
72 Severínia 02 0,80 380 0,51
73 Santa Cruz
das Palmeiras
05 2,00 908 1,23
74 Tabatinga 01 0,40 123 0,16
75 Tambaú 03 1,20 649 0,88
76 Tarumã 01 0,40 337 0,45
77 Terra Roxa 01 0,40 84 0,11
78 Turmalina 02 0,80 144 0,19
79 Urânia 01 0,40 93 0,12
80 Vargem
Grande do Sul
01 0,40 183 0,24
81 Viradouro 04 1,60 605 0,82
82 Votuporanga 01 0,40 523 0,71
TOTAL 249 100,00 73488 100,00
Fonte: Pesquisa de campo
58.
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A BACIA HIDROGRÁFICA COMO UNIDADE
TERRITORIAL PARA O PLANEJAMENTO E GESTÃO
AMBIENTAL: ESTUDO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO
RIBEIRÃO PRETO NO MUNICÍPIO DE RIBEIRÃO
PRETO - SP
Gabriel Vendruscolo de FREITAS*
RESUMO: Pretende-se com este artigo apresentar uma metodologia de
trabalho que estabelece a bacia hidrográfica como unidade de
planejamento e gestão ambiental, as vantagens e desvantagens desta
abordagem e algumas técnicas para realização do diagnóstico físico de
bacias utilizando como exemplo a área de drenagem do ribeirão Preto e
das sub-bacias dos córregos Laureano, Retiro Saudoso, Tanquinho e
dos Campos, no município de Ribeirão Preto – SP.
PALAVRAS-CHAVE: Planejamento, Gestão Ambiental, Bacia
Hidrográfica
Introdução
O desenvolvimento urbano desse final de século XX tem
produzido impactos significativos sobre a qualidade de vida nas cidades
de médio porte e neste contexto insere-se o município de Ribeirão Preto,
pertencendo à uma das regiões de maior desenvolvimento do Estado de
São Paulo e do Brasil. A cidade cresce rapidamente e horizontalmente,
*
Arquiteto e Urbanista. Especialista em geoprocessamento pela UFSCAR. Docente do
Centro Universitário “Barão de Mauá”, Ribeirão Preto (SP).
59.
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vendo a cada dia, o seu perímetro urbano expandir-se, com o surgimento
de novos condomínios e loteamentos em áreas periféricas.
Em contrapartida a este desenvolvimento identificamos, a cada
ano, o crescimento dos problemas socioeconômicos e ambientais
causados pelas enchentes em vários pontos da cidade.
Segundo Tucci; Porto; Barros, (1995, p.14) “o crescimento
urbano produz o aumento na freqüência e nos níveis de inundação”. Os
autores mencionam que no Brasil ocorre um crescimento sem
planejamento, de forma irresponsável e sem as devidas precauções com
a drenagem urbana.
Para Viessman; Harbaugh; Knapp (1972, apud Villela, 1975), a
bacia hidrográfica é uma região definida topograficamente, drenada por
um curso d‟água ou um sistema conectado de cursos d‟água tal que toda
vazão efluente seja descarregada através de uma simples saída.
A bacia hidrográfica pode ser entendida também como uma
unidade ecossistêmica e morfológica que permite a melhor análise e
entendimento dos problemas ambientais, portanto pode ser utilizada para
o ordenamento do território e da gestão ambiental.
Segundo Lanna (1995), a gestão ambiental é um processo de
articulação que abrange diversos setores da sociedade, buscando
objetivos comuns em um espaço determinado.
A gestão de bacias hidrográficas, portanto, fundamenta-se no
conceito da gestão ambiental, tornando como objeto de estudo as
regiões determinadas topograficamente pelas bacias hidrográficas.
Lorandi e Cançado (2002, p.37), concebem que o planejamento
e o gerenciamento de bacias hidrográficas têm de “incorporar todos os
recursos ambientais da área de drenagem e não só o hídrico; adotar uma
abordagem de integração dos aspectos sociais, econômicos e políticos,
com ênfase nos primeiros e incluir os objetivos de qualidade ambiental
para a utilização dos recursos, procurando aumentar a produtividade dos
mesmos, ao mesmo tempo, diminuir os impactos e riscos ambientais na
bacia de drenagem”. Os autores enfatizam a integração de todos os
aspectos que abrangem a sociedade, com o meio físico onde vivem.
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A adoção das bacias como unidade de planejamento representa
vantagens e desafios a serem superados (Lanna 1995, p.51).
Vantagens:
1 Objeto que proporciona uma gestão integrada do ecossistema e um
instrumento de aplicação dinâmico, que pode variar de acordo com
os imprevistos do projeto.
2 Rede de drenagem como termômetro das relações causa e efeito.
3 Fácil detecção dos resultados e de algum desequilíbrio do sistema,
utilizando a rede de drenagem e a qualidade da água como
reguladores dos recursos naturais.
Desvantagens:
1 Limites administrativos dos municípios não batem com os limites das
bacias, tornando algumas ações integradas dificultadas por
interesses políticos.
2 Espaço de trabalho é diverso e o planejamento ambiental deve
flexibilizar seus limites, de forma a considerar as inter-relações nos
seus diversos níveis (SANTOS, 2004).
Podemos estabelecer quatro etapas para o planejamento da gestão de
bacias hidrográficas:
1. A ação: desenvolver, ordenar, urbanizar, aproveitar os recursos;
2. O objeto: a bacia hidrográfica, os recursos naturais nela existentes,
as áreas urbanas e rurais que abrangem os limites topográficos da
bacia.
3. O objetivo específico: qualidade da água e dos fundos de vale,
conservar e proteger os recursos naturais, ordenamento do uso do
solo, controle das enchentes.
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