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DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 1
CENTRO UNIVERSITÁRIO “BARÃO DE MAUÁ”
DIALOGUS
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2 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011.
FICHA CATALOGRÁFICA
DIALOGUS (Graduações em Geografia, em História e em Pedagogia...
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PREFÁCIO
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  1. 1. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 1 CENTRO UNIVERSITÁRIO “BARÃO DE MAUÁ” DIALOGUS revista das graduações em licenciatura em História, Geografia e Pedagogia ISSN 1808-4656 Ribeirão Preto v.7 n.2 2011 p.1-133
  2. 2. 2 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. FICHA CATALOGRÁFICA DIALOGUS (Graduações em Geografia, em História e em Pedagogia – Centro Universitário “Barão de Mauá”) Ribeirão Preto, SP – Brasil, v.7, n.2, ago/dez 2011. Semestral 14,7 X 20,7. 133p. 2011, 7-2 ISSN 1808-4656 1. Educação. 2. História. 3. Geografia I. Centro Universitário Barão de Mauá. II. Cursos de Graduação em Licenciatura em História, em Geografia e em Pedagogia. CAPA: “Evolução da Educação”, autoria: Sandra Araújo DIALOGUS é uma publicação semestral dos cursos de História e Pedagogia mantidos pelo Centro Universitário Barão de Mauá, Ribeirão Preto, SP. Solicita-se permuta. As opiniões emitidas são de responsabilidade dos autores. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desde que citada a fonte. EXPEDIENTE Reitora Profª. Me. Maria Célia Pressinatto Pró-Reitoras de Ensino Profª. Drª. Dulce Maria Pamplona Guimarães e Profª. Drª. Joyce Maria Worschech Gabrielli Diretores Sr. José Favaro Júnior Sr. Guilherme Pincerno Favaro Sra. Neusa Pincerno Teixeira Srª. Elizabeth M. Cristina Pincerno Favaro e Silva Sr. Carlos César Palma Spinelli Sr. Marco Aurélio Palma Spinelli Departamento Didático Pedagógico Profa. Esp. Dulce Aparecida Trindade do Val Prof. Ms. Geraldo Alencar Ribeiro Coordenadora da Graduação em História Profa. Ms. Lilian Rodrigues de Oliveira Rosa Coordenador da Graduação em Pedagogia Prof. Ms. Cicero Barbosa do Nascimento Comissão Editorial Prof. Ms. Cícero Barbosa do Nascimento Profa. Esp. Cláudia Helena de Araújo Baldo Profa. Dra. Lilian Rodrigues de Oliveira Rosa Prof. Ms. Rafael Cardoso de Mello Conselho Editorial Andréa Coelho Lastória, profª Drª Antônio Aparecido de Souza, prof. Ms. Antônio Carlos Lopes Petean, prof. Ms. Beatriz Ribeiro Soares, profª Drª Charlei Aparecido da Silva, prof. Dr. Dulce Maria Pamplona Guimarães, profª. Drª. Edvaldo Cesar Moretti, prof. Dr. Fábio Augusto Pacano, prof. Ms. Fábio Fernandes Villela, prof. Dr. Francisco Sergio Bernardes Ladeira, prof. Dr. Ivan Aparecido Manoel, prof. Dr. José William Vesentini, prof. Dr. Aparecida Turolo Garcia, profª Drª José Luís Vieira de Almeida, prof. Dr. Lélio Luiz de Oliveira, prof. Dr. Marcos Antonio Gomes Silvestre, prof. Ms. Marilia Curado Valsechi, profª Drª Maria Lúcia Lamounier, profª Drª Nainora Maria Barbosa de Freitas, profª Drª Pedro Paulo Funari, prof. Dr. Renato Leite Marcondes, prof. Dr. Robson Mendonça Pereira, prof. Dr. Ronildo Alves dos Santos, prof. Dr. Sedeval Nardoque, prof. Dr. Silvio Reinod Costa, prof. Dr. Solange Vera Nunes Lima D’Água, profa. Dra. Taciana Mirna Sambrano, profª Drª
  3. 3. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 3 PREFÁCIO Prefaciar a Dialogus é sempre extremamente prazeroso pois é o momento em que temos em mãos, concretamente, os desdobramentos e os resultados da nossa produção acadêmica e a sua divulgação, objetivos fundamentais da institui- ção universitária. Abre este número uma entrevista concedida pela profª. drª. Maria de Fáti- ma C. G. de Matos sobre a história das artes visuais em nossa cidade. Logo em seguida é apresentado um dossiê sobre a educação brasileira no século passado. O primeiro artigo de autoria de Ramires S. T. Carvalho, centra-se na formação do- cente destacando a importância da construção de sua identidade profissional. O segundo da professora Daniele M. Carvalho e profª. drª. Filomena E. P. Assoline volta-se também à formação docente priorizando as suas memórias de leitura. Compondo ainda este dossiê, contamos com o artigo de Luís Fernando de Oliveira que traça uma correlação entre a crise dos valores básicos no chamado mundo pós-moderno e a educação brasileira à luz do pensamento de Nietzsche. Outros dois artigos discorrem sobre aspectos da história da religião cató- lica em nosso país. O do esp. Rafael J. Silveira que se debruça sobre a resistência católica diante das propostas da concepção liberal de educação no período que vai de 1930 até o início da década de 1960 e o da profª. drª. Lilian R. de Oliveira Rosa que se propõe compreender as estratégias de negociação entre a Igreja católica brasileira, a Santa Sé e o Estado nos primeiros anos da República. O prof. esp. Moreno, em seu artigo Descartes e sua descoberta da subs- tância espiritual, discute alguns aspectos, como o racionalismo, a dúvida radical, o espírito e a matéria, na filosofia cartesiana. A nova lei do aviso prévio, em uma perspectiva histórica, é abordada pelo Bel. Marco Antônio Batista. Mais uma vez, portanto a Dialogus aprimora-se com trabalhos de qualida- de que nos trazem informações, provocam crítica, reflexão e, o mais importante, impulsionam novas pesquisas. Reitoria do Centro Universitário Barão de Mauá
  4. 4. 4 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. Apresentação do segundo número do sétimo volume A cada vez que vemos materializados artigos, entrevistas e demais textos em nossa revista, mais temos a certeza de que nosso caminho foi bem trilhado, bem conduzido. A entrega deste volume cristaliza a importância que a Revista Dialogus adquiriu ao longo destes sete anos no Centro Universitário Barão de Mauá, para não citar a região de Ribeirão Preto e o Brasil. Assumimos estas esferas de importância na medida em que nossos cola- boradores advém das mais variadas Instituições de Ensino Superior do país. São professores e pesquisadores provenientes de universidades e faculdades públicas (estaduais e federais) e privadas, participando efetivamente destes diálogos interdisciplinares – marca de nosso periódico – das áreas de Educação, Epistemologia e História. Destacamos neste segundo número de 2011 a entrevista de Adriana Silva com Maria de Fátima Costa Garcia de Matos. Uma lição sobre arte e sobre as relações da entrevistada com o universo artístico. O nosso dossiê, desta vez, focou nas questões educacionais. “A educa- ção brasileira no século XX”, foi o tema que movimentou nossos colaboradores. Iniciamos com Ramires Santos Teodoro Carvalho e a sua produção sobre a trajetó- ria da profissão professor, ao longo do último século. Já Daniele Machado Carvalho e Filomena Elaine de Paiva Assoline nos emprestaram suas ideias quanto as me- mórias de leituras e a formação dos professores em sua fase inicial. Fechando o nosso dossiê, Luis Fernando de Oliveira escreve sobre educação e ética no Brasil, a partir dos preceitos da filosofia de Nietzsche. Os demais artigos são igualmente ricos, cada qual com sua temática, ob- jeto e problematizações. Rafael José da Silveira produz um interessante artigo sobre a resistência católica frente ao discurso neoliberal. Outro texto que se fez presente nesta edição se faz no campo da epistemologia – “Descartes e a descoberta da substância espi- ritual”, do autor Luis Carlos Moreno. Marco Antonio Batista analisa a urgente ques- tão sobre o aviso prévio e a história do Direito do Trabalho, e, finalizando este segundo número do ano de 2011, Lilian Rodrigues de Oliveira Rosa avalia a com- plexa relação entre o Estado brasileiro, a Santa Sé e a Igreja Católica durante os idos de 1889 a 1991. Comissão Editorial
  5. 5. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 5 SUMÁRIO/SUMMARY ENTREVISTA/INTERVIEW 9 Um pouco da história das artes visuais de Ribeirão Preto: entre- vista com Maria de Fátima da Silva Costa Garcia de Mattos. A little bit of history of the visual arts of Ribeirão Preto: interview wirh Maria de Fátima da Silva Costa Garcia de Mattos. Adriana SILVA DOSSIÊ/SPECIAL “A educação brasileira no século XX” 19 Trajetória da profissão docente durante o século XX. The trajectory of teaching profession during the twentieth century. Ramires Santos Teodoro CARVALHO 31 Memórias de leituras e formação inicial de professores. Memories of reading and initial teacher formation. Daniele Machado CARVALHO Filomena Elaine Paiva ASSOLINI 53 A educação para a ética no Brasil fundamentada na filosofia nietzschiana. Education for ethics in Brazil from nietzschean philosophy. Luis Fernando de OLIVEIRA ARTIGOS/ARTICLES 67 A resistência católica ao avanço da concepção liberal da educa- ção no Brasil (1930-1961). The Catholic resistance and advancement of the liberal conception of education in Brazil. Rafael José da SILVEIRA
  6. 6. 6 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 79 Descartes e sua descoberta da substância espiritual. Descartes and his discovery of spiritual substance. Luís Carlos MORENO 95 A história do Direito do trabalho e a nova lei do aviso prévio. The history of the Labour Law and the new Law of prior notice. Marco Antonio BATISTA 111 Estratégias de negociação entre a Santa Sé, o Estado brasileiro e a Igreja Católica local entre 1889 e 1991. Strategies and negotiations between the Holy See, the Brazilian state and the local Catholic church between 1889 and 1991. Lilian Rodrigues de Oliveira ROSA 127 Índice de autores/Authors index. 128 Índice de Assuntos. 129 Subject Index. 130 Normas para publicação na revista DIALOGUS.
  7. 7. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 7 ENTREVISTA/INTERVIEW
  8. 8. 8 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011.
  9. 9. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 9 UM POUCO DA HISTÓRIA DAS ARTES VISUAIS DE RIBEIRÃO PRETO: ENTREVISTA COM MARIA DE FÁTIMA DA SILVA COSTA GARCIA DE MATTOS* Adriana SILVA** Inicialmente a entrevista objetivava buscar informações sobre os imigran- tes italianos Bassano Vaccarini, Leonello Berti e Pedro Caminada Manuel-Gismondi - os três artistas plásticos. Ao final, mostrou-se um material interessante para o entendimento sobre a história das artes em Ribeirão Preto. Aprofessora Dra. Maria de Fátima, ao revelar sua trajetória acadêmica, contribui com informações para uma maior compreensão sobre o universo educacional. Adriana Silva – Defina arte. Maria de Fátima – É uma pergunta difícil para a gente que trabalha com arte, mas vou te devolver com uma colocação. Quando eu comecei com meus 17 anos, quando eu entrei na Faculdade, logo na primeira semana de aula, eu perguntei ao então professor Pedro Caminada Manuel-Gismondi, como ele gostava que a gente se lembrasse sempre, o nome completo dele. E eu sempre muito atrevida, muito fa- lante, perguntando muito, e ele falando sobre a contemplação sobre a fruição esté- tica e eu perguntei a ele: em resumo, o que é arte professor? E ele me respondeu: que a arte era a expressão do sentimento contemplado, 1) E o que era uma definição dele, se tornou uma definição sua? Maria de Fátima – Pra mim se tornou. Eu fiquei com isso, e você bem pode obser- var, que hoje, 35, quase 40 anos depois, eu tenho isso vivo, mas aprendi com isso realmente que a expressão da arte vem exatamente dessa contemplação que nós temos, que nós fazemos, uma contemplação do objeto, a contemplação da ideia, a contemplação que na verdade vai nutri o meu fazer artístico. Porque o fazer não nasce pelo próprio impulso, pela própria criatividade, eu antes disso tenho aquele processo platônico da ideação no momento em que eu vou colocando, isso tam- bém vai me permitindo sentir fazer uma outra espécie de trabalho interior comigo mesma. Eu acho que é nessa relação, talvez um pouco catártica, que eu de repen- te me auto realizo, eu contemplo. E quando eu contemplo o objeto, que é esta ideia * Entrevista feita com a Professora, Pedagoga e Doutra em Artes pela ECA-USP, Maria de Fátima da Silva Costa Garcia de Mattos. ** Jornalista, escritora e Doutora em Educação pela UFSCar. Email para contato: Ipccic439@gmail.com
  10. 10. 10 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. formada, eu acredito que aí também eu me contemplo como pessoa, como ser e, nesse sentido eu entendo, aquilo é arte. Porque arte acima de tudo eu acho que ela não faz esse caminho se ela não fosse exatamente no sentido literal dela. Arte é sensibilidade. Eu acho que arte sem sensibilidade nós não temos diálogo, nós não formamos dialogo sem sensibilidade. Então é por isso que eu acredito que é um caminho realmente. Eu contemplo um objeto, uma ideia, aquilo que eu venho for- mando para que ao contemplar eu possa ter nessa fruição estética, eu consiga captar dela, via sensibilidade, via criação, via outros elementos, que aí sim, eu me dou conta: isso é arte. 2) A arte precisa ser entendida? Maria de Fátima – Não. Eu acho que talvez como a gente costuma ensinar, arte é uma linguagem universal. Ela está presente em tudo, em todos e acho que em qualquer lugar do mundo. Independe da nação, da língua falada, ou da maneira mais inteligível possível de se adequar e conviver com o social. Aarte está presen- te em tudo. Então eu acredito que a arte é muito a sua maneira de olhar, a sua maneira de ver e, principalmente hoje, depois de tantos anos trabalhando com arte, eu muitas vezes me questiono se muitas vezes não é somente o olhar da gente que é muito mais artístico que o próprio fazer. Eu acredito que o olhar é mais artístico. Você vê, você olha determinado local, com um olhar mais sensível àquilo que o local lhe oferece e você obviamente ao vê-lo você o interpreta artisticamente. E você é capaz de ver como se fosse uma paisagem, uma coisa que modifica, você olha e você vê aquilo e ninguém mais enxerga. Esse olha eu acho que faz parte desse sensível que todos nós internalizamos, temos conosco e que eu acho que é isso que a gente vê quando abre os olhos. A gente abre essa câmara do sensível que nós temos. Por isso que eu não vejo a arte, eu aprendo a ler a arte. Eu aprendo a ler artisticamente um produto, uma figura, uma ideia. Aquilo que eu na verdade tenho na minha frente. Eu acho que a arte faz parte de uma leitura. 3) É Possível haver arte naquilo que não é belo, logo naquilo que é feio? Maria de Fátima – Talvez a gente devesse fazer uma regressão exatamente ao conceito de gosto, ao conceito do que é belo e do que é feio. Na verdade o belo para mim é o belo platônico, é o ideal de beleza. O belo para mim se concentra na perfeição., que era aquele belo platônico. Ele é a perfeição em si, mas ele é a perfeição alcançada pelo trabalho. Ele é a perfeição alcançada pela visão do artista na obra. Ele é essa perfeição que me leva a um trilhar de uma maneira mais ade- quada naquela concepção. Na concepção artística. Na concepção daquilo que está
  11. 11. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 11 sendo realizado. Se é feio, eu volto na resposta anterior, ele é um critério do olhar de quem vê. Para quem vê muitas vezes o feio é de uma beleza incomensurável. E o gosto, eu acho que na verdade se eu gosto mais porque acho isso belo ou se gosto menos porque acho isso feio, ao mesmo tempo eu penso um pouco em Bourdieu quando ele fala da distinção, quando ele fala sobre o gosto. E na verdade ele vai buscar um parâmetro. Muitas vezes eu não tenho como desenvolver o gosto se eu não consegui trilhar o meu lado do olhar sobre o social. E dependendo de onde eu venho, de como eu me porto e onde eu me insiro. O meu gosto, eu posso moldá-lo. Eu posso vir a conquistá-lo porque eu tenho que ter essa definição, esse discernimento. Na verdade eu acho que não existe o belo e o feio. Entre a doçura da bela e a fera eu acho que é só a beleza que se aprimora não a máscara da fera. 4) Fale sobre o Bassano Vaccarini como professor. Maria de Fátima – Como professor o Vaccarini era um encanto. Eu me lembro dele já nos anos 1970, eu fui aluna dele entre 1973, 1980. Sempre muito perfeccionista, exigente. Aquantidade de telas, de exercícios, que propostas que ele nos pedia era uma coisa quase que feita de maneira industrial. Eram dez para a próxima aula, eram quinze para a próxima aula, e ele não tinha medida, mas eu acho que isso era muito do espírito artístico dele. Ele era um artista que a ente percebia que no con- tato com o fazer artístico não tinha medida. Ele se dedicava como um todo. A gente percebia a força com que ele colocava aquela bisnaga na tela, e a gente percebia que ele também não tinha medida. Como ele também não tinha medida na escultu- ra. Eu digo isso porque ele não tinha horário. Ele não era aquela pessoa disciplina- da que dependia de determinados momentos para poder fazer. Ele se imbuia des- se fazer, que na verdade esteticamente é o grande prazer. Era onde ele ia fazendo cada vez mais e eu acho que isso ele tinha em relação aos seus alunos. Ele cobrava na mesma violência de solicitação. Mas como professor ele era perfeito. A lembrança que me traz uma paixão muito gostosa foram as duas especializações que eu fiz com ele: do Laboratório Vivencial do Artista no Teatro e a sobre Cenogra- fia e Indumentária. Nunca pensei em viver o aprendizado de alguma coisa que fosse cênica e composição cênica ao mesmo tempo e chegávamos ao ponto como de fato chegamos, eu encenei naquela época Damas das Camélias, eu fazia o papel da Margarida e ele uma vez brincando comigo falou: eu só lhe dou dez se você chorar. Eu tinha uma terrível ansiedade e preocupação com aquilo. Eu ensai- ava com meu pai e com minha mãe todas as noites, televisão era pouca naquela época, eu ensaiava o texto de maneira que meu pai e minha mãe pudessem ser meu crivo principal. E um belo dia, falando naquela empolgação eu esbocei uma
  12. 12. 12 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. emoção e eu vi que nos olhos do meu pai ele ficou muito vaidoso vendo sua filha encenar alguma coisa. E eu levei tudo aquilo para a peça. A minha mãe ajudou, naquela época tinha um cristal japonês que a gente usava para tratar a enxaqueca e, naquela época eu usava e me ajudou muito eu poder chorar. Mas eu livremente conseguia a emoção. E ele me deu dez. Só que na verdade o que foi muito legal, que eu acho que o curso trouxe muita contribuição para nós, eu fui a terceira turma do Curso de Educação Artística, é que nós montávamos as pranchas, desenháva- mos os cenários, desenhávamos os personagens em aquarela, na verdade naque- la época, na Língua Portuguesa a “ecoline” a tinta francesa que a gente comprava naquela época, nós pintávamos de uma forma liquida, transparente, que ele dizia que era essa a sutileza que ele queria de nós, essa sensibilidade, essa leveza que ele queria de nós no palco. Então as tintas com que eu fazia as pranchas no dese- nho tinham que ficar bem liquida. Eu guardei isso dele. Era uma forma muito ele- gante que ele tinha de passar para nós esse fundamento das Artes Cênicas. Utilizei bastante enquanto professora do Ensino Fundamental. 5) Apesar de morar em Ribeirão Preto, Vaccarini sempre se manteve italiano? Maria de Fátima – Italianíssimo. Poucas palavras ele falava em português. Era um Italiano aportuguesado, e sempre falante, estabanado, da mesma forma que o Pedro, e da mesma forma que o Berti, ainda que esse mais contido. Eram professores que a gente percebia que tinha um espírito tão grande que eu acho que o fato de ser aquela grandeza italiana, aquela grandeza romana como a gente vê na arte italiana de uma maneira geral. Eles eram uma presença contínua no prédio onde a gente tinha aula. O que eu quero dizer com isso? Que o espírito deles era tão grande, que preenchia o local. Quando acabava a aula e o professor saia, parecia que ficava tudo vazio e a minha turma tinha cento e vinte alunos. 6) Fale um pouco sobre sua experiência artística e de convivência com o Pedro Manuel Maria de Fátima - Eu tinha uma admiração muito grande, em primeiro lugar, pela aula que ele dava. Eu acho que é onde o professor normalmente vai, era uma um espelho. A gente vai se afeiçoando a algumas coisas e depois um dia, a gente vai buscando naquela imagem e naquela pessoa, alguma coisa que você fala: um dia eu quero ser como ele. Eu tinha dele uma imagem docente muito bonita, muito boa. Ele tinha uma aula extremamente difícil, era uma aula difícil de conteúdo, de fala, porque você imagina uma sala de 120 alunos, uma italiano falando pouco português, e na medida em que a gente perguntasse, nem sempre ele gostava.
  13. 13. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 13 Uma vez ele pediu o projetor de slides e o rapaz demorou para trazer e quando o funcionário trouxe, a lâmpada estava falhando. Eu sentava na primeira fileira, claro, e eu sentada ao lado do tripé de madeira usado para projetar lá na lousa. Quando o projeto foi ligado, a lâmpada estava com meia vida, e a lâmpada falhou uma vez, falhou a segunda, o Professor Pedro muito intempestivo, até o chamar o rapas de novo ele ficou irritado e chutou com o pé aquele tripé e eu senti o peso da lâmpada do projetor de slides no meu dedão. E aquilo me deixou, que eu não sabia como fazer, eu tinha de chorar, doeu muito. Era a intempestividade dele. Isso era muito próprio dele. Ele ficou bravo com uma aluna, uma amiga inclusive, ele ficou bravo com ele e tirou os óculos e arremessou porque ela tinha feito uma pergunta que era meio fora de hora para ele. E ele então arremessou e a perna do óculos quebrou. E ele passou até o final do ano com a perna do óculos embrulhadinha num espara- drapo branco que quando ela caia ele colocava em cima da mesa e quando preci- sava do óculos, ele o colocava sem a alça e segurava com a mão e continuava dando aula para nós gesticulando somente com a outra mão. Eu acho que esse critério todo, na verdade, essa intempestividade toda dele, eu acho que era o seu lado artista. Esse não era o lado docente. O lado docente era aquele que queria que a gente aprendesse. Era aquele que eu tenho certeza que eu herdei. Era aque- le lado que a gente fica possessa, porque a gente ensina com prazer, a gente se doa, a gente mostra obra, volta na obra, lê a obra como todo, explica, disseca a obra toda em planos, em linhas, em cores, em volume, e você está passando aque- le conteúdo com a alma e você percebe que a recíproca não é verdadeira. Hoje, tantos anos passados, eu entendo os acessos que ele tinha. Ele era uma artista. Num pais recém chegado, principalmente que nos anos 70, nós não tínha- mos essa herança, principalmente no interior. Que herança nós tínhamos de cultu- ra artística? Então se deparar com um grupo de italianos, educados na própria Itália, educados em uma escola italiana, numa escola italiana, veja bem, eu te digo, aquele menino escolar cuja a história corre na veia, que sabe contar pedra por pedra da rua, do paralelepípedo porque Le tem a história no sangue, diferentemen- te de nós brasileiros. Então eles trazendo isso, nós tínhamos assim, uma venera- ção em poder vê-los trabalhar. Eu pensava sempre, como ele consegue dar aula e ele não lê nada. Isso eu incorporei. 7) E a arte do Pedro? Maria de Fátima – Eu acho que a arte do Pedro não era meiga, não era doce. Eu acho que ele tinha a singeleza artística no próprio temperamento dele, nos dois lados que todos nós temos, mas era muito mais expressiva, mais expressionista,
  14. 14. 14 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. era mais pastosa, talvez a maneira de ver dele fosse mais atenta, mais agressiva, naquilo que ele fazia. Uma coisa que me chama a atenção, quando o Pedro teve um derrame e eu fui visitá-lo, é a quantidade de obra que ele tinha do ateliê dele.E foi uma pessoa que dentro de Ribeirão Preto ficou muito lembrada como o profes- sor de todos, mas a sua obra especificamente eu acho que foi pouco comentada. Talvez porque ele também fosse uma pessoa nesse sentido mais introspectiva. 8) Além do universo acadêmico, como foi sua relação com o professor Gismondi? Maria de Fátima – Ele tinha uma monitora fixa, que era uma monitora de aula, que era a professora Maria Elizia Borges e posteriormente se tornou uma docente no curso. Eu monitorava as provas que nós chamávamos do corredor da morte, por- que ficávamos todos enfileirados e era prova oral. Nós entrávamos nas saletas de cada um dos docentes e aí então ele passava aqueles famigerados dez slides, o que eu também fiz durante muito anos na minha depois como professora. Ele passava e nós tínhamos que saber e era zero ou dez. Ou eu sabia ou eu não sabia. E tinha uma lista extensa das coisas que nós tínhamos que saber que tinha naque- les slides; século, data, quem era o pintor, nome de obra, que técnica era... Então era um aprendizado mais consistente. Eu era então aquele que monitorava todos os carretéis dele e montava, a cada aluno que entrava, dez diferentes. Ele não admitia sequer que a gente dissesse: dá licença, eu queria usar o sanitário. Ele respondia. Não, você não pode, você fica. Primeiro nós temos que cumprir a prova, depois você vai. Pra surpresa minha, eu comecei a lecionar no ensino superior em 77 em outra cidade e em Ribeirão Preto em 81, quando foi criada a Faculdade de Arquitetura de Ribeirão Preto. Foi convidado um corpo docente de elite, professo- ras Daici, Maria Elizia, Prof. Pedro, Francisco Amêndola, como professor de foto- grafia e outros excelentes professores que a memória falha. E o professor Pedro teria que ter alguém para revezar, porque ele estava em uma fase que ele não queria mais assumir aulas todas as semanas num curso, era uma cara horária muito extensa. E ele então disse que tinha uma pessoa que trabalhava ali que poderia dividir com ele a disciplina ele disse: a Maria de Fátima pode ser uma boa companheira. Isso me enobreceu demais. Isso foi em 81. Nós chegamos a prepa- rar algumas aulas juntos. Eu tinha muita vergonha, muito respeito, muito medo mesmo de falar algum impropério, que tivesse alguma coisa que não estava da maneira correta e que ele me repreendesse, porque ele faria isso com a maior facilidade, duramente, na frente de qualquer pessoa. Tenho ainda alguns slides com a letrinha dele que eu guardei, porque eram slides que ele mesmo catalogou e ele revezava comigo uma semana cada um, só que na aula dele eu sempre ia para
  15. 15. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 15 assistir. Para mim era um prazer poder ouvir a aula dele. Apos dois anos ele viajou para a Itália. Ele tinha um compromisso, ele tinha uma exposição. Ele ficou mais de seis meses lá e quando ele retornou ele trouxe um mimo para mim com um cartão escrito que eu já ensinei o que eu tinha para te ensinar e agora você já pode ficar sozinha. E realmente com bastante medo eu continuei com os meus carretéis de 180 slides como era o sistema dele e fiz isso por mais de 20 anos até que a tecnologia me ensinou a passar para as transparência e hoje para o sistema de multimídia. Por uns 15 anos eu fiz o mesmo sistema, inclusive com o corredor da morte. Hoje eu tenho um prazer que esse eu agradeço ao Pedro Gismondi, que é quando um aluno meu viaja, assim como uma aluna esses dias me postou no facebook; profes- sora, muito obrigada por ter me educado em História da Arte. Isso eu acho que não tem preço. Isso é a escola do Pedro Gismondi. 9) Fale sobre o Leonello Berti. Maria de Fátima – O Berti era de todos acho que o mais tímido conosco na sala de aula. Falava pouco, trabalhava muito bem, mas era muito rápido, muito lépido para poder fazer as coisas conosco, principalmente as tintas, o manuseio. Ele era uma pessoa muito querida. Ele foi o paraninfo da minha turma, que infelizmente no 14 de fevereiro daquele ano não colou grau porque ele faleceu. Suspendemos a nos- sa festa de formatura, voltamos posteriormente e colocamos grau na sala do doutor Eletro e não tivemos festa. Ele era o nosso paraninfo. Era um querido, era uma pessoa especialíssima, tinha uma delicadeza e uma coisa que a gente sempre memorava, a delicadeza com que ele lidava com a cor, ele não tinha delicadeza para lidar com o pincel , era a técnica . Ele tinha uma delicadeza para lidar com a cor. Parece que ele escolhia aquilo que de mais elegante, cativo, aquilo que mais adoçasse aquele trabalho que a gente estava fazendo. A gente tinha um afeto mui- to grande por ele. 10) As cores fortes que ele usava em seus quadros tinha explicação? Maria de Fátima – Talvez esse lado totalmente expressivo da Escola Italiana. A gente percebe que o próprio temperamento deles muitas vezes contracenava na obra ao mesmo tempo que eu tinha uma sutileza de cor , mais clara, mais fria, eu tinha aquele violência da cor mais forte, mais sobrecarregada. Eu tinha nisso, um ímpeto, um espírito criativo, artístico dele. Nós víamos muito disso na obra dele. Obra que ele puxava a cor no centro do quadro e você não distinguia a figura você só via como se fossem lambidas de pincel. E ali estava o que ele queria dizer e não na figura que ele compunha. Poucas vezes ele ensinava para nós a compor atra-
  16. 16. 16 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. vés da forma. Nós não tínhamos a forma rosto para que eu pudesse compor , mas através das cores, o contorno que me era dado pela cor eu definia o rosto de quem eu estava fazendo e a maneira como eu estava vendo. 11) Qual a importância desses três professores de artes italianos? Maria de Fátima – Eu acho que eles são os personagens importantes dessa histó- ria de formação artística para a cidade de Ribeirão Preto. Acho que todos que vêem desse ensino de artes de Ribeirão Preto, desde as primeiras turmas, são ainda devedores desse conceito, desse ensinamento, que de maneira ou outra nós pudemos absorver de cada um deles. Eles foram para nós uma escola artística e eu não tenho medo de dizer, principalmente por mim, eles foram uma escola de vida. Nós aprendemos com eles a matéria, a lição. Não passávamos realmente sem mérito. Eles tinham um crivo impressionante que hoje seria improvável de se utilizar na sistemática que nós temos hoje nas escolas. Mesmo no ensino superior, na formação dos professores de arte, seria hoje improvável de podermos utilizar, mas eles nos educaram artisticamente e nos educaram, acho, que principalmente naquilo que posteriormente, dez anos depois, nós viemos a conhecer como o mo- vimento da escolhinhas de artes. Eu aprendi a olhar a obra de arte. Eu aprendi a fazer a leitura da obra de arte. Eu aprendi a doutrinar o olhar. Eu aprendi a filtrar o olhar e hoje quando eu busco em um aluno, ensinar exatamente que quando ele olhe um ornamento da arquitetura, que ele olhe em especial um trecho somente de uma escultura, ou a cabeça ou a análise daquele braço ou quando eu olho em uma tela eu espero que ele lembre filtre o olhar. A minha maior paixão hoje é quando no ensino superior eu dou um exercício depois de um ano e meio de curso, e eu consigo que o aluno olhe duas linguagens diferentes, artes visuais e arquitetura, por exemplo, e que ele consiga ver, aquela casa, uma obra de arte de uma mesma época e que estejam extremamente dialógicas. Que ele consiga ver através do ponto, da linha, da luz e da cor. Que ele consiga fazer esse exercício. E aí normal- mente ele vira para mim e diz: mas era tão óbvio e porque eu não enxerguei antes? E naquele dia para mim eu ganhei o ano. Porque? Por que é quando o olhar dele casou, é quando ele não percebeu, mas ele aprendeu. Então eu acho que nesse sentido a nossa escola foi muito boa. Eles foram realmente de uma escolarização acho que do futuro na cidade de Ribeirão Preto. SILVA,Adriana. Alittle bit of history of the visual arts of Ribeirão Preto: interview wirh Maria de Fátima da Silva Costa Garcia de Mattos. DIALOGUS. Ribeirão Preto, v.7, n.2, 2011, p.11-21.
  17. 17. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 17 DOSSIÊ/SPECIAL “A Educação brasileira no século XX”
  18. 18. 18 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011.
  19. 19. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 19 TRAJETÓRIA DA PROFISSÃO DOCENTE DURANTE O SÉCULO XX Ramires Santos Teodoro Carvalho* RESUMO: O texto apresenta saberes necessários para os profissionais da educa- ção, a formação da identidade do professor (reflexivo e pesquisador), apreender as concepções acerca do ensino e a importância em desenvolver competências para ensinar. Analisar as práticas docentes como caminho para repensar a formação inicial e contínua de professores e sua identidade profissional, tendo como base teórico-metodológico a questão dos saberes que constituem a docência e o desen- volvimento dos processos de reflexão docente sobre a prática. PALAVRAS-CHAVE: Formação Inicial e Contínua; Professor Reflexivo; Identida- de; Saberes da Docência. INTRODUÇÃO O presente trabalho tem como objetivo a contextualização do problema, dificuldades, erros, acertos durante o século XX e no terceiro milênio que adentramos, cujo cenário encontra-se marcado pela progressividade da revolução científica, pela agilidade das transformações socioculturais, faz-se necessário um ensino científico objetivo para todos. Nesse caso, torna-se obrigatório uma visão para aquele que ensina: o professor, para suas compreensões acerca do ensino e do ser professor de profissão, isto é, aproximar-se dos mecanismos que lhe permi- tam abordar o ensino e todo o seu contexto circunstancial. Portanto, em face ao que foi exposto, justifica-se direcionar o nosso olhar a esta problemática, visando atentar a ruptura e visão externa, do conjunto de re- produções criadas em sua pluralidade a partir de ideias estereotipadas, rebaixando a atuação do professor como um mero técnico reprodutor de conteúdos e esque- mas de aprendizado. 1 CONCEITO DE PROFESSOR REFLEXIVO A definição de ‘Professor reflexivo’ vem sendo extensamente discutido nos meios educacionais de diversos países, inclusive no Brasil, a partir dos * Graduação em Pedagogia, Especialização em Metodologia de História e Geografia pelo Centro Universitário Barão de Mauá, Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil. E-mail do autor ramirestcarvalho@hotmail.com. Orientador: CleideAugusto.
  20. 20. 20 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. anos 90, do século XX. O professor norte-americano John Dewey (1859-1952), caracteriza o pen- samento reflexivo como elemento impulsionador da melhoria de práticas profissio- nais docentes. O pensar reflexivo compreende uma condição de dúvida, hesitação, ambiguidade, ato de pesquisa e requer indagação, buscando constatar a resolução da dúvida. Para Dewey (1979, p. 24) “a necessidade da solução de uma dúvida é o fator básico e orientador em todo o mecanismo da reflexão”. Segundo Holec (1979, p.26), o conceito de aprendizagem autônoma é a competência para administrar a própria aprendizagem o que implica em: “Ser ca- paz de definir objetivos pessoais, organizar e gerir tempos e espaços auto-avaliar e avaliar processos, controlar ritmos, conteúdos e tarefas na sua relação com os objetivos a seguir, procurar meios e estratégias relevantes”. Podemos observar que a partir da discussão e reflexão anexa começam a emergir novas propostas para a reconstrução da prática pedagógica. Segundo Freire (1996), a formação permanente dos professores é fundamental para a reflexão crítica sobre a prática. “É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática” (FREIRE, 1996, p. 44). Importante salientar que para a melhoria do ensino e suas bases estão assentadas na formação dos professores. São eles os responsáveis pela ação educativa e pelo desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem. A formação do professor por meio da prática reflexiva tem como objetivo crucial trazer a consolidação da autonomia profissional. Alarcão (1996) mostra-nos que os pensamentos do professor Donald Schön ajudaram para que a efígie do professor fosse mais ativo, autônomo e crítico e pudesse fazer suas escolhas questionando aquela do profissional cumpridor de ordens que procedem da sociedade. Neste sentido, o professor reflexivo se caracteriza como um ser humano criativo, capaz de refletir, analisar, questionar sobre sua prática para agir, e agindo, não seja mero reprodutor de ideias e práticas que lhe são exteriores. Consequentemente, espera-se que o professor reflexivo seja capaz de forma autô- noma agir com inteligência e flexibilidade, buscando construir e reconstruir conhe- cimentos. As estratégias de formação reflexiva fazem referências com princípios de formação que Vieira e Moreira (1993) definem como enfoque no sujeito, enfoque nos processos de formação, problematização do saber e da experiência, integração teoria e prática e introspecção metacognitiva.
  21. 21. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 21 Professor Schön (1995), considera a prática profissional como oportuni- dade para construção do conhecimento que se realiza por meio da reflexão, análi- se e problematização. Para o pesquisador, a atuação do educador envolve conhe- cimento prático (conhecimento na ação, saber-fazer); a reflexão-na-ação (metamorfosear o conhecimento prático em ação); e reflexão-sobre-ação e refle- xão-na-ação (que é o nível reflexivo). Zeichner (1993) diz que a reflexão otimizada por Schön emprega-se a profissionais individuais, cujas metamorfoses que conseguem operar são emer- gentes: os professores não conseguem modificar as situações além das salas de aula. Para alguns autores Schön tinha consciência das limitações dos profissionais reflexivos, por não especificar os pensamentos sobre a linguagem, sistemas de valores, método de compreensão e a forma de definição do conhecimento. Os prin- cípios fundamentais para que os professores consigam mudar a produção do ensi- no, segundo ideais de igualdade e de justiça. Portanto, não basta apenas à refle- xão, é necessário ao professor, competência para intervir nas situações concretas e reduzir tais problemas. Os professores não refletem sobre a metamorfose, pois, são condicionados ao contexto em que atuam. Nesse sentido, considera-se que a óptica de Schön é reducionista e limitante por evitar contextos institucionais e conjecturar a prática reflexiva de modo individual. Os professores exercem um papel eminente na estruturação e produção do conhecimento pedagógico e estas ações refletem na instituição, na escola, no aluno e na sociedade em geral. Desta maneira, o professor tem papel ativo na educação e não um papel simplesmente técnico que se limita à execução de nor- mas e receitas ou à aplicação de teorias exteriores à sua própria identidade profis- sional. Isso nos mostra que a profissão docente é uma tarefa exímia para intelectu- ais e implicam num saber fazer (Santos, 1998). 2. REFLETIR NA AÇÃO, SOBRE A AÇÃO E SOBRE A REFLEXÃO NA AÇÃO As ações para formação continuada de professores no Brasil intensifica- ram-se na década de 1980 (BRASIL, 1999). A partir da década de 1990 a formação continuada passou a ser analisada como uma das estratégias indispensáveis para o processo de construção de um novo perfil profissional do professor (NÓVOA, 1991; GARCIA, 1994, PIMENTA, 1994, ESTRELA, 1997; GATTI, 1997; VEIGA, 1998). Baseado nos estudos desenvolvidos por Schön (1995), Alarcão (2003) Perez-Gómez (1992), foi possível organizar as operações que envolvem o modelo reflexivo a partir de quatro conceitos e/ou movimentos básicos: o conhecimento na ação; a reflexão na ação; a reflexão sobre a ação; e a reflexão para a ação.
  22. 22. 22 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. Por isso, a postura reflexiva do professor não só requer o saber fazer, como também saber educar de forma consciente, para que suas práticas e deci- sões sejam tomadas para o favorecimento da aprendizagem do aluno. Segundo Perrenoud (2002), ensinar é, antes de tudo, agir na urgência, decidir na incerteza. Para o educador Paulo Freire (2001) a reflexão nada mais é que: fazer e o pensar, entre o pensar e o fazer, ou seja, no “pensar para o fazer” e no “pensar sobre o fazer”. Segundo Pimenta (1996) diretrizes e decisões político-curriculares, direcionam para a magnitude do triplo movimento sugerido por Schön, da reflexão na ação, da reflexão sobre a ação e da reflexão sobre a reflexão na ação, à medida que o professor compreende-se como profissional autônomo. Refletindo sobre o tema, Pimenta (2000) nos mostra que o saber docente não é constituído apenas da prática, mas também pelas teorias da educação. A teoria tem magnitude crucial na formação dos docentes, pois concede aos indivídu- os diferentes pontos de vista para uma ação contextualizada, propiciando perspec- tivas de análise para que os professores conheçam os contextos históricos, soci- ais, culturais organizacionais e de si próprios como profissionais. O professor encontra-se em processo contínuo de formação, refletir sua formação significa pensá-la como um continuum de formação inicial e contínua. “Entende, também, que a formação é, na verdade, autoformação, uma vez que os professores reelaboram os saberes iniciais em confronto com suas experiências práticas, cotidianamente vivenciadas nos contextos escolares”. (PIMENTA, 1997, p. 11). É nessa contenda de trocas de experiências e práticas que docentes vão constituindo seus saberes como praticum, isto é, aquele que imutavelmente reflete sobre a prática Para Freire (2001, p. 53) a crítica é a curiosidade epistemológica, resul- tante da transformação da curiosidade ingênua, que criticizar-se. Corroborando com essa ideia Freire afirma: A curiosidade como inquietação indagadora, como inclinação ao desvelamento de algo, como pergunta verbalizada ou não, como procura de esclarecimento, como sinal de atenção que sugere alerta faz parte integrante do fenômeno vital. Não have- ria criatividade sem a curiosidade que nos move e que nos põe pacientemente impa- cientes diante do mundo que não fizemos, acrescentando a ele algo que fizemos. Segundo Lastória, (2004 apud MIZUKAMI et al. 2002), a premissa básica do ensino reflexivo, é a questão de analisar as crenças, valores e as hipóteses que
  23. 23. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 23 os professores manifestam sobre seu ensino, matéria, conteúdo do currículo que trabalham, sobre seus alunos e sobre a própria aprendizagem que se pauta na prática docente. A concepção de professor reflexivo não se exaure no contíguo da sua ação docente. De acordo com Alarcão (1992, p. 24-35) Ser professor implica saber quem sou, as razões pelas quais faço o que faço e conciencializar-me do lugar que ocupo na sociedade. Numa perspectiva de pro- moção do estatuto da profissão docente, os professores têm de ser agentes ativos do seu próprio desenvolvimento e do funcionamento das escolas como organiza- ção ao serviço do grande projeto social que é a formação dos educandos. Pérez-Gómez (1992), referindo-se a Habermas, pontua que a transforma- ção da prática dos professores deve dar-se, numa perspectiva crítica. Assim, deve ser adotada uma postura cautelosa na abordagem da prática reflexiva, evitando que a ênfase do professor não venha operar, estranhamente a separação da sua prática do contexto organizacional no qual ocorre. Fica, portanto, evidenciado a necessidade da realização de uma articulação, no âmbito das investigações sobre a prática docente reflexiva, entre práticas cotidianas e contextos mais amplos, con- siderando o ensino como prática social concreta. No começo do século XXI, a escola é acareada com a necessidade de responder à democratização do sistema de ensino. Esse aspecto amplia a concep- ção de saber escolar e coloca-o em diálogo com o saber dos alunos e com a pró- pria realidade nas quais as práticas sociais se desenvolvem. Quando refletimos sobre a formação da identidade do professor nos re- portamos a Pimenta (1999). A formação continuada, deve fomentar a apropriação dos saberes pelos docentes, no sentido à autonomia, para conduzir a prática críti- co-reflexiva, contemplando o cotidiano escolar e seus saberes oriundo da experi- ência docente. Contudo, o conceito de formação continuada deve contemplar de forma coesa: (1) a socialização do conhecimento produzido pela humanidade; (2) as diferentes áreas de atuação; (3) a relação ação-reflexão-ação; (4) o envolvimento do profes- sor em planos sistemáticos de estudo individual ou coletivo; (5) as necessidades concretas da escola e dos seus profissionais; (6) a valorização da experiência do profissional. Mas, também: (7) a continuidade e a amplitude das ações empreen- didas; (8) a explicitação das diferentes políticas para a educação pública; (9) o compromisso com a mudança; (10) o trabalho coletivo; (11) a associação com a
  24. 24. 24 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. pesquisa científica desenvolvida em diferentes campos do saber (ALVES, 1995 apud CARVALHO; SIMÕES, 1999, p.4). Desta forma, a escola será o ambiente de formação do professor e a prá- tica educativa o conteúdo dessa formação. A reflexão do professor pautará um “um investigador da sala de aula, que formula suas estratégias e reconstrói a sua ação pedagógica” (ALMEIDA, 2002 p.28), assim como afirma Silva (2005 p.28), “a práti- ca transforma-se em fonte de investigação, de experimentação e de indicação de conteúdo para a formação”. A formação contínua de professores é afrontada como um continuum Lastória apud Mizukami et al. (2002). Dessa forma, a formação continuada coloca no cerne das atenções, o desenvolvimento pessoal e social dos formandos, desen- volvendo sua identidade profissional conforme suas experiências de formação so- cial. Os fatores que interferem sobre a educação e a profissão docente, apon- tam os principais desafios que o professor precisa vencer para conquistar a auto- nomia profissional. Conceitos de ciência interdisciplinar apontam os benefícios, caso haja um dialogo entre as ciências, observando como as representações sociais estão pre- sentes e interferem significativamente na prática educativa e na formação docente. O principal objetivo do professor é buscar a consolidação da autonomia profissional mais ativa, crítica e reflexiva, capaz de avaliar e questionar a prática docente a fim de agir sobre ela e não como um mero reprodutor de ideias e práticas que lhes são impostas, capaz de ser livre para fazer escolhas e tomar decisões, contestando aquela do profissional cumpridor de ordens que emanam de fora das salas de aula. O professor de hoje não tem tempo para refletir suas ações na sociedade, em contrapartida, a sociedade também não tem tempo para o papel da profissão docente e a importância da mesma e, sobretudo, porque a sociedade, pós-industri- al, nem sequer reconhece a nobreza e a complexidade do seu trabalho. 3. GÊNESE E CRITICA DE UM CONCEITO Segundo Kemmis (1985) a sala de aula é o lugar de experimentação e investigação, onde o professor é aquele que se dedica a refletir a melhoria dos problemas numa compreensão limitada, pois há influência da sociedade sobre suas práticas e ações, por conseguinte, o conhecimento o torna produto de contextos sociais e históricos. Nessa diretriz, Giroux (1997), afirma que a simples reflexão no
  25. 25. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 25 labor docente em sala de aula é escasso para poder compreender os elementos que são regularizadores da prática profissional. Uma identidade profissional se constrói a partir da significação social, da revisão permanente dos significados sociais e das tradições da profissão; assim como, da reafirmação de práticas ratificadas culturalmente e que permanecem sig- nificativas. Segundo Garrido (2006), as práticas que resistem às inovações, estão repletas de saberes válidos da realidade; do confronto entre as teorias e práticas, da análise sistêmica das práticas à luz das teorias existentes. Portanto, a nova construção de teorias, significa que cada professor, na qualidade de ator e autor, confere à atividade docente no seu cotidiano a partir de seus valores, o modo a situar-se no mundo, de sua história de vida, suas representações, de saberes, suas angústias e anseios, do sentido que tem em sua vida: o ser professor. O desafio, posto aos cursos de formação inicial é de contribuir para o processo de “passagem dos alunos de seu ver o professor como aluno ao seu ver- se como professor, isto é, construir a sua identidade de professor”. (PIMENTA, 1996, p.19). A influência da apropriação e produção das teorias para a melhoria das práticas de ensino e dos resultados vem analisar a prática dos professores, consi- derando não somente a pluralidade social, heterogeneidade de saberes, como tam- bém a desigualdade nos sentidos sociais, econômicos, culturais e políticos. Assim, Carr (1995) direciona a transformação das características efêmeras das práticas dos professores para uma perspectiva crítica. Giroux (1997, p.37) desenvolve a partir das limitações de Schön uma con- cepção de professor como intelectual-crítico, ou seja, a reflexão é uma interação coletiva para incorporar a análise dos contextos escolares no sentido da reflexão: “um compromisso emancipatório de transformação das desigualdades sociais”. A escola e professores deixam de ser homogêneos e passivos e tornam- se agentes transformadores, assim, ao analisamos como estes podem desempe- nhar processos de interação nas quais a escola represente o lugar de reflexão crítica. As propostas educativas apresentam um discurso para preparar para a vida adulta com a capacidade crítica em uma sociedade pluralista. Em contrapartida, o labor do professor e a contextualidade da escola se estruturam para negar estas finalidades. Nesse paradoxo, os professores suportam as pressões que o contexto social e institucional exercem sobre eles, com isso suas preocupações e perspec- tivas se reduzem a análise da sala de aula. A centralidade do professor passou a ser a valorização do seu pensar, do
  26. 26. 26 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. seu sentir, de suas crenças e valores como perspectivas importantes para compre- ender o seu fazer. Os professores não se reduziram às salas de aula, nem limita- ram-se a executar currículos, ao contrário, elaboram, definem e reinterpretam-nos. Assim, a priori de elaborar pesquisas para a compreensão da atividade docente nos processos de construção da identidade, personalidade e desenvolvimento da profissionalização, para o desenvolvimento do status e liderança. Partindo da ótica conceitual levantada em torno do professor reflexivo, empregamos a valorização e o desenvolvimento dos saberes, quão a valorização como sujeitos intelectuais capazes de produzir conhecimentos, colaborar nas deci- sões da gestão escolar, mediando à compreensão para a reinvenção da escola democrática. Ser professor exige a valorização de formação no trabalho crítico-reflexi- vo, na práxis que realiza e nas experiências compartilhadas. Nesse sentido, enten- de que a teoria proporciona pistas e chaves de leitura, mas isto não expressa ficar ao nível dos saberes individuais. Pimenta (1996) nos mostra que a primazia da formação inicial passa por três tipos saberes: saberes de prática reflexiva, teoria especializada e saberes de militância pedagógica. O que coloca os elementos para produzir a profissão docente, dotando-a de saberes específicos que não são únicos, no sentido de que não compõem um corpo acabado de conhecimentos, pois os problemas da prática profissional do- cente não são meramente instrumentais, mas comportam situações problemáticas que requerem decisões num terreno de grande complexidade, incerteza, singulari- dade e de conflito de valores. A análise realizada no texto nos mostra quão grande contribuição à refle- xão valoriza o exercício da docência, os saberes do professor, o trabalho coletivo e das instituições escolares enquanto espaço de formação contínua. Isso evidencia que o professor produz conhecimento a partir da prática, desde que a sua investi- gação reflita intencionalmente sobre a prática, sistematizando os resultados obti- dos com o suporte da teoria. Portanto, como pesquisador de sua própria prática. Os seguintes problemas apresentados criticam uma perspectiva individu- alista da reflexão, ausência de criticidade potenciadores de uma reflexão crítica, a demasiada ênfase nas práticas, a impossibilidade da investigação nos espaços escolares e a limitação dessa, nesse contexto. Essas críticas emergem das anali- ses teóricas dos diferentes autores, a partir delas é possível propor possibilidades de superação desses limites sintetizados. Fica evidente que estamos falando de uma política de formação e exercí- cio docente que engrandece os professores e as escolas como capazes de pensar,
  27. 27. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 27 que articulam os saberes científicos, pedagógicos e do conhecimento na constru- ção e na proposição das transformações necessárias para as práticas escolares e às formas de organizar o espaço de ensinar e aprender, responsabilidade com ensino de resultados e qualidade social. Os professores não são meros executores e cumpridores de deliberações técnicas e burocráticas gestadas de fora. Dessa forma, investimento na formação inicial, no desenvolvimento profissional e investi- mentos nas escolas, a fim de que formem ambientes capazes de ensinar com qua- lidade. Segundo Garrido (2006), é necessário à instituição escolar, ser local reflexi- vo-pesquisador e espaço de análise crítica de suas práticas. A sólida formação, só poderá ser desenvolvida pelas universidades compromissadas com a formação inicial e o desenvolvimento de professores, capazes de aliar a pesquisa nos pro- cessos formativos. Dessa maneira, exprimimos um projeto emancipatório, compro- metido com a responsabilidade de tornar a escola companheira na democratização social, econômica, política, tecnológica e cultural, para que seja mais justa e igua- litária. CONSIDERAÇÕES FINAIS O conceito de professor reflexivo delineada no texto, permite uma análise crítica contextualizada de superar as limitações, afirmando como um conceito que requer o acompanhamento de políticas públicas coerentes para sua efetivação. Neste sentido, a intervenção no processo de formação dos professores em que as escolas, como instituição principal, desenvolvam ambientes democráti- cos e crítico, busquem a reflexão e a prática com a missão de educar os alunos para que sejam cidadãos reflexivos e ativos. Corroborando com essa ideia, Freire (2002, p.68) afirma: “Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo”. Finalizamos destacando a formação dos professores apenas para poder- mos ter uma premissa sobre a necessidade de investir cada vez mais em situações que promovam a qualidade na Educação, abrangida aqui como a melhoria da for- mação dos professores Enfim, outro mundo é apetecível e possível para a Educa- ção brasileira. CARVALHO, Ramires Santos Teodoro. The trajectory of teaching profession during the twentieth centur. DIALOGUS. Ribeirão Preto, v.7., n.2., 2011, pp. 25-39.
  28. 28. 28 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. ABSTRACT: The text presents the necessary knowledge for professionals in education, the formation of the identity of the teacher (reflective and researcher), seize the conceptions on the teaching and the importance in developing skills to teach. Analyze the teaching practices as a way to rethink the initial and in-service training of teachers and their professional identity, based on methodological questions of knowledge that constitute the teaching and the development of the processes of reflection on teaching practice. KEYWORDS: Initial and continuing training; Reflective Teacher; Identity; Knowledge of Teaching. REFERÊNCIAS ALARCÃO, Isabel (1992). Continuar a formar-se, renovar e inovar. A formação con- tínua de professores. Revista da Escola Superior de Educação de Santarém, p. 24-35, 1992. ALARCÃO, Isabel (org.). Formação reflexiva de professores. Estratégias de super- visão. Porto Portugal: Porto Editora LDA, 1996. ______. Professores reflexivos em uma escola reflexiva. São Paulo: Cortez, 2003. ALMEIDA, E. R. de S. A formação dos professores das classes especiais para o uso do computador na sala de aula. Recife: UFPE, Projeto de dissertação do mestrado em Educação, 2002. BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Funda- mental. Referências para formação de professores. Brasília, DF: MEC/ SEF, 1999. CARR, Wilfred. Uma teoría para la educatión – hacia uma investigación educativa crítica. Madrid: Morata, 1995. CARVALHO, Janete Magalhães; SIMÕES, Regina Helena Silva. O que dizem os artigos publicados em periódicos especializados, na década de 90 sobre o processo de formação continuada de professora? Artigo publicado em CD-room da XXII ANPEDE. GT Formação de Professores. Caxambu, MG: 1999. DEWEY, John. Como pensamos: como se relaciona o pensamento reflexivo com o processo educativo, uma reexposição. São Paulo: Editora Nacional, 1979. ESTRELA, M. T.; ESTEVES, M.; RODRIGUES, A. Síntese da Investigação sobre FormaçãoInicialdeProfessoresemPortugal(1990-2000).Porto:EditoraPorto,2002.
  29. 29. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 29 FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2001. GARCÍA, Marcelo G. A formação de professores: novas perspectivas baseadas na investigação sobre o pensamento do professor. In: NÓVOA, António. (org.). Os professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992. p.51-76.GARRIDO, Selma; GHEDIN, Evandro. (orgs.) Professor Reflexivo no Brasil: gênese e crítica de um conceito. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2006. GIROUX, Henry A. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. HOLEC, H. Autonomy and Foreign Language Leanúng. London: Pergamon Press, 1979. HOLEC, H. (1989) Les apprentissages auto-dirigés In: Les États Généraux des Langues, Paris, p. 26-29 AvriL, 1989. KEMMIS, S. Action researchand the politcs of reflection. In BOUD, D.; KEOGH, R.; WALKER, D. (eds.). Reflection. Turning experience into learning. Londres: Kongan Page, 1985. LASTÓRIA,A. C.; GONÇALVES, A. R.; OLIVEIRA,A. R. (2006) Saberes y prácticas docentes con el uso de atlas municipales escolares. In: GÓMEZ RODRIGUEZ,A.E.; NÚÑEZ GALIANO, M. P. (org.) Formar para investigar, investigar para formar endidáctica de las ciencias sociales. Málaga, AUPDCS - Digarza, p. 245-254. LIBANEO, José Carlos; PIMENTA, Selma Garrido. Formação de profissionais da educação: visão crítica e perspectiva de mudança. Educ. Soc., Campinas: Cedes, n. 68, p. 239-277, 1999. MIZUKAMI, M. G. N. et al. Escola e aprendizagem da docência: Processos de investigação e formação. São Carlos: EDUFSCar, 2002. NÓVOA, António (org.). Profissão professor. 2ª ed. Porto: Porto Editora, 1992. PÉREZ GÓMEZ, Angel. Las funciones sociales de la escuela: de la reproducción a la reconstrucción crítica del conocimiento y la experiencia. In: GIMENO SACRISTÁN, J.; PÉREZ GÓMEZ,A. Compreender y transformar la escuela. Madri: Morata, 1992. PERRENOUD, P. A prática reflexiva no ofício do professor: profissionalização e razão pedagógica. Porto Alegre: Artmed, 2002.
  30. 30. 30 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. PIMENTA, Selma G. O estágio na formação de professores-unidade teoria e prática? São Paulo: Cortez, 1994. ______. Educação, Pedagogia e Didática. In: PIMENTA, Selma G.( org.). Pedago- gia, ciência da educação? São Paulo: Cortez, 1996. ______. Formação de professores: saberes e identidade. In: ______. (org.). Sabe- res pedagógicos e atividades docentes. São Paulo: Cortez, 1999. ______. A pesquisa em Didática. Anais do X Endipe. Rio de Janeiro, jun. de 2000. Disponível em: <http://sites.uol.coi-n.br/smonteiro/anped>. Acesso em jun. 2012. PIMENTA, Selma; GARRIDO, Elsa; MOURA, Manoel. Pesquisa colaborativa na escola como abordagem facilitadora para o desenvolvimento profissional do pro- fessor. In: MARIN, Alda I. (org.). Educação Continuada. Campinas: Papirus, 2000. SANTOS, Milton. O professor como intelectual na sociedade contemporânea. In: Anais do IX Endipe. Águas de Lindóia, v. III, 1998. SCHÖN, Donald. Formar professores como profissionais reflexivos. In: NÓVOA, A. (org.). Os professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1995. SILVA, E. M. A. Dispositivos metodológicos para a formação continuada de profes- sores: uma abordagem crítico-reflexiva. In: FERREIRA, A. T. B.; ALBUQUERQUE, E. B. C.; LEAL, T. F. Formação continuada de professores: questões para refle- xão. Belo Horizonte: Autêntica, 2005. VIEIRA, F; MORElRA, M. A. Para além dos Testes. A Avaliação Processual na Aula de Inglês. Braga: Universidade do Minho, 1993. ZEICHNER, K. A Formação Reflexiva de Professores Ideias e Práticas. Lisboa: EDUCA, 1993.
  31. 31. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 31 MEMÓRIAS DE LEITURA E FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES Daniele Machado CARVALHO* Filomena Elaine Paiva ASSOLINI** Resumo: Essa pesquisa visa investigar a relação que os estudantes de Licenciatu- ra em Pedagogia estabeleceram com a leitura, durante o seu percurso de escolarização, nos níveis fundamental e médio, com a finalidade de compreender- mos se e como tal relação ecoa e repercute em seu processo de formação inicial, em particular no que diz respeito à aprendizagem e à aquisição de conhecimentos científicos. As investigações realizadas mostram a importância da memória discursiva, no que diz respeito à compreensão dos ecos e repercussões no proces- so de aprendizagem dos estudantes universitários, decorrentes de sua relação com a leitura na Educação Básica. Cumpre mencionar, assim, que a formação do do- cente não começa quando ele se matricula em um curso de Ensino Superior ou em formação continuada, mas sim a partir de momento em que se insere no processo formal de escolarização. Palavras chave: Leitura. Formação Inicial. Memória Discursiva. Aprendizagem. Introdução A preocupação com a questão da leitura, particularmente no curso de gra- duação em Pedagogia, despertou nosso interesse por essa investigação. Nossas inquietações nasceram a partir de observações feitas em nossa própria sala de aula. Sentimo-nos incomodados pelo fato de ouvirmos alguns estudantes, nossos colegas de curso, afirmarem ora que não gostam de ler, ora que não têm tempo para ler o que de fato gostariam, ora que gostariam de mudar as metodologias e práticas pedagógicas desenvolvidas por alguns professores do Ensino Fundamen- tal, em escolas nas quais realizaram seus estágios. Nossas análises partem das relações que estudantes do curso de Licenci- atura em Pedagogia estabeleceram com a leitura, durante todo o seu período de escolarização formal, Ensino Fundamental e Médio. Questionamos se e como tais * Graduada em Pedagogia pela FFCLRP-USP, Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil. E-mail da autora: daniele_05@hotmail.com. ** Docente do Departamento de Educação, Informação e Comunicação, FFCLRP-USP, Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil. E-mail da autora: elainesol@netsite.com.br.
  32. 32. 32 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. relações reverberam, hoje, quando ocupam a posição de sujeitos-universitários, além de investigarmos a influência dessas relações para a apropriação de conheci- mentos científico-acadêmicos. Para alcançar nossos objetivos, fundamentamo-nos nos aparatos teóricometodológicos da Análise de Discurso de matriz francesa, nos postulados do referencial Histórico-Cultural, proposto por Chartier e colaboradores e nos estu- dos e pesquisas sobre a formação inicial de professores. Queremos destacar que para o desenvolvimento desta pesquisa, conta- mos com o apoio da Pró-Reitoria de Graduação da Universidade de São Paulo, a partir de nossa inserção no Programa Ensinar com Pesquisa / 2010. Fundamentação teórica: conceitos definições Para iniciarmos apresentaremos uma breve exposição dos conceitos da Análise de Discurso de matriz francesa – teoria à qual nos filiamos e que embasa nossos estudos e investigações. Fundamentada na teoria semiótica, a Análise de Discurso estuda não a frase ou a palavra isoladamente, mas o funcionamento dos textos e dos sentidos considerando as condições sócio-histórico-culturais, sendo assim, “no discurso te- mos o social e o histórico indissociados” (ORLANDI, 2006, p. 14). Destacamos, aqui, que quando estamos falando de discurso, referimo-nos ao “efeito de sentidos entre locutores” (PÊCHEUX, 1969), ou seja, é um instrumen- to de comunicação que tem seu funcionamento através da relação entre os locuto- res e, essa relação, é afetada pela formação discursiva, pelo contexto histórico, pela posição que os locutores ocupam. Portanto, a Análise de Discurso (A.D.) tra- balha e estuda essa relação entre o discurso e a exterioridade, entre o discurso e suas condições de produção. Contra as práticas conteudistas, a A.D. não questiona o seu objeto de aná- lise com questões como: “o que o autor quis dizer?”, “qual a mensagem central do texto?”. Para o analista de discurso, indagações como estas não procuram com- preender os sentidos que estão circulando nos textos, “o discurso é assim palavra em movimento, prática de linguagem: com o estudo do discurso observa-se o ho- mem falando” (ORLANDI, 2007, p. 15). Além disso, a A.D. atenta-se à opacidade buscando perscrutar o que o incompleto e o disperso querem dizer, ou seja, ques- tiona o funcionamento da linguagem, “[...] para a Análise do Discurso, a questão que se coloca não é descobrir o que o texto quer dizer, mas trabalhar o texto para descobrir como ele significa” (ORLANDI, 1987, p. 66). Cumpre lembrar que, para a A.D., a linguagem não é neutra, nem transpa-
  33. 33. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 33 rente, ou seja, é marcada e influenciada pela ideologia dominante. A linguagem aqui referida não deve ser considerada como algo exato, completo e que não está suscetível a falhas, mas como um instrumento utilizado pelos sujeitos para se tor- narem atuantes na sociedade. Uma vez aceita essa característica, não podemos mais deixar de estudar a linguagem fora do contexto social em que ela está inserida. Dando prosseguimento, trazemos o conceito de interdiscurso que, segun- do Orlandi (2007), se trata de todas as formulações já ditas ou vistas que foram esquecidas, mas que determinam e influenciam em nosso discurso; irrepresentável, ele é constituído de todos os dizeres “já ditos”. É ele que preside todo o dizer, fornecendo a cada sujeito sua realidade enquanto sistema de evidências e de sig- nificações percebidas, experimentadas (ORLANDI, 1987, 2001, 2006). Ao pensarmos no papel do interdiscurso na formulação de um novo discur- so, podemos nos aprofundar e pensarmos que não existem sentidos que não possu- am relações com outros, uma vez que, ao falarmos estamos sendo influenciados, inconscientemente, por vozes já ditas antes em outro contexto e, possivelmente em outra formação discursiva: “[...] um sujeito não é homogêneo, e sim heterogêneo, constituído por um conjunto de diferentes vozes” (FERNANDES, 2005, p. 13). É válido salientar que o discurso do sujeito – o intradiscurso –, aquele que o sujeito acredita ter originado em si, constitui-se pelo interdiscurso, o que contraria e desmonta a crença do sujeito como fonte e origem do sentido. Paula (2008) lem- bra que a relação que o sujeito do discurso mantém com o interdiscurso nos remete ao processo de constituição do sujeito (do inconsciente), da forma como nos ensi- na a psicanálise lacaniana (LACAN, 1957, 1998). Um outro conceito que permeia essa pesquisa é o que se refere à memó- ria discursiva, que segundo Pêcheux (1997, 1999), é a memória dos sentidos cons- tituídos pela relação dialética que se estabelece entra e Língua e a História. É um tipo de memória que se busca a partir de indícios deixados pelos acontecimentos histórico-linguísticos, nas superfícies dos arquivos a serem lidos. Com relação ao referencial Histórico-Cultural nos embasamos nos postu- lados de Chartier (1999) e colaboradores no que se refere às práticas de leitura no decorrer da história da humanidade, as concepções de leitura, a sua significância sócio-cultural e as diversas maneiras para sua prática. Em suas pesquisas, Chartier procura compreender como se deram as prá- ticas de leitura, sem deixar de levar em consideração especificidades e condições que levaram o homem a realizá-las. Para o autor, não podemos estudar essa práti- ca sem nos atentarmos, também, às condições históricosociais que a influencia- ram. Segundo Chartier (1990),
  34. 34. 34 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. a história cultural, tal como a entendemos, tem por principal objecto identificar o modo como em diferentes lugares e movimentos uma determinada realidade social é construída, pensada, dada a ler (p. 16- 17). É fundamental lembrar que, no enfoque discursivo, os sentidos e os sujei- tos não são entendidos como estáticos, mas como movimento e historicidade. Historicidade, em nova perspectiva teórica, [...] não se define pela cronologia, nem por seus acidentes, nem é tampouco evo- lução, mas produção de sentidos [...] não há história sem discurso. É aliás, pelo discurso que a história não é só evolução, mas sentido, ou melhor, é pelo discurso que não se está só na evolução, mas na História (ORLANDI, 1990, p. 14). De um ponto de vista discursivo, portanto, história é entendida como trama de sentidos, que não se confunde com a cronologia de fatos, mas que se define como produção de sentidos sobre o real, que determina essa cronologia, intervindo na constituição dos sujeitos e no funcionamento da linguagem. Concordando que a historicidade é que constitui o funcionamento das práticas de leitura, não podemos deixar de citar a influencia da ideologia numa dada sociedade. O filósofo Foucault (1979), ao problematizar a noção de ideologia, instiga- nos a pensar como são produzidos, historicamente, efeitos de verdade no interior de discursos. Tais efeitos não são, em si, nem verdadeiros, nem falsos. Eles permi- tem considerar a ideologia em seu funcionamento, no jogo discursivo em que se travam pequenas e cotidianas batalhas pelos jogos de verdade. Com base nos estudos nietzschianos, Foucault (1979 e 1988) afirma que a verdade não pode ser entendida como única, fixa, estável, mas como verdades que são constantemente construídas e postuladas para certos momentos, em da- dos lugares; se existem escolhas, a verdade já não pode ser uma. Foucaut (1979 e 1988) explica que a verdade está circularmente ligada a sistemas de poder, que a produzem e a apoiam e também, está relacionada a efeitos de poder que ela induz e produz. Com relação à questão da interpretação, que na perspectiva discursiva, é uma injunção, o que significa que, face a um objeto simbólico, o sujeito se encontra na necessidade de dar sentido, é relevante explicarmos que o Discurso Pedagógi- co Escolar – D.P.E. – pode silenciar os sentidos através da paráfrase ou incentivar que os educandos exponham seus pontos de vistas e interpretações possíveis através da polissemia. Isso nos faz entender que a leitura de um texto permite que os sentidos
  35. 35. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 35 ecoem e sejam estabelecidos conforme a historicidade do sujeito-leitor e as múlti- plas posições que pode estar inserido. Cumpre lembrar que os sentidos caminham de maneira tortuosa e que quem estabelece esse caminho percorrido são as condi- ções de produção as quais o indivíduo se encontra. Para encerramos esse momento trabalharemos agora com a questão da Formação Inicial de professores, o que queremos destacar é que durante o período de graduação as vivências e experiências escolares que fizeram parte da história de vida do futuro professor não podem e não devem ser desconsideradas, uma vez que, mesmo que ele não se dê conta disso, as marcas e os ecos dessas vivências, que constituem a sua memória discursiva, irá reverberar em sua futura atuação profissional. Concordamos com Coracini (2000), quando afirma que a formação do do- cente não começa quando ele se matricula em um curso de ensino superior ou em formação continuada, mas sim a partir do momento em que o futuro professor pas- sa a ter contato com o ambiente escolar, ou seja, quando ingressa na educação infantil ou nas séries iniciais do ensino fundamental. São essas primeiras relações entre professor-aluno e aluno-escola que influenciarão, inconscientemente, na for- ma como o docente em formação irá ministrar e formular suas aulas. Tendo em vista, portanto, que a leitura constitui-se em ferramenta basilar para a formação docente e, considerando que as histórias de leituras dos estudan- tes não devem ser desconsideradas, assinalamos que: “ler é fazer-se ler e dar-se a ler” (GOULEMOT, 1996, p. 116). Em outros termos, ler é produzir sentidos a partir de diferentes posições que podemos ocupar ao longo de nossa história de vida. Essa produção de sentidos sustenta-se e alimenta-se de nossas leituras anteriores ou, como diz Goulemot (1996), na nossa “biblioteca vivida” (p. 116). Portanto, quanto mais rico o arquivo do futuro professor, quanto mais bem nutrida sua memória discursiva, quanto mais bem constituída sua biblioteca, maiores condições e recur- sos ele terá para exercer sua profissão. Ou, como diz Assolini (2009, 2010), permi- tir a emergência da subjetividade do sujeito. De acordo com a autora, a valorização da subjetividade do educando e do próprio educador poderia contribuir positiva- mente, no sentido de que o imaginário acerca do educador (docente) pudesse ser deslocado, possibilitando aos educandos (estudantes universitários) compreender melhor o docente, enquanto sujeito que ocupa, em determinadas condições de produção, a posição de um sujeito a quem cabe não a simples transmissão de conhecimento, a de um sujeito que detém o saber, mas sim um docente-pesquisa- dor, mediador, entre a cultura e os conhecimentos científicos disponibilizados e os estudantes.
  36. 36. 36 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. Com relação a isso entendemos que a Universidade deve abrir espaços para que os estudantes possam realizar leituras e interpretações que não se res- trinjam à paráfrase, ou seja, à reprodução de sentidos estabilizados, cristalizados. Consideramos que, ao ampliar as condições de produção, para que os estudantes possam realizar leituras que não as acadêmicas, propriamente ditas, a Universida- de e, especialmente os cursos de licenciatura, podem contribuir para ampliar e aprimorar a criatividade do estudante. Entendemos que o curso de licenciatura em Pedagogia poderia, desde os semestres iniciais do curso, oferecer aos estudantes oportunidades para se inscre- verem em formações discursivas que admitissem a diversidade de sujeitos-leito- res, bem como para realizarem leituras intertextuais. A noção de intertextualidade implica a relação que um texto tem com outros textos. Indurky (2001, p. 29-30) tratando dessa questão, define a intertextualidade como a retomada, releitura que um texto produz sobre outro texto, aproximando-se para transformá-lo ou assimilá- lo. Assim, o processo de intertextualidade lança o texto a uma origem possível. Nessa perspectiva, Assolini (1999, 2003, 2006, 2008, 2009, 2010) vem desenvolvendo estudos que mostram que, quando o estudante não pode ocupar a posição-sujeito de intérprete-historicizado, dificilmente ele poderá ou conseguirá ocupar a posição-autor. Assim, quando a instituição escolar silencia a produção de outros sentidos, de outras leituras, de outras interpretações, ela impede a criação de reais espaços interpretativos que poderiam possibilitar aos alunos se inscreve- rem no interdiscurso, criarem sítios de significância e historicizarem os sentidos. Aspectos metodológicos O processo metodológico da presente pesquisa envolveu, inicialmente, a realização de dez entrevistas semiestruturadas com graduandos, de períodos di- versos, do curso de Pedagogia de uma universidade pública do Estado de São Paulo. Essas entrevistas resultaram em recortes que serão analisados e discutidos – as sequências discursivas de referência, S.D.R. (Courtine, 1981). Cumpre enfatizar que procuramos entender, através das entrevistas, as relações que os graduandos de Pedagogia tiveram com a leitura em toda formação escolar e como essas marcas históricas interferem na maneira como eles lidam com a leitura hoje. Utilizamos de entrevistas semiestruturadas a fim de que pudéssemos rea- lizar outras perguntas pertinentes ao tema. Além disso, entendemos que, em con- cordância com Authier-Revuz (1998), através do discurso oral os indivíduos não possuem pleno controle da dispersão dos sentidos, da falha e do equívoco, o que
  37. 37. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 37 nos permite compreender e interpretar a discursividade, os traços deixados em sua produção, o dito e o não dito, traços que se manifestam pelo equívoco, pelas fa- lhas, pelas rupturas da língua em relação ao sujeito, possíveis de serem captura- dos, na relação intradiscurso e interdiscurso. Nessa relação recai a ênfase metodológica de nosso trabalho. Como diz Authier-Revuz (1998): “[...] o texto oral, em que não se podem suprimir as reformulações, deixa mecanicamente, no fio do discurso, os traços do processo de produção (p. 97); portanto, todas as entrevistas foram gravadas e transcritas literalmente pela própria estudante bolsista e, a partir delas, buscamos compreender as histórias de leitura que os estudantes tiveram em sua formação básica e o que isso trouxe como consequência para a forma como lidam com a leitura. Além disso, através da utilização de entrevistas semiestruturadas, os estu- dantes narram e descrevem sobre suas vidas, de forma que sua subjetividade en- tão emerja. Segundo Guedes-Pinto, Gomes e Silva (2008), ao falar de si, de suas ex- periências passadas, os indivíduos resgatam de seus arquivos de memória não só aquilo que realmente aconteceu, mas também o que poderia ter acontecido e aqui- lo que eles gostariam que acontecesse. Nosso trabalho, então, foi verificar essas nuances presentes no discurso, referentes ao que o sujeito pensa sobre a leitura e o que realmente se passou em sua história de vida, pois assumir que a memória também pode ser uma possibilidade de mudança, uma alternativa para as situações já vividas ou em curso significa assumir também que, ao construirmos um trabalho de pesquisa pautado nos pressupostos teóri- cos da História Oral, estamos diante de um grande mosaico (GUEDES-PINTO, GOMES e SILVA, 2008, p. 22).47 Ou seja, tanto a memória discursiva do sujeito quanto as diversas interpre- tações que podemos fazer delas vão se interligando e formando nosso objeto de estudo. A realização das entrevistas e a sua transcrição literal consiste no primeiro passo, rumo ao tratamento dos fatos linguísticos. Trata-se de um primeiro momen- to, no qual o analista decide o que fará parte do corpus. Para a constituição do nosso corpus, delimitamos alguns recortes discursivos baseados em nosso objeto de estudo. Segundo Fernandes (2008), “trata- se da seleção de fragmentos do corpus para análise, ou seja, ele precisa ainda selecionar pequenas partes, escolhidas por relações semânticas, tendo em vista os objetivos do estudo” (p. 65), o que quer dizer que no caso dessa pesquisa, este corpus está relacionado com a questão da leitura e a formação de docentes.
  38. 38. 38 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. Iremos, então, partir para as análises discursivas lembrando que, devido às limitações para o presente artigo, optamos por cinco recortes para o embasamento de nossas considerações finais. Análises discursivas Para analisarmos e discutirmos os recortes – as sequências discursivas de referência, S.D.R., (Courtine, 1981) – obtidos através de entrevistas realizadas com estudantes de Pedagogia devemos lembrar que os consideramos como histo- ricamente constituídos e, portanto, permeados e influenciados pela ideologia em que estão inseridos, uma vez que um está em constante processo de formação com o outro. Cabe dizer que os gestos de interpretação que procedemos não esca- pam da posição de sujeito-estudanteuniversitário(a) inserido em um lugar, em um tempo, em um espaço em que a subjetividade da sua história de vida entra inevita- velmente na interpretação. O primeiro recorte se refere à questão: As leituras que você realizou, ou não, na infância e na adolescência, contribuíram para se aprendizado acadêmico? Como foram essas leituras? Como elas aconteceram? Onde? Com que pessoas? (1) Na infância? Não. Não contribuíram. Eu não li muito na infância e também, é ... as pessoas não leram para mim. Também ... então, não! Na infância mesmo eu não tive, não que eu me lembre acho que se eu tivesse tido alguma experiência marcante eu me lembraria mas acho que não teve nada marcante. Aí um pouco foram os professores, mas eu também não considero que eles tenham sido signi- ficativos. Acho que foi uma outra situação. Na verdade a situação foi assim, é ... posso ir falando assim? É ... depois que eu saí do colegial, do colegial né? Antes era colegial. Eu ... eu comecei a ler outras coisas, li gibi, aí eu me senti livre, eu não tinha que ler aquelas coisas que eram obrigatórias que os professores exigi- am, então eu senti uma certa liberdade, agora eu vou ler tudo o que eu quiser. Comecei a ler gibi, na verdade o gibi do Batman e aí eu comecei a gostar muito mais de leitura do que eu gostava quando tava na escola né. Aí do Batman passou para outras coisas como o ... acho que uma das coisas que marcantes foram o Sidney Shaldon (aí eu li vários livros do Sidney Shaldon), achava muito legal. Aí eu cansei e fui pra outra coisa como Agatha Christie, então assim, mais na litera- tura internacional e daí ... aí que eu comecei a gostar muito mais de outras coisas assim, inclusive coisas brasileiras é Machado deAssis, então só depois que eu saí do colegial que eu comecei a gostar, por exemplo, de literatura brasileira, e lá era obrigado. (Posição de sujeito estudante universitário “A”) Podemos notar que, a partir das sequências discursivas de referência –
  39. 39. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 39 S.D.R. – destacadas, que o sujeito “A” não considera que as leituras realizadas na infância tenham tido significativa importância em sua vida. Percebemos que não é atribuída às instituições de ensino a responsabilidade pelo gosto, hoje, com a leitu- ra: “aí um pouco foram os professores, mas eu também não considero que eles tenham sido significativos” (Sujeito A). Podemos observar que o sujeito “A”, em seu processo de escolarização, realizou diversas leituras, concebidas por ele como “obrigatórias”, que ocasiona- ram o não estímulo e não gosto por tal prática, sendo elas vistas por ele como uma “prisão”. Nesse contexto, trazemos o conceito da leitura parafrástica tal como é postulado por Assolini (1999) em que, o professor, através do Discurso Pedagógico Autoritário, D.P.A., estabelece as leituras e a interpretação, única, do texto traba- lhado, desestimulando a atuação do educando, sendo assim, a ‘verdade’ é imposta pela voz do saber que fala no professor, auto- ridade convenientemente titulada, aceita e reconhecida como legítima, no espaço escolar. Lembremo-nos de que a imagem social do aluno é a de um sujeito que não possui conhecimento algum, cabendo-lhe, assim, submeter-se ao discurso e às imposições da posição-professor, que, supostamente, exerce o domínio exclu- sivo do conhecimento e, na maior parte das vezes, não admite discordâncias ou contribuições diferentes e até mesmo imprevisíveis (ASSOLINI, 1999, p. 105). É pertinente assinalar, também, que as leituras realizadas pelo sujeito “A”, quando afirma “eu senti uma certa liberdade”, permitem-nos pensar que, naquele momento de sua história de vida, ele consegue estabelecer com a leitura uma relação prazerosa, posto que está inserido em formações discursivas que lhe dão oportunidade de experimentar “uma certa liberdade”. Segundo nosso gesto interpretativo, trata-se de uma liberdade que lhe permitiria selecionar e escolher livros e textos, neste caso gibis, que fazem vivenciar situações agradáveis com as quais se identifica: “Comecei a ler gibi, na verdade o gibi do Batman e aí eu come- cei a gostar muito mais de leitura do que eu gostava quando tava na escola né”. No que diz respeito à questão da obrigatoriedade da leitura, no contexto escolar, quereríamos destacar que, em toda formação social, se fazem presentes diferentes formas de controle da interpretação. Esse controle advém, segundo Pêcheux (1995), de um lado da necessidade que tem todo sujeito de dominar sua relação com o não sentido, ou como diz o próprio filósofo, de ter um mundo “se- manticamente normal” e, de outro, da necessidade de toda sociedade de adminis- trar a relação do sujeito com os sentidos. Lembramos aqui a imprevisibilidade decorrente da relação do sujeito com
  40. 40. 40 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. os sentidos ou, como salienta Orlandi (2001), [...] não é porque o processo de significação é aberto que não seria regido, administrado. Ao contrário, é justamente pela abertura que há determinação: lá onde, a língua, passível de jogo (ou afetada pelo equívoco) se inscreve na histó- ria para que haja sentido (p. 20). A instituição escolar enquanto aparelho ideológico, no dizer de Althusser (1974), gerencia os sentidos que podem circular, ou seja, circulam os sentidos que ela, a instituição escolar, julga adequados para atingir os seus fins que, na maioria dos casos, não correspondem, na prática, ao que consta nos projetos político-pe- dagógicos. Ainda em relação ao recorte número 1, gostaríamos de nos deter na se- guinte sequência discursiva: “Aí um pouco foram os professores, mas eu também não considero que eles tenham sido significativos”. Como pode ser constatado, o sujeito “A”, nega a influência de seus professores, em sua infância, negando as contribuições para a sua formação como sujeito-leitor. Ocupando-nos da marca linguístico-discursiva da negação, trazemos Castro (1992, p. 5), que a entende como “[...] um momento privilegiado no qual toda a multivocidade da linguagem se evidencia”. É interessante salientar que Freud, já no início do século XX, ensina-nos que, ao negar, o sujeito está afirmando. De acordo com o pai da Psicanálise, “[...] a negação constitui um modo de tomar conhecimento do que está reprimido; com efeito, já é uma suspensão da repressão, embora não, naturalmente, uma aceita- ção do que está reprimido” (FREUD, 1925, p. 296). Em diálogo com o autor acima citado, trazemos Indursky (1997) que nos esclarece que “a negação revela, embora tente camuflar, o que é e não é dito ao mesmo tempo” (p. 68). Assim, embora o sujeito “A” não se dê conta, ao negar, traz à tona uma verdade como bem coloca Castro, com quem compartilhamos: “[...] a negação é um modo de a verdade, vale dizer, a verdade do inconsciente, se revelar e se ocultar ao mesmo tempo” (CASTRO, 1992, p. 5). Com relação às experiências com a leitura durante o ensino fundamental e médio, destacamos os seguintes recortes: (2) Bom no fundamental ... é o que eu falei: os livros eu achava mais interessan- tes, porque os professores se preocupavam com livros que se adequavam à faixa etária que eu estava. Quando foi pro Ensino Médio, no sistema de só pensando no vestibular, então, tinha professor que nem dava o livro completo; já dava o resumo
  41. 41. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 41 pronto porque você tinha que saber o que tava no livro só pra fazer prova. (Posi- ção de Sujeito estudante universitário “B”) (3) No Ensino Fundamental não tinha tanto aquela obrigação de ler, né? Era uma coisa mais livre. Eu pegava livro porque eu gostava mesmo de ler e não era aqueles livros difíceis igual no Ensino Médio e na graduação, mas eu lia. Era assim com menos frequência do que no Ensino Médio. Agora no Ensino Médio tinha que ler mais aquelas leituras obrigatórias, principalmente de português, re- dação, literatura e história. Tinha muitos textos – aí já era mais obrigatório ler. (Posição de Sujeito estudante universitário “C”) Nos recortes escolhidos, notamos que durante todo o processo de escolarização os estudantes não tiveram outra relação com a leitura que não fosse através da imposição, da obrigatoriedade. Observa-se que essa característica se agrava durante o Ensino Médio devido às exigências dos vestibulares. É importante destacar que o sujeito-professor, para que seus educandos obtenham bons resultados nessas avaliações, acaba procurando alternativas como os “resumos”, para que eles possam compreender rapidamente a mensagem cen- tral da obra. Atitude essa que inibe as diversas interpretações que podem ser for- muladas através de uma leitura atenta da obra, pois “a interpretação é sempre regida por condições de produção específicas que, no entanto, aparecem como universais e eternas. Disso resulta a impressão do sentido único e verdadeiro” (ORLANDI, 2006, p. 25). Além disso, esse apagamento da interpretação própria do leitor não per- mite que o estudante ocupe e exercite seu gesto de autoria. O fato de o ensino da leitura estar sustentado pela ilusão de sentido literal ou do efeito referencial traz como conseqüência o entendimento de que compre- ender o texto significa simplesmente ir ao código lingüístico e buscar ‘o’ sentido que estaria colado à palavra. Sendo assim, a atividade de compreensão textual, isto é, saber como um objeto simbólico produz sentidos, saber como as interpreta- ções funcionam, reduz-se à transcrição de respostas dadas pelo próprio professor (que as copiou do manual didático), antes mesmo de o aluno refletir sobre o texto (ASSOLINI, 1999, p. 222). Em relação a isso e levando em consideração a contribuição da História Cultural através dos postulados de Chartier (1999), destacamos que a leitura é uma prática histórica, que se deve levar em conta a historicidade tanto de locutor quanto do interlocutor para que se produzam gestos de interpretação. As práticas
  42. 42. 42 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. de leitura não são algo estático, mas relacionam-se ao momento histórico e às condições de produção. Quanto ao caráter histórico da leitura, concordamos que “[...] na história da leitura, se pensarmos na leitura como uma prática, há a cada dia milhões de indivíduos que realizam milhões de atos de leitura” (CHARTIER, 2001, p. 101). Acreditando na importância da historicidade do sujeito para a aquisição positiva da prática de leitura, analisaremos, agora, a influência do professor, visto como um modelo no que se refere a essa questão, na vida desses estudantes. O recorte número quatro é referente à questão: Você lembra de algum (a) professor (a) que tenha sido um modelo, uma referência, no que se refere a leitura de maneira ampla? Teve algum professor que te marcou? (4) Então, modelo de leitura assim, não! Eu lembro que tinha um profes- sor de biologia. As aulas dele eram muito boas e por causa da forma com ele ministrava a matéria, eu comecei a ler por conta livros e revistas sobre paleontologia, sobre fitologia; ele não indicava, a matéria dele que era muito boa! Eu gostei, despertei o interesse por causa do jeito que ele dava a aula, como ele trabalhava com a matéria e eu, por conta, comecei a ir atrás, mas da escola mesmo não tinha muita, muita coisa não. (Posição de Sujeito estudante universitário “D”) O que nos chama a atenção é que, quando se pensa em incentivo à leitu- ra, logo se estabelece que essa tarefa é, somente, do professor de literatura e língua portuguesa. Como podemos notar, esse incentivo é responsabilidade de toda escola e, consequentemente, de todo corpo docente. Decorre daí a importância da formação profissional docente, pois, mais do que nunca, o estudante da sociedade atual – quer seja da Educação Básica, quer seja do Ensino Superior – tem a expectativa por situações de ensino não mais fundamentadas na simples e inócua “transmissão de conhecimentos”, mas sim a partir de situações que lhe assegurem possibilidades de investigação e pesquisa; associação e relação entre teoria e prática e, sobretudo, elaboração de um conhe- cimento em que se coloque como autor de seu próprio dizer. Iremos nos dedicar, agora, à análise de recortes referentes à relação que os estudantes universitários do curso de Pedagogia estabelecem com a leitura durante a graduação. A questão formulada foi: Como você pretende trabalhar com a leitura, quando ocupar a posição professor(a)? (5) Eu pretendo incentivar a leitura, e eu pretendo assim, é... mostrar para
  43. 43. DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. 43 os alunos como é gostoso ler e apresentar pra eles vários tipos de literatura. Por- que, muitas vezes, a criança pode não se interessar pela leitura porque é imposto a ela algo (de) que ela não gosta, mas de repente você mostra, dá opções pra ela: “olha você pode ler isso, não só o livro você pode ler história em quadrinhos, você pode ler poesia”, eu acho que o interessante, a chave (a partir de) que você pode atrair o leitor, é dar as opções pra ele ler. (Posição de Sujeito estudante univer- sitário “E”) Para a análise dessa última questão, deter-nos-emos primeiramente, na sequência discursiva “Eu pretendo incentivar a leitura, eu pretendo assim, é... mos- trar para os alunos como é gostoso ler e apresentar pra eles vários tipos de litera- tura” relacionada à formação imaginária, por parte do estudante “E”, de que, no futuro, quando ocupar a posição professor, trabalharia a leitura considerando diver- sos gêneros textuais. É válido lembrar que as formações imaginárias são constitutivas do discurso, uma vez que todo discurso é direcionado (inconscientemente) em função da ima- gem que o sujeito faz de si, do outro e do objeto do qual fala. No que concerne às sequências discursivas, “porque muitas vezes a criança pode não se interessar pela leitura porque é imposto a ela algo (de) que ela não gosta, mas de repente você mostra, dá opções para ela” e “eu acho que o interessan- te, a chave (a partir de) que você pode atrair o leitor, é dar as opções para ele ler”, nossos gestos de interpretação levam-nos a compreender que o sujeito “E” está fa- lando de si, de suas próprias experiências – logicamente que de maneira indireta, camuflada, oblíqua. Ao dizer “porque é imposto a ela algo (de) que ela não gosta”, o sujeito-estudante-universitário “E” está falando que lhe foram impostas situações pe- dagógicas com a leitura das quais não gostou ou com as quais não concordou. Compreendemos “história de vida”, tal como propõe Coracini (2003a) em seu texto “A subjetividade na escrita do professor”, não como um monumento capaz de ser construído – história verídica, capaz de ser rememorada, mas sim como “frag- mentos de discursos que carregam consigo fragmentos de uma realidade sócio- histórica” (p. 03) . Como já observado em outros capítulos, temos como base teórica a noção de um sujeito cindido, atravessado pelo inconsciente, cujo discurso, no vão desejo de controlar os sentidos exibe falhas, furos, desejos, ficando a linguagem entendida como o lugar do equívoco ou, como explica Orlandi (1999, 2001, 2006), para a língua fazer sentido é preciso a história intervir e com ela o equívoco, a ambiguidade, a espessura material do significante. O sujeito não tem acesso ao modo como os sentidos se constituem nele, uma
  44. 44. 44 DIALOGUS, Ribeirão Preto v.7 n.2 2011. vez que é afetado pela memória discursiva, pelas suas filiações, que vão historicizando a trajetória de cada um. No caso acima, parece-nos que o sujeito “E” é impingido a entrar em forma- ções discursivas nas quais predominam alguns traços de autoritarismo no proces- so de ensino-aprendizagem. Ele parece não concordar nem se identificar com es- sas formações discursivas. Lembremos que a identidade do sujeito é afetada en- quanto sujeito do discurso, pois de acordo com Pêcheux (1995), a identidade resul- ta de processos de identificação, segundo os quais o sujeito deve inscrever-se em uma (e não em outra) formação discursiva para que suas palavras tenham sentido. Sendo assim, o significante “opções”, que aparece duas vezes no recorte aci- ma, nos permite perscrutar o desejo do sujeito de levar para a sala de aula metodologias de ensino diferentes das quais vivenciou em sua historia. Em suas formações imaginárias, ele projeta sua futura atuação com base no entendimento de que o trabalho pedagógico com diferentes gêneros textuais cons- titui-se em alternativa vigorosa para o desenvolvimento de uma prática pedagógica escolar diferenciada com a leitura. Nesse trabalho, gênero está sendo tomado na perspectiva de Bakhtin, que nos ensina que a linguagem deve ser pensada na relação com as diferentes esfe- ras de atividades humanas. Ao fazer uso da linguagem nas diversas atividades sociais, o homem se insere em um gênero; dessa relação entre a vida e a lingua- gem originam-se as coerções genéricas sobre as práticas discursivas (Cf. BAKHTIN, 1992, 1997). Avançando com as nossas interpretações, concordamos com os estudos de Eckert-Hoff (2008) ao observar que: [...] está instituído, no imaginário – construído pelos cursos de formação – que o sujeito professor deve inovar, o que o leva a enfatizar, no seu dizer, a ques- tão do novo, [...] o que denuncia a constante busca pela completude (p. 82). Como vimos procurando mostrar, o sujeito, tal como concebido na pers- pectiva da A.D., é historicamente determinado pelo interdiscurso, pela memória do dizer e também marcado por determinações inconscientes. As marcas dessa me- mória irão influenciar sua atuação, quando no exercício do magistério. Sendo as- sim, é importante que, de fato, os estudantes possam apropriar-se dos conheci- mentos que lhes são apresentados, saboreá-los, ocupando o lugar de intérpretes- historicizados, desde o início do curso. Para nós, ocupar tal posição é condição imprescindível para que possam proporcionar aos alunos, que estarão sob sua

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