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lembranças de família 1
100 ANOS SALGUEIRO
Lembranças de família
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 32
Sumário
	 Abertura	................................................................................................................................................5
	
	 Introdução ............................................................................................................................................7
	 Depoimentos dos filhos	
	 Anna ........................................................................................................................................................9
	 Antônio .................................................................................................................................................17
	 Célia ......................................................................................................................................................37
	 Sônia ......................................................................................................................................................79
	 José ......................................................................................................................................................111
	 Luiz ......................................................................................................................................................121
	
	 Depoimentos do genro e nora						
	 José Maria ............................................................................................................................................127
	 Vera .....................................................................................................................................................133
	
	 Epílogo ..............................................................................................................................................137
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 54
Abertura
	 “(...) Família é prato difícil de preparar. São muitos ingredientes. Reunir todos é um problema. (...) Não é
para qualquer um. Os truques, os segredos, o imprevisível. Às vezes, dá até vontade de desistir. (...) Mas a vida -
(...) - sempre arruma um jeito de nos entusiasmar e abrir o apetite. O tempo põe a mesa, determina o número de
cadeiras e os lugares. Súbito, feito milagre, a família está servida. Fulana sai a mais inteligente de todas. Beltrano
veio no ponto, é o mais brincalhão e comunicativo, unanimidade. Sicrano - quem diria? - solou, endureceu,
murchou antes do tempo. Este, o mais gordo e generoso, farto, abundante. Aquele o que surpreendeu e foi morar
longe. Ela, a mais apaixonada. A outra, a mais consistente.
	 (...) Já estão aí? Todas? Ótimo. Agora, ponha o avental, pegue a tábua, a faca mais afiada e tome alguns cuidados.
Logo, logo, você também estará cheirando a alho e cebola. Não se envergonhe de chorar. Família é prato que emociona.
E a gente chora mesmo. De alegria, de raiva ou de tristeza.
	 Primeiro cuidado: temperos exóticos alteram o sabor do parentesco. Mas, se misturadas com delicadeza, estas espe-
ciarias - que quase sempre vêm da África e do Oriente e nos parecem estranhas ao paladar - tornam a família muito
mais colorida, interessante e saborosa.
	 Atenção também com os pesos e as medidas. Uma pitada a mais disso ou daquilo e, pronto: é um verdadeiro de-
sastre. Família é prato extremamente sensível. Tudo tem de ser muito bem pesado, muito bem medido. Outra coisa: é
preciso ter boa mão, ser profissional. Principalmente na hora que se decide meter a colher. Saber meter a colher é verda-
deira arte. Uma grande amiga minha desandou a receita de toda a família, só porque meteu a colher na hora errada.
	 O pior é que ainda tem gente que acredita na receita da família perfeita. Bobagem. Tudo ilusão. Não existe “Fa-
mília a Oswaldo Aranha”; “Família à Rossini”, “Família à Belle Meunière” ou “Família ao Molho Pardo” - em que
o sangue é fundamental para o preparo da iguaria. Família é afinidade, é “à Moda da Casa”. E cada casa gosta de
preparar a família a seu jeito.
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 76
	 Há famílias doces. Outras, meio amargas. Outras, apimentadíssimas. Há também as que não têm gosto de nada
- seriam assim um tipo de “Família Diet”, que você suporta só para manter a linha. Seja como for, família é prato que
deve ser servido sempre quente, quentíssimo. Uma família fria é insuportável, impossível de se engolir.(...)
	 Enfim, receita de família não se copia, se inventa. A gente vai aprendendo aos poucos, improvisando e transmitin-
do o que sabe no dia a dia. A gente cata um registro ali, de alguém que sabe e conta, e outro aqui, que ficou no pedaço
de papel. Muita coisa se perde na lembrança. Principalmente, na cabeça de um velho já meio caduco como eu. O que
este veterano cozinheiro pode dizer é que, por mais sem graça, por pior que seja o paladar, família é prato que você tem
que experimentar e comer. Se puder saborear, saboreie. Não ligue para etiquetas. Passe o pão naquele molhinho que
ficou na porcelana, na louça, no alumínio ou no barro. Aproveite ao máximo. Família é prato que, quando se acaba,
nunca mais se repete.
AZEVEDO, Francisco. Arroz de Palma. 5.ed. Rio de Janeiro: Record, 2012.
		 (p.11–14).
Introdução
	 A ideia da comemoração dos 100 anos do nascimento do Papai surgiu a partir da leitura, feita por Antônio,
de um livro emprestado por sua filha Fernanda, ARROZ DE PALMA, de autoria de Francisco Azevedo.
	 Este livro narra a saga da família portuguesa de José Custódio e Maria Romana. O personagem - relator da
historia - é o filho mais velho do casal, chamado Antônio. Coincidência?
	 O livro se inicia com o relato de Antônio, então, com 88 anos, preparando as refeições para um encontro com
a família. Família que ele define como um prato que emociona e, também, como um prato difícil de preparar. É
preciso ter muito cuidado para não desandar a receita. Reunir toda a família exige coragem, devoção, paciência...
	 O Antônio, personagem do livro, como o nosso Antônio, se encontra saudoso porque está há muito tempo
sem ver seus irmãos e, por isso, pensou que o centenário seria um bom pretexto para a reunião da família, inclu-
sive contando com a presença dos sobrinhos, sobrinhas, netos e netas, que ele ainda não conhecia.
	 E Vera, sua esposa, foi a primeira a incentivá-lo a organizar a reunião. Assim, Antônio telefonou para a sua
filha Fernanda que, por sua vez, conversou com a sua tia Célia e lhe enviou de presente o referido livro. Após
a leitura, Célia adorou a ideia e conversou com cada um dos irmãos, sugerindo não só que todos lessem o livro
como, também, antecipando a possibilidade de um encontro de todos eles. Foi dado, assim, o primeiro e prin-
cipal passo para o futuro encontro.
	 Assim, todos os irmãos e irmãs ficaram animados, concordaram com a proposta e definiram a data do en-
contro: 03 de agosto de 2013, a data de seu nascimento.
	 Em seguida, era necessário decidir o que cada um dos irmãos deveria escrever. Optamos por um texto que
relatasse as lembranças mais marcantes de nosso pai. Nossa intenção era que estes escritos poderiam subsidiar
um relato mais amplo sobre a trajetória de vida de nosso pai que, posteriormente, seriam condensadas em um
pendrive ou, quem sabe, em um livro?
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 98
	 A partir daí, iniciamos cada um de nós a escrever as passagens mais importantes que vivemos em nossa fa-
mília. E foram muitas as lembranças, tantos os casos, inúmeras as situações (...). E, paralelamente, começamos a
recolher documentos sobre a sua trajetória de vida, sua família, seus estudos, seu trabalho, suas músicas preferi-
das, (...) ilustrando sempre que possível, com fotografias... Algumas dessas lembranças nos fizeram rir, enquanto
outras, algumas vezes, provocaram lágrimas...
	 E os depoimentos foram chegando, pouco a pouco, de acordo com a disponibilidade de cada um de nós. E,
com eles, algumas dúvidas foram surgindo: o que faremos com esse material? Organizaremos um resumo de tudo
que foi escrito pelos filhos? Ou destacaremos o depoimento de cada um? Os depoimentos eram tão genuínos
que, muitas vezes, alguns fatos se repetiram em diferentes escritos. Daí, pensamos: quem sabe essas repetições nos
estão mostrando as características mais marcantes do nosso pai, o senhor Salgueiro?
	 Outro desafio surgiu ao tentarmos organizar os escritos de cada um de nós: deveríamos seguir a ordem
cronológica em que cada um dos depoimentos foi escrito ou a data em que cada um de nós os enviou? Ao final,
optamos pelo depoimento de cada um dos filhos, em ordem cronológica: Anna, Antônio, Célia, Sônia, José e
Luiz, e, em seguida as noras e os genros.
Depoimento Anna
Como nosso PAI me surpreendia!
	 Depois que li os lindos textos de meus irmãos – Célia, Antônio, Sônia, José e Luiz – me pus a pensar: o que
restou para eu escrever? Eles já escreveram tudo sobre papai! Inclusive alguns acontecimentos que eu desconhecia!
Realmente me senti perdida...
	 Durante a noite, depois de muito matutar, tive uma ideia: vou escrever sobre duas situações em que papai
me SURPREENDEU!
	 O primeiro relato tem início no ano de 1954, quando estudando no colégio de Passa Quatro, na 3ª série gi-
nasial, eu e algumas colegas de minha turma, decidimos organizar um time de voleibol. Já jogávamos no próprio
colégio durante o recreio, nas aulas de Educação Física e, muitas vezes, algumas partidas entre as internas e as
externas.
	 Assim, a partir dessa primeira experiência, organizamos um time de vôlei feminino que denominamos Alvi
Celeste. Dele faziam parte algumas colegas da 3ª série ginasial. Era um grupo muito unido, muito companheiro,
muito comprometido...
	 Nossos treinos aconteciam ao final da tarde, pelo menos três vezes por semana, em uma quadra de terra,
em frente à nossa casa, à Avenida Coronel Ribeiro Pereira, nº 2. Mamãe, toda folga que tinha, estava na janela
acompanhando as partidas e observando o desempenho da filha. Quando eu conseguia fazer uma defesa mais
difícil ou uma cortada indefensável, ela vibrava!
	 Continuamos a treinar, e a jogar ora com o time do internato e ora com dois outros times da cidade – o
Rubro Negro e o Blue Star -, até que surgiu a primeira oportunidade de jogarmos em outra cidade. O convite
veio de um time de Itanhandu. Quando contei à mamãe desse convite para jogar em Itanhandu, antes que eu
terminasse de falar, ela já me respondeu categoricamente: Nem pensar! Seu pai não vai deixar! Não precisa tentar!
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 1110
	 Para mim foi uma decepção! Mas mesmo assim, resolvi
tentar convencer o papai. Na verdade, não foi necessário ne-
nhum argumento para convencê-lo. Ele, de cara, concordou,
e não só concordou como levou toda a família para assistir a
partida. Foi só alegria! Eles torceram muito! E para completar
essa felicidade, conseguimos vencer o time adversário.
	 Daí para frente, participamos de muitas partidas em di-
ferentes cidades, tanto do estado de São Paulo, como do Rio
e de Minas, sempre apoiadas por papai e mamãe. Jogamos
mais de uma vez na cidade de Cruzeiro, em Engenheiro Pas-
sos, em Lorena,...
	 Também jogamos em Itajubá. Desta vez, foi mamãe que
nos acompanhou e levamos conosco o José, que devia ter mais ou menos uns três anos. Mamãe fez para ele uma
camiseta igual ao uniforme do nosso time e ele foi de mascote. Fez muito sucesso!			
	 Daí em diante, realizamos também outras viagens e enfrentamos os ti-
mes de voleibol de Maria da Fé, de Santa Rita do Sapucaí. Nessas últimas
partidas, a Célia já integrava nosso time. Vencemos todas as partidas, só
perdemos para o time de Santa Rita. Isso ocorreu tanto na partida realizada
em Santa Rita como na partida realizada em Passa Quatro. Infelizmente,
tivemos que reconhecer que o time de Santa Rita era superior ao nosso!
	 Também, considero importante dizer que papai e mamãe incentivaram
essas atividades e delas participaram com muita alegria. Não perdiam ne-
nhuma partida realizada em Passa Quatro. Sempre estavam presentes, tor-
cendo pelo time e principalmente pelas filhas.
	 A última partida que jogamos foi no Rio. Recebemos um convite de um
time de Jacarepaguá. Aí enfrentamos um problema: quem nos acompanharia
nessa viagem? Fizemos várias tentativas e não conseguimos nenhuma mãe dispo-
nível para nos acompanhar. Já estávamos desanimadas, e desistindo da viagem
ao Rio, quando o senhor Salgueiro nos salvou! Sem pestanejar ele topou acom-
panhar nosso time que, nessa altura, já era dele também. Alugamos um ônibus
e lá fomos com o senhor Salgueiro para o Rio de Janeiro. Enfrentamos um time
forte, foi uma partida dura, mas conseguimos vencer! Foi só comemoração!
	 Em seguida, passo ao segundo relato. Trata-se da proibição do senhor Salgueiro de as filhas participarem de
festas dançantes em casa de colegas e em bailes na “Sociedade” em Passa Quatro. Ele, definitivamente, não admi-
tia! Carnaval, a gente só ia ao baile infantil! Fazíamos várias tentativas, usávamos vários argumentos para ele nos
deixar ir aos bailes, mas tudo em vão!
	 Mais uma vez fui por ele surpreendida! Nessa época papai trabalhava em Elói Mendes. E, em uma de suas
vindas à Passa Quatro para visitar a família, ele me convidou para ir a Elói Mendes, para um baile com a orquestra
Cassino de Sevilha. Quase desmaiei de susto! E mamãe também! Mais do que depressa, mamãe ajeitou um vestido
e lá fui eu com o senhor Salgueiro para o baile. Ele estava todo feliz de me levar para dançar! Foi maravilhoso ir
a um baile acompanhada pelo meu pai. Inimaginável!
	 Assim, a partir dessa data, passamos a participar dos bailes que aconteciam em Passa Quatro - eu, Célia e
Sonia. Mas sempre acompanhadas da dona Auxiliadora. Ela, que também gostava muito de dançar, ficava muito
feliz em nos levar aos bailes e, principalmente, em saber que papai já não era mais tão rígido como antes! SUR-
PREENDENTE ESSE SENHOR SALGUEIRO!
	 Que saudades, meu pai!
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 1312
Lembranças de papai: diário do ano de 1940
Anna Maria Salgueiro Caldeira
	 Recentemente, buscando lembranças de meu pai, tive uma grande surpresa! Na caixa de sapato, já meio
desgastada, encontrei um caderno de capa dura, com uma etiqueta com os dizeres: Diário do ano de 1940, de José
Manoel Salgueiro.
	 A partir de várias leituras desse diário, me sinto capaz de fazer uma síntese das principais ideias nele contidas.
Para isso, extraí, do próprio texto, algumas partes que traduzem os momentos mais significativos de sua vida no
ano de 1940.
	 Dentre os fatos mais marcantes e de muita felicidade em sua vida, no ano de 1940, ressalto o seu noivado
com minha mãe e, três meses depois, o casamento. Em seguida, ele enfrenta uma realidade muito dura e que
lhe causou profunda tristeza: a morte de seu querido pai, meu avô, o senhor Salgueiro, que há seis anos estava
paralítico.
	 No entanto, antes de recontar essas passagens alegres e, também, aquela que lhe causou aflição e sofrimento,
gostaria de ressaltar o seu compromisso com seu pai, sua mãe e com seus irmãos. Papai cuidava muito de seu
pai, tinha por ele um carinho especial e, inúmeras vezes, lhe dava o banho, fazia a sua barba e até cortava o seu
cabelo. Levava-o, algumas vezes, até o quintal para pudesse conhecer a horta, cuidada por ele todas as manhãs
bem cedinho.
	 Papai ajudava também seus irmãos, especialmente, sua irmã Joaquina, viúva e com cinco filhos ainda peque-
nos, pagando o aluguel da casa em que morava. Também cuidava de sua horta, ora capinando, ora plantando,
colocando terra, podando, replantando legumes e verduras. Além disso, era zeloso com seu irmão caçula Chico,
ajudando-o quando necessário, mas sendo severo quando era preciso.
	 Papai gostava de levantar muito cedo para cuidar da horta, atividade que realizava diariamente. Assim, não
me causou surpresa quando, em seu diário, ele escreve que: às cinco horas da manhã, capinei a horta, plantei um
pé de limão galego, semeei cebola e cenoura, plantei feijão, fiz canteiro, capinei meu amendoim e mandioca (...). O
produto deste trabalho era tanto para uso próprio, como também era vendido, ajudando a despesa da casa.
	 Na parte da tarde, papai trabalhava na Coletoria Federal, como auxiliar. Além desse trabalho, papai também
menciona que faz escrita para várias pessoas conhecidas, rendimento que contribui também para a manutenção
de sua família.
	 Também, pude perceber nos seus relatos que sua casa estava sempre cheia de gente. Quase todos os dias,
ele escreve: estiveram em casa tio Cristiano, tio Tonho e tio Euclides, dona Isaura, dona Marieta, dona Dália e
Zequinha, Frederico, Hélio e Cecília, dona Antônia e Yolanda, Carlota, Hélio Faria, dona Ângela, dona Maria
Catita e primo Mário, entre muitos outros.
	 Passo, em seguida, a relatar os principais momentos, de sua vida cotidiana, por ele registrados em seu diário e
que se referem, especialmente, à sua relação com a Auxiliadora, nossa mãe que, algumas vezes, é também referida
por ele como Nina.
	 Em 1º de janeiro de 1940, papai escreve: Fui á missa junto com Nina. Estive com ela o dia todo. É o meu
amorzinho de alma, coração e corpo. Dei um passeio com ela. O dia de hoje passamos admiravelmente, deixando-me
saudades. Dia adorável! Cheguei à minha casa às 11 horas e trouxe a aliança de Nina. E, em 16 de janeiro, ele diz:
Arranjei minha aliança, pagando dez mil réis.
	 Foram muitas as cartas e os encontros que papai e mamãe trocaram entre os meses de janeiro e maio, quando
se casaram. Ainda em janeiro, dia 17, ele recebe carta de Nina. No dia 18, ele escreve: Fui à Piranguinho encontrar
com Nina. E no dia 20 registra: Nina esteve em casa. Almoçou comigo e a tarde fui junto com ela para a cidade, onde
fomos assentar no banco do jardim. Fomos à casa do Álvaro de Castro, o filho dele fez um ano. Depois descemos e fomos
à casa de dona Antônia e Yolanda.
	 No dia 21 de janeiro, ele assim se refere à mamãe:
	 Nina chegou e estivemos juntinhos durante muito tempo. É um anjo que tenho. À tarde fui com ela à fábrica de
camas e voltamos de ônibus. Estive em casa de dona Antônia, e demos um passeio. Amei a Nina como ninguém ama.
Fui embora às 11:30 horas.
	 No dia seguinte – dia 22 - papai escreve:
	 (...) Nina esteve em casa. Abracei e kiss. Fui acompanhá-la até a estação. (...) Adeus minha querida. Ela chorou
poucos minutos antes de embarcar, não sei por que motivo. Nina embarcou para Santa Rita às 9 horas.
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 1514
	 A seguir, extrato do diário dos dias 21 e 22 de janeiro de 1940:
	 Nos dias seguintes, a correspondência entre
eles se manteve intensa! No dia 7 de fevereiro, ele es-
creve: Telegrafei para Nina pela data de seu aniversário.
Ela hoje completou 23 anos.
	 No dia 11 de fevereiro, papai e mamãe ficaram
noivos. Nesse dia ele registra em seu diário: Fui cedo
à Santa Rita voltando à noite. Estive com Nina o dia
todo. Com Jandira, Adolfina, Doris, Geraldo, Toninho.
Falei com Adolfina sobre o nosso noivado. Deixei as
alianças com a Nina para mandar apertar. Choveu!
	 Em 12 de fevereiro, papai relata: Fui cedo à
Santa Rita, voltando à noite. Estive com Nina durante
o dia todo. Com Jandira e Geraldo, Adolfina, Doris, Toninho. (...)
Deixei as alianças com Nina para ajustá-las.
	 Em 3 de março, novamente em Santa Rita com a Nina, papai
conta: Passei o dia em casa de Auxiliadora. Fui à missa com ela. Esti-
vemos arranjando os cartões de participação do noivado, subscritando
tanto para Santa Rita, como para Itajubá e outras localidades.
	 E já no dia 6 de março, ele escreve: o doutor Gaspar veio dar-
-me os parabéns pelo noivado e eu o convidei para padrinho.
Dois dias depois, papai telefona para a Auxiliadora, vai a Santa
Rita e registra em seu diário: É um anjo, a minha queridinha. E,
no dia 11 de março, registra: Faz hoje 5 anos e 8 meses que papai
está de cama e um mês que fiquei noivo de Auxiliadora.
	 Em seguida, o relato de papai no dia 24 de março:
	 ...embarquei cedo para Santa Rita, estive o dia com Nina, meu
amorzinho. Adolfina ofereceu-nos um jantar. O (Zé) Gouveia e a
Doris ficaram noivos! Estive firme! Auxiliadora mandou uns doces
para mamãe. Guardei de lembrança do jantar uma rolha e uma
folha datada de 24/03/1940. Nina
	 Nos intervalos entre as idas e vindas de papai à Santa Rita, as cartas entre os dois são praticamente diárias.
	 No dia 14 de abril, papai escreve: fui cedo a Olegário e Santa Rita e voltei à noite. Passei o dia com a querida
Maria Auxiliadora. Fui ao ginásio, estive com dona Espanha e Milton. Auxiliadora deu-me a aliança que mandei
arranjar e um lencinho rosado. Lá se foi o meu amorzinho...
	 Papai recebeu, em 18 de abril, carta expressa de sua noiva com os papéis de casamento. No dia seguinte, assinou
os papéis e escreveu para Auxiliadora e, no outro dia, recebeu outra carta de sua noiva com o edital do casamento.
	 Em 25 de abril, ele registra que Auxiliadora veio de Santa Rita com dona Adolfina. Fui à cidade com Auxilia-
dora e ela com a mãe vieram jantar em casa. Fui ao cinema com a Auxiliadora. A sogra Adolfina comprou os móveis
para eu e Auxiliadora.
	 No dia seguinte, ele anota no diário: Nina foi embora cedo. Fui ver os móveis. E, em seguida, coloca:
ATENÇÂO
Meus pais: Antônio Manuel Salgueiro e Anna Victória da Silva Salgueiro, ele de 1863 e mamãe de 1879.
Auxiliadora: Antônio Luiz de Souza e Adolfina Ribeiro Duarte
	 E, no dia 2 de maio, escreve: Participei o senhor Lopes e Ferreira, o senhor Jarbas, Edson e família que vou me casar.
	 E, no dia 8: comprei um chapéu por 70$000 e meu sapato por 65$000 na Liberty. Dona Maria Gonçalves deu-
-me 10$000 para comprar uma gravata de casamento.
	 E, no dia seguinte: Fui ao Forum buscar o papel de meu casamento para enviar para Nina.
	 No dia 12, Papai vai novamente a Santa Rita: Passei o dia com ela alegre e feliz!
	 E as cartas, diárias, continuaram de lá para cá e daqui para lá!
	 E, no dia 20 de maio, papai relata que o senhor Maurício deu-lhe de presente de casamento 100$000 mil
réis e o doutor Gaspar deu-lhe seis copos e uma jarra de cristal; Jaime e Milena lhe deram uma Santa Terezinha.
	 Finalmente, chegou o dia 21 de maio de 1940!
	 Dia feliz para mim e para Auxiliadora! Fui de automóvel para Santa Rita. Levei comigo de automóvel papai e
mamãe até Olegário Maciel. Cheguei a Santa Rita às 12:20 horas. Estive com Auxiliadora e os seus. Casamos às 17:30
horas. Nós não ficamos nervosos, todos calmos. Meus padrinhos, o Dr. Gaspar Lisboa e dona Nair Rezende Lisboa,
foram para ambas as cerimonias. E os da Auxiliadora, no civil, foram Américo Julidore e dona Espanha e, no religioso,
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 1716
senhor Otávio Ribeiro e dona Maria José Carvalho Renó. (...) Nina ganhou muitos presentes. Recebemos muitos cartões
de felicitação. Passei uma noite feliz com Auxiliadora. Dormimos a noite toda pela primeira vez, felizes e contentes!
	 Logo abaixo dessa parte do relato, mamãe escreve no diário: Senti-me muito feliz nesse dia. Assinado: Auxilia-
dora Salgueiro.
	 Papai tinha muito carinho e cuidado com seus pais. Seu pai, Antônio Manoel Salgueiro, nasceu em 25 de
agosto de 1862, em Pombal do Marques, Portugal. Casou-se em Serra Azul em 1895. Viveu, por seis anos, para-
lítico. Faleceu aos 78 anos. Deixou cinco filhos e doze netos. Sua morte causou grande comoção ao meu pai que,
assim, se expressou em seu diário, no dia de sua morte:
	 Dia 8 de junho:
	 Página negra da minha vida. Papai faleceu às 4 horas da madrugada, sem ninguém ver.Telefonei para Olegário
e Piranguinho para Dona e José. Vesti papai com a mamãe. Telefonei para Pedra Branca Alegre e Delfim Moreira.
Mandei fazer 3003contos de convite, mandei fazer o caixão de segunda, que papai me pediu. Fui à igreja encomendar
a (...). O padre Theodoro que encomendou papai. Papai foi descido à sepultura às 5 horas e 35 cinco minutos da tarde
e o meu último olhar para ele foi às cinco horas e quarenta e cinco minutos. A sepultura é de nº 184, quadra 17.
	 Papai nasceu em Portugal em 1862, em 25 de agosto, no lugar Pombal do Marquês. Seus pais eram: Manuel Antônio
Salgueiro e Joaquina Maria Salgueiro, casou-se em Serra Azul, em 6 de julho
de 1895, deixou 5 filhos e 12 netos.
	 A partir desse dia, papai escreve uma lista enorme de nomes de pessoas
que estiveram com ele, tanto no enterro, como em sua casa, nos dias seguintes.
	 Os relatos posteriores a esta data se referem às atividades de papai no
dia-a-dia, seja em casa como no trabalho, algumas viagens com mamãe à
Santa Rita e visitas da vó Adolfina e outros parentes à sua casa em Itajubá.
	 No entanto, chamou a minha atenção a última página do diário,
datada de 13 de dezembro de 1940. Papai escreve: Não trabalhei no dia
de Santa Luzia. Fui à missa.
	 Ao ler esta última frase, me veio à memória que papai tinha uma gran-
de devoção por Santa Luzia e que, todos os anos, no seu dia, ele ia à missa
em uma igreja em Pinheirinho. Por acaso, encontrei uma foto dele, ainda
pequeno, em que está bem visível uma alteração nos seus olhos. Então me
lembrei de que ele nos dizia que foi curado por sua fé em Santa Luzia!
Vô Salgueiro
Depoimento Antônio
	 Do casamento de Antonio Manoel Salgueiro, natural de
Portugal (25-08-1863/08-06-1940) e AnnaVictoria, brasileira,
(25-04-1879 /13-09-1969), realizado em Pedra Azul- SP, em
06/07/1879, nasceram seis filhos: Antônio (11-06-1896/17-
09-1897), Joaquina (28-03-1898/22-01-1966), Anna (25-
12-1903/ 12-12-1986), José Benedito (28-02-1906/01-03-
1966), José Manoel (03-08-1913/ 02 -09 -86) e José Francisco
(16-06-1916/ 02 08-1991). Seus avós paternos eram Manoel
Antônio Salgueiro e Maria Joaquina Salgueiro e os avós ma-
ternos Francisco Rodrigues da Silva e Maria da Glória Guima-
rães. Jose Manoel nasceu na Pimenteira em Olegário Maciel.
	 Passaporte do Vô Antônio Manoel – outubro 1986
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 1918
Anotações do Vô Antônio Manoel do nascimento e morte de
seus filhos
Anotações de Papai do nascimento de seus pais e nascimento e morte de seus irmãos
Papai foi o único dos filhos que conseguiu estudar. Para isso trabalhava na escola onde estudava.
Certificado de Conclusão do 2º ano – 1932
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 2120
Certificado de Conclusão do quinto ano - 1935
	 O primeiro, segun-
do e terceiro anos do gi-
nasial cursou no Colégio
São Vicente de Paulo em
Itajubá. A quarta e quin-
ta séries, no Instituto
Moderno de Educação e
Ensino em Santa Rita do
Sapucaí, época em que
conheceu sua futura es-
posa Nina.
	 Enquanto alguns colegas continuaram os estudos em escolas superiores, papai foi obrigado a interrompê-los
para trabalhar porque seu Pai sofreu um derrame cerebral e ficou paralítico por seis anos. Seu colega de turma
Olavo Miranda, por exemplo, formou-se em Direito e foi professor de Português e Espanhol no Colégio Itajubá.
Condoído, pelo fato dele ter concluído a quinta
série, que correspondia ao nosso científico, fato
raro na época, o senhor Jarbas Guimarães, coletor
federal em Itajubá, convidou papai para ser seu
auxiliar na coletoria.
	 Em agosto e setembro de 1938, papai voltou
a Santa Rita para votar, nas primeiras eleições da
constituição de 1938, ocasião em que reencon-
trou a Nina, que estava noiva. No entanto, ela
desmanchou o noivado e voltaram a namorar.
E, em 11-02-1940, ficaram noivos e, em 21-05-
1940, estavam casados.
Convite do Baile de Formatura em Santa Rita do Sapucaí - dezembro de 1934
Comunicação do contrato de casamento - 11/02/1940
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 2322
	 A seguir, relaciono uma série de documentos relativos à vida profissional de meu pai. Em 31 de agosto de 1944,
foi nomeado interinamente para exercer o cargo de escrivão da Coletoria de Rendas Federais, em Delfim Moreira.
Designação para exercer interinamente o cargo de Escrivão da Coletoria de Rendas
Federais em Delfim Moreira – 31/08/1944
	 Em 1945, fez concurso de provas para provimento à classe inicial de carreira de Escrivão de Coletoria Fe-
deral, e foi nomeado, em 29 de agosto de 1946, conforme certificado apresentado a seguir, permanecendo em
Delfim Moreira.
Certificado de Habilitação como Escrivão Federal – 1946
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 2524
	 Em 1949, foi transferido para Passa Quatro, onde permaneceu como escrivão federal. Foi coletor federal em
Elói Mendes, onde ele ficou pouco tempo e retornou a Passa Quatro como coletor federal.
	 Acompanhando a trajetória profis-
sional de nosso pai, moramos inicial-
mente em Itajubá, à Rua José Joaquim
91. Daí, mudamos sucessivamente
para Delfim Moreira, novamente para
Itajubá, em seguida para Passa Quatro,
voltamos a Itajubá e, em 1950, muda-
mos definitivamente para Passa Qua-
tro, na Avenida Cel. Ribeiro Pereira,
número 2.
	 Passa Quatro com as quatro curvas
do rio e as pedras enfeitando o leito de
suas ruas – no dizer do Oliveira - en-
feitiçou toda a família, viramos passa-
quatrenses.
	 Finalmente, em 1960, mudamos para a Rua Major Alessandro, 68, onde papai morou até o seu falecimento
em 1986.
	 Papai e mamãe tiveram seis filhos: Anna Maria, Antônio, Célia Maria, Sônia Maria, José e Luiz.
	 Nosso Pai tinha uma grande destreza manual, tanto na horta como nas “escritas”, em compensação, para
dançar era um fracasso. A música também não era seu ponto forte, mas gostava de pelo menos três: Kalu, Aqueles
olhos verdes e No Rancho Fundo. As duas primeiras podem ser explicadas pelos olhos verdes de D. Auxiliadora
e a última porque ele foi colega do Alvarenga, da dupla Alvarenga e Ranchinho, do primeiro Ranchinho - foram
três -. Papai no contava até que o apelido do Ranchinho veio de tanto os colegas pedirem para ele cantar “aquela
do Rancho”, assim virou Ranchinho.
	 Na horta, seus canteiros eram muito bem feitos e as verduras milimetricamente plantadas. Até o laço para
pegar os sabiás, comedores de morango, era muito bem feito. O caramanchão de plantação de chuchu era um
primor de obra e, sua produção, eu vendia semanalmente para o Patronato e para a quitanda da D. Maria Kato.
	 As cercas que ele fazia no quintal eram perfeitas. Comprava a vara de bambu, serrava os pedaços todos do
mesmíssimo tamanho e, com seu facão, os rachava ao meio. Tudo exatamente igual. A cerca era feita com as ta-
Cartão de Natal – 1969/1970
quaras a 45°, com as metades cortadas se contrapondo.
	 Durante muito tempo papai foi produtor de mudas de café. Plantava as sementes e cuidava das mudas e,
depois de passado certo tempo, replantava-as. No início usava as tradicionais jacas de bambu. Posteriormente
inovou com o uso do compensado, grampeado nas duas pontas, como suporte para o plantio das mudas. Para
combater os insetos daninhos nas plantações, pegávamos sapos nas ruas. Já nessa época, o Senhor Salgueiro era
ecologicamente correto.
	 Também, para obtenção de adubo, ele fazia dois buracos na horta de aproximadamente 1,50X 1,50 X 1,00,
onde depositava todo o lixo orgânico da casa além de folhas secas do quintal, que ele molhava regularmente.
Enquanto esvaziava um buraco, ia enchendo o outro e, assim, tinha adubo o tempo todo.
	 Além da horta e dos pés de cafés, ele também cuidava do seu jardim. A “vedete” era a plantação de lírios.
Eram plantados para serem colhidos anualmente no dia de finados. Ele colhia e levava as flores para o túmulo de
seu Pai em Itajubá.
	 Lembro-me também de quando comprou ou alugou, não sei ao certo, um terreno onde é hoje o Bairro
Copacabana, onde pretendia ampliar sua horta. Para isso, era preciso canalizar um córrego que passava no meio
do terreno. O senhor Salgueiro emprestou da Prefeitura fôrmas metálicas, comprou cascalho, cimento e ferro, e
fomos construir as manilhas. Deviam ter 60 cm de diâmetro. Colocávamos os ferros na forma e os misturávamos
com a massa. A vibração era obtida com pedaços de ferro batendo nas formas.
	 Depois de desenformadas e curadas, em uma área cimentada na entrada de nossa casa, as manilhas eram
transportadas, de carroça, para a futura horta. Em seguida, foi feita a canalização do córrego. Infelizmente, a obra
não resistiu à primeira chuva!
	 Meu pai tinha também uma grande habilidade nas escritas que fazia em casa. Ele traçava, no borrador, linhas
paralelas, com sua régua plástica preta, sempre com uma simetria perfeita!
	 No final da vida, o que muito me marcou, foi quando Papai estava internado no hospital em Itajubá. Em
seus delírios, ele recorria sempre à ajuda de seu Pai, falecido há mais de quarenta anos.
	 Meu Pai se levantava sempre muito cedo, cuidava da horta, fazia o café, chamava os filhos para irem ao co-
légio e ia trabalhar na Coletoria, de portas fechadas.
	 Na nossa infância nunca tivemos empregada doméstica em casa, era tudo por conta da D. Auxiliadora. Ela
era a faz-de-tudo de nossa casa. Assim, nas raras ocasiões em que ela se ausentava, Papai assumia a cozinha. Sua
característica era fazer arroz vermelho. Usava para isso massa de tomate. Fazia também o viradinho de queijo e,
ocasionalmente, a broa pau-a-pique.
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 2726
O viradinho era servido no café da manhã.
RECEITA DO VIRADO
Ingredientes para quatro pessoas
1 colher de sopa de óleo
320 grs. de queijo
200 grs. de farinha de milho
3 ovos batidos
3 colheres de sopa de açúcar
Preparo
Corte o queijo em fatias bem finas... Reserve.
Bata os ovos até a mistura ficar uniforme e despeje na panela com a gordura quente.
Mexa bem até começar a cozinhar.
Despeje o queijo na panela e continue a mexer.
Acrescente a farinha de milho, continuando a mexer.
Finalmente, coloque o açúcar e bom apetite!
Senhor Salgueiro em Campo Grande
	 Papai e Mamãe vieram muitas vezes à Campo
Grande. Assim, relatarei os fatos mais marcantes de
sua permanência em nossa.
	 A primeira vez que aqui veio, ele viu um tuca-
no e me disse que várias pessoas lhe pediram para
levar aquele passarinho. Eu estranhei aquele pedido.
Depois que ele me explicou eu entendi que o que
aquelas pessoas queriam era um “bicudo”.
	 Em 1972, quando jantávamos na casa do Ker-
man Machado, ele ficou batendo um longo papo
com o governador José Fragelli, sem saber quem ele
era. E acabou levando um baita susto quando eu o
informei de quem se tratava.
	 Em junho de 1977, no aniversário de 10 anos da
PLANEL, fomos, com meu grande amigo Fabiano,
pescar no Rio Piquiri na Fazenda Santo Antonio do
Paraíso. Em uma manhã pescamos 54 pacus. Foram
momentos de rara felicidade! Vô Salgueiro e Antônio - Pescaria em Mato Grosso do Sul
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 2928
Papai pescando - Mato Grosso do Sul
Papai e Mamãe também vieram a Campo Grande para o nascimento de meus filhos.
Papai e Nanda - Presidente Prudente
Vô perto das rosas que plantou em Campo Grande com Ronan e Nanda
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 3130
Vó Nina ensinando a fazer nhoque com Nanda, Papai e Fabiana
Papai, Ronan, Fernanda, Fabiana e Vera – Cabo Frio
Antônio, Vera, Fernanda, Vinícius e Fabiana - Curitiba
Vinicius, Cristina, Camila, Ronan, Gabriela, Fernanda e Fabiana
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 3332
Camila, Cristina, Eduardo, Fernanda, Vera, Ronan, Fabiana, Antônio, Gabriela e Marcelo
	 Em uma das vindas de papai à Campo Grande, fomos nas manhãs do sábado plantar algumas mudas de
abacaxi em um terreno que eu possuía nas proximidades da Universidade Federal. De enxada nas mãos plantamos
e carpimos o abacaxisal. Depois que compramos o Fazendão, trocamos a diversão, encontramos brinquedo novo!
De Passa Quatro vieram mudas de capim Guatemala e dois casais de ganso, sendo um, o de bico preto, além das
mudas de amora branca.
Presentes marcantes
	 A primeira lembrança que ganhei de meu pai foi uma espada. Meu Pai a recebeu do seu Pai que, por sua vez,
foi presenteado por um amigo que lutou na Guerra do Paraguai. Recentemente mostrei a espada para meu neto
Vinicius e ele ficou encantado! De onde ele está, sei que meu pai deu um belo sorriso nesse momento.
	 E ganhei também um relógio antigo de parede. Não foi o relógio “oficial” da família que, me parece, foi
presenteado ao José. Mas o que ganhei, provavelmente, é tão antigo quanto o outro.
	 E Papai tinha também o costume de dar moedas de prata de libra esterlina. Eu e o Ronan ganhamos este regalo.
	 Suas músicas preferidas eram:
KALU
Humberto Teixeira
Kalu, Kalu
Tira o verde desses óiosdi riba d’eu
Kalu, Kalu
Não me tente se você já me esqueceu
Kalu, Kalu
Esse oiá despois do que se assucedeu
Cum franqueza só n’um tendo coração
Fazê tal judiação
Você tá mangando d’eu
Com franqueza só não tendo coração
Fazê tal judiação
Você tá mangando d’eu!
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 3534
AQUELES OLHOS VERDES
Aqueles olhos verdes
Translúcidos serenos
Parecem dois amenos
Pedaços do luar
Mas têm a miragem
Profunda do oceano
E trazem todo o engano
Das procelas do mar
Aqueles olhos verdes
Que inspiram tanta calma
Entraram em minh’alma
Encheram-na de dor
Aqueles olhos tristes
Pegaram-me tristeza
Deixando-me a crueza
De tão infeliz amor
Aqueles olhos verdes
Que inspiram tanta calma
Entraram em minh’alma
Encheram-na de dor
Aqueles olhos tristes
Pegaram-me tristeza
Deixando-me a crueza
De tão infeliz amor
Astral
	 Apesar de não ser de muito conversar, meu Pai tinha um magnetismo fora do normal e, enquanto ele
esteve entre nós, orbitávamos ao seu redor.
	 Nas festas de fim de ano, sempre estávamos juntos, comendo castanhas portuguesas, leitoa, bacalhoada e
nem sei mais o que...
Sua Família
	 Não é possível falar de meu
Pai, sem nos lembrarmos da Sá
Donana. Ela morou com meus
pais desde que eles se casaram e
só, esporadicamente, passava al-
gum tempo com o tio Zé Gran-
de em Itajubá. Papai sempre foi
extremamente paciente com ela.
E ela não era fácil! Era só ser
contrariada e ela tinha chilique!
E toca a correr para dar-lhe as
30 gotas de coramina.
	 Papai era muito preocupa-
do com seus irmãos e sempre
que eles precisavam de alguma
ajuda, lá estava o “Zé Mané” os
socorrendo! Zé Mané, pois era
assim que sua família o chamava. Ele cuidava de todos! Não se tratava apenas de um amor fraterno, era um amor
quase crístico!
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 3736
Santa Luzia
	 Na infância meu Pai foi acometido de um problema na visão e foi curado devido às orações a Santa Luzia e,
desde então, passou a manifestar uma enorme crença pela santa.
	 Assim, diante de qualquer problema que tínhamos nos olhos, ele prescrevia que disséssemos três vezes: Santa
Luzia passou por aqui, com seu cavalinho comendo capim. E, ao mesmo tempo, deslizássemos o polegar abaixo
dos olhos. Com todo esse fervor, infalivelmente, - no dia 13 de dezembro - dia de Santa Luzia, papai ia à Missa
na Igreja do Pinheirinho. Ia a pé ou de charrete, mas sempre lá estava ele para agradecer a graça recebida.
Depoimento Célia
“Oque a memória ama, fica eterno”
Adélia Prado
	 Antes de escrever minhas lembranças de coisas vividas com meu pai, gostaria de contar para vocês sobre um
livro que ganhei de minha sobrinha, Gabriela, intitulado “A sabedoria do Salgueiro”, de Jean-Yves Leloup, e
que recorda muito nosso pai. É a cara dele!
	 A seguir, transcrevo pequenos trechos do livro para vocês:
	 “Alguns passos adiante, ele viu um Salgueiro à margem do rio... Os galhos flexíveis do Salgueiro se inclinavam sob o peso da
neve; ao chegarem ao solo, eles se libertavam suavemente de sua carga e, então, voltavam aos seus lugares, intactos.” (2005, p.15).
	(...) “brandura na retidão, doçura no vigor” (...) (2005, p.23).
	(...) ”a atitude dócil mas firme do Salgueiro, no balanço de suas folhas, dos seus galhos, em sua não-resistência,na
sua aceitação do movimento, aparente revés, mas que traz novidade, mudança... e que exige o seu enraizamento para
que ele cresça para o alto. Assim, não será arrancado, mas permanecerá; não medirá força, mas será forte; será abrigo
para as águias e para os pássaros; será sempre fonte inesgotável de sabedoria.” (2005).
	 Meu pai se foi... mas deixou boas lembranças, ensinamentos para a vida inteira.
	 Há imagens de vivências, de lugares, de sabores, de cheiros, que mantenho dentro de mim e isso é muito
bom! Às vezes, deixa uma saudade e uma tristeza danadas.
	 Tiveram ele e D. Auxiliadora seis filhos: Anna Maria, Antônio, Célia Maria, Sônia Maria, José e Luiz.
	 Papai queria que meu nome fosse Getúlio, se eu tivesse nascido homem. Por causa do Presidente Getúlio Vargas! Já
imaginaram?
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 3938
	 O casamento deles foi bem sucedido: papai e mamãe tinham temperamentos diferentes, mas se comple-
tavam. Eu nunca ouvi uma discussão entre eles. Como todos sabem, papai era o centro da casa, o muro de arrimo
da família e nossa mãe sempre foi o centro deste centro. Ele era tradicional, careta, mas evoluiu com o tempo,
empurrado pelas circunstâncias e pela mamãe, o que permitiu entre outras coisas que os filhos estudassem fora.
	 Das cidades onde moramos-
Itajubá, Delfim Moreira, Passa
Quatro - tenho mais lembranças
da última. De Itajubá tenho lem-
branças de nossa casa, de alguns
parentes (tios e primos), da fábri-
ca de farinha – Fecularia Faria -
do Senhor Mozart Faria, que era
na frente de nossa casa; ele era
padrinho da Sonia. Buscávamos
na fábrica aqueles bijus enormes
que comíamos com mel. Ali-
ás, meu pai gostava de comidas
com mel (massa de pastel frita) e
com manteiga (mandioca cozida
amassada com manteiga e açú-
car), além da banana cozida com
açúcar e canela. O quintal de nos-
sa casa era enorme e tinha várias
árvores frutíferas, de muitas e variadas espécies.
	 De Passa Quatro papai foi transferido como coletor federal para Elói Mendes. Ele foi seguro, porque tinha a
promessa do Dr. Castro de que arrumaria sua transferência novamente para Passa Quatro. Coisa que não aconte-
ceu. Nós chegamos a arrumar a mudança para lá, mas logo que o Sr. Chiquinho Galvão ficou sabendo da perda
que Passa Quatro teria, trouxe-o de volta. Quem foi conhecer Elói Mendes foi a Anna, que ficou hospedada no
hotel onde papai morava.
	 Para relatar minhas lembranças de Passa Quatro, porque elas estão muito mescladas, vou dividi-las em qua-
tro partes:
I - As lembranças da
rua de baixo
	 Quando morávamos na avenida,
éramos vizinhos dos Carneiro (papai
escolheu minha madrinha de crisma na
família, a D. Francisca) e do Sr. Custó-
dio, que era de Virgínia e mandava pra
gente aqueles caquis enormes, onde pa-
pai colocava um pouquinho de vinagre
nas folhas e embrulhava cada um deles
em jornais para amadurecer.
	 Papai tinha também muito cui-
dado com os cachos de uvas e com os
morangos e os embrulhava, um a um,
para os pássaros não comerem.
	 Éramos também vizinhos do Fer-
rão que tinha a fábrica de Doces Estrê-
la do Sul. Lembro-me das goiabadas,
marmeladas e bananadas que comíamos com queijo branco.
	 São tantas pessoas boas a recordar nesta época de nossa vida, a Luiza e o José Luiz na casa da esquina, a Ma-
riazinha que me ensinou a jogar baralho e o seu marido Milton, que era padrinho do Luiz.
	 Lembro-me do cheiro forte do cipreste - que formava a cerca divisória entre a casa do gerente da Rede Fer-
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 4140
roviária Federal e a rua do Patronato - que sempre sentíamos quando subíamos para o centro da cidade.
	 No Beco do Barroso, tínhamos muitos amigos especiais, entre eles a Zezé costureira e sua família e a Dona
Rita e seus filhos. Havia o campo de vôlei na frente de nossa casa onde treinávamos todos os dias. O nosso time
era o Alvi Celeste.
	 Lembro-me, também, de nossa primeira comunhão. Nós cinco fizemos em Passa Quatro na Igreja Matriz de
São Sebastião, apenas a Anna fez a primeira comunhão em Itajubá.
	 Sinto saudades das nossas brincadeiras nos vagões de trem que ficavam parados na estação. Dos canteiros
de flores, das frutas, das parreiras de uva na porta da cozinha e das parreiras de maracujá na entrada principal e
lateral da casa. Do galinheiro na porta da cozinha, do cachorro Bob do Tão e das inúmeras vezes que, enquanto
papai plantava as mudas e tratava as plantas, nós ficávamos, na divisa da parte cimentada com o início do quintal,
jogando finca. Eu adorava! Hoje em dia quase ninguém sabe o que é brincar de finca.
	 E tudo isso junto e misturado vem com a marca registrada da presença do pai.
	 Graças ao papai, fui Rainha da Caridade em 1951. E o agradeço até hoje: foi o meu único reinado! rs. Ganhei
um piano e uma boneca enormes de presente.Tenho a boneca até hoje. Acho que já posso considerá-la “antiguidade”!
	 Abaixo uma lista elaborada pelo papai, em abril de 1951, com o resultado final do concurso.
Coroação Rainha da Caridade - 1951
II - As lembranças da
rua de cima
Casa da Rua Major d’Alessandro nº 68 - Passa Quatro
Vista da Serra da Mantiqueira da parte de trás da casa - Passa Quatro
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 4342
	 Nessa casa, éramos vizinhos dos italianos Olindo e Mary. Papai conversava com eles pela varanda, assim
como com a Lecy e o Chico Saulle, que moravam na casa da frente. Ele sempre comprava o “vinho dos italianos”
que não podia faltar em nossas me-
lhores refeições. Na porta de frente
para a rua, era o cartório do Sr. Jo-
aquim Tibúrcio. Tínhamos também
bastante relacionamento com a famí-
lia Scianni - eu fui colega da Vicentina
e da Rosária, e fui aluna da Benita no
colégio e aluna da Marina nas aulas de
piano. O Aldo era colega do Antônio,
o Constante era parceiro nos jogos de
vôlei no Campo do Rubro Negro.
	 Nossa casa era pertinho da escola
(INSA), do campo do Rubro Negro,
do Jardim dos Leões...
	 Tenho boas lembranças do vi-
nho dos italianos, da fábrica de gua-
raná Açoreana, do guaraná Rádio, e
o Guaranita, da Cibal. Muitas vezes
tomávamos o guaraná fazendo um
furinho na tampa com um prego. Era uma delícia!
	 Também os vizinhos da “rua do meio” eram todos amigos. O Zé Leite e a Dona Lourdes - lembro-me muito
da Rural Willys de cor verde deles -, e o Dr. Castro, que além de amigo era nosso médico.
	 Tenho lembrança da participação de papai, quando a mamãe fazia o famoso doce de abóbora, aquele que era
cristalizado por fora e molhadinho por dentro. Era muito trabalhoso, e ela colocava até cal nele! Papai ajudava
na logística do transporte das fôrmas com os doces: de dentro da cozinha para a parte externa da casa para tomar
sol. Durava muitos dias esse ir e vir com os doces, mas valia a pena!
	 Por falar na parceria deles, enquanto ela cuidava de todos os serviços domésticos e do acompanhamento dos
estudos dos filhos, ele se encarregava de todas as compras e pagamentos.
	 Na rua de cima, na esquina em frente ao hotel Gonçalves, que era da Dona Fralzina, estava a casa da Dona
Renê, para mim, a casa mais linda de Passa Quatro, enorme, antiga, com aquelas parreiras na lateral, ao lado
da tipografia do senhor Castorino, que ficava na frente da casa da Kaffa, do Pedro Morssri e da Rita. E logo na
esquina, a casa do Chiquinho e da Ana Maria. Que saudade deles!
	 Papai, assim como nós, também se divertia muito com os casos contados pela Rita. Ela era espontânea, caris-
mática, tinha uma “veia artística”. Um dia lá em casa, na sala de jantar, enquanto a Rita nos contava um de seus
casos tragicômicos, ela chegou a desmaiar. Todos correram preocupados para socorrê-la, inclusive papai que ficou
todo afobado e, no final, era teatro dela, que se levantou e todos demos muitas risadas!
Papai e D. Marcos Barbosa Papai e os padres do Ginásio São Miguel -
Padres Lino e Francisco e Dr. Rangel
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lembranças de família 4544
	 Papai prezava muito suas amizades. Seus amigos eram os mais variados. Impossível nominá-los, mas vou citar
apenas os que ainda estão gravados em minha memória, seja pela simpatia, presença, inteligência: Senhor Cance-
la, que trabalhou com ele durante anos na Coletoria e sempre o ajudou muito; Dom Marcos Barbosa, contempo-
râneo de escola, escritor, poeta, membro da Academia de Brasileira de Letras; Dona Aspásia, que era sua prima e
morava em Belo Horizonte; Alvarenga e o Ranchinho, cantores e colega de escola; os padres Michel, Domingos,
Francisco, Zé Maria, Lino, do Ginásio São Miguel; Napoleão, vizinho da Coletoria, padrinho do Luiz e dono
do cinema; Carlos e Mário Anacleto que também trabalhavam com ele na Coletoria, colegas e amigos; as irmãs
do Colégio Nossa Senhora Aparecida. Entre elas, as Irmãs Emiliana e Silvéria, que também eram irmãs, filhas do
Dr. Ernesto Sanches, que já era amigo do papai desde que morávamos em Itajubá. A vó Donana era madrinha da
Irmã Emiliana.
	 O Sr. Gersino era fiscal de rendas e pai do Gerson, que nós chamávamos de “filho do pai”, pois papai
participou ativamente da educação dele. Lembro de uma vez, que papai autorizou o Gerson a comprar roupas
na loja Nogueira para sua formatura. No dia da formatura o Gerson apareceu vestido com uma camisa verde
abacate... Papai ficou muito bravo! Vocês não imaginam a
indignação do pai, que chamou a atenção dele na formatura
mesmo.
	 Por falar em abacate, lembro-me que colhíamos os
abacates lá em casa, da janela da sala da copa. Papai bolou
um jeito todo especial para colher os abacates. Ele mon-
tou uma vara com alguma coisa cortante na ponta, que
era acoplada a uma cestinha de taquara, de tal maneira
que colhia o abacate inteiro, perfeito!... e que era rapida-
mente cortado ao meio e comido na própria casca, com
açúcar e limão.
	 Tenho boas lembranças de quando papai chegava
das viagens, sempre com um presentinho para nós, fosse
uma caixinha vermelha de passas ou uma maçã argentina.
Seu retorno era sempre uma alegria!
Era um festeiro!
	 Lembro-me das festas de pri-
meira comunhão, de quinze anos,
de formatura, das comemorações
do vestibular (a festa do Antônio
foi maior do que as outras...), das
festas de noivado e de casamento.
Ele e mamãe contavam sempre
com a participação carinhosa e
imprescindível da tia Jandira.
	 Ele tinha “feeling” para fes-
tas e não economizava dinheiro e
trabalho para que elas fossem óti-
mas, bonitas e bem servidas: do-
ces sofisticados, drinks (perna de
moça, ponche), bolos enormes, de
vários andares. Anna me contou
outro dia do bolo de sua primeira
comunhão, feito pela tia Jandira,
era um bolo de três andares: no
primeiro tinha um missal com um
terço de continhas prateadas e no terceiro, um cálice com uma hóstia. Incrível!
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 4746
	 Tenho lembrança também das festas da Santa Casa que aconteciam todos os anos: ele arrematava frango
recheado, prendas e garrafas de vinho nas barraquinhas e levava para casa. E dos cartuchos que a gente ganhava
na Coroação de Nossa Senhora, quando nos vestíamos de anjos e coroávamos a Virgem.
	 Por falar em comida e lembranças boas, me recordo bem dos pés de moleque, moídos e de grão, que ele trazia
de Piranguinho, comprados nas barracas azuis e vermelhas.
Festa de formatura de Anna - Curso Normal - Passa Quatro - 1958
	 Abaixo fotos da primeira comunhão de todos os filhos: Anna Maria, Antônio, Célia Maria, Sônia Maria, José
e Luiz.
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 4948
	 Antes de papai comprar o telefone 53 (foto do aparelho abaixo), as ligações eram feitas via telefonista, in
loco. Acho que o nome dela era Isabel. A “central telefônica” era na rua principal. Precisava de um mensageiro vir
avisar em casa quando recebíamos alguma ligação telefônica, do mesmo modo que precisávamos ir até lá quan-
do precisávamos fazer alguma ligação. Às vezes, a ligação não completava e nós ficávamos ansiosos pela notícia,
aguardando, por horas, uma nova ligação. E nunca pensávamos que pudesse ser uma boa notícia. Era um sufoco!
Uma dificuldade! Imaginem a aflição do papai!
	 No entanto, hoje, usufruímos de tanta facilidade de comunicação - TV com alta definição, computadores,
celulares, IPAD, IPOD, entre outras tecnologias – que é difícil para os mais jovens entenderem a realidade que
vivemos naquela época.
	 Sempre achei que ele gostaria que a cerimônia do meu casamento tivesse sido igual ao da Sônia com toda
pompa e circunstância: muitos convidados e eu com um belo vestido longo branco entrando pela Igreja Matriz
de São Sebastião, pelos braços dele. Entretanto o meu casamento foi simples, poucos convidados, vestido rosa
curto, luz de lampiões. Do jeito que eu escolhi, ele fez o melhor que podia. Ele tinha orgulho de “carregar” as
filhas.
	 Abaixo as fotos de Papai com as filhas nos casamentos:
Sônia – 1970Célia – 1967 Anna – 1968
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lembranças de família 5150
	 Lembram-se do quadro de medalhas de
honra ao mérito do Antônio e do orgulho do pai
quando as medalhas eram entregues no cinema,
que ficava sempre lotado? O Antônio sempre
estava entre os três primeiros alunos colocados,
revezando com o Tarso e com o Aldo, na maioria
das vezes. Papai ficava na plateia todo orgulhoso!
E, depois da entrega das medalhas, havia a come-
moração lá em casa!
	 Papai também nos presenteou com um pia-
no alemão – Ritter – que pertencia ao Napoleão
e ficava no Hotel de Lourdes. Ele ficava muito
orgulhoso quando suas filhas tocavam nos con-
certos de piano. O primeiro foi organizado pela
dona Cidinha e o segundo por Marina Scianni.
É, é sempre bom esclarecer que minha participa-
ção era modesta, com o “meu carro chefe”: “Tira,
tira o seu pezinho”, do Villa-Lobos.
	 E papai não deixava de nos incentivar:
ele comprava as partituras no Rio de Ja-
neiro, bancava as aulas de piano com a
Marina Scianni e as minhas aulas teóricas
em São Lourenço. Além disso, nos pres-
tigiava com sua presença e elogios num
“sarau” que acontecia na sala de visitas lá
de casa, depois do jantar, à luz de lam-
pião... Suas músicas preferidas eram Kalu,
Tardes Silenciosas de Lindóia e Asa Bran-
ca. Mamãe sempre cantava. Sua voz era
linda!
	 Quando a energia elétrica chegou, ele
comprou uma “eletrola” que tinha de um
lado o rádio e do outro o toca disco. Ela
José com as medalhas recebidas por Antônio no Ginásio São Miguel
não durou muito! Uma pena! O cupim logo estragou todo o móvel e a mamãe ficou muito triste ao se desfazer
dela. Papai sempre que viajava comprava discos para nós.
	 Ouvi muito relatos sobre a ajuda do pai aos passaqua-
trenses quando caiu uma tromba d’água em Passa Quatro
na época de Natal - 22/12/1956 e a cidade ficou ilhada
por alguns dias! Foi o único Natal de minha infância e
adolescência que não passei em casa. Estava em Santa Rita
do Sapucaí passando uns dias de férias na casa da Vó Adol-
fina e sofri muito com a falta de notícias de casa. Quando
voltei para casa soube que papai foi muito corajoso no
resgate dos corpos das pessoas atingidas!
	 Tenho lembranças também do cafezinho bem quente,
com uma pitadinha de cachaça, que ele nos servia na saída
dos banhos, na época do frio. Lembro-me também de sua
bicicleta preta que ficava no corredor de entrada. Ah! E ti-
nha a bicicleta da Anna, que ela ganhou de Natal do papai,
que era linda, prateada, importada, objeto de desejo meu,
da Sônia e, certamente, de muitas amigas nossas!
	 Lembro-me de nossas caminhadas até o Parque das
Águas para encher o galão com água mineral na fonte Pa-
dre Manoel da Nóbrega e que se transformavam em um
passeio à tarde. Algumas vezes papai ia até à fonte de bici-
cleta. No parque, bem na frente da fonte principal, tinha
um campo de vôlei onde jogávamos de vez em quando. O
time era o Blue Star.
	 Também me recordo que as camisas sociais de papai eram todas brancas, de tricoline, impecáveis. Antes de a
luz elétrica chegar a Passa Quatro, elas eram passadas com o ferro a carvão. Seus ternos eram bonitos, a maioria,
escuros. As meias, sempre pretas. Era um homem elegante! Sempre manteve o mesmo peso (72 Kg.) e não tinha
barriga. Andava muito a pé, fazia exercícios físicos, capinava muito e andava de bicicleta.
	 Ele tinha uma turma de amigos que iam para as pescarias no Rio Grande, no Rio Verde... Dentre eles,
me lembro do Lazinho. Tenho também lembranças da amizade dele com o Sr. Falabello, do Banco Hipote-
cário. Parece que foi com ele que o papai comprou um lote na praia de Santos e que, muito tempo depois,
Anna e sua bicicleta
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 5352
eles “descobriram” que o lote era em alto mar!
	 Do Clube, NOSSA! Nosso horário de voltar era 21 horas. Ficávamos revoltadas porque era muito cedo,
mas senão voltássemos no horário marcado, ele ia lá buscar-nos, era uma tristeza! Se teimássemos, era castigo! Em
alguns bailes, poucos, ele autorizava e mamãe nos acompanhava. Carnaval nem pensar...
	 Tínhamos na estante vários dicionários, enciclopédias, coleções: lembro-me muito do Tesouro da Juventude
e da Enciclopédia Prática Jackson.
	 Comprava também tecidos no Rio de Janeiro, a maioria na Casa Gebara, para que a mamãe costurasse nos-
sos vestidos. E ela caprichava! E eles ficavam lindos!
	 Também era constante a peleja dele com os lampiões Aladim, com a queima e a troca das camisinhas.
	 E Papai sempre recebeu, em nossa casa, os amigos de Passa Quatro e de Belo Horizonte com gosto e cordia-
lidade. Lembro-me de minhas amigas e colegas de faculdade: Ana Maria, que era de Perdões e Virginia, de Belo
Horizonte, além de nossas primas, Vera Lúcia de Mirassol e, principalmente, a Cidinha, filha da tia Jandira, que
morava em Santa Rita do Sapucaí.
	 Papai era um homem bem informado. Lia jornais (o “Sul de Minas”, de Itajubá, o “O Correio da Manhã”,
do Rio de Janeiro, além do Diário Oficial da União). Gostava também de ouvir rádio e tinha um grande círculo
de amizades. Eu sempre gostei muito de ler “O Correio da Manhã” e, durante algum tempo, eu e minha amiga
Vicentina Scianni nos correspondíamos com Carlos Heitor Cony. Era a glória!
	 Tenho lembranças do quarto da vó Donana, do carinho e da paciência que ele tinha com ela. Ele mesmo
comprava seus vestidos, suas meias e sapatos pretos. Sempre iguais! Comprava também as roscas secas que ela gos-
tava para tomar com café com leite bem quente, as linhas mercier crochet para “crochetar” suas colchas e toalhas de
mesa. Algumas delas,
ela nos presenteava
para “o enxoval” e
outras, era o papai
mesmo que compra-
va (RS). Ela fazia um
relatório para o papai
de nossas bagunças
quando ele chegava
da Coletoria, no final
da tarde.Fotos Vó Donana
	 Papai tinha um xodó com o fogão de lenha e cuidava muito dele. Acho que o capricho dele com o forno
e com a lenha era principalmente por causa das leitoas pururucas e dos biscoitões de polvilho. E nosso banho
quentinho dependia também do fogão, com suas serpentinas...
	 Lembro-me também do primeiro fogão a querosene da marca DAKO e da geladeira que ele comprou. Foi a
primeira que tivemos e que durou por muitos anos!
	 Ah! O “quarto escuro”! Lá ele armazenava bebidas e comidas. Engradados de cerveja, vinhos, azeites, baca-
lhau, e muitas latarias, além das compras de mercearia rotineiras da casa. Ele escolhia as azeitonas, a marca do
arroz, o tipo do café, e tenho lembrança de que as latas de ervilhas “coração de manteiga” tinham de ser número
zero, para colocar no arroz de forno.
	 Nossa! Em relação à escola, apesar de sermos boas alunas, sempre tinha a tensão minha e da Sônia com a
chegada dos boletins, com medo das broncas e dos castigos do papai. Como eu fazia Curso Normal na parte da
manhã e Curso de Contabilidade à noite, um mês eu estudava mais as matérias para um curso e no mês seguinte
para o outro, de tal maneira que, todos os meses, ocorria um desgaste com a chegada dos boletins. Já a Anna e o
Antônio ficavam tensos porque quando tiravam 9,9 “choravam”... Sacanagem, né?
	 A nitidez da lembrança boa que tenho dele, nos buscando – Sonia e eu – na saída da escola, quando chovia,
levando, nos braços, as nossas capinhas, a minha,
com forro azul e, a da Sônia, com forro vermelho.
E ambas confeccionadas por mamãe. Sentia-me
superprotegida!
	 Papai também era inspetor do Ministério da
Educação – do Instituto Nossa Senhora Aparecida1
e
do Ginásio São Miguel - onde estudamos. Acho que
ele gostava do que fazia, apesar de ser trabalhoso.
	 Antônio, José e Luiz estudaram no Ginásio São
Miguel. Os padres eram betharramitas, provenien-
tes de diversas partes do mundo, a maioria da Eu-
ropa. Quase todos eram amigos do papai.
1	 A Escola Nossa Senhora Aparecida foi fundada em 1913 na cidade de Caxambu, com a denominação de Escola Normal Nossa Senhora
Aparecida. Foi transferida para Passa Quatro em 1915. De 1913 a 1927 esteve sob a direção de um grupo de leigos. Em 1927 passou para a Direção da
Sociedade Religiosa Moral e Científica. De 1932 a 1942 foi ministrado paralelamente ao Curso Normal, um Curso Doméstico. Em 1943, fundou-se
o Ginásio Nossa Senhora Aparecida. Em 1953, fundou-se a Escola Técnica de Comércio. Em 1955, o estabelecimento passou a ter a denominação de
Instituto Nossa Senhora Aparecida (INSA).
Formatura Curso Ginasial - INSA – Passa Quatro
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 5554
Instituto Nossa Senhora Aparecida
Ginásio São Miguel - Passa Quatro
	 Tenho lembranças também de quando
éramos menores e nos sentávamos na sala
de jantar para estudar. Papai colocava um
lampião Aladim de cada lado da mesa e
ele e mamãe ficavam sentados nas poltro-
nas da sala nos vigiando... Apesar disso,
o Antônio puxava as tranças da Anna e
chutava as pernas minhas e da Sônia pelo
buraco do meio da mesa, sem que nin-
guém visse. Um artista!
	 E, ainda que possa parecer paradoxal,
papai era bom demais e, também, rígido
e autoritário. Lembro-me que o Luizinho,
quando o papai o chamava, ele respondia
rapidamente: ”Sim! Senhor, meu Pai!”.
	 Papai trazia, para nós todos, o café na
cama às cinco horas da manhã, para que
depois estudássemos até a hora de ir para a escola. Nessa época ainda não havia luz na cidade. Ele também fazia
e levava, todos os dias, o café na cama para mamãe.
	 Era também muito preocupado com nossa saúde: tomávamos Calcigenol no verão, Emulsão de Scott no
inverno, além de um mingau para “dentes fortes”, que ele mesmo preparava. Íamos todos os semestres no dentis-
ta: em Passa Quatro, no “Pedrinho dentista” e, em Itanhandu, no Dr. Gil Carneiro. Tomávamos também umas
injeções na farmácia do Serafim. Não me recordo mais prá que.
	 Papai tinha prazer em ver as filhas jogar vôlei. Depois de algum tempo passou a autorizar pequenas viagens
para que fôssemos jogar em cidades próximas. Foi um período muito bom para mim!
	 Também encaminhou os filhos para fazer aulas de datilografia com a D. Maria Cavalcante. Ganhei de pre-
sente dele uma máquina portátil de datilografia Remington que levei para Belo Horizonte e me ajudou muito na
Universidade. Era como se fosse um laptop hoje em dia.
	 E, em nossa primeira viagem a Guarapari, ele e D. Auxiliadora entraram no mar juntos! Eita viagem boa!
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 5756
	 Abaixo fotos de Guarapari e a carta que o papai enviou para o Antônio, em 21/11/1974, descrevendo os
preparativos para a viagem.
Carta de Papai para o Antônio
Família Salgueiro em Guarapari - Dezembro de 1974
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 5958
	 Ganhei dele uma coleção de lápis, na foto, que até hoje enfeitam minha casa, além de uma pequena coleção
de moedas que dei de presente para o meu neto Pedro.
Família Salgueiro em Guarapari - Dezembro de 1974
III - Quando viemos para Belo Horizonte estudar
	 Só voltávamos para casa nos feriados e nas férias.
	 Papai nos visitava em diferentes endereços em que morávamos em Belo Horizonte: na casa da Dona Clotilde
e do Sr. Armando lá na Serra, no Hotel São Domingos no centro da cidade, na casa da Vera Cançado no Prado e
na república na Av. Paraná, onde morava com Anna, Hebe, Ana Tereza e Lourdinha. Ele nunca vinha de “mãos
abanando”, sempre trazia um mimo: ovos, docinhos de leite cortados, cajuzinhos, sequilhos e pé-de-moleque que
a mamãe fazia e arrumava em caixas de sapato forradas com papel de seda.
	 Anna e eu íamos de Belo Horizonte a Passa Quatro de ônibus (ENSA, eu acho!). Era uma viagem longa.
Fazíamos baldeação em Três Corações e de lá íamos até São Lourenço e depois para Passa Quatro. Quando pa-
pai podia, ele ia ou mandava nos buscar de
carro em São Lourenço para irmos até Passa
Quatro. Ele sempre era muito atencioso! Um
gentleman!
	 Conheço poucos pais que participaram
tão intensa e afetivamente da vida e da
educação dos filhos!
	 Papai sempre olhou por nós, esteve ao
nosso lado, nos fez feliz.
	 Como já contei, ele era, ao mesmo, tem-
po bravo, autoritário, meigo, afetuoso. Tenho
um cartão que ele enviou para seus pais em
abril de 1934, que traduz essas características!
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 6160
IV - Aúltima fase
	 Foi quando, já casados, voltávamos todos, principalmente no Natal, com a família toda, com os netos pe-
quenos. Ele e mamãe preparavam as comidas, com capricho especial, principalmente, o leitão pururuca, o arroz
de forno, as bacalhoadas, os pudins de queijo. Eles faziam as comidas prediletas de cada um. A minha predileta
era o pudim de queijo.
Ceia de Natal - Passa Quatro
Abaixo algumas receitas originais.
RECEITA DE PUDIM DE QUEIJO
12 colheres de queijo
16 colheres de açúcar
8 ovos
1 colher de sopa de margarina
Untar a forma com margarina e polvilhar com açúcar
Assar em banho Maria.
RECEITA DE PÃO CHEIO – de linguiça e queijo
100 grs de fermento
1xícara de leite “quebrando a frieza” (sic)
3 ovos
1xícara de óleo
1 kg de farinha de trigo
Sal a gosto.
Sugestão: 1 colher de sopa de sal e 1 colher de sopa de açúcar.
Amassar bem e fazer o pão e deixar crescer.
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lembranças de família 6362
RECEITA DE PÃO DE LÓ AMERICANO
7 claras batidas em neve
7 gemas
14 colheres de açúcar
Bater bem. Quando estiver em bolha, coloque:
14 colheres de farinha de trigo
1 colher de sopa de pó Royal
1xícara de leite
Forre o tabuleiro com papel impermeável.
Os netos e bisnetos do Senhor Salgueiro
	 Papai e mamãe estiveram presentes no nascimento de meus filhos Alexandre e Flávia. O nascimento do
Alexandre foi com muita adrenalina porque, além dele ser o primeiro neto, ele nasceu no Rio de Janeiro, numa
quarta-feira de cinzas... Papai foi padrinho de batismo dele. Ele sempre foi muito atencioso com os meninos.
Quando não podia comparecer aos aniversários, telefonava ou enviava telegramas. Abaixo, entre as fotos dos
netos (Alexandre e Flávia) e dos bisnetos (Pedro, Bia e Rebeca), um telegrama que papai e mamãe enviaram para
a Flavinha quando ela completou dois anos!
Vó Nina, Célia, Alexandre e Pedro Alex, Flavinha e Papai
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Telegrama Papai e Mamãe para Flávia - aniversário de 2 anos
Alexandre e Flávia
Alexandre e Pedro
Alexandre
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Bia, Rebeca e Michal
Flavinha, Bia e Rebeca
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	 Senti muito papai não estar vivo quando seus bisnetos nasceram. Fico imaginando a felicidade dele nos
acompanhando no nascimento do Pedro, meu primeiro neto, em Franca – São Paulo, no nascimento da Bia e
Rebeca em Dublin, quando ele e mamãe fariam sua primeira viagem internacional para a Irlanda, aflitos com o
nascimento das gêmeas2
.
	 Depois, imagino também suas visitas nos aniversários do Pedro em Franca, e em Gibraltar, em Steinhausen,
na Suíça, comemorando e experimentando as comidas típicas, tomando vinhos saborosos, ressabiados com as
bebidas fortes da República Tcheca, terra do Michal, e dando o maior colo e carinho prá todos nós! Haja colo!
	 Foi marcante a atitude do papai e da mamãe nos natais em Passa Quatro quando eles sempre presenteavam
os netos com um dinheiro, dentro de envelopes, que eram colocados no saco vermelho de Papai Noel que a vó
Nina deixava dependurado no portal da sala de jantar. Era uma alegria!
	 Como nós todos nos reuníamos com nossas famílias no Natal, até hoje não entendo o milagre do banheiro
lá de casa. Nunca deu problema, apesar das filas e das batidas na porta, às vezes desesperadas, pedindo pressa!
2	 O 14º bisneto(a) do vô Salgueiro está para chegar. Flávia e Michal vão me dar a alegria de outro(a) neto(a).
Luiz, Célia, Sônia, Anna, José, Mamãe e Antônio
José, Célia, Sônia, Vó Nina, Luiz, Anna e Antônio
Meus irmãos
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lembranças de família 7170
Célia, Anna, José, Sônia, Luiz e Antônio
Célia, Luiz, Anna, Sônia, José e Antônio - Outubro de 2005 - BH
José, Vó Nina, Sônia, Célia e Antônio
Célia, Antônio, Sônia - 50 anos José – Volta Redonda.
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Célia e Antônio Célia e José Célia e Luiz
Anna e Célia – Santa Rita de Sapucaí - Barcelona
Célia e Sônia - Passa Quatro
Anna, Sônia, Célia e Mamãe
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Sua doença
	 No início da doença de papai, lembro-me bem que, uma de suas reclamações, era de uma dor forte na batata
das pernas. No princípio ficou muito preocupado: tinha sofrido muito com o vô paralítico e ficou apreensivo
com a possibilidade de ficar “entrevado”. Foi aventada até a possibilidade de sua dor ser psicológica. Foi pensada
também a possibilidade de ser proveniente de algum problema na coluna. As consultas continuaram em Belo
Horizonte. Foi examinado por vários especialistas, desde o clínico geral, o reumatologista, o neurologista, o proc-
tologista. Acabou até fazendo a cirurgia de próstata no Hospital São Lucas, em Belo Horizonte, quando mamãe
e todos os filhos vieram e ficaram com ele, em regime de plantão. E ele deu trabalho! Depois de muitas consultas
e exames, finalmente, o Dr. José Araújo conseguiu fazer o diagnóstico de Doença de Parkinson. Começou o tra-
tamento, que era medicamentoso. Ele tinha consciência de que sua doença era progressiva e da importância dos
remédios. Apesar disso – talvez pela dificuldade de deglutição -, os comprimidos que ele deveria tomar começa-
ram a ser escondidos nos bolsos do pijama, nos miolos de pão, no vaso sanitário e até debaixo dos colchões...
Amorte, o enterro, as homenagens
	 Papai morreu às 19,30 horas do dia 02/09/1986, em Passa Quatro. Cheguei cinco minutos depois.
	 Até hoje não sei porquê mas, depois do enterro, resolvi escrever prá ele. Considero que foi nossa última
conversa. Nunca mostrei prá ninguém.
	 “Papai, foi muito triste chegar em nossa casa e encontrar você morto”. Foi uma sensação horrorosa. Pai, cheguei
com a Anna, o José e o Antônio já estavam lá.
Você sempre foi a pessoa mais importante que eu tive.
	 Peguei o travesseiro que você estava deitado e fiquei com ele, para tentar conseguir guardar o seu calor pai, quando
abraçar nele. Te beijei muito, fiz cafuné (aquele no nariz que você gosta tanto). Passei a mão na sua carequinha. De-
pois você foi esfriando e eu fiquei abraçando você, tentando passar o meu calor prá você. Mas não adiantou pai, e você
esfriou de vez.
	 A Sonia e o Zé (o Antonio um pouco também) que trocaram sua roupa, arrumaram você para a última viagem
a Itajubá. Eu separei aquele terno azul marinho. O bonito, que você fez para ir ao casamento do Luiz. Esqueci de
pegar o colete. Os meninos acharam melhor não colocar gravata. Você ficou bonito, com a fisionomia tranquila. Aquele
crucifixo da vó Donana nós colocamos em suas mãos. Que mãos mais bonitas que você tem, né pai? Estava todo mundo
muito triste e todo mundo tomando as providências para você ficar bem e para fazer as coisas que você queria.
	 Mamãe ficou muito desorientada. Também pudera, né pai, perdeu o maridão que ela tinha. E nós? O melhor pai
do mundo. Puxa pai, tudo o que o senhor podia e não podia fez pela gente, né?
	 No velório, sabe quem passou a noite inteira lá? O Pita. Lembra que quando o pai dele morreu o senhor deu a
maior força? A Lecy, o Chico, o italiano (ele fechou o restaurante logo que soube que você tinha morrido), a tia Doris,
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lembranças de família 7776
o Chico, a Silvana, a Lurdes, o Zé Leite, a Sonia, o Antonio, a Anna, o Zé, a Elisa e o sogro do Pedrinho.
	 Estava um frio danado! Daqueles piores. Precisa ver pai, quando o Zé Gonçalves chegou. Ele chorava igual um me-
nino. Como todo mundo gostava de você. Fica até difícil contar todo mundo que veio despedir de você, mas vou tentar
contar. Acho que todo mundo veio, os amigos das pescarias, os amigos fazendeiros, os amigos das fofocas, os amigos mais
pobres que você ajudava, as meninas do Sr. Alcides, a D. Zezé costureira, o açougueiro que foi nosso vizinho (esqueci o
nome dele), o Zé Luiz da Luiza.
	 O Zé André deu a maior mão pai. O Zé Maria chegou de madrugada. O Arthur chegou depois das 10 horas.
	 Também estava lá o Nicolau, o Serafim, a mulher dele (tá tão ruinzinha pai), o Milton Costa, o Napoleão, o filho
do Zé de Almeida, os Tibúrcio. A Vanderlea também veio pai. O Carlos, o seu enfermeiro, veio várias vezes. O Napo,
a Nely (ela chorava tanto!), a Águeda Cancela, a Marina Pelegrini, a Ana vizinha, o Chiquinho, o Alcides Carneiro.
	 Pai, no dia seguinte, quando você foi conosco para a Igreja (meio dia!) as pessoas foram se encontrando e todo
mundo queria te carregar. Impressionante! Precisa ver os meninos (os Salgueiros) chorando, sofrendo, mas te levando
com orgulho pela rua principal. As lojas, os bancos, todos abaixaram suas portas.
	 Quando o Luiz chegou pai, você já estava morto. Ele ficou muito abatido. Logo o nosso caçulinha.
	 A Michelinha, o Gu e a Nicole estavam lá firmes e tristes. Os outros meninos/netos não deu tempo prá ir buscar.
Mas todos estavam rezando pro senhor. O Alexandre era seu afilhado, mas não teve jeito.
	 Os irmãos da mãe vieram todos. O tio Chico foi lá em Itajubá pai. Estava arrasado!
	 Queria contar da tristeza do Carlos Diamantino, da Maria Alice (ela ficou o tempo todo com você), a mulher do
Carlos, a Águeda. Na Igreja, depois da missa, a Águeda falou umas palavras prá você tão bonitas, que nós todos ficamos
mais emocionados ainda! Você era muito querido, muito admirado, muito amado. Ela falou das coisas boas que você
fez. O Zé Castilho também falou umas palavras, simples, espontânea e te deu a maior prestigiada. Contou que você
chegou a Passa Quatro, há 39 anos e construiu muita coisa: da família bonita, íntegra e honesta que você fez, das aju-
das que você dava aos pobres, do tanto que você gostava da vó Donana. Foi uma despedida bonita, mas muito triste. A
comadre falou na Igreja prá você também pai.
	 Eu não queria que te enterrassem de jeito nenhum. Mas não teve jeito pai.
	 As meninas da tia Joaquina estavam lá, desesperadas! Você foi um pai prá elas, né? As irmãs da mãe também, os
outros sobrinhos seus, o Dr. Gaspar, o Meloni. Todo amigo seu que ficou sabendo estava lá. Na hora que te colocaram
no túmulo junto com a vó Donana, com o Vô e o tio Zé Grande me deu uma sensação muito ruim. Credo!
	 Ah! Sabe a Aparecida Mota? Fez um discurso prá você em Itajubá. Foi muito bonito. Ela fala mais bonito do que
os outros, mas achei os outros mais espontâneos, não sei...
	 Já estou com muita saudade pai. Como é aí? Está com muito frio? Do que você está precisando? Eu queria ajudar
tanto!
	 Icha! Hoje é meu aniversário. Que aniversário o meu. Foi uma ...! Não vou completar porque sei que você não
gosta de palavrão.
	 Será que nunca mais vou conversar com você pai? Vai ser duro!
	 Vamos ajudar a olhar a mãe, o tio Chico. A tia Dona não foi ao enterro porque não estava passando bem. A Elza
estava lá. Amanhã te conto outras coisas. Vou fazer de tudo que puder para você sentir orgulho de mim pai. Prometo!
Vou ser gente igual você sempre quis.
	 Bença pai! Lembra? Bença mãe, bença pai, a vó bateu em mim... Um beijo.
	 Amanhã a gente conversa mais.”
	 Itajubá, 04 de setembro de 1986.
	 Obrigada por tudo Pai!
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 7978
José Manoel Salgueiro
Depoimento Sônia
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 8180
José Manoel Salgueiro- Belo Horizonte - 1938
	 O Pai era conhecido por todos como Salgueiro e passou assim o nome para seus filhos e netos. Quando
alguém ia a nossa casa ou telefonava à procura de algum de nós a pergunta era sempre  a mesma: com qual Sal-
gueiro que vocês querem falar? Seu nome era tão forte quanto sua pessoa. Até hoje eu sou conhecida como Sônia
Salgueiro.
	 Sua atividade principal era a de Coletor Federal, mas gostava muito de trabalhar com a terra. Assim, tinha
o costume de deitar-se muito cedo e levantar-se antes do sol nascer.
	 Falar do Pai é muito fácil, pois vem logo a lembrança de seu amor e do seu carinho, de sua responsabilidade,
habilidade e disciplina. Não esquecendo, claro, que era um homem muito alegre e brincalhão!
	 No entanto, em algumas situações, fui responsável pela sua calvície, porque não dizer sua careca! Era
muito arteira, tirava notas vermelhas, reprovação na escola, expulsão de cinema, reclamação de professores,
artes e travessuras que só eu era capaz! Ele, que gostava tanto de ver seus filhos em primeiro lugar, receben-
do medalhas, elogios, e eu, tão diferente! Mas, em contra partida, lhe dei coisas maravilhosas, como três
lindos netos - Nicole, Gustavo e Michele -, que muito amaram o avô. Ah! Eu também lhe dei muito amor,
carinho, amizade e compreensão.
O Pai sempre gostou muito de criança. Quan-
do pequena, tenho lembrança dele brincando
com a gente. Com os filhos, o que ele tinha de
enérgico, tinha também de carinhoso. Já com
os netos, ele só teve o lado carinhoso, brincava
muito com  Nicole e Gustavo, com Michele foi
bem menos, pois ele já estava doente. Recordo
sempre do pai brincando conosco e, também,
com os netos: Serra, serra, serrador, serra o
papo do vovô!
	 Sempre que o Pai saía com minhas crianças,
ele sempre lhes dava as mãos, muito preocupa-
do que era com a segurança delas. Ele sempre
me perguntava se eu não havia me esquecido
do Calcigenol e da Emulsão de Scott.  Chegou
a preparar uma mistura de farinha milagrosa, para eu fazer mingau para as crianças!
	 O Pai e a mãe eram padrinhos de batismo do Gustavo. Deram-lhe, como presente de batismo, uma cader-
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 8382
neta de poupança na Caixa Estadual que só foi encerrada com o fechamento da Caixa.
	 Como o Pai era agitado e ansioso para tudo, não podia ser diferente com a espera do nascimento de seus
netos. Quando um dos filhos anunciava a chegada de mais um netinho, ele e mamãe iam felizes ao encontro do
mais novo membro da família que acabara de nascer.
	 Também gostaria de mencionar que ele foi premiado com um neto que nasceu, como ele, no dia 03 de agos-
to: nosso querido Diego! E, quando o Pai já estava  acamado, a visita - de Luana e Diego - o deixou muito feliz!
Agora que já sou avó, consigo entender a magia de ter um neto. Sempre que o Pai mencionava o nome dos filhos,
ele se referia a nós como “os meninos e as meninas”, somos a herança do Pai e da Mãe.
Família Salgueiro
Família SalgueiroJosé, Vó Nina, Luiz, Vô Salgueiro e Sônia
Luiz, Sônia, Célia, José, Anna e Antônio
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 8584
	 Ele também recebeu com alegria seus 15 netos: Tatiana, Gabriela e Frederico, da Anna; Fabiana, Fernanda
e Ronan, do Antônio; Alexandre e Flávia, da Célia; Nicole, Gustavo e Michele, meus filhos; Luana, Diego e Na-
thália, do José e Thamyris, do Luiz.
	 E, desses netos,  vieram 13 bisnetos: Débora e Lucas, da Nicole; Pedro, do Alexandre; Vinícius, da Fernanda;
Gabriela, da Fabiana; Camila, do Ronan; Bia e Rebeca, da Flávia; Isabella e Leonardo, do Gustavo; Maria Fer-
nanda, da Michele; Lucca, da Luana e Lucas, do Frederico. Todos eles representam o maior regalo deixado por
nossos queridos pais.
Nicole, Gustavo e os avós
Vó Nina, Nicole e Vó Salgueiro
Netos e netas
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 8786
Tatiana, Jordani, Nicole, Vô Salgueiro, Gabriela, Gustavo e Frederico
Frederico, Gustavo, Flávia, Gabriela, Alexandre, Thamyris, Fernanda, Fabiana, Ronan e Michele
Nicole, Michele e Gabriela
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 8988
Vô Salgueiro, netos e netas
Luana, Michele e FredMichele e Luana
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 9190
Vó Nina, Luana, Vô Salgueiro e Vó AdolfinaVô Salgueiro e netos Michele, Gustavo, Gabriela, Luiz, Frederico, André, Anna, Priscila, Elisa, José, Sônia, Vó Nina,
Célia, Arthur, José André, Alexandre, Tatiana e Nicole.
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 9392
Nicole, Gustavo e Michele
Débora, Nicole, Sérgio e Lucas
Isabella, Gustavo, Leonardo e Luciana
Rodrigo, Michele e Maria Fernanda
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 9594
Vou contar agora um pouco sobre a época em que morávamos na avenida.
	 O Pai tinha uma plantação de mudas de
café. Como era linda a sua plantação! Até
hoje tenho o banquinho que ele se sentava
para plantar as mudas.
	 E a peleja para recolher a terra preta, o es-
terco e a lenha. A terra preta e o esterco eram
para a sua tão querida horta. Como era boni-
ta! Os canteiros eram retos e altos, feitos com
uma linha esticada, para ter certeza de que
ficariam retos. Isso eu aprendi! Fiz também
muitos canteiros como ele.
	 E aqueles buracos no quintal, que ele enchia com restos de comida e da
horta? Deixava curtir e virava um ótimo esterco para suas plantas. Como as
couves, as chicórias, as alfaces, os espinafres e os tomates eram gostosos! E o
creme de espinafre no pão? E os morangos e tomates que nós ajudávamos a
colocar em saquinhos de papel, um a um, para tristeza do sabiá.
	 Falando em sabiá, recordo das fitas vermelhas amarradas em suas perni-
nhas, para que nenhum outro sabiá se aproximasse. Isso incluía a construção do
alçapão de taquara. Eram tão bonitos e perfeitos! Aliás, perfeição era uma de
suas qualidades. E aquela cerca de bambu, quanto capricho, quanta perfeição,
eram mais seguras que os muros!
	 E o galinheiro, que era dentro do forno que havia no quintal. Com isso tinhamos ovos e galinhas. E o
ovo quente com sal...
	 Irmãos, vocês se lembram do passarinho do Pai que ficava na cozinha, com a janela e porta abertas?
Ele contava isso com muito orgulho. Não me lembro do nome do passarinho, mas quando ele morreu foi
uma tristeza geral. Foi enterrado em baixo do pé de limão rosa, lá no fundo do quintal.
	 Tivemos poucos animais, só o passarinho do Pai e o cachorro Bob do Antônio. Quanta peleja do Pai
Sônia na Avenida
na tentativa de impedir a fuga do Bob! Ele vivia mordendo a canela do senhor Tito, até que o mataram.
	 Por outro lado, lembro-me, também, como o Pai ficou
feliz quando conseguiu comprar um terreno, ali no bairro
Copacabana, para plantação. Lógico isso exigiu muita mão
de obra, entre outras, a construção de manilhas. Quanto
trabalho! Depois de tudo feito e a plantação formada, veio
uma tromba d água e levou tudo. No dia seguinte, ele ven-
deu esse tão sonhado terreno!
	 Não posso também me esquecer das flores que eram
plantadas com tanto carinho - a boca de leão de variadas
cores, os lírios para o dia de finados, as rosas e as espadinhas
tão coloridas! E a poda das parreiras, que tinham que ser
feitas na primeira lua nova de julho! As podas envolviam as
roseiras e parreiras da vizinhança!
	 E quando ainda morávamos na avenida, no meu ani-
versário, o Pai costumava fazer uma linda fogueira na noite
de São João. Como a gente gostava de montar a fogueira
na rua: lenhas, bambus, gravetos! Quanta agitação! A fo-
gueira ficava linda! Eu gostava muito de pular fogueira! Não me recordo de minha idade nessa façanha, mas,
nesse aniversário, o meu presente foi um saco de foguetes. Lembro muito bem, que as bombinhas estavam
colocadas em um saco azul de açúcar pérola e, eu, correndo de um lado para o outro. Resolvi pular a fogueira
e, quando pulei, o saco de fogos caiu em cima dela. Minha desilusão foi enorme, fiquei muito triste junto com
meu Pai.
	 Mas, à medida que fomos crescendo, vieram os horários a cumprir e ainda mais disciplina. Aliás, eu
sempre tinha apenas o primeiro dia de férias, os demais dias eram dias de castigo. E o silêncio obrigatório no
horário do cochilo do pai, depois do almoço e na Hora do Brasil? E, já ia me esquecendo dos jogos de futebol,
transmitidos pelo rádio! Aí, sim, ficávamos quietos, mudos e calados! E, apesar do silêncio que nos era exigido,
havia ainda o assoalho de nossa casa que não contribuía conosco. Como ele rangia! Eram aquelas tábuas largas
e cheias de cupim que, com o tempo, foram sendo substituídas por tábuas finas e, ainda assim, o rangido não
acabou. Até hoje Luciana e Gustavo tentam driblar as tábuas. Que bom que ainda posso ouvir esse rangido!
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 9796
	 Mudamos para a casa de cima e lá também festajamos muitos natais, aniversários, formaturas, noivados e
casamentos...
	 As flores sempre foram
um grande amor do Pai:
as trepadeiras de rosinhas,
as várias roseiras que ele
plantava e as rosas que co-
lhia com tanto amor! Além
delas, os pés de abacate e o
pé da pimenta do reino! Ah!
Essa foi uma grande desilu-
são para o Pai! Cuidou tanto
do pé de pimenta, para de-
pois descobrir que não era
a tão famosa pimenta do
reino. Lógico, em seguida, a
mesma foi cortada!
	 Não podemos esquecer o
orgulho do Pai de ser inspe-
tor do colégio e do ginásio.
Que absurdo quando penso
que ele assinava todas as folhas das provas parciais e finais de cada aluno!
	 Outro fato que deixou o pai muito feliz foi quando ele comprou o carrinho para carregar os falecidos. Como
ele não podia carregá-los sozinho, com o carrinho ele resolveu o problema. O carrinho é usado até hoje. E os
caixões de defuntos que ele doava para as famílias mais carentes?
	 E, recordo-me das matulas que mamãe preparava para as viagens! E, nas eleições em que ele era o presidente
da sessão, ela também preparava diversas guloseimas para ele compartilhar com seus colegas de trabalho.
	 Terno, camisa branca e gravata, assim era o seu traje de trabalho, até que veio a tão sonhada aposentadoria.
E com ela, a pescaria! Como eram gostosos os mandis que ele pescava! Como a mãe fazia aquele afogadinho de
mandi delicioso! A Nicole até hoje sente saudade! Foi uma época muito feliz da vida dele.
	 Algum tempo depois, veio o imposto de renda que lhe dava muito trabalho, mas lhe dava também prazer! 	
	 Essa é a outra façanha dele que aprendi! A seguir, a foto dele, sentado na cama de solteiro, rodeado de for-
mulários de Imposto de renda.
	
	
	 Com as idas e vindas, o tempo foi passando e vieram as doenças. Como fiquei brava quando descobri que os
medicamentos, prescritos para ele, eram colocados no miolo do pão e,
em seguida, jogados no vaso. Isso levou tempo para ser descoberto! Mas
ele, muito esperto, só mudava o lugar do descarte: a beira da cama ou o
bolso do roupão.
	 Ainda não mencionei o que mais fazia o Pai sofrer! Eram as diferen-
ças entre nossa Mãe e a Vó Donana! Como lidar com essa situação era
difícil! Êta ciúme bravo!
	 Não podemos nos esquecer do carinho de nosso Pai pelos seus ir-
mãos: Tio Zé Grande, Tio Chico, Tia Joaquina e Tia Dona e também
pelos seus sobrinhos que o amaram tanto. Quando ele adoeceu todos
vieram dar-lhe um abraço, um carinho.
	 E a doença de papai foi se agravando, até que ele não resistiu mais...
Papai e seu “arquivo” de Imposto de Renda
Sonia e Vó Donana
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 9998
	 	 Foi um momento muito sofrido para mamãe, para mim, para
meus irmãos, para toda a família, os parentes e os amigos...
	 	 No seu enterro havia muita gente e muitos discursos. Para to-
dos, foi fácil falar dele, pois não lhe faltavam qualidades, tais como,
a bondade, a honestidade e a hombridade. Sua vida foi exemplar!
Todos sentiram, naquele momento, como era grande a nossa per-
da. Aquele Homem maravilhoso estava partindo, deixando esse
mundo que tanto amou e lutou para que seguíssemos sua jornada.
E, é assim que faço até hoje. Tenho sempre, em meus pensamen-
tos, a sua luta, que foi grande e dura, mas repleta de vitórias!
	 	 Uma das preocupações de nosso pai era, no início de cada ano,
comprar a folhinha do Sagrado Coração de Jesus. Isso ele fez desde
o nascimento de seus filhos. Tenho, em meu caderno, a folhinha
do dia do meu nascimento, a recordação que ele me deixou. Com
o seu falecimento, a mãe continuou com esse costume.
	
	
	 O Pai destacava e guardava as folhi-
nhas de datas especiais e dizia que as men-
sagens que elas traziam revelavam uma
realidade. Então, no dia de seu falecimen-
to, fui até a copa, no lugar que ficava a fo-
lhinha. Destaquei-a e a li. Foi então que
entendi o porquê daquela fidelidade do
Pai para com a folhinha. O pensamento
daquele dia era: Não é triste amar e per-
der. O triste é nunca ter amado.
	 Hoje, me sinto feliz, pois sei que ele realizou seus sonhos e metas: proporcionou estudo a todos os filhos,
acompanhou-os por uma grande parte de nossas vidas, vendo-os todos casados e com netos.
	 Sua emoção foi tamanha que, no dia do casamento do Luiz, ele foi hospitalizado. E, assim, ele não pode par-
ticipar da tão esperada cerimônia de casamento de seu filho caçula, que representaria a conquista de seu último
objetivo.
	 Também, as suas afilhadas - Maristela, Carminha e Picida -, até hoje, quando falamos dele, só mencionam
recordações boas que elas têm. O Pai marcou muito suas vidas!
	 Quão grande era a felicidade do Pai quando comprou o seu primeiro carro! Branco, fusca... Ele encontrou
um pouco de dificuldade para dirigir, mas conseguiu tirar a sua carteira de motorista. Ia treinar no campo de
futebol do ginásio.
	 E foi triste o dia em que ele conseguiu tirar um fusca zero, cor caramelo. Estava todo vaidoso mostrando o
fusca para mim e a Mãe quando, de repente, um bêbado caiu e bateu a cabeça bem no meio da porta. Amassou-a
bastante! Papai perdeu a voz e a ação! Até hoje consigo ver o desaponto em seus olhos!
	 Recordo-me, também, da primeira viagem que
fez ao Rio, foi em 1972 para visitar a Anna. Foi a
60 km/h quando, de repente, resolveu correr e cor-
tar. Adivinhem em que lugar? Em um posto poli-
cial! Como consequência, recebeu a primeira multa.
Depois do susto, ainda estacionado, pediu ao José
André que continuasse a viagem.
	 Quando ainda moça, ganhei também de meu
Pai uma libra esterlina que esteve comigo até pouco
tempo. Agora passei a mesma para meu filho Gusta-
vo.
	 Tenho outra lembrança do Pai. Quando moci-
nha, eu fiquei sem falar com ele, devido aos castigos
que ele me dava! No entanto, numa viagem que fez a
Itajubá, ele me trouxe de presente um lindo relógio,
comprado na Loja Vera Cruz. Segundo ele, era para
que eu o perdoasse daqueles castigos que tinham me deixado tão magoada! Assim, ele se explicou e me deu um
forte abraço e o relógio. Mesmo naquela época, o relógio não teve tanta importância para mim como teve o seu
Nicole e Vô Salgueiro - Passa Quatro
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 101100
abraço! Quanto carinho e verdade envolvia aquele abraço! Meus castigos me deram, de presente, o abraço de meu
pai.
	 O Pai teve três passagens constrangedoras e divertidas que eu vivenciei. A primeira foi o golpe do coletor.
Um senhor se apresentou como Coletor Federal dizendo que tinha sido assaltado. O Pai o acolheu e ele ficou uns
dois dias em nossa casa. E o Pai ainda deu dinheiro para que o senhor seguisse a viagem. Isso foi no casamento
da Célia. Passado alguns dias, o Pai recebeu um telegrama, da receita federal, comunicando da presença de um
senhor, que se passava por coletor... Já era tarde demais, o Pai já havia caído no golpe.
	 A segunda passagem foi o telegrama de pêsames que ele passou para a D. Nair, esposa do Dr. Gaspar. A
Chiquita havia passado lá em casa contando que o Dr. Gaspar tinha falecido. O Pai foi rápidinho ao correio e
enviou um telegrama. Dias depois ele recebeu um telegrama do próprio Dr. Gaspar dizendo que estava vivo!
	 E, finalmente, a terceira passagem se refere à visita que o Pai fez para a dona Laura Carneiro pensando que
ela tivesse falecido e, para sua surpresa, foi a própria dona Laura que o atendeu. 	
	 E, também, não podemos nos esquecer da homenagem ao nosso Pai, no livro “Laços e Laços”, página 273, de
Maria Lúcia Amorim de Luca, que transcrevo em seguida:
Seu Salgueiro
Aos filhos
O amigo do leão
Com ele fez amizade
E não era fácil não
Era o único na cidade
Tinha um grande coração
Não perdia um enterro
Ia...
Nem que fosse um pouquinho
Já com seu passo miudinho.
Fazia “declaração”.
Era amigo do peito e dizia:
“pra tudo tem jeito”.
Ficava meio bravo
“por que veio com atraso”?
“Não sabia do prazo?”
“Que fazer?”
“Só se for magia!”
“Com que dinheiro comprou???”
“Como pagou?”
“Veja o leão te pegou!”
Agora está no céu
Segurando o leão na mão
Pra gente sonegar aqui no chão!
Obrigada, Seu Salgueiro.
	 Outra data importante para ele, foi quando recebeu o título de cidadão honorário passaquatrense. No primei-
ro momento, ele ficou muito feliz e, em seguida, ele percebeu a responsabilidade daquele título e, também, que
caberia a ele fazer um discurso de agradecimento. Tenho a carta convite da Câmara Municipal de Passa Quatro, e
a cola do  discurso que foi feito por ele em agradecimento. Tudo isso o desafiou e lhe causou uma certa ansiedade!
	 Através desses documentos, podemos sentir a expectativa deste tão honrado título. Essa conquista ocorreu
no dia 19 março, de 1975, quando papai já morava em Passa Quatro,  há 27 anos. Como isso foi difícil! Quantas
expectativas ele criou! Mas na hora tudo saiu perfeito! Como ele falou gostoso, conseguiu tocar os corações!
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 103102
	 Foi um título merecido, pois ele se sentia, de fato, um cidadão passaquatrense, uma vez que foi em Passa
Quatro que passou a maior parte de sua vida! A cada problema que surgia na cidade, lá estava ele pronto para
lutar com a mesma fidelidade que lutaria por seus interesses. De fato, esse título representou a continuação de
suas vitórias e conquistas!	
Comunicado do Título de CIDADÃO DE PASSA QUATRO
Diploma de Cidadania – 19/03/1975
100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro
lembranças de família 105104
Papai com o título de cidadão honorário
Papai, Mamãe, filhos, genros e netos Carta de Papai para o Antônio agradecendo os cumprimentos pelo título de cidadão passaquatrense
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  • 2. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 32 Sumário Abertura ................................................................................................................................................5 Introdução ............................................................................................................................................7 Depoimentos dos filhos Anna ........................................................................................................................................................9 Antônio .................................................................................................................................................17 Célia ......................................................................................................................................................37 Sônia ......................................................................................................................................................79 José ......................................................................................................................................................111 Luiz ......................................................................................................................................................121 Depoimentos do genro e nora José Maria ............................................................................................................................................127 Vera .....................................................................................................................................................133 Epílogo ..............................................................................................................................................137
  • 3. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 54 Abertura “(...) Família é prato difícil de preparar. São muitos ingredientes. Reunir todos é um problema. (...) Não é para qualquer um. Os truques, os segredos, o imprevisível. Às vezes, dá até vontade de desistir. (...) Mas a vida - (...) - sempre arruma um jeito de nos entusiasmar e abrir o apetite. O tempo põe a mesa, determina o número de cadeiras e os lugares. Súbito, feito milagre, a família está servida. Fulana sai a mais inteligente de todas. Beltrano veio no ponto, é o mais brincalhão e comunicativo, unanimidade. Sicrano - quem diria? - solou, endureceu, murchou antes do tempo. Este, o mais gordo e generoso, farto, abundante. Aquele o que surpreendeu e foi morar longe. Ela, a mais apaixonada. A outra, a mais consistente. (...) Já estão aí? Todas? Ótimo. Agora, ponha o avental, pegue a tábua, a faca mais afiada e tome alguns cuidados. Logo, logo, você também estará cheirando a alho e cebola. Não se envergonhe de chorar. Família é prato que emociona. E a gente chora mesmo. De alegria, de raiva ou de tristeza. Primeiro cuidado: temperos exóticos alteram o sabor do parentesco. Mas, se misturadas com delicadeza, estas espe- ciarias - que quase sempre vêm da África e do Oriente e nos parecem estranhas ao paladar - tornam a família muito mais colorida, interessante e saborosa. Atenção também com os pesos e as medidas. Uma pitada a mais disso ou daquilo e, pronto: é um verdadeiro de- sastre. Família é prato extremamente sensível. Tudo tem de ser muito bem pesado, muito bem medido. Outra coisa: é preciso ter boa mão, ser profissional. Principalmente na hora que se decide meter a colher. Saber meter a colher é verda- deira arte. Uma grande amiga minha desandou a receita de toda a família, só porque meteu a colher na hora errada. O pior é que ainda tem gente que acredita na receita da família perfeita. Bobagem. Tudo ilusão. Não existe “Fa- mília a Oswaldo Aranha”; “Família à Rossini”, “Família à Belle Meunière” ou “Família ao Molho Pardo” - em que o sangue é fundamental para o preparo da iguaria. Família é afinidade, é “à Moda da Casa”. E cada casa gosta de preparar a família a seu jeito.
  • 4. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 76 Há famílias doces. Outras, meio amargas. Outras, apimentadíssimas. Há também as que não têm gosto de nada - seriam assim um tipo de “Família Diet”, que você suporta só para manter a linha. Seja como for, família é prato que deve ser servido sempre quente, quentíssimo. Uma família fria é insuportável, impossível de se engolir.(...) Enfim, receita de família não se copia, se inventa. A gente vai aprendendo aos poucos, improvisando e transmitin- do o que sabe no dia a dia. A gente cata um registro ali, de alguém que sabe e conta, e outro aqui, que ficou no pedaço de papel. Muita coisa se perde na lembrança. Principalmente, na cabeça de um velho já meio caduco como eu. O que este veterano cozinheiro pode dizer é que, por mais sem graça, por pior que seja o paladar, família é prato que você tem que experimentar e comer. Se puder saborear, saboreie. Não ligue para etiquetas. Passe o pão naquele molhinho que ficou na porcelana, na louça, no alumínio ou no barro. Aproveite ao máximo. Família é prato que, quando se acaba, nunca mais se repete. AZEVEDO, Francisco. Arroz de Palma. 5.ed. Rio de Janeiro: Record, 2012. (p.11–14). Introdução A ideia da comemoração dos 100 anos do nascimento do Papai surgiu a partir da leitura, feita por Antônio, de um livro emprestado por sua filha Fernanda, ARROZ DE PALMA, de autoria de Francisco Azevedo. Este livro narra a saga da família portuguesa de José Custódio e Maria Romana. O personagem - relator da historia - é o filho mais velho do casal, chamado Antônio. Coincidência? O livro se inicia com o relato de Antônio, então, com 88 anos, preparando as refeições para um encontro com a família. Família que ele define como um prato que emociona e, também, como um prato difícil de preparar. É preciso ter muito cuidado para não desandar a receita. Reunir toda a família exige coragem, devoção, paciência... O Antônio, personagem do livro, como o nosso Antônio, se encontra saudoso porque está há muito tempo sem ver seus irmãos e, por isso, pensou que o centenário seria um bom pretexto para a reunião da família, inclu- sive contando com a presença dos sobrinhos, sobrinhas, netos e netas, que ele ainda não conhecia. E Vera, sua esposa, foi a primeira a incentivá-lo a organizar a reunião. Assim, Antônio telefonou para a sua filha Fernanda que, por sua vez, conversou com a sua tia Célia e lhe enviou de presente o referido livro. Após a leitura, Célia adorou a ideia e conversou com cada um dos irmãos, sugerindo não só que todos lessem o livro como, também, antecipando a possibilidade de um encontro de todos eles. Foi dado, assim, o primeiro e prin- cipal passo para o futuro encontro. Assim, todos os irmãos e irmãs ficaram animados, concordaram com a proposta e definiram a data do en- contro: 03 de agosto de 2013, a data de seu nascimento. Em seguida, era necessário decidir o que cada um dos irmãos deveria escrever. Optamos por um texto que relatasse as lembranças mais marcantes de nosso pai. Nossa intenção era que estes escritos poderiam subsidiar um relato mais amplo sobre a trajetória de vida de nosso pai que, posteriormente, seriam condensadas em um pendrive ou, quem sabe, em um livro?
  • 5. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 98 A partir daí, iniciamos cada um de nós a escrever as passagens mais importantes que vivemos em nossa fa- mília. E foram muitas as lembranças, tantos os casos, inúmeras as situações (...). E, paralelamente, começamos a recolher documentos sobre a sua trajetória de vida, sua família, seus estudos, seu trabalho, suas músicas preferi- das, (...) ilustrando sempre que possível, com fotografias... Algumas dessas lembranças nos fizeram rir, enquanto outras, algumas vezes, provocaram lágrimas... E os depoimentos foram chegando, pouco a pouco, de acordo com a disponibilidade de cada um de nós. E, com eles, algumas dúvidas foram surgindo: o que faremos com esse material? Organizaremos um resumo de tudo que foi escrito pelos filhos? Ou destacaremos o depoimento de cada um? Os depoimentos eram tão genuínos que, muitas vezes, alguns fatos se repetiram em diferentes escritos. Daí, pensamos: quem sabe essas repetições nos estão mostrando as características mais marcantes do nosso pai, o senhor Salgueiro? Outro desafio surgiu ao tentarmos organizar os escritos de cada um de nós: deveríamos seguir a ordem cronológica em que cada um dos depoimentos foi escrito ou a data em que cada um de nós os enviou? Ao final, optamos pelo depoimento de cada um dos filhos, em ordem cronológica: Anna, Antônio, Célia, Sônia, José e Luiz, e, em seguida as noras e os genros. Depoimento Anna Como nosso PAI me surpreendia! Depois que li os lindos textos de meus irmãos – Célia, Antônio, Sônia, José e Luiz – me pus a pensar: o que restou para eu escrever? Eles já escreveram tudo sobre papai! Inclusive alguns acontecimentos que eu desconhecia! Realmente me senti perdida... Durante a noite, depois de muito matutar, tive uma ideia: vou escrever sobre duas situações em que papai me SURPREENDEU! O primeiro relato tem início no ano de 1954, quando estudando no colégio de Passa Quatro, na 3ª série gi- nasial, eu e algumas colegas de minha turma, decidimos organizar um time de voleibol. Já jogávamos no próprio colégio durante o recreio, nas aulas de Educação Física e, muitas vezes, algumas partidas entre as internas e as externas. Assim, a partir dessa primeira experiência, organizamos um time de vôlei feminino que denominamos Alvi Celeste. Dele faziam parte algumas colegas da 3ª série ginasial. Era um grupo muito unido, muito companheiro, muito comprometido... Nossos treinos aconteciam ao final da tarde, pelo menos três vezes por semana, em uma quadra de terra, em frente à nossa casa, à Avenida Coronel Ribeiro Pereira, nº 2. Mamãe, toda folga que tinha, estava na janela acompanhando as partidas e observando o desempenho da filha. Quando eu conseguia fazer uma defesa mais difícil ou uma cortada indefensável, ela vibrava! Continuamos a treinar, e a jogar ora com o time do internato e ora com dois outros times da cidade – o Rubro Negro e o Blue Star -, até que surgiu a primeira oportunidade de jogarmos em outra cidade. O convite veio de um time de Itanhandu. Quando contei à mamãe desse convite para jogar em Itanhandu, antes que eu terminasse de falar, ela já me respondeu categoricamente: Nem pensar! Seu pai não vai deixar! Não precisa tentar!
  • 6. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 1110 Para mim foi uma decepção! Mas mesmo assim, resolvi tentar convencer o papai. Na verdade, não foi necessário ne- nhum argumento para convencê-lo. Ele, de cara, concordou, e não só concordou como levou toda a família para assistir a partida. Foi só alegria! Eles torceram muito! E para completar essa felicidade, conseguimos vencer o time adversário. Daí para frente, participamos de muitas partidas em di- ferentes cidades, tanto do estado de São Paulo, como do Rio e de Minas, sempre apoiadas por papai e mamãe. Jogamos mais de uma vez na cidade de Cruzeiro, em Engenheiro Pas- sos, em Lorena,... Também jogamos em Itajubá. Desta vez, foi mamãe que nos acompanhou e levamos conosco o José, que devia ter mais ou menos uns três anos. Mamãe fez para ele uma camiseta igual ao uniforme do nosso time e ele foi de mascote. Fez muito sucesso! Daí em diante, realizamos também outras viagens e enfrentamos os ti- mes de voleibol de Maria da Fé, de Santa Rita do Sapucaí. Nessas últimas partidas, a Célia já integrava nosso time. Vencemos todas as partidas, só perdemos para o time de Santa Rita. Isso ocorreu tanto na partida realizada em Santa Rita como na partida realizada em Passa Quatro. Infelizmente, tivemos que reconhecer que o time de Santa Rita era superior ao nosso! Também, considero importante dizer que papai e mamãe incentivaram essas atividades e delas participaram com muita alegria. Não perdiam ne- nhuma partida realizada em Passa Quatro. Sempre estavam presentes, tor- cendo pelo time e principalmente pelas filhas. A última partida que jogamos foi no Rio. Recebemos um convite de um time de Jacarepaguá. Aí enfrentamos um problema: quem nos acompanharia nessa viagem? Fizemos várias tentativas e não conseguimos nenhuma mãe dispo- nível para nos acompanhar. Já estávamos desanimadas, e desistindo da viagem ao Rio, quando o senhor Salgueiro nos salvou! Sem pestanejar ele topou acom- panhar nosso time que, nessa altura, já era dele também. Alugamos um ônibus e lá fomos com o senhor Salgueiro para o Rio de Janeiro. Enfrentamos um time forte, foi uma partida dura, mas conseguimos vencer! Foi só comemoração! Em seguida, passo ao segundo relato. Trata-se da proibição do senhor Salgueiro de as filhas participarem de festas dançantes em casa de colegas e em bailes na “Sociedade” em Passa Quatro. Ele, definitivamente, não admi- tia! Carnaval, a gente só ia ao baile infantil! Fazíamos várias tentativas, usávamos vários argumentos para ele nos deixar ir aos bailes, mas tudo em vão! Mais uma vez fui por ele surpreendida! Nessa época papai trabalhava em Elói Mendes. E, em uma de suas vindas à Passa Quatro para visitar a família, ele me convidou para ir a Elói Mendes, para um baile com a orquestra Cassino de Sevilha. Quase desmaiei de susto! E mamãe também! Mais do que depressa, mamãe ajeitou um vestido e lá fui eu com o senhor Salgueiro para o baile. Ele estava todo feliz de me levar para dançar! Foi maravilhoso ir a um baile acompanhada pelo meu pai. Inimaginável! Assim, a partir dessa data, passamos a participar dos bailes que aconteciam em Passa Quatro - eu, Célia e Sonia. Mas sempre acompanhadas da dona Auxiliadora. Ela, que também gostava muito de dançar, ficava muito feliz em nos levar aos bailes e, principalmente, em saber que papai já não era mais tão rígido como antes! SUR- PREENDENTE ESSE SENHOR SALGUEIRO! Que saudades, meu pai!
  • 7. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 1312 Lembranças de papai: diário do ano de 1940 Anna Maria Salgueiro Caldeira Recentemente, buscando lembranças de meu pai, tive uma grande surpresa! Na caixa de sapato, já meio desgastada, encontrei um caderno de capa dura, com uma etiqueta com os dizeres: Diário do ano de 1940, de José Manoel Salgueiro. A partir de várias leituras desse diário, me sinto capaz de fazer uma síntese das principais ideias nele contidas. Para isso, extraí, do próprio texto, algumas partes que traduzem os momentos mais significativos de sua vida no ano de 1940. Dentre os fatos mais marcantes e de muita felicidade em sua vida, no ano de 1940, ressalto o seu noivado com minha mãe e, três meses depois, o casamento. Em seguida, ele enfrenta uma realidade muito dura e que lhe causou profunda tristeza: a morte de seu querido pai, meu avô, o senhor Salgueiro, que há seis anos estava paralítico. No entanto, antes de recontar essas passagens alegres e, também, aquela que lhe causou aflição e sofrimento, gostaria de ressaltar o seu compromisso com seu pai, sua mãe e com seus irmãos. Papai cuidava muito de seu pai, tinha por ele um carinho especial e, inúmeras vezes, lhe dava o banho, fazia a sua barba e até cortava o seu cabelo. Levava-o, algumas vezes, até o quintal para pudesse conhecer a horta, cuidada por ele todas as manhãs bem cedinho. Papai ajudava também seus irmãos, especialmente, sua irmã Joaquina, viúva e com cinco filhos ainda peque- nos, pagando o aluguel da casa em que morava. Também cuidava de sua horta, ora capinando, ora plantando, colocando terra, podando, replantando legumes e verduras. Além disso, era zeloso com seu irmão caçula Chico, ajudando-o quando necessário, mas sendo severo quando era preciso. Papai gostava de levantar muito cedo para cuidar da horta, atividade que realizava diariamente. Assim, não me causou surpresa quando, em seu diário, ele escreve que: às cinco horas da manhã, capinei a horta, plantei um pé de limão galego, semeei cebola e cenoura, plantei feijão, fiz canteiro, capinei meu amendoim e mandioca (...). O produto deste trabalho era tanto para uso próprio, como também era vendido, ajudando a despesa da casa. Na parte da tarde, papai trabalhava na Coletoria Federal, como auxiliar. Além desse trabalho, papai também menciona que faz escrita para várias pessoas conhecidas, rendimento que contribui também para a manutenção de sua família. Também, pude perceber nos seus relatos que sua casa estava sempre cheia de gente. Quase todos os dias, ele escreve: estiveram em casa tio Cristiano, tio Tonho e tio Euclides, dona Isaura, dona Marieta, dona Dália e Zequinha, Frederico, Hélio e Cecília, dona Antônia e Yolanda, Carlota, Hélio Faria, dona Ângela, dona Maria Catita e primo Mário, entre muitos outros. Passo, em seguida, a relatar os principais momentos, de sua vida cotidiana, por ele registrados em seu diário e que se referem, especialmente, à sua relação com a Auxiliadora, nossa mãe que, algumas vezes, é também referida por ele como Nina. Em 1º de janeiro de 1940, papai escreve: Fui á missa junto com Nina. Estive com ela o dia todo. É o meu amorzinho de alma, coração e corpo. Dei um passeio com ela. O dia de hoje passamos admiravelmente, deixando-me saudades. Dia adorável! Cheguei à minha casa às 11 horas e trouxe a aliança de Nina. E, em 16 de janeiro, ele diz: Arranjei minha aliança, pagando dez mil réis. Foram muitas as cartas e os encontros que papai e mamãe trocaram entre os meses de janeiro e maio, quando se casaram. Ainda em janeiro, dia 17, ele recebe carta de Nina. No dia 18, ele escreve: Fui à Piranguinho encontrar com Nina. E no dia 20 registra: Nina esteve em casa. Almoçou comigo e a tarde fui junto com ela para a cidade, onde fomos assentar no banco do jardim. Fomos à casa do Álvaro de Castro, o filho dele fez um ano. Depois descemos e fomos à casa de dona Antônia e Yolanda. No dia 21 de janeiro, ele assim se refere à mamãe: Nina chegou e estivemos juntinhos durante muito tempo. É um anjo que tenho. À tarde fui com ela à fábrica de camas e voltamos de ônibus. Estive em casa de dona Antônia, e demos um passeio. Amei a Nina como ninguém ama. Fui embora às 11:30 horas. No dia seguinte – dia 22 - papai escreve: (...) Nina esteve em casa. Abracei e kiss. Fui acompanhá-la até a estação. (...) Adeus minha querida. Ela chorou poucos minutos antes de embarcar, não sei por que motivo. Nina embarcou para Santa Rita às 9 horas.
  • 8. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 1514 A seguir, extrato do diário dos dias 21 e 22 de janeiro de 1940: Nos dias seguintes, a correspondência entre eles se manteve intensa! No dia 7 de fevereiro, ele es- creve: Telegrafei para Nina pela data de seu aniversário. Ela hoje completou 23 anos. No dia 11 de fevereiro, papai e mamãe ficaram noivos. Nesse dia ele registra em seu diário: Fui cedo à Santa Rita voltando à noite. Estive com Nina o dia todo. Com Jandira, Adolfina, Doris, Geraldo, Toninho. Falei com Adolfina sobre o nosso noivado. Deixei as alianças com a Nina para mandar apertar. Choveu! Em 12 de fevereiro, papai relata: Fui cedo à Santa Rita, voltando à noite. Estive com Nina durante o dia todo. Com Jandira e Geraldo, Adolfina, Doris, Toninho. (...) Deixei as alianças com Nina para ajustá-las. Em 3 de março, novamente em Santa Rita com a Nina, papai conta: Passei o dia em casa de Auxiliadora. Fui à missa com ela. Esti- vemos arranjando os cartões de participação do noivado, subscritando tanto para Santa Rita, como para Itajubá e outras localidades. E já no dia 6 de março, ele escreve: o doutor Gaspar veio dar- -me os parabéns pelo noivado e eu o convidei para padrinho. Dois dias depois, papai telefona para a Auxiliadora, vai a Santa Rita e registra em seu diário: É um anjo, a minha queridinha. E, no dia 11 de março, registra: Faz hoje 5 anos e 8 meses que papai está de cama e um mês que fiquei noivo de Auxiliadora. Em seguida, o relato de papai no dia 24 de março: ...embarquei cedo para Santa Rita, estive o dia com Nina, meu amorzinho. Adolfina ofereceu-nos um jantar. O (Zé) Gouveia e a Doris ficaram noivos! Estive firme! Auxiliadora mandou uns doces para mamãe. Guardei de lembrança do jantar uma rolha e uma folha datada de 24/03/1940. Nina Nos intervalos entre as idas e vindas de papai à Santa Rita, as cartas entre os dois são praticamente diárias. No dia 14 de abril, papai escreve: fui cedo a Olegário e Santa Rita e voltei à noite. Passei o dia com a querida Maria Auxiliadora. Fui ao ginásio, estive com dona Espanha e Milton. Auxiliadora deu-me a aliança que mandei arranjar e um lencinho rosado. Lá se foi o meu amorzinho... Papai recebeu, em 18 de abril, carta expressa de sua noiva com os papéis de casamento. No dia seguinte, assinou os papéis e escreveu para Auxiliadora e, no outro dia, recebeu outra carta de sua noiva com o edital do casamento. Em 25 de abril, ele registra que Auxiliadora veio de Santa Rita com dona Adolfina. Fui à cidade com Auxilia- dora e ela com a mãe vieram jantar em casa. Fui ao cinema com a Auxiliadora. A sogra Adolfina comprou os móveis para eu e Auxiliadora. No dia seguinte, ele anota no diário: Nina foi embora cedo. Fui ver os móveis. E, em seguida, coloca: ATENÇÂO Meus pais: Antônio Manuel Salgueiro e Anna Victória da Silva Salgueiro, ele de 1863 e mamãe de 1879. Auxiliadora: Antônio Luiz de Souza e Adolfina Ribeiro Duarte E, no dia 2 de maio, escreve: Participei o senhor Lopes e Ferreira, o senhor Jarbas, Edson e família que vou me casar. E, no dia 8: comprei um chapéu por 70$000 e meu sapato por 65$000 na Liberty. Dona Maria Gonçalves deu- -me 10$000 para comprar uma gravata de casamento. E, no dia seguinte: Fui ao Forum buscar o papel de meu casamento para enviar para Nina. No dia 12, Papai vai novamente a Santa Rita: Passei o dia com ela alegre e feliz! E as cartas, diárias, continuaram de lá para cá e daqui para lá! E, no dia 20 de maio, papai relata que o senhor Maurício deu-lhe de presente de casamento 100$000 mil réis e o doutor Gaspar deu-lhe seis copos e uma jarra de cristal; Jaime e Milena lhe deram uma Santa Terezinha. Finalmente, chegou o dia 21 de maio de 1940! Dia feliz para mim e para Auxiliadora! Fui de automóvel para Santa Rita. Levei comigo de automóvel papai e mamãe até Olegário Maciel. Cheguei a Santa Rita às 12:20 horas. Estive com Auxiliadora e os seus. Casamos às 17:30 horas. Nós não ficamos nervosos, todos calmos. Meus padrinhos, o Dr. Gaspar Lisboa e dona Nair Rezende Lisboa, foram para ambas as cerimonias. E os da Auxiliadora, no civil, foram Américo Julidore e dona Espanha e, no religioso,
  • 9. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 1716 senhor Otávio Ribeiro e dona Maria José Carvalho Renó. (...) Nina ganhou muitos presentes. Recebemos muitos cartões de felicitação. Passei uma noite feliz com Auxiliadora. Dormimos a noite toda pela primeira vez, felizes e contentes! Logo abaixo dessa parte do relato, mamãe escreve no diário: Senti-me muito feliz nesse dia. Assinado: Auxilia- dora Salgueiro. Papai tinha muito carinho e cuidado com seus pais. Seu pai, Antônio Manoel Salgueiro, nasceu em 25 de agosto de 1862, em Pombal do Marques, Portugal. Casou-se em Serra Azul em 1895. Viveu, por seis anos, para- lítico. Faleceu aos 78 anos. Deixou cinco filhos e doze netos. Sua morte causou grande comoção ao meu pai que, assim, se expressou em seu diário, no dia de sua morte: Dia 8 de junho: Página negra da minha vida. Papai faleceu às 4 horas da madrugada, sem ninguém ver.Telefonei para Olegário e Piranguinho para Dona e José. Vesti papai com a mamãe. Telefonei para Pedra Branca Alegre e Delfim Moreira. Mandei fazer 3003contos de convite, mandei fazer o caixão de segunda, que papai me pediu. Fui à igreja encomendar a (...). O padre Theodoro que encomendou papai. Papai foi descido à sepultura às 5 horas e 35 cinco minutos da tarde e o meu último olhar para ele foi às cinco horas e quarenta e cinco minutos. A sepultura é de nº 184, quadra 17. Papai nasceu em Portugal em 1862, em 25 de agosto, no lugar Pombal do Marquês. Seus pais eram: Manuel Antônio Salgueiro e Joaquina Maria Salgueiro, casou-se em Serra Azul, em 6 de julho de 1895, deixou 5 filhos e 12 netos. A partir desse dia, papai escreve uma lista enorme de nomes de pessoas que estiveram com ele, tanto no enterro, como em sua casa, nos dias seguintes. Os relatos posteriores a esta data se referem às atividades de papai no dia-a-dia, seja em casa como no trabalho, algumas viagens com mamãe à Santa Rita e visitas da vó Adolfina e outros parentes à sua casa em Itajubá. No entanto, chamou a minha atenção a última página do diário, datada de 13 de dezembro de 1940. Papai escreve: Não trabalhei no dia de Santa Luzia. Fui à missa. Ao ler esta última frase, me veio à memória que papai tinha uma gran- de devoção por Santa Luzia e que, todos os anos, no seu dia, ele ia à missa em uma igreja em Pinheirinho. Por acaso, encontrei uma foto dele, ainda pequeno, em que está bem visível uma alteração nos seus olhos. Então me lembrei de que ele nos dizia que foi curado por sua fé em Santa Luzia! Vô Salgueiro Depoimento Antônio Do casamento de Antonio Manoel Salgueiro, natural de Portugal (25-08-1863/08-06-1940) e AnnaVictoria, brasileira, (25-04-1879 /13-09-1969), realizado em Pedra Azul- SP, em 06/07/1879, nasceram seis filhos: Antônio (11-06-1896/17- 09-1897), Joaquina (28-03-1898/22-01-1966), Anna (25- 12-1903/ 12-12-1986), José Benedito (28-02-1906/01-03- 1966), José Manoel (03-08-1913/ 02 -09 -86) e José Francisco (16-06-1916/ 02 08-1991). Seus avós paternos eram Manoel Antônio Salgueiro e Maria Joaquina Salgueiro e os avós ma- ternos Francisco Rodrigues da Silva e Maria da Glória Guima- rães. Jose Manoel nasceu na Pimenteira em Olegário Maciel. Passaporte do Vô Antônio Manoel – outubro 1986
  • 10. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 1918 Anotações do Vô Antônio Manoel do nascimento e morte de seus filhos Anotações de Papai do nascimento de seus pais e nascimento e morte de seus irmãos Papai foi o único dos filhos que conseguiu estudar. Para isso trabalhava na escola onde estudava. Certificado de Conclusão do 2º ano – 1932
  • 11. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 2120 Certificado de Conclusão do quinto ano - 1935 O primeiro, segun- do e terceiro anos do gi- nasial cursou no Colégio São Vicente de Paulo em Itajubá. A quarta e quin- ta séries, no Instituto Moderno de Educação e Ensino em Santa Rita do Sapucaí, época em que conheceu sua futura es- posa Nina. Enquanto alguns colegas continuaram os estudos em escolas superiores, papai foi obrigado a interrompê-los para trabalhar porque seu Pai sofreu um derrame cerebral e ficou paralítico por seis anos. Seu colega de turma Olavo Miranda, por exemplo, formou-se em Direito e foi professor de Português e Espanhol no Colégio Itajubá. Condoído, pelo fato dele ter concluído a quinta série, que correspondia ao nosso científico, fato raro na época, o senhor Jarbas Guimarães, coletor federal em Itajubá, convidou papai para ser seu auxiliar na coletoria. Em agosto e setembro de 1938, papai voltou a Santa Rita para votar, nas primeiras eleições da constituição de 1938, ocasião em que reencon- trou a Nina, que estava noiva. No entanto, ela desmanchou o noivado e voltaram a namorar. E, em 11-02-1940, ficaram noivos e, em 21-05- 1940, estavam casados. Convite do Baile de Formatura em Santa Rita do Sapucaí - dezembro de 1934 Comunicação do contrato de casamento - 11/02/1940
  • 12. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 2322 A seguir, relaciono uma série de documentos relativos à vida profissional de meu pai. Em 31 de agosto de 1944, foi nomeado interinamente para exercer o cargo de escrivão da Coletoria de Rendas Federais, em Delfim Moreira. Designação para exercer interinamente o cargo de Escrivão da Coletoria de Rendas Federais em Delfim Moreira – 31/08/1944 Em 1945, fez concurso de provas para provimento à classe inicial de carreira de Escrivão de Coletoria Fe- deral, e foi nomeado, em 29 de agosto de 1946, conforme certificado apresentado a seguir, permanecendo em Delfim Moreira. Certificado de Habilitação como Escrivão Federal – 1946
  • 13. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 2524 Em 1949, foi transferido para Passa Quatro, onde permaneceu como escrivão federal. Foi coletor federal em Elói Mendes, onde ele ficou pouco tempo e retornou a Passa Quatro como coletor federal. Acompanhando a trajetória profis- sional de nosso pai, moramos inicial- mente em Itajubá, à Rua José Joaquim 91. Daí, mudamos sucessivamente para Delfim Moreira, novamente para Itajubá, em seguida para Passa Quatro, voltamos a Itajubá e, em 1950, muda- mos definitivamente para Passa Qua- tro, na Avenida Cel. Ribeiro Pereira, número 2. Passa Quatro com as quatro curvas do rio e as pedras enfeitando o leito de suas ruas – no dizer do Oliveira - en- feitiçou toda a família, viramos passa- quatrenses. Finalmente, em 1960, mudamos para a Rua Major Alessandro, 68, onde papai morou até o seu falecimento em 1986. Papai e mamãe tiveram seis filhos: Anna Maria, Antônio, Célia Maria, Sônia Maria, José e Luiz. Nosso Pai tinha uma grande destreza manual, tanto na horta como nas “escritas”, em compensação, para dançar era um fracasso. A música também não era seu ponto forte, mas gostava de pelo menos três: Kalu, Aqueles olhos verdes e No Rancho Fundo. As duas primeiras podem ser explicadas pelos olhos verdes de D. Auxiliadora e a última porque ele foi colega do Alvarenga, da dupla Alvarenga e Ranchinho, do primeiro Ranchinho - foram três -. Papai no contava até que o apelido do Ranchinho veio de tanto os colegas pedirem para ele cantar “aquela do Rancho”, assim virou Ranchinho. Na horta, seus canteiros eram muito bem feitos e as verduras milimetricamente plantadas. Até o laço para pegar os sabiás, comedores de morango, era muito bem feito. O caramanchão de plantação de chuchu era um primor de obra e, sua produção, eu vendia semanalmente para o Patronato e para a quitanda da D. Maria Kato. As cercas que ele fazia no quintal eram perfeitas. Comprava a vara de bambu, serrava os pedaços todos do mesmíssimo tamanho e, com seu facão, os rachava ao meio. Tudo exatamente igual. A cerca era feita com as ta- Cartão de Natal – 1969/1970 quaras a 45°, com as metades cortadas se contrapondo. Durante muito tempo papai foi produtor de mudas de café. Plantava as sementes e cuidava das mudas e, depois de passado certo tempo, replantava-as. No início usava as tradicionais jacas de bambu. Posteriormente inovou com o uso do compensado, grampeado nas duas pontas, como suporte para o plantio das mudas. Para combater os insetos daninhos nas plantações, pegávamos sapos nas ruas. Já nessa época, o Senhor Salgueiro era ecologicamente correto. Também, para obtenção de adubo, ele fazia dois buracos na horta de aproximadamente 1,50X 1,50 X 1,00, onde depositava todo o lixo orgânico da casa além de folhas secas do quintal, que ele molhava regularmente. Enquanto esvaziava um buraco, ia enchendo o outro e, assim, tinha adubo o tempo todo. Além da horta e dos pés de cafés, ele também cuidava do seu jardim. A “vedete” era a plantação de lírios. Eram plantados para serem colhidos anualmente no dia de finados. Ele colhia e levava as flores para o túmulo de seu Pai em Itajubá. Lembro-me também de quando comprou ou alugou, não sei ao certo, um terreno onde é hoje o Bairro Copacabana, onde pretendia ampliar sua horta. Para isso, era preciso canalizar um córrego que passava no meio do terreno. O senhor Salgueiro emprestou da Prefeitura fôrmas metálicas, comprou cascalho, cimento e ferro, e fomos construir as manilhas. Deviam ter 60 cm de diâmetro. Colocávamos os ferros na forma e os misturávamos com a massa. A vibração era obtida com pedaços de ferro batendo nas formas. Depois de desenformadas e curadas, em uma área cimentada na entrada de nossa casa, as manilhas eram transportadas, de carroça, para a futura horta. Em seguida, foi feita a canalização do córrego. Infelizmente, a obra não resistiu à primeira chuva! Meu pai tinha também uma grande habilidade nas escritas que fazia em casa. Ele traçava, no borrador, linhas paralelas, com sua régua plástica preta, sempre com uma simetria perfeita! No final da vida, o que muito me marcou, foi quando Papai estava internado no hospital em Itajubá. Em seus delírios, ele recorria sempre à ajuda de seu Pai, falecido há mais de quarenta anos. Meu Pai se levantava sempre muito cedo, cuidava da horta, fazia o café, chamava os filhos para irem ao co- légio e ia trabalhar na Coletoria, de portas fechadas. Na nossa infância nunca tivemos empregada doméstica em casa, era tudo por conta da D. Auxiliadora. Ela era a faz-de-tudo de nossa casa. Assim, nas raras ocasiões em que ela se ausentava, Papai assumia a cozinha. Sua característica era fazer arroz vermelho. Usava para isso massa de tomate. Fazia também o viradinho de queijo e, ocasionalmente, a broa pau-a-pique.
  • 14. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 2726 O viradinho era servido no café da manhã. RECEITA DO VIRADO Ingredientes para quatro pessoas 1 colher de sopa de óleo 320 grs. de queijo 200 grs. de farinha de milho 3 ovos batidos 3 colheres de sopa de açúcar Preparo Corte o queijo em fatias bem finas... Reserve. Bata os ovos até a mistura ficar uniforme e despeje na panela com a gordura quente. Mexa bem até começar a cozinhar. Despeje o queijo na panela e continue a mexer. Acrescente a farinha de milho, continuando a mexer. Finalmente, coloque o açúcar e bom apetite! Senhor Salgueiro em Campo Grande Papai e Mamãe vieram muitas vezes à Campo Grande. Assim, relatarei os fatos mais marcantes de sua permanência em nossa. A primeira vez que aqui veio, ele viu um tuca- no e me disse que várias pessoas lhe pediram para levar aquele passarinho. Eu estranhei aquele pedido. Depois que ele me explicou eu entendi que o que aquelas pessoas queriam era um “bicudo”. Em 1972, quando jantávamos na casa do Ker- man Machado, ele ficou batendo um longo papo com o governador José Fragelli, sem saber quem ele era. E acabou levando um baita susto quando eu o informei de quem se tratava. Em junho de 1977, no aniversário de 10 anos da PLANEL, fomos, com meu grande amigo Fabiano, pescar no Rio Piquiri na Fazenda Santo Antonio do Paraíso. Em uma manhã pescamos 54 pacus. Foram momentos de rara felicidade! Vô Salgueiro e Antônio - Pescaria em Mato Grosso do Sul
  • 15. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 2928 Papai pescando - Mato Grosso do Sul Papai e Mamãe também vieram a Campo Grande para o nascimento de meus filhos. Papai e Nanda - Presidente Prudente Vô perto das rosas que plantou em Campo Grande com Ronan e Nanda
  • 16. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 3130 Vó Nina ensinando a fazer nhoque com Nanda, Papai e Fabiana Papai, Ronan, Fernanda, Fabiana e Vera – Cabo Frio Antônio, Vera, Fernanda, Vinícius e Fabiana - Curitiba Vinicius, Cristina, Camila, Ronan, Gabriela, Fernanda e Fabiana
  • 17. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 3332 Camila, Cristina, Eduardo, Fernanda, Vera, Ronan, Fabiana, Antônio, Gabriela e Marcelo Em uma das vindas de papai à Campo Grande, fomos nas manhãs do sábado plantar algumas mudas de abacaxi em um terreno que eu possuía nas proximidades da Universidade Federal. De enxada nas mãos plantamos e carpimos o abacaxisal. Depois que compramos o Fazendão, trocamos a diversão, encontramos brinquedo novo! De Passa Quatro vieram mudas de capim Guatemala e dois casais de ganso, sendo um, o de bico preto, além das mudas de amora branca. Presentes marcantes A primeira lembrança que ganhei de meu pai foi uma espada. Meu Pai a recebeu do seu Pai que, por sua vez, foi presenteado por um amigo que lutou na Guerra do Paraguai. Recentemente mostrei a espada para meu neto Vinicius e ele ficou encantado! De onde ele está, sei que meu pai deu um belo sorriso nesse momento. E ganhei também um relógio antigo de parede. Não foi o relógio “oficial” da família que, me parece, foi presenteado ao José. Mas o que ganhei, provavelmente, é tão antigo quanto o outro. E Papai tinha também o costume de dar moedas de prata de libra esterlina. Eu e o Ronan ganhamos este regalo. Suas músicas preferidas eram: KALU Humberto Teixeira Kalu, Kalu Tira o verde desses óiosdi riba d’eu Kalu, Kalu Não me tente se você já me esqueceu Kalu, Kalu Esse oiá despois do que se assucedeu Cum franqueza só n’um tendo coração Fazê tal judiação Você tá mangando d’eu Com franqueza só não tendo coração Fazê tal judiação Você tá mangando d’eu!
  • 18. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 3534 AQUELES OLHOS VERDES Aqueles olhos verdes Translúcidos serenos Parecem dois amenos Pedaços do luar Mas têm a miragem Profunda do oceano E trazem todo o engano Das procelas do mar Aqueles olhos verdes Que inspiram tanta calma Entraram em minh’alma Encheram-na de dor Aqueles olhos tristes Pegaram-me tristeza Deixando-me a crueza De tão infeliz amor Aqueles olhos verdes Que inspiram tanta calma Entraram em minh’alma Encheram-na de dor Aqueles olhos tristes Pegaram-me tristeza Deixando-me a crueza De tão infeliz amor Astral Apesar de não ser de muito conversar, meu Pai tinha um magnetismo fora do normal e, enquanto ele esteve entre nós, orbitávamos ao seu redor. Nas festas de fim de ano, sempre estávamos juntos, comendo castanhas portuguesas, leitoa, bacalhoada e nem sei mais o que... Sua Família Não é possível falar de meu Pai, sem nos lembrarmos da Sá Donana. Ela morou com meus pais desde que eles se casaram e só, esporadicamente, passava al- gum tempo com o tio Zé Gran- de em Itajubá. Papai sempre foi extremamente paciente com ela. E ela não era fácil! Era só ser contrariada e ela tinha chilique! E toca a correr para dar-lhe as 30 gotas de coramina. Papai era muito preocupa- do com seus irmãos e sempre que eles precisavam de alguma ajuda, lá estava o “Zé Mané” os socorrendo! Zé Mané, pois era assim que sua família o chamava. Ele cuidava de todos! Não se tratava apenas de um amor fraterno, era um amor quase crístico!
  • 19. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 3736 Santa Luzia Na infância meu Pai foi acometido de um problema na visão e foi curado devido às orações a Santa Luzia e, desde então, passou a manifestar uma enorme crença pela santa. Assim, diante de qualquer problema que tínhamos nos olhos, ele prescrevia que disséssemos três vezes: Santa Luzia passou por aqui, com seu cavalinho comendo capim. E, ao mesmo tempo, deslizássemos o polegar abaixo dos olhos. Com todo esse fervor, infalivelmente, - no dia 13 de dezembro - dia de Santa Luzia, papai ia à Missa na Igreja do Pinheirinho. Ia a pé ou de charrete, mas sempre lá estava ele para agradecer a graça recebida. Depoimento Célia “Oque a memória ama, fica eterno” Adélia Prado Antes de escrever minhas lembranças de coisas vividas com meu pai, gostaria de contar para vocês sobre um livro que ganhei de minha sobrinha, Gabriela, intitulado “A sabedoria do Salgueiro”, de Jean-Yves Leloup, e que recorda muito nosso pai. É a cara dele! A seguir, transcrevo pequenos trechos do livro para vocês: “Alguns passos adiante, ele viu um Salgueiro à margem do rio... Os galhos flexíveis do Salgueiro se inclinavam sob o peso da neve; ao chegarem ao solo, eles se libertavam suavemente de sua carga e, então, voltavam aos seus lugares, intactos.” (2005, p.15). (...) “brandura na retidão, doçura no vigor” (...) (2005, p.23). (...) ”a atitude dócil mas firme do Salgueiro, no balanço de suas folhas, dos seus galhos, em sua não-resistência,na sua aceitação do movimento, aparente revés, mas que traz novidade, mudança... e que exige o seu enraizamento para que ele cresça para o alto. Assim, não será arrancado, mas permanecerá; não medirá força, mas será forte; será abrigo para as águias e para os pássaros; será sempre fonte inesgotável de sabedoria.” (2005). Meu pai se foi... mas deixou boas lembranças, ensinamentos para a vida inteira. Há imagens de vivências, de lugares, de sabores, de cheiros, que mantenho dentro de mim e isso é muito bom! Às vezes, deixa uma saudade e uma tristeza danadas. Tiveram ele e D. Auxiliadora seis filhos: Anna Maria, Antônio, Célia Maria, Sônia Maria, José e Luiz. Papai queria que meu nome fosse Getúlio, se eu tivesse nascido homem. Por causa do Presidente Getúlio Vargas! Já imaginaram?
  • 20. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 3938 O casamento deles foi bem sucedido: papai e mamãe tinham temperamentos diferentes, mas se comple- tavam. Eu nunca ouvi uma discussão entre eles. Como todos sabem, papai era o centro da casa, o muro de arrimo da família e nossa mãe sempre foi o centro deste centro. Ele era tradicional, careta, mas evoluiu com o tempo, empurrado pelas circunstâncias e pela mamãe, o que permitiu entre outras coisas que os filhos estudassem fora. Das cidades onde moramos- Itajubá, Delfim Moreira, Passa Quatro - tenho mais lembranças da última. De Itajubá tenho lem- branças de nossa casa, de alguns parentes (tios e primos), da fábri- ca de farinha – Fecularia Faria - do Senhor Mozart Faria, que era na frente de nossa casa; ele era padrinho da Sonia. Buscávamos na fábrica aqueles bijus enormes que comíamos com mel. Ali- ás, meu pai gostava de comidas com mel (massa de pastel frita) e com manteiga (mandioca cozida amassada com manteiga e açú- car), além da banana cozida com açúcar e canela. O quintal de nos- sa casa era enorme e tinha várias árvores frutíferas, de muitas e variadas espécies. De Passa Quatro papai foi transferido como coletor federal para Elói Mendes. Ele foi seguro, porque tinha a promessa do Dr. Castro de que arrumaria sua transferência novamente para Passa Quatro. Coisa que não aconte- ceu. Nós chegamos a arrumar a mudança para lá, mas logo que o Sr. Chiquinho Galvão ficou sabendo da perda que Passa Quatro teria, trouxe-o de volta. Quem foi conhecer Elói Mendes foi a Anna, que ficou hospedada no hotel onde papai morava. Para relatar minhas lembranças de Passa Quatro, porque elas estão muito mescladas, vou dividi-las em qua- tro partes: I - As lembranças da rua de baixo Quando morávamos na avenida, éramos vizinhos dos Carneiro (papai escolheu minha madrinha de crisma na família, a D. Francisca) e do Sr. Custó- dio, que era de Virgínia e mandava pra gente aqueles caquis enormes, onde pa- pai colocava um pouquinho de vinagre nas folhas e embrulhava cada um deles em jornais para amadurecer. Papai tinha também muito cui- dado com os cachos de uvas e com os morangos e os embrulhava, um a um, para os pássaros não comerem. Éramos também vizinhos do Fer- rão que tinha a fábrica de Doces Estrê- la do Sul. Lembro-me das goiabadas, marmeladas e bananadas que comíamos com queijo branco. São tantas pessoas boas a recordar nesta época de nossa vida, a Luiza e o José Luiz na casa da esquina, a Ma- riazinha que me ensinou a jogar baralho e o seu marido Milton, que era padrinho do Luiz. Lembro-me do cheiro forte do cipreste - que formava a cerca divisória entre a casa do gerente da Rede Fer-
  • 21. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 4140 roviária Federal e a rua do Patronato - que sempre sentíamos quando subíamos para o centro da cidade. No Beco do Barroso, tínhamos muitos amigos especiais, entre eles a Zezé costureira e sua família e a Dona Rita e seus filhos. Havia o campo de vôlei na frente de nossa casa onde treinávamos todos os dias. O nosso time era o Alvi Celeste. Lembro-me, também, de nossa primeira comunhão. Nós cinco fizemos em Passa Quatro na Igreja Matriz de São Sebastião, apenas a Anna fez a primeira comunhão em Itajubá. Sinto saudades das nossas brincadeiras nos vagões de trem que ficavam parados na estação. Dos canteiros de flores, das frutas, das parreiras de uva na porta da cozinha e das parreiras de maracujá na entrada principal e lateral da casa. Do galinheiro na porta da cozinha, do cachorro Bob do Tão e das inúmeras vezes que, enquanto papai plantava as mudas e tratava as plantas, nós ficávamos, na divisa da parte cimentada com o início do quintal, jogando finca. Eu adorava! Hoje em dia quase ninguém sabe o que é brincar de finca. E tudo isso junto e misturado vem com a marca registrada da presença do pai. Graças ao papai, fui Rainha da Caridade em 1951. E o agradeço até hoje: foi o meu único reinado! rs. Ganhei um piano e uma boneca enormes de presente.Tenho a boneca até hoje. Acho que já posso considerá-la “antiguidade”! Abaixo uma lista elaborada pelo papai, em abril de 1951, com o resultado final do concurso. Coroação Rainha da Caridade - 1951 II - As lembranças da rua de cima Casa da Rua Major d’Alessandro nº 68 - Passa Quatro Vista da Serra da Mantiqueira da parte de trás da casa - Passa Quatro
  • 22. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 4342 Nessa casa, éramos vizinhos dos italianos Olindo e Mary. Papai conversava com eles pela varanda, assim como com a Lecy e o Chico Saulle, que moravam na casa da frente. Ele sempre comprava o “vinho dos italianos” que não podia faltar em nossas me- lhores refeições. Na porta de frente para a rua, era o cartório do Sr. Jo- aquim Tibúrcio. Tínhamos também bastante relacionamento com a famí- lia Scianni - eu fui colega da Vicentina e da Rosária, e fui aluna da Benita no colégio e aluna da Marina nas aulas de piano. O Aldo era colega do Antônio, o Constante era parceiro nos jogos de vôlei no Campo do Rubro Negro. Nossa casa era pertinho da escola (INSA), do campo do Rubro Negro, do Jardim dos Leões... Tenho boas lembranças do vi- nho dos italianos, da fábrica de gua- raná Açoreana, do guaraná Rádio, e o Guaranita, da Cibal. Muitas vezes tomávamos o guaraná fazendo um furinho na tampa com um prego. Era uma delícia! Também os vizinhos da “rua do meio” eram todos amigos. O Zé Leite e a Dona Lourdes - lembro-me muito da Rural Willys de cor verde deles -, e o Dr. Castro, que além de amigo era nosso médico. Tenho lembrança da participação de papai, quando a mamãe fazia o famoso doce de abóbora, aquele que era cristalizado por fora e molhadinho por dentro. Era muito trabalhoso, e ela colocava até cal nele! Papai ajudava na logística do transporte das fôrmas com os doces: de dentro da cozinha para a parte externa da casa para tomar sol. Durava muitos dias esse ir e vir com os doces, mas valia a pena! Por falar na parceria deles, enquanto ela cuidava de todos os serviços domésticos e do acompanhamento dos estudos dos filhos, ele se encarregava de todas as compras e pagamentos. Na rua de cima, na esquina em frente ao hotel Gonçalves, que era da Dona Fralzina, estava a casa da Dona Renê, para mim, a casa mais linda de Passa Quatro, enorme, antiga, com aquelas parreiras na lateral, ao lado da tipografia do senhor Castorino, que ficava na frente da casa da Kaffa, do Pedro Morssri e da Rita. E logo na esquina, a casa do Chiquinho e da Ana Maria. Que saudade deles! Papai, assim como nós, também se divertia muito com os casos contados pela Rita. Ela era espontânea, caris- mática, tinha uma “veia artística”. Um dia lá em casa, na sala de jantar, enquanto a Rita nos contava um de seus casos tragicômicos, ela chegou a desmaiar. Todos correram preocupados para socorrê-la, inclusive papai que ficou todo afobado e, no final, era teatro dela, que se levantou e todos demos muitas risadas! Papai e D. Marcos Barbosa Papai e os padres do Ginásio São Miguel - Padres Lino e Francisco e Dr. Rangel
  • 23. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 4544 Papai prezava muito suas amizades. Seus amigos eram os mais variados. Impossível nominá-los, mas vou citar apenas os que ainda estão gravados em minha memória, seja pela simpatia, presença, inteligência: Senhor Cance- la, que trabalhou com ele durante anos na Coletoria e sempre o ajudou muito; Dom Marcos Barbosa, contempo- râneo de escola, escritor, poeta, membro da Academia de Brasileira de Letras; Dona Aspásia, que era sua prima e morava em Belo Horizonte; Alvarenga e o Ranchinho, cantores e colega de escola; os padres Michel, Domingos, Francisco, Zé Maria, Lino, do Ginásio São Miguel; Napoleão, vizinho da Coletoria, padrinho do Luiz e dono do cinema; Carlos e Mário Anacleto que também trabalhavam com ele na Coletoria, colegas e amigos; as irmãs do Colégio Nossa Senhora Aparecida. Entre elas, as Irmãs Emiliana e Silvéria, que também eram irmãs, filhas do Dr. Ernesto Sanches, que já era amigo do papai desde que morávamos em Itajubá. A vó Donana era madrinha da Irmã Emiliana. O Sr. Gersino era fiscal de rendas e pai do Gerson, que nós chamávamos de “filho do pai”, pois papai participou ativamente da educação dele. Lembro de uma vez, que papai autorizou o Gerson a comprar roupas na loja Nogueira para sua formatura. No dia da formatura o Gerson apareceu vestido com uma camisa verde abacate... Papai ficou muito bravo! Vocês não imaginam a indignação do pai, que chamou a atenção dele na formatura mesmo. Por falar em abacate, lembro-me que colhíamos os abacates lá em casa, da janela da sala da copa. Papai bolou um jeito todo especial para colher os abacates. Ele mon- tou uma vara com alguma coisa cortante na ponta, que era acoplada a uma cestinha de taquara, de tal maneira que colhia o abacate inteiro, perfeito!... e que era rapida- mente cortado ao meio e comido na própria casca, com açúcar e limão. Tenho boas lembranças de quando papai chegava das viagens, sempre com um presentinho para nós, fosse uma caixinha vermelha de passas ou uma maçã argentina. Seu retorno era sempre uma alegria! Era um festeiro! Lembro-me das festas de pri- meira comunhão, de quinze anos, de formatura, das comemorações do vestibular (a festa do Antônio foi maior do que as outras...), das festas de noivado e de casamento. Ele e mamãe contavam sempre com a participação carinhosa e imprescindível da tia Jandira. Ele tinha “feeling” para fes- tas e não economizava dinheiro e trabalho para que elas fossem óti- mas, bonitas e bem servidas: do- ces sofisticados, drinks (perna de moça, ponche), bolos enormes, de vários andares. Anna me contou outro dia do bolo de sua primeira comunhão, feito pela tia Jandira, era um bolo de três andares: no primeiro tinha um missal com um terço de continhas prateadas e no terceiro, um cálice com uma hóstia. Incrível!
  • 24. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 4746 Tenho lembrança também das festas da Santa Casa que aconteciam todos os anos: ele arrematava frango recheado, prendas e garrafas de vinho nas barraquinhas e levava para casa. E dos cartuchos que a gente ganhava na Coroação de Nossa Senhora, quando nos vestíamos de anjos e coroávamos a Virgem. Por falar em comida e lembranças boas, me recordo bem dos pés de moleque, moídos e de grão, que ele trazia de Piranguinho, comprados nas barracas azuis e vermelhas. Festa de formatura de Anna - Curso Normal - Passa Quatro - 1958 Abaixo fotos da primeira comunhão de todos os filhos: Anna Maria, Antônio, Célia Maria, Sônia Maria, José e Luiz.
  • 25. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 4948 Antes de papai comprar o telefone 53 (foto do aparelho abaixo), as ligações eram feitas via telefonista, in loco. Acho que o nome dela era Isabel. A “central telefônica” era na rua principal. Precisava de um mensageiro vir avisar em casa quando recebíamos alguma ligação telefônica, do mesmo modo que precisávamos ir até lá quan- do precisávamos fazer alguma ligação. Às vezes, a ligação não completava e nós ficávamos ansiosos pela notícia, aguardando, por horas, uma nova ligação. E nunca pensávamos que pudesse ser uma boa notícia. Era um sufoco! Uma dificuldade! Imaginem a aflição do papai! No entanto, hoje, usufruímos de tanta facilidade de comunicação - TV com alta definição, computadores, celulares, IPAD, IPOD, entre outras tecnologias – que é difícil para os mais jovens entenderem a realidade que vivemos naquela época. Sempre achei que ele gostaria que a cerimônia do meu casamento tivesse sido igual ao da Sônia com toda pompa e circunstância: muitos convidados e eu com um belo vestido longo branco entrando pela Igreja Matriz de São Sebastião, pelos braços dele. Entretanto o meu casamento foi simples, poucos convidados, vestido rosa curto, luz de lampiões. Do jeito que eu escolhi, ele fez o melhor que podia. Ele tinha orgulho de “carregar” as filhas. Abaixo as fotos de Papai com as filhas nos casamentos: Sônia – 1970Célia – 1967 Anna – 1968
  • 26. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 5150 Lembram-se do quadro de medalhas de honra ao mérito do Antônio e do orgulho do pai quando as medalhas eram entregues no cinema, que ficava sempre lotado? O Antônio sempre estava entre os três primeiros alunos colocados, revezando com o Tarso e com o Aldo, na maioria das vezes. Papai ficava na plateia todo orgulhoso! E, depois da entrega das medalhas, havia a come- moração lá em casa! Papai também nos presenteou com um pia- no alemão – Ritter – que pertencia ao Napoleão e ficava no Hotel de Lourdes. Ele ficava muito orgulhoso quando suas filhas tocavam nos con- certos de piano. O primeiro foi organizado pela dona Cidinha e o segundo por Marina Scianni. É, é sempre bom esclarecer que minha participa- ção era modesta, com o “meu carro chefe”: “Tira, tira o seu pezinho”, do Villa-Lobos. E papai não deixava de nos incentivar: ele comprava as partituras no Rio de Ja- neiro, bancava as aulas de piano com a Marina Scianni e as minhas aulas teóricas em São Lourenço. Além disso, nos pres- tigiava com sua presença e elogios num “sarau” que acontecia na sala de visitas lá de casa, depois do jantar, à luz de lam- pião... Suas músicas preferidas eram Kalu, Tardes Silenciosas de Lindóia e Asa Bran- ca. Mamãe sempre cantava. Sua voz era linda! Quando a energia elétrica chegou, ele comprou uma “eletrola” que tinha de um lado o rádio e do outro o toca disco. Ela José com as medalhas recebidas por Antônio no Ginásio São Miguel não durou muito! Uma pena! O cupim logo estragou todo o móvel e a mamãe ficou muito triste ao se desfazer dela. Papai sempre que viajava comprava discos para nós. Ouvi muito relatos sobre a ajuda do pai aos passaqua- trenses quando caiu uma tromba d’água em Passa Quatro na época de Natal - 22/12/1956 e a cidade ficou ilhada por alguns dias! Foi o único Natal de minha infância e adolescência que não passei em casa. Estava em Santa Rita do Sapucaí passando uns dias de férias na casa da Vó Adol- fina e sofri muito com a falta de notícias de casa. Quando voltei para casa soube que papai foi muito corajoso no resgate dos corpos das pessoas atingidas! Tenho lembranças também do cafezinho bem quente, com uma pitadinha de cachaça, que ele nos servia na saída dos banhos, na época do frio. Lembro-me também de sua bicicleta preta que ficava no corredor de entrada. Ah! E ti- nha a bicicleta da Anna, que ela ganhou de Natal do papai, que era linda, prateada, importada, objeto de desejo meu, da Sônia e, certamente, de muitas amigas nossas! Lembro-me de nossas caminhadas até o Parque das Águas para encher o galão com água mineral na fonte Pa- dre Manoel da Nóbrega e que se transformavam em um passeio à tarde. Algumas vezes papai ia até à fonte de bici- cleta. No parque, bem na frente da fonte principal, tinha um campo de vôlei onde jogávamos de vez em quando. O time era o Blue Star. Também me recordo que as camisas sociais de papai eram todas brancas, de tricoline, impecáveis. Antes de a luz elétrica chegar a Passa Quatro, elas eram passadas com o ferro a carvão. Seus ternos eram bonitos, a maioria, escuros. As meias, sempre pretas. Era um homem elegante! Sempre manteve o mesmo peso (72 Kg.) e não tinha barriga. Andava muito a pé, fazia exercícios físicos, capinava muito e andava de bicicleta. Ele tinha uma turma de amigos que iam para as pescarias no Rio Grande, no Rio Verde... Dentre eles, me lembro do Lazinho. Tenho também lembranças da amizade dele com o Sr. Falabello, do Banco Hipote- cário. Parece que foi com ele que o papai comprou um lote na praia de Santos e que, muito tempo depois, Anna e sua bicicleta
  • 27. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 5352 eles “descobriram” que o lote era em alto mar! Do Clube, NOSSA! Nosso horário de voltar era 21 horas. Ficávamos revoltadas porque era muito cedo, mas senão voltássemos no horário marcado, ele ia lá buscar-nos, era uma tristeza! Se teimássemos, era castigo! Em alguns bailes, poucos, ele autorizava e mamãe nos acompanhava. Carnaval nem pensar... Tínhamos na estante vários dicionários, enciclopédias, coleções: lembro-me muito do Tesouro da Juventude e da Enciclopédia Prática Jackson. Comprava também tecidos no Rio de Janeiro, a maioria na Casa Gebara, para que a mamãe costurasse nos- sos vestidos. E ela caprichava! E eles ficavam lindos! Também era constante a peleja dele com os lampiões Aladim, com a queima e a troca das camisinhas. E Papai sempre recebeu, em nossa casa, os amigos de Passa Quatro e de Belo Horizonte com gosto e cordia- lidade. Lembro-me de minhas amigas e colegas de faculdade: Ana Maria, que era de Perdões e Virginia, de Belo Horizonte, além de nossas primas, Vera Lúcia de Mirassol e, principalmente, a Cidinha, filha da tia Jandira, que morava em Santa Rita do Sapucaí. Papai era um homem bem informado. Lia jornais (o “Sul de Minas”, de Itajubá, o “O Correio da Manhã”, do Rio de Janeiro, além do Diário Oficial da União). Gostava também de ouvir rádio e tinha um grande círculo de amizades. Eu sempre gostei muito de ler “O Correio da Manhã” e, durante algum tempo, eu e minha amiga Vicentina Scianni nos correspondíamos com Carlos Heitor Cony. Era a glória! Tenho lembranças do quarto da vó Donana, do carinho e da paciência que ele tinha com ela. Ele mesmo comprava seus vestidos, suas meias e sapatos pretos. Sempre iguais! Comprava também as roscas secas que ela gos- tava para tomar com café com leite bem quente, as linhas mercier crochet para “crochetar” suas colchas e toalhas de mesa. Algumas delas, ela nos presenteava para “o enxoval” e outras, era o papai mesmo que compra- va (RS). Ela fazia um relatório para o papai de nossas bagunças quando ele chegava da Coletoria, no final da tarde.Fotos Vó Donana Papai tinha um xodó com o fogão de lenha e cuidava muito dele. Acho que o capricho dele com o forno e com a lenha era principalmente por causa das leitoas pururucas e dos biscoitões de polvilho. E nosso banho quentinho dependia também do fogão, com suas serpentinas... Lembro-me também do primeiro fogão a querosene da marca DAKO e da geladeira que ele comprou. Foi a primeira que tivemos e que durou por muitos anos! Ah! O “quarto escuro”! Lá ele armazenava bebidas e comidas. Engradados de cerveja, vinhos, azeites, baca- lhau, e muitas latarias, além das compras de mercearia rotineiras da casa. Ele escolhia as azeitonas, a marca do arroz, o tipo do café, e tenho lembrança de que as latas de ervilhas “coração de manteiga” tinham de ser número zero, para colocar no arroz de forno. Nossa! Em relação à escola, apesar de sermos boas alunas, sempre tinha a tensão minha e da Sônia com a chegada dos boletins, com medo das broncas e dos castigos do papai. Como eu fazia Curso Normal na parte da manhã e Curso de Contabilidade à noite, um mês eu estudava mais as matérias para um curso e no mês seguinte para o outro, de tal maneira que, todos os meses, ocorria um desgaste com a chegada dos boletins. Já a Anna e o Antônio ficavam tensos porque quando tiravam 9,9 “choravam”... Sacanagem, né? A nitidez da lembrança boa que tenho dele, nos buscando – Sonia e eu – na saída da escola, quando chovia, levando, nos braços, as nossas capinhas, a minha, com forro azul e, a da Sônia, com forro vermelho. E ambas confeccionadas por mamãe. Sentia-me superprotegida! Papai também era inspetor do Ministério da Educação – do Instituto Nossa Senhora Aparecida1 e do Ginásio São Miguel - onde estudamos. Acho que ele gostava do que fazia, apesar de ser trabalhoso. Antônio, José e Luiz estudaram no Ginásio São Miguel. Os padres eram betharramitas, provenien- tes de diversas partes do mundo, a maioria da Eu- ropa. Quase todos eram amigos do papai. 1 A Escola Nossa Senhora Aparecida foi fundada em 1913 na cidade de Caxambu, com a denominação de Escola Normal Nossa Senhora Aparecida. Foi transferida para Passa Quatro em 1915. De 1913 a 1927 esteve sob a direção de um grupo de leigos. Em 1927 passou para a Direção da Sociedade Religiosa Moral e Científica. De 1932 a 1942 foi ministrado paralelamente ao Curso Normal, um Curso Doméstico. Em 1943, fundou-se o Ginásio Nossa Senhora Aparecida. Em 1953, fundou-se a Escola Técnica de Comércio. Em 1955, o estabelecimento passou a ter a denominação de Instituto Nossa Senhora Aparecida (INSA). Formatura Curso Ginasial - INSA – Passa Quatro
  • 28. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 5554 Instituto Nossa Senhora Aparecida Ginásio São Miguel - Passa Quatro Tenho lembranças também de quando éramos menores e nos sentávamos na sala de jantar para estudar. Papai colocava um lampião Aladim de cada lado da mesa e ele e mamãe ficavam sentados nas poltro- nas da sala nos vigiando... Apesar disso, o Antônio puxava as tranças da Anna e chutava as pernas minhas e da Sônia pelo buraco do meio da mesa, sem que nin- guém visse. Um artista! E, ainda que possa parecer paradoxal, papai era bom demais e, também, rígido e autoritário. Lembro-me que o Luizinho, quando o papai o chamava, ele respondia rapidamente: ”Sim! Senhor, meu Pai!”. Papai trazia, para nós todos, o café na cama às cinco horas da manhã, para que depois estudássemos até a hora de ir para a escola. Nessa época ainda não havia luz na cidade. Ele também fazia e levava, todos os dias, o café na cama para mamãe. Era também muito preocupado com nossa saúde: tomávamos Calcigenol no verão, Emulsão de Scott no inverno, além de um mingau para “dentes fortes”, que ele mesmo preparava. Íamos todos os semestres no dentis- ta: em Passa Quatro, no “Pedrinho dentista” e, em Itanhandu, no Dr. Gil Carneiro. Tomávamos também umas injeções na farmácia do Serafim. Não me recordo mais prá que. Papai tinha prazer em ver as filhas jogar vôlei. Depois de algum tempo passou a autorizar pequenas viagens para que fôssemos jogar em cidades próximas. Foi um período muito bom para mim! Também encaminhou os filhos para fazer aulas de datilografia com a D. Maria Cavalcante. Ganhei de pre- sente dele uma máquina portátil de datilografia Remington que levei para Belo Horizonte e me ajudou muito na Universidade. Era como se fosse um laptop hoje em dia. E, em nossa primeira viagem a Guarapari, ele e D. Auxiliadora entraram no mar juntos! Eita viagem boa!
  • 29. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 5756 Abaixo fotos de Guarapari e a carta que o papai enviou para o Antônio, em 21/11/1974, descrevendo os preparativos para a viagem. Carta de Papai para o Antônio Família Salgueiro em Guarapari - Dezembro de 1974
  • 30. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 5958 Ganhei dele uma coleção de lápis, na foto, que até hoje enfeitam minha casa, além de uma pequena coleção de moedas que dei de presente para o meu neto Pedro. Família Salgueiro em Guarapari - Dezembro de 1974 III - Quando viemos para Belo Horizonte estudar Só voltávamos para casa nos feriados e nas férias. Papai nos visitava em diferentes endereços em que morávamos em Belo Horizonte: na casa da Dona Clotilde e do Sr. Armando lá na Serra, no Hotel São Domingos no centro da cidade, na casa da Vera Cançado no Prado e na república na Av. Paraná, onde morava com Anna, Hebe, Ana Tereza e Lourdinha. Ele nunca vinha de “mãos abanando”, sempre trazia um mimo: ovos, docinhos de leite cortados, cajuzinhos, sequilhos e pé-de-moleque que a mamãe fazia e arrumava em caixas de sapato forradas com papel de seda. Anna e eu íamos de Belo Horizonte a Passa Quatro de ônibus (ENSA, eu acho!). Era uma viagem longa. Fazíamos baldeação em Três Corações e de lá íamos até São Lourenço e depois para Passa Quatro. Quando pa- pai podia, ele ia ou mandava nos buscar de carro em São Lourenço para irmos até Passa Quatro. Ele sempre era muito atencioso! Um gentleman! Conheço poucos pais que participaram tão intensa e afetivamente da vida e da educação dos filhos! Papai sempre olhou por nós, esteve ao nosso lado, nos fez feliz. Como já contei, ele era, ao mesmo, tem- po bravo, autoritário, meigo, afetuoso. Tenho um cartão que ele enviou para seus pais em abril de 1934, que traduz essas características!
  • 31. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 6160 IV - Aúltima fase Foi quando, já casados, voltávamos todos, principalmente no Natal, com a família toda, com os netos pe- quenos. Ele e mamãe preparavam as comidas, com capricho especial, principalmente, o leitão pururuca, o arroz de forno, as bacalhoadas, os pudins de queijo. Eles faziam as comidas prediletas de cada um. A minha predileta era o pudim de queijo. Ceia de Natal - Passa Quatro Abaixo algumas receitas originais. RECEITA DE PUDIM DE QUEIJO 12 colheres de queijo 16 colheres de açúcar 8 ovos 1 colher de sopa de margarina Untar a forma com margarina e polvilhar com açúcar Assar em banho Maria. RECEITA DE PÃO CHEIO – de linguiça e queijo 100 grs de fermento 1xícara de leite “quebrando a frieza” (sic) 3 ovos 1xícara de óleo 1 kg de farinha de trigo Sal a gosto. Sugestão: 1 colher de sopa de sal e 1 colher de sopa de açúcar. Amassar bem e fazer o pão e deixar crescer.
  • 32. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 6362 RECEITA DE PÃO DE LÓ AMERICANO 7 claras batidas em neve 7 gemas 14 colheres de açúcar Bater bem. Quando estiver em bolha, coloque: 14 colheres de farinha de trigo 1 colher de sopa de pó Royal 1xícara de leite Forre o tabuleiro com papel impermeável. Os netos e bisnetos do Senhor Salgueiro Papai e mamãe estiveram presentes no nascimento de meus filhos Alexandre e Flávia. O nascimento do Alexandre foi com muita adrenalina porque, além dele ser o primeiro neto, ele nasceu no Rio de Janeiro, numa quarta-feira de cinzas... Papai foi padrinho de batismo dele. Ele sempre foi muito atencioso com os meninos. Quando não podia comparecer aos aniversários, telefonava ou enviava telegramas. Abaixo, entre as fotos dos netos (Alexandre e Flávia) e dos bisnetos (Pedro, Bia e Rebeca), um telegrama que papai e mamãe enviaram para a Flavinha quando ela completou dois anos! Vó Nina, Célia, Alexandre e Pedro Alex, Flavinha e Papai
  • 33. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 6564 Telegrama Papai e Mamãe para Flávia - aniversário de 2 anos Alexandre e Flávia Alexandre e Pedro Alexandre
  • 34. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 6766 Bia, Rebeca e Michal Flavinha, Bia e Rebeca
  • 35. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 6968 Senti muito papai não estar vivo quando seus bisnetos nasceram. Fico imaginando a felicidade dele nos acompanhando no nascimento do Pedro, meu primeiro neto, em Franca – São Paulo, no nascimento da Bia e Rebeca em Dublin, quando ele e mamãe fariam sua primeira viagem internacional para a Irlanda, aflitos com o nascimento das gêmeas2 . Depois, imagino também suas visitas nos aniversários do Pedro em Franca, e em Gibraltar, em Steinhausen, na Suíça, comemorando e experimentando as comidas típicas, tomando vinhos saborosos, ressabiados com as bebidas fortes da República Tcheca, terra do Michal, e dando o maior colo e carinho prá todos nós! Haja colo! Foi marcante a atitude do papai e da mamãe nos natais em Passa Quatro quando eles sempre presenteavam os netos com um dinheiro, dentro de envelopes, que eram colocados no saco vermelho de Papai Noel que a vó Nina deixava dependurado no portal da sala de jantar. Era uma alegria! Como nós todos nos reuníamos com nossas famílias no Natal, até hoje não entendo o milagre do banheiro lá de casa. Nunca deu problema, apesar das filas e das batidas na porta, às vezes desesperadas, pedindo pressa! 2 O 14º bisneto(a) do vô Salgueiro está para chegar. Flávia e Michal vão me dar a alegria de outro(a) neto(a). Luiz, Célia, Sônia, Anna, José, Mamãe e Antônio José, Célia, Sônia, Vó Nina, Luiz, Anna e Antônio Meus irmãos
  • 36. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 7170 Célia, Anna, José, Sônia, Luiz e Antônio Célia, Luiz, Anna, Sônia, José e Antônio - Outubro de 2005 - BH José, Vó Nina, Sônia, Célia e Antônio Célia, Antônio, Sônia - 50 anos José – Volta Redonda.
  • 37. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 7372 Célia e Antônio Célia e José Célia e Luiz Anna e Célia – Santa Rita de Sapucaí - Barcelona Célia e Sônia - Passa Quatro Anna, Sônia, Célia e Mamãe
  • 38. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 7574 Sua doença No início da doença de papai, lembro-me bem que, uma de suas reclamações, era de uma dor forte na batata das pernas. No princípio ficou muito preocupado: tinha sofrido muito com o vô paralítico e ficou apreensivo com a possibilidade de ficar “entrevado”. Foi aventada até a possibilidade de sua dor ser psicológica. Foi pensada também a possibilidade de ser proveniente de algum problema na coluna. As consultas continuaram em Belo Horizonte. Foi examinado por vários especialistas, desde o clínico geral, o reumatologista, o neurologista, o proc- tologista. Acabou até fazendo a cirurgia de próstata no Hospital São Lucas, em Belo Horizonte, quando mamãe e todos os filhos vieram e ficaram com ele, em regime de plantão. E ele deu trabalho! Depois de muitas consultas e exames, finalmente, o Dr. José Araújo conseguiu fazer o diagnóstico de Doença de Parkinson. Começou o tra- tamento, que era medicamentoso. Ele tinha consciência de que sua doença era progressiva e da importância dos remédios. Apesar disso – talvez pela dificuldade de deglutição -, os comprimidos que ele deveria tomar começa- ram a ser escondidos nos bolsos do pijama, nos miolos de pão, no vaso sanitário e até debaixo dos colchões... Amorte, o enterro, as homenagens Papai morreu às 19,30 horas do dia 02/09/1986, em Passa Quatro. Cheguei cinco minutos depois. Até hoje não sei porquê mas, depois do enterro, resolvi escrever prá ele. Considero que foi nossa última conversa. Nunca mostrei prá ninguém. “Papai, foi muito triste chegar em nossa casa e encontrar você morto”. Foi uma sensação horrorosa. Pai, cheguei com a Anna, o José e o Antônio já estavam lá. Você sempre foi a pessoa mais importante que eu tive. Peguei o travesseiro que você estava deitado e fiquei com ele, para tentar conseguir guardar o seu calor pai, quando abraçar nele. Te beijei muito, fiz cafuné (aquele no nariz que você gosta tanto). Passei a mão na sua carequinha. De- pois você foi esfriando e eu fiquei abraçando você, tentando passar o meu calor prá você. Mas não adiantou pai, e você esfriou de vez. A Sonia e o Zé (o Antonio um pouco também) que trocaram sua roupa, arrumaram você para a última viagem a Itajubá. Eu separei aquele terno azul marinho. O bonito, que você fez para ir ao casamento do Luiz. Esqueci de pegar o colete. Os meninos acharam melhor não colocar gravata. Você ficou bonito, com a fisionomia tranquila. Aquele crucifixo da vó Donana nós colocamos em suas mãos. Que mãos mais bonitas que você tem, né pai? Estava todo mundo muito triste e todo mundo tomando as providências para você ficar bem e para fazer as coisas que você queria. Mamãe ficou muito desorientada. Também pudera, né pai, perdeu o maridão que ela tinha. E nós? O melhor pai do mundo. Puxa pai, tudo o que o senhor podia e não podia fez pela gente, né? No velório, sabe quem passou a noite inteira lá? O Pita. Lembra que quando o pai dele morreu o senhor deu a maior força? A Lecy, o Chico, o italiano (ele fechou o restaurante logo que soube que você tinha morrido), a tia Doris,
  • 39. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 7776 o Chico, a Silvana, a Lurdes, o Zé Leite, a Sonia, o Antonio, a Anna, o Zé, a Elisa e o sogro do Pedrinho. Estava um frio danado! Daqueles piores. Precisa ver pai, quando o Zé Gonçalves chegou. Ele chorava igual um me- nino. Como todo mundo gostava de você. Fica até difícil contar todo mundo que veio despedir de você, mas vou tentar contar. Acho que todo mundo veio, os amigos das pescarias, os amigos fazendeiros, os amigos das fofocas, os amigos mais pobres que você ajudava, as meninas do Sr. Alcides, a D. Zezé costureira, o açougueiro que foi nosso vizinho (esqueci o nome dele), o Zé Luiz da Luiza. O Zé André deu a maior mão pai. O Zé Maria chegou de madrugada. O Arthur chegou depois das 10 horas. Também estava lá o Nicolau, o Serafim, a mulher dele (tá tão ruinzinha pai), o Milton Costa, o Napoleão, o filho do Zé de Almeida, os Tibúrcio. A Vanderlea também veio pai. O Carlos, o seu enfermeiro, veio várias vezes. O Napo, a Nely (ela chorava tanto!), a Águeda Cancela, a Marina Pelegrini, a Ana vizinha, o Chiquinho, o Alcides Carneiro. Pai, no dia seguinte, quando você foi conosco para a Igreja (meio dia!) as pessoas foram se encontrando e todo mundo queria te carregar. Impressionante! Precisa ver os meninos (os Salgueiros) chorando, sofrendo, mas te levando com orgulho pela rua principal. As lojas, os bancos, todos abaixaram suas portas. Quando o Luiz chegou pai, você já estava morto. Ele ficou muito abatido. Logo o nosso caçulinha. A Michelinha, o Gu e a Nicole estavam lá firmes e tristes. Os outros meninos/netos não deu tempo prá ir buscar. Mas todos estavam rezando pro senhor. O Alexandre era seu afilhado, mas não teve jeito. Os irmãos da mãe vieram todos. O tio Chico foi lá em Itajubá pai. Estava arrasado! Queria contar da tristeza do Carlos Diamantino, da Maria Alice (ela ficou o tempo todo com você), a mulher do Carlos, a Águeda. Na Igreja, depois da missa, a Águeda falou umas palavras prá você tão bonitas, que nós todos ficamos mais emocionados ainda! Você era muito querido, muito admirado, muito amado. Ela falou das coisas boas que você fez. O Zé Castilho também falou umas palavras, simples, espontânea e te deu a maior prestigiada. Contou que você chegou a Passa Quatro, há 39 anos e construiu muita coisa: da família bonita, íntegra e honesta que você fez, das aju- das que você dava aos pobres, do tanto que você gostava da vó Donana. Foi uma despedida bonita, mas muito triste. A comadre falou na Igreja prá você também pai. Eu não queria que te enterrassem de jeito nenhum. Mas não teve jeito pai. As meninas da tia Joaquina estavam lá, desesperadas! Você foi um pai prá elas, né? As irmãs da mãe também, os outros sobrinhos seus, o Dr. Gaspar, o Meloni. Todo amigo seu que ficou sabendo estava lá. Na hora que te colocaram no túmulo junto com a vó Donana, com o Vô e o tio Zé Grande me deu uma sensação muito ruim. Credo! Ah! Sabe a Aparecida Mota? Fez um discurso prá você em Itajubá. Foi muito bonito. Ela fala mais bonito do que os outros, mas achei os outros mais espontâneos, não sei... Já estou com muita saudade pai. Como é aí? Está com muito frio? Do que você está precisando? Eu queria ajudar tanto! Icha! Hoje é meu aniversário. Que aniversário o meu. Foi uma ...! Não vou completar porque sei que você não gosta de palavrão. Será que nunca mais vou conversar com você pai? Vai ser duro! Vamos ajudar a olhar a mãe, o tio Chico. A tia Dona não foi ao enterro porque não estava passando bem. A Elza estava lá. Amanhã te conto outras coisas. Vou fazer de tudo que puder para você sentir orgulho de mim pai. Prometo! Vou ser gente igual você sempre quis. Bença pai! Lembra? Bença mãe, bença pai, a vó bateu em mim... Um beijo. Amanhã a gente conversa mais.” Itajubá, 04 de setembro de 1986. Obrigada por tudo Pai!
  • 40. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 7978 José Manoel Salgueiro Depoimento Sônia
  • 41. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 8180 José Manoel Salgueiro- Belo Horizonte - 1938 O Pai era conhecido por todos como Salgueiro e passou assim o nome para seus filhos e netos. Quando alguém ia a nossa casa ou telefonava à procura de algum de nós a pergunta era sempre  a mesma: com qual Sal- gueiro que vocês querem falar? Seu nome era tão forte quanto sua pessoa. Até hoje eu sou conhecida como Sônia Salgueiro. Sua atividade principal era a de Coletor Federal, mas gostava muito de trabalhar com a terra. Assim, tinha o costume de deitar-se muito cedo e levantar-se antes do sol nascer. Falar do Pai é muito fácil, pois vem logo a lembrança de seu amor e do seu carinho, de sua responsabilidade, habilidade e disciplina. Não esquecendo, claro, que era um homem muito alegre e brincalhão! No entanto, em algumas situações, fui responsável pela sua calvície, porque não dizer sua careca! Era muito arteira, tirava notas vermelhas, reprovação na escola, expulsão de cinema, reclamação de professores, artes e travessuras que só eu era capaz! Ele, que gostava tanto de ver seus filhos em primeiro lugar, receben- do medalhas, elogios, e eu, tão diferente! Mas, em contra partida, lhe dei coisas maravilhosas, como três lindos netos - Nicole, Gustavo e Michele -, que muito amaram o avô. Ah! Eu também lhe dei muito amor, carinho, amizade e compreensão. O Pai sempre gostou muito de criança. Quan- do pequena, tenho lembrança dele brincando com a gente. Com os filhos, o que ele tinha de enérgico, tinha também de carinhoso. Já com os netos, ele só teve o lado carinhoso, brincava muito com  Nicole e Gustavo, com Michele foi bem menos, pois ele já estava doente. Recordo sempre do pai brincando conosco e, também, com os netos: Serra, serra, serrador, serra o papo do vovô! Sempre que o Pai saía com minhas crianças, ele sempre lhes dava as mãos, muito preocupa- do que era com a segurança delas. Ele sempre me perguntava se eu não havia me esquecido do Calcigenol e da Emulsão de Scott.  Chegou a preparar uma mistura de farinha milagrosa, para eu fazer mingau para as crianças! O Pai e a mãe eram padrinhos de batismo do Gustavo. Deram-lhe, como presente de batismo, uma cader-
  • 42. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 8382 neta de poupança na Caixa Estadual que só foi encerrada com o fechamento da Caixa. Como o Pai era agitado e ansioso para tudo, não podia ser diferente com a espera do nascimento de seus netos. Quando um dos filhos anunciava a chegada de mais um netinho, ele e mamãe iam felizes ao encontro do mais novo membro da família que acabara de nascer. Também gostaria de mencionar que ele foi premiado com um neto que nasceu, como ele, no dia 03 de agos- to: nosso querido Diego! E, quando o Pai já estava  acamado, a visita - de Luana e Diego - o deixou muito feliz! Agora que já sou avó, consigo entender a magia de ter um neto. Sempre que o Pai mencionava o nome dos filhos, ele se referia a nós como “os meninos e as meninas”, somos a herança do Pai e da Mãe. Família Salgueiro Família SalgueiroJosé, Vó Nina, Luiz, Vô Salgueiro e Sônia Luiz, Sônia, Célia, José, Anna e Antônio
  • 43. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 8584 Ele também recebeu com alegria seus 15 netos: Tatiana, Gabriela e Frederico, da Anna; Fabiana, Fernanda e Ronan, do Antônio; Alexandre e Flávia, da Célia; Nicole, Gustavo e Michele, meus filhos; Luana, Diego e Na- thália, do José e Thamyris, do Luiz. E, desses netos,  vieram 13 bisnetos: Débora e Lucas, da Nicole; Pedro, do Alexandre; Vinícius, da Fernanda; Gabriela, da Fabiana; Camila, do Ronan; Bia e Rebeca, da Flávia; Isabella e Leonardo, do Gustavo; Maria Fer- nanda, da Michele; Lucca, da Luana e Lucas, do Frederico. Todos eles representam o maior regalo deixado por nossos queridos pais. Nicole, Gustavo e os avós Vó Nina, Nicole e Vó Salgueiro Netos e netas
  • 44. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 8786 Tatiana, Jordani, Nicole, Vô Salgueiro, Gabriela, Gustavo e Frederico Frederico, Gustavo, Flávia, Gabriela, Alexandre, Thamyris, Fernanda, Fabiana, Ronan e Michele Nicole, Michele e Gabriela
  • 45. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 8988 Vô Salgueiro, netos e netas Luana, Michele e FredMichele e Luana
  • 46. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 9190 Vó Nina, Luana, Vô Salgueiro e Vó AdolfinaVô Salgueiro e netos Michele, Gustavo, Gabriela, Luiz, Frederico, André, Anna, Priscila, Elisa, José, Sônia, Vó Nina, Célia, Arthur, José André, Alexandre, Tatiana e Nicole.
  • 47. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 9392 Nicole, Gustavo e Michele Débora, Nicole, Sérgio e Lucas Isabella, Gustavo, Leonardo e Luciana Rodrigo, Michele e Maria Fernanda
  • 48. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 9594 Vou contar agora um pouco sobre a época em que morávamos na avenida. O Pai tinha uma plantação de mudas de café. Como era linda a sua plantação! Até hoje tenho o banquinho que ele se sentava para plantar as mudas. E a peleja para recolher a terra preta, o es- terco e a lenha. A terra preta e o esterco eram para a sua tão querida horta. Como era boni- ta! Os canteiros eram retos e altos, feitos com uma linha esticada, para ter certeza de que ficariam retos. Isso eu aprendi! Fiz também muitos canteiros como ele. E aqueles buracos no quintal, que ele enchia com restos de comida e da horta? Deixava curtir e virava um ótimo esterco para suas plantas. Como as couves, as chicórias, as alfaces, os espinafres e os tomates eram gostosos! E o creme de espinafre no pão? E os morangos e tomates que nós ajudávamos a colocar em saquinhos de papel, um a um, para tristeza do sabiá. Falando em sabiá, recordo das fitas vermelhas amarradas em suas perni- nhas, para que nenhum outro sabiá se aproximasse. Isso incluía a construção do alçapão de taquara. Eram tão bonitos e perfeitos! Aliás, perfeição era uma de suas qualidades. E aquela cerca de bambu, quanto capricho, quanta perfeição, eram mais seguras que os muros! E o galinheiro, que era dentro do forno que havia no quintal. Com isso tinhamos ovos e galinhas. E o ovo quente com sal... Irmãos, vocês se lembram do passarinho do Pai que ficava na cozinha, com a janela e porta abertas? Ele contava isso com muito orgulho. Não me lembro do nome do passarinho, mas quando ele morreu foi uma tristeza geral. Foi enterrado em baixo do pé de limão rosa, lá no fundo do quintal. Tivemos poucos animais, só o passarinho do Pai e o cachorro Bob do Antônio. Quanta peleja do Pai Sônia na Avenida na tentativa de impedir a fuga do Bob! Ele vivia mordendo a canela do senhor Tito, até que o mataram. Por outro lado, lembro-me, também, como o Pai ficou feliz quando conseguiu comprar um terreno, ali no bairro Copacabana, para plantação. Lógico isso exigiu muita mão de obra, entre outras, a construção de manilhas. Quanto trabalho! Depois de tudo feito e a plantação formada, veio uma tromba d água e levou tudo. No dia seguinte, ele ven- deu esse tão sonhado terreno! Não posso também me esquecer das flores que eram plantadas com tanto carinho - a boca de leão de variadas cores, os lírios para o dia de finados, as rosas e as espadinhas tão coloridas! E a poda das parreiras, que tinham que ser feitas na primeira lua nova de julho! As podas envolviam as roseiras e parreiras da vizinhança! E quando ainda morávamos na avenida, no meu ani- versário, o Pai costumava fazer uma linda fogueira na noite de São João. Como a gente gostava de montar a fogueira na rua: lenhas, bambus, gravetos! Quanta agitação! A fo- gueira ficava linda! Eu gostava muito de pular fogueira! Não me recordo de minha idade nessa façanha, mas, nesse aniversário, o meu presente foi um saco de foguetes. Lembro muito bem, que as bombinhas estavam colocadas em um saco azul de açúcar pérola e, eu, correndo de um lado para o outro. Resolvi pular a fogueira e, quando pulei, o saco de fogos caiu em cima dela. Minha desilusão foi enorme, fiquei muito triste junto com meu Pai. Mas, à medida que fomos crescendo, vieram os horários a cumprir e ainda mais disciplina. Aliás, eu sempre tinha apenas o primeiro dia de férias, os demais dias eram dias de castigo. E o silêncio obrigatório no horário do cochilo do pai, depois do almoço e na Hora do Brasil? E, já ia me esquecendo dos jogos de futebol, transmitidos pelo rádio! Aí, sim, ficávamos quietos, mudos e calados! E, apesar do silêncio que nos era exigido, havia ainda o assoalho de nossa casa que não contribuía conosco. Como ele rangia! Eram aquelas tábuas largas e cheias de cupim que, com o tempo, foram sendo substituídas por tábuas finas e, ainda assim, o rangido não acabou. Até hoje Luciana e Gustavo tentam driblar as tábuas. Que bom que ainda posso ouvir esse rangido!
  • 49. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 9796 Mudamos para a casa de cima e lá também festajamos muitos natais, aniversários, formaturas, noivados e casamentos... As flores sempre foram um grande amor do Pai: as trepadeiras de rosinhas, as várias roseiras que ele plantava e as rosas que co- lhia com tanto amor! Além delas, os pés de abacate e o pé da pimenta do reino! Ah! Essa foi uma grande desilu- são para o Pai! Cuidou tanto do pé de pimenta, para de- pois descobrir que não era a tão famosa pimenta do reino. Lógico, em seguida, a mesma foi cortada! Não podemos esquecer o orgulho do Pai de ser inspe- tor do colégio e do ginásio. Que absurdo quando penso que ele assinava todas as folhas das provas parciais e finais de cada aluno! Outro fato que deixou o pai muito feliz foi quando ele comprou o carrinho para carregar os falecidos. Como ele não podia carregá-los sozinho, com o carrinho ele resolveu o problema. O carrinho é usado até hoje. E os caixões de defuntos que ele doava para as famílias mais carentes? E, recordo-me das matulas que mamãe preparava para as viagens! E, nas eleições em que ele era o presidente da sessão, ela também preparava diversas guloseimas para ele compartilhar com seus colegas de trabalho. Terno, camisa branca e gravata, assim era o seu traje de trabalho, até que veio a tão sonhada aposentadoria. E com ela, a pescaria! Como eram gostosos os mandis que ele pescava! Como a mãe fazia aquele afogadinho de mandi delicioso! A Nicole até hoje sente saudade! Foi uma época muito feliz da vida dele. Algum tempo depois, veio o imposto de renda que lhe dava muito trabalho, mas lhe dava também prazer! Essa é a outra façanha dele que aprendi! A seguir, a foto dele, sentado na cama de solteiro, rodeado de for- mulários de Imposto de renda. Com as idas e vindas, o tempo foi passando e vieram as doenças. Como fiquei brava quando descobri que os medicamentos, prescritos para ele, eram colocados no miolo do pão e, em seguida, jogados no vaso. Isso levou tempo para ser descoberto! Mas ele, muito esperto, só mudava o lugar do descarte: a beira da cama ou o bolso do roupão. Ainda não mencionei o que mais fazia o Pai sofrer! Eram as diferen- ças entre nossa Mãe e a Vó Donana! Como lidar com essa situação era difícil! Êta ciúme bravo! Não podemos nos esquecer do carinho de nosso Pai pelos seus ir- mãos: Tio Zé Grande, Tio Chico, Tia Joaquina e Tia Dona e também pelos seus sobrinhos que o amaram tanto. Quando ele adoeceu todos vieram dar-lhe um abraço, um carinho. E a doença de papai foi se agravando, até que ele não resistiu mais... Papai e seu “arquivo” de Imposto de Renda Sonia e Vó Donana
  • 50. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 9998 Foi um momento muito sofrido para mamãe, para mim, para meus irmãos, para toda a família, os parentes e os amigos... No seu enterro havia muita gente e muitos discursos. Para to- dos, foi fácil falar dele, pois não lhe faltavam qualidades, tais como, a bondade, a honestidade e a hombridade. Sua vida foi exemplar! Todos sentiram, naquele momento, como era grande a nossa per- da. Aquele Homem maravilhoso estava partindo, deixando esse mundo que tanto amou e lutou para que seguíssemos sua jornada. E, é assim que faço até hoje. Tenho sempre, em meus pensamen- tos, a sua luta, que foi grande e dura, mas repleta de vitórias! Uma das preocupações de nosso pai era, no início de cada ano, comprar a folhinha do Sagrado Coração de Jesus. Isso ele fez desde o nascimento de seus filhos. Tenho, em meu caderno, a folhinha do dia do meu nascimento, a recordação que ele me deixou. Com o seu falecimento, a mãe continuou com esse costume. O Pai destacava e guardava as folhi- nhas de datas especiais e dizia que as men- sagens que elas traziam revelavam uma realidade. Então, no dia de seu falecimen- to, fui até a copa, no lugar que ficava a fo- lhinha. Destaquei-a e a li. Foi então que entendi o porquê daquela fidelidade do Pai para com a folhinha. O pensamento daquele dia era: Não é triste amar e per- der. O triste é nunca ter amado. Hoje, me sinto feliz, pois sei que ele realizou seus sonhos e metas: proporcionou estudo a todos os filhos, acompanhou-os por uma grande parte de nossas vidas, vendo-os todos casados e com netos. Sua emoção foi tamanha que, no dia do casamento do Luiz, ele foi hospitalizado. E, assim, ele não pode par- ticipar da tão esperada cerimônia de casamento de seu filho caçula, que representaria a conquista de seu último objetivo. Também, as suas afilhadas - Maristela, Carminha e Picida -, até hoje, quando falamos dele, só mencionam recordações boas que elas têm. O Pai marcou muito suas vidas! Quão grande era a felicidade do Pai quando comprou o seu primeiro carro! Branco, fusca... Ele encontrou um pouco de dificuldade para dirigir, mas conseguiu tirar a sua carteira de motorista. Ia treinar no campo de futebol do ginásio. E foi triste o dia em que ele conseguiu tirar um fusca zero, cor caramelo. Estava todo vaidoso mostrando o fusca para mim e a Mãe quando, de repente, um bêbado caiu e bateu a cabeça bem no meio da porta. Amassou-a bastante! Papai perdeu a voz e a ação! Até hoje consigo ver o desaponto em seus olhos! Recordo-me, também, da primeira viagem que fez ao Rio, foi em 1972 para visitar a Anna. Foi a 60 km/h quando, de repente, resolveu correr e cor- tar. Adivinhem em que lugar? Em um posto poli- cial! Como consequência, recebeu a primeira multa. Depois do susto, ainda estacionado, pediu ao José André que continuasse a viagem. Quando ainda moça, ganhei também de meu Pai uma libra esterlina que esteve comigo até pouco tempo. Agora passei a mesma para meu filho Gusta- vo. Tenho outra lembrança do Pai. Quando moci- nha, eu fiquei sem falar com ele, devido aos castigos que ele me dava! No entanto, numa viagem que fez a Itajubá, ele me trouxe de presente um lindo relógio, comprado na Loja Vera Cruz. Segundo ele, era para que eu o perdoasse daqueles castigos que tinham me deixado tão magoada! Assim, ele se explicou e me deu um forte abraço e o relógio. Mesmo naquela época, o relógio não teve tanta importância para mim como teve o seu Nicole e Vô Salgueiro - Passa Quatro
  • 51. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 101100 abraço! Quanto carinho e verdade envolvia aquele abraço! Meus castigos me deram, de presente, o abraço de meu pai. O Pai teve três passagens constrangedoras e divertidas que eu vivenciei. A primeira foi o golpe do coletor. Um senhor se apresentou como Coletor Federal dizendo que tinha sido assaltado. O Pai o acolheu e ele ficou uns dois dias em nossa casa. E o Pai ainda deu dinheiro para que o senhor seguisse a viagem. Isso foi no casamento da Célia. Passado alguns dias, o Pai recebeu um telegrama, da receita federal, comunicando da presença de um senhor, que se passava por coletor... Já era tarde demais, o Pai já havia caído no golpe. A segunda passagem foi o telegrama de pêsames que ele passou para a D. Nair, esposa do Dr. Gaspar. A Chiquita havia passado lá em casa contando que o Dr. Gaspar tinha falecido. O Pai foi rápidinho ao correio e enviou um telegrama. Dias depois ele recebeu um telegrama do próprio Dr. Gaspar dizendo que estava vivo! E, finalmente, a terceira passagem se refere à visita que o Pai fez para a dona Laura Carneiro pensando que ela tivesse falecido e, para sua surpresa, foi a própria dona Laura que o atendeu. E, também, não podemos nos esquecer da homenagem ao nosso Pai, no livro “Laços e Laços”, página 273, de Maria Lúcia Amorim de Luca, que transcrevo em seguida: Seu Salgueiro Aos filhos O amigo do leão Com ele fez amizade E não era fácil não Era o único na cidade Tinha um grande coração Não perdia um enterro Ia... Nem que fosse um pouquinho Já com seu passo miudinho. Fazia “declaração”. Era amigo do peito e dizia: “pra tudo tem jeito”. Ficava meio bravo “por que veio com atraso”? “Não sabia do prazo?” “Que fazer?” “Só se for magia!” “Com que dinheiro comprou???” “Como pagou?” “Veja o leão te pegou!” Agora está no céu Segurando o leão na mão Pra gente sonegar aqui no chão! Obrigada, Seu Salgueiro. Outra data importante para ele, foi quando recebeu o título de cidadão honorário passaquatrense. No primei- ro momento, ele ficou muito feliz e, em seguida, ele percebeu a responsabilidade daquele título e, também, que caberia a ele fazer um discurso de agradecimento. Tenho a carta convite da Câmara Municipal de Passa Quatro, e a cola do  discurso que foi feito por ele em agradecimento. Tudo isso o desafiou e lhe causou uma certa ansiedade! Através desses documentos, podemos sentir a expectativa deste tão honrado título. Essa conquista ocorreu no dia 19 março, de 1975, quando papai já morava em Passa Quatro,  há 27 anos. Como isso foi difícil! Quantas expectativas ele criou! Mas na hora tudo saiu perfeito! Como ele falou gostoso, conseguiu tocar os corações!
  • 52. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 103102 Foi um título merecido, pois ele se sentia, de fato, um cidadão passaquatrense, uma vez que foi em Passa Quatro que passou a maior parte de sua vida! A cada problema que surgia na cidade, lá estava ele pronto para lutar com a mesma fidelidade que lutaria por seus interesses. De fato, esse título representou a continuação de suas vitórias e conquistas! Comunicado do Título de CIDADÃO DE PASSA QUATRO Diploma de Cidadania – 19/03/1975
  • 53. 100 Anos Salgueiro 100 Anos Salgueiro lembranças de família 105104 Papai com o título de cidadão honorário Papai, Mamãe, filhos, genros e netos Carta de Papai para o Antônio agradecendo os cumprimentos pelo título de cidadão passaquatrense