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  1. 127 7. SAÚDE E EDUCAÇÃO: CONCEPÇÕES SOBRE AS POSSIBILIDADES DE INTEGRAÇÃO 7.1. Principais resultados obtidos Como foi colocado no segundo capítulo, determinadas questões foram formuladas com o objetivo de orientar a coleta e a análise de dados deste estudo. Em relação à primeira questão – “quais as concepções existentes entre os profissionais de saúde a respeito das dificuldades de aprendizagem e do fenômeno do fracasso escolar, em relação ao modelo de atendimento prestado aos distúrbios de aprendizagem” – pode-se concluir que a maioria dos profissionais de saúde estudados expressaram concepções de “fracasso escolar” onde, apesar de considerarem a existência de dificuldades de aprendizagem localizadas nos alunos, parecem estar mais inclinados em apontar certas características da escola, como por exemplo, a inadequação da metodologia de ensino, a insuficiência da formação docente, as dificuldades do sistema educacional em se relacionar com a criança de hoje, exposta a vários estímulos e desafios, como os principais determinantes do insucesso acadêmico. Mesmo acreditando que o seu trabalho junto aos escolares apresenta boas possibilidades de êxito, os profissionais de saúde advertem quanto à existência de determinados limites em sua atuação, limites estes que auxiliam a desmitificação da imagem, geralmente existente entre a população, de que são dotados de poderes “mágicos”. Em relação às concepções sobre a integração saúde - educação, os profissionais colocaram que o contato com a área de educação e, conseqüentemente, com os professores é dificultado pela sua obrigação em alcançar um determinado índice de produtividade. As opiniões e idéias coletadas sobre a integração saúde-educação parecer revelar que a maioria dos profissionais está de acordo sobre a idéia de que professores e profissionais de saúde atuem conjuntamente na busca de
  2. 128 soluções para o fracasso escolar, expressando opiniões sobre a integração como importante para a diminuição da tendência de super-especialização do trabalho da saúde, fundamental para que as ações de saúde se tornem mais resolutivas e advertindo quanto à inserção do médico no contexto de tratamento dos chamados “distúrbios de aprendizagem”, o que parece confirmar a idéia da pouca necessidade da realização de exames neurológicos em relação a esse tipo de queixa. As respostas obtidas à segunda questão formulada – “quais as concepções dos professores a respeito das dificuldades de aprendizagem e do fenômeno do fracasso escolar e expectativas em relação ao modelo de atendimento prestado aos distúrbios de aprendizagem e às formas viáveis de integrar saúde e educação” – indicam que as professoras que participaram do estudo possuem várias definições para o conceito de “fracasso escolar”, como o não alcance, por parte do aluno, aos parâmetros considerados necessários para a promoção, o mau rendimento ou falta de produtividade do aluno nas tarefas escolares, reprovações sucessivas, não ocorrência do processo de ensino- aprendizagem ou falhas no desenvolvimento cognitivo e moral do escolar. Especificamente em relação às causas do fenômeno do fracasso escolar, observou-se que, de modo geral, as docentes o atribuem à causas centradas na criança (problemas de problemas de saúde, subnutrição, gestação e hereditariedade, problemas psicológicos ou emocionais, falta de atenção, concentração e motivação para aprender, faltas excessivas) e na família (falta de estímulo e incentivo). Poucas professoras mencionaram aspectos relacionados à escola e as que fizeram citaram a inadequação da metodologia do ensino e falta de mínimas condições para ensinar satisfatoriamente o aluno. As expectativas das professoras em relação ao modelo de atendimento prestado aos escolares pela instituição de saúde relaciona-se à crença de esse serviço atenda às necessidades dos alunos encaminhados e que seus problemas escolares sejam solucionados. Parece existir entre as docentes um processo de
  3. 129 idealização das possibilidades e capacidades da instituição de saúde em relação à resolução dos problemas escolares observados pelas professoras em seus alunos. Outra conclusão importante refere-se ao nível de desconhecimento, entre as professoras, acerca da natureza e amplitude da atuação dos profissionais de saúde pública, já que muitas não conseguiram expressar com clareza o que sabem sobre o que cada profissional faz e que estes podem atuar em várias localidades além da escola, frustando o seu desejo de que os profissionais de saúde estejam junto a elas dentro de sala de aula, atuando de maneira emergencial e remediativa. Quanto às concepções dos pais a respeito das dificuldades de aprendizagem e do fenômeno do fracasso escolar e suas expectativas em relação ao atendimento especializado prestado, os dados obtidos indicam que, de modo geral, as mães que participaram da pesquisa atribuem a origem das dificuldades de aprendizagem basicamente a duas classes de fatores: aqueles relacionados à criança (baixa auto-estima, dificuldades em lidar com perdas afetivas, insegurança, falta de iniciativa, falta de limites, agitação, deficiência mental da criança, doença mental, falta de esforço) ou àqueles relacionados à família (determinadas dificuldades no relacionamento familiar, como crises e separações conjugais). Apenas uma mãe manifestou uma postura mais crítica em relação à escola, reclamando de se sentir pressionada pela escola para que “resolvesse” o problema de seu filho e acusando a professora de não dar a devida atenção à criança em sala de aula. Quanto aos alunos, alguns atribuíram algum fator determinante à sua dificuldade escolar e pode-se concluir que todos se referem a algum aspecto individual ou pessoal, como não saber ler, não saber “nada”, serem preguiçosos ou não conseguirem “guardar” as coisas em sua memória. Quanto às expectativas das mães em relação ao modelo de atendimento do psicólogo, parecem acreditar que o mesmo consiga, por meio de “conversas”, descobrir as razões pelas quais seus filhos apresentam problemas
  4. 130 escolares e que haja o desaparecimento ou a diminuição das dificuldades de aprendizagem observadas. Os alunos esperam que, indo ao psicólogo, consigam resolver os problemas de aprendizagem que apresentam em sala de aula e acreditam que o Ambulatório Regional de Especialidades seja uma lugar semelhante a um hospital, onde pessoas doentes são recuperadas, reabilitadas ou curadas de alguma patologia de ordem física. É necessário destacar aqui a autoridade que as professoras parecem exercer no imaginário das mães dos alunos, seja por ocuparem um cargo importante ou por serem detentoras de um conhecimento socialmente valorizado. A questão que se levanta aqui não diz respeito à pertinência da autoridade do professor em relação aos pais dos escolares, mas como esse autoridade tem sido usada no caso de alunos com problemas de aprendizagem. A obediência à autoridade da professora parece levar as mães dessas crianças a acatarem sugestões e orientações dadas sem maiores discussões ou resistências. Quanto à questão onde se tenta verificar, entre os professores e profissionais de saúde, se é possível e desejável a integração entre as áreas de saúde e educação, sob quais condições seria possível e desejável tal integração e como viabilizá-la, têm-se que, com relação aos temas “alunos com dificuldades de aprendizagem” ou “fracasso escolar” há, por parte dos professores, a tendência de não perceberem ou negarem a sua parcela de participação ou de responsabilidade na configuração destes processos. Parecem, assim, atribuir apenas aos profissionais de saúde a competência de atuarem na resolução destes fenômenos. Há indícios de que os docentes entrevistados acreditam que são responsáveis e possuem competência apenas para ensinar um tipo determinado de aluno que não costuma apresentar dificuldades de aprendizagem ou de comportamento. No entanto, a isenção de responsabilidade ou participação do corpo docente na construção de processos como o fracasso escolar parece coerente com a concepção sobre “distúrbios de aprendizagem” e causas do “fracasso escolar”.
  5. 131 A maioria das pesquisas de alguma forma voltadas para a investigação da atribuição de causalidade dos docentes sobre o fracasso escolar (por exemplo MALUF &; BARDELLI, 1991; CARVALHO, 1992; PATTO, 1993; SCOZ, 1994), aponta que estes consideram o aluno como o maior responsável pelo insucesso na escola e pouco ou quase nunca atribuem à escola ou a sua atuação qualquer pêso na determinação deste fenômeno. Portanto, se os “distúrbios de aprendizagem” e o “fracasso escolar” são de responsabilidade do aluno e, mais ainda, causado por desordens orgânicas ou emocionais, torna-se natural e, até mesmo, correta a concepção de que os “problemas” do indivíduo devam ser solucionados por outros profissionais de saúde, confirmando a tese da medicalização do fracasso escolar proposta, dentre outros, por COLLARES & MOYSÉS (1989). Os profissionais de saúde, por sua vez, parecem mostrar-se com boa disposição no que diz respeito à integração entre as áreas de saúde e educação, porém ressaltam a dificuldade em gerenciar as exigências instituídas pelo ARE, em termos de produtividade, e a possibilidade de realização de atividades em que seja necessário a sua ausência da instituição. Alguns profissionais, como a terapeuta ocupacional, possuem uma postura mais crítica a respeito das possibilidades de integração entre saúde e educação no sentido de que o ARE, enquanto instituição de saúde, não apresenta uma política que indique a preocupação em implantar ações ou mesmo programas que visem a promoção de saúde, que sejam preventivas, voltando-se apenas às ações remediativas ou reabilitadoras de patologias já instaladas. Quanto às possibilidades e modalidades de integração saúde - educação, os profissionais de saúde fizeram sugestões sobre as ações que, sob o seu ponto de vista, possibilitariam maior contato e interação entre as duas áreas, como por exemplo: o envio de equipes multiprofissionais para as escolas com o objetivo de conhecer as necessidades e realidade em que vive a clientela de escolares ou a criação de “núcleos” de atendimento multiprofissional para a triagem e avaliação dos alunos, que poderiam reduzir o número de casos
  6. 132 encaminhados aos serviços de saúde e racionalizar a demanda de alunos para o atendimento médico. Advertiu-se, ainda, quanto à necessidade dos profissionais de ambas as áreas refletirem sobre a disponibilidade em exporem o seu trabalho para que ações que visem a integração possam dar bons resultados. As sugestões para a elaboração de ações que possibilitem a integração entre as duas áreas, propostas pelos profissionais de saúde, parecem ser ainda limitadas à modalidades baseadas em um modelo onde as ações e atividades são, de alguma forma, voltadas aos escolares e suas “problemáticas” e necessidades ou, então, são feitas propostas onde se idealizam “encontros” entre os profissionais de saúde e os professores, sem maiores explicitações quanto ao caráter dos mesmos. Julga-se necessário o aprofundamento das concepções sobre a “integração saúde - educação”, de modo a se propor um modelo de atuação conjunta que possibilite a realização de ações eficazes. No entanto, pode-se afirmar que, se depender da opinião expressa pelos profissionais de saúde e educação, existe a vontade necessária para construir-se um projeto de atuação integrada entre as duas áreas, pelo menos no tocante à superação do fenômeno do fracasso escolar. Entretanto, em relação às possibilidades de concretização da proposta de integração entre os profissionais de saúde e educação, levantam-se dois pontos a serem aprofundados: - o conceito de fracasso escolar presente no meio educacional, o qual centraliza a determinação do insucesso acadêmico exclusivamente em aspectos relacionados ao aluno, isentando e nem chegando a considerar alguns fatores intra - escolares, como responsáveis na construção deste fenômeno; - a dificuldade dos profissionais de saúde em abandonar uma prática (modelo clínico) que, apesar da maioria considerar não resolutiva e obsoleta, ainda parece ser o ponto de referência para a atuação junto à clientela escolar,
  7. 133 mesmo que exista uma política oficial que recomenda a adoção de um modelo de atuação diferenciado. Desta maneira, os resultados obtidos neste estudo possibilitam o levantamento de algumas sugestões que merecem ser consideradas em próximos trabalhos acerca da temática da integração saúde - educação: por que o trabalho dentro de uma perspectiva de integração saúde - educação não é consolidado, apesar dos profissionais de saúde e educação possuírem, a princípio, boa disposição para esse tipo de atuação? Em outras palavras, a política de atuação integrada entre as áreas de saúde e educação existe, embora não seja colocada em prática. Por que razões o projeto de integração dessa natureza não é efetivamente implantado? Por que algumas alternativas simples, como a participação de profissionais de saúde em horários rotineiros de reunião de docentes (como por exemplo, o Horário de Trabalho Pedagógico ou HTP), onde haveria chance de discussão sobre vários assuntos de interesse conjunto, não é posta em prática? Em que medida um projeto de formação continuada (sejam através de cursos, workshops, etc) para os profissionais de saúde e educação, que possibilitasse ou promovesse uma atuação mais crítica por parte destes profissionais, não é proposto e promovido pelos órgãos oficiais? Estas considerações surgem, a partir da idéia de que a integração saúde e educação parece estar situada apenas no âmbito das conjecturas e das hipóteses, na medida em que se pode perceber que os profissionais de saúde e educação desconhecem que os órgãos oficiais recomendam esse tipo de modelo de atuação para as duas áreas. Em relação à realização desta pesquisa, como em todo trabalho científico, enfrentaram-se dificuldades e obstáculos metodológicos. A maior dificuldade encontrada pela pesquisadora foi a de gerenciar o processo de coleta de dados em relação aos quatro tipos de sujeitos e os dois tipos instrumentos de pesquisa utilizados. Foi difícil, também, manter o equilíbrio em relação ao vários
  8. 134 tipos de papéis desempenhados no decorrer da pesquisa, ou seja, a psicóloga, a profissional de saúde e a pesquisadora. É necessário enfatizar que o contato com os alunos foi muito gratificante, na medida em que, além de possibilitar uma visão mais completa do fenômeno estudado, deu voz a essa população pouco considerada, como sujeitos de pesquisa, nos trabalhos científicos sobre o fracasso escolar e outros fenômenos educacionais brasileiros. 7.2. Contribuições a uma proposta de integração entre o trabalho de psicólogos e professores, baseado nas teorias “reflexivas” Nesta seção, pretende-se lançar algumas idéias para a discussão de um projeto de ação conjunta entre psicólogos e professores que, mesmo não esgotando o assunto sobre a integração saúde - educação, pode trazer alguns subsídios para um projeto futuro de trabalho conjunto entre os profissionais das duas áreas de atuação. As discussões relativas à melhoria da qualidade de ensino passam, inevitavelmente, pelo debate sobre a formação do professor, seja esse inicial ou continuada, assim como a própria formação do psicólogo, quando se leva em conta os seus diferentes campos de atuação profissional. Novas tendências apontam para uma formação docente alicerçada na prática do professor e na reflexão sobre esse prática. Tais abordagens são chamadas de “reflexivas” e uma das inovações propostas é a adoção de um modelo de formação que se inspira naquela oferecida aos profissionais da área de saúde (como a medicina e a enfermagem) denominado de modelo “clínico” de formação (GARCIA, 1992), o qual não deve ser confundido com o método clínico de atuação. Segundo PERRENOUD(1993), a formação dos profissionais na área de saúde tem, como uma de suas preocupações, a instrumentalização dos estudantes para que consigam administrar os conflitos, angústias, fracassos e os demais sentimentos presentes no cotidiano de atuação, assim como proporcionar
  9. 135 a estes uma compreensão da complexidade e especificidade de seu trabalho, o qual exige o enfrentamento diário de situações de doença, dor e morte; além disto os estudantes, inevitavelmente, devem passar por estágios relativamente longos em instituições como hospitais e ambulatórios, onde poderão conhecer as características de sua atuação e onde também deverão assumir a responsabilidade por suas ações e decisões. Ainda de acordo com esse autor, o modelo clínico de formação de professores “... pressupõe não só estágios intensivos e diversificados, mas também uma forte articulação entre esses estágios e os locais e momentos de reflexão na prática.” No modelo clínico de formação alguns recursos pedagógicos específicos, como os “estudos de caso” (estudo de situações consideradas potencialmente problemáticas para o professor), podem e devem ser utilizados com a finalidade de diminuir a distância do aluno em relação aos eventos da prática profissional. Um outro profissional que se submete a uma formação de tipo clínico é o psicólogo e a formação em Psicologia enfatiza, na maioria das vezes, independente da área de especialização, um processo contínuo de reflexão a respeito da teoria e da prática profissional, que se intensifica no momento do chamado estágio supervisionado. O estágio do estudante de Psicologia é acompanhado, como indica o nome, de reuniões de supervisão (individuais ou grupais) conduzidas por um profissional, geralmente, mais experiente e capacitado para esse função; discutem-se as questões emergentes da prática, o arcabouço teórico que sustenta as ações dos estagiários e todos os sentimentos, intuições, desejos e dificuldades que a realidade de trabalho pode trazer. No entanto, o processo de ingresso do psicólogo recém-formado na realidade de atuação profissional, mesmo precedido por um período de estágio é, geralmente, marcado pela constatação não muito agradável da grande dificuldade de relacionamento entre as teorias psicológicas e os fenômenos vislumbrados na prática profissional. Pode-se, inclusive, dizer que o ingresso do psicólogo no mercado de trabalho, com todos seus problemas e suas decepções, assemelha-se
  10. 136 bastante com o choque sentido pelo professor iniciante, quando encontra-se pela primeira vez em sala de aula. No entanto, esse não seria a única semelhança entre o trabalho de psicólogos e professores pois, quando pensamos em campos específicos de atuação em psicologia (como a área clínica, escolar ou organizacional) podemos facilmente contemplar a idéia do psicólogo como um agente educativo. No caso da área clínica, por exemplo, os transtornos de personalidade podem ser encarados como transtornos da aprendizagem da realidade ∗ e, neste sentido, a psicoterapia teria como uma de suas metas proporcionar ao indivíduo a possibilidade de reaprendizagem da realidade e de si mesmo. Assim, na medida em que auxilia o indivíduo em seu processo de reaprendizagem da realidade e das relações entre esse e o desenvolvimento de sua personalidade, o psicoterapeuta estaria atuando como um agente educativo. O mesmo se aplica à atuação no campo da psicologia escolar. Em uma análise a respeito da inserção de psicólogos em escolas, REGER (1964 in PATTO, 1991), distingue duas posturas que podem ser adotadas por estes profissionais no ambiente educacional: psicologia escolar - clínica ou psicologia clínica - escolar. A distinção entre estes dois tipos de postura, se dá em relação ao grau de sofisticação presente na atuação do profissional. No primeiro caso, o psicólogo escolar - clínico, atuando em menor grau de sofisticação, aplicaria testes de Q.I. (quociente de inteligência), realizando também atendimentos terapêuticos individuais ou grupais; já o psicólogo clínico - escolar, num maior grau de sofisticação, agiria como consultor em Saúde Mental, realizando trabalho de orientação direta à familiares e professores. No campo das organizações, os processos de ensino e aprendizagem freqüentemente ocorrem em várias situações, como por exemplo, na realização de recrutamento, seleção e treinamento de pessoal.  In: BLEGER, J. Temas de Psicologia. São Paulo, Martins Fontes, 1980, p.62.
  11. 137 Entretanto, não acreditamos que as similaridades entre docentes e psicólogos limitem-se apenas à esfera da concepção, planejamento e desenvolvimento de atividades educativas e, por conseqüência, da amplitude do conceito de educação. Psicólogos e professores desenvolvem um tipo de trabalho onde devem tomar decisões, assumir responsabilidades e riscos. Pode-se, portanto, qualificar a prática de ambos os profissionais como eminentemente solitária, na medida em que não podem compartilhar com seus colegas, no exato momento da tomada de decisão, suas dúvidas e certezas, bem como a insegurança de se defrontar com aquelas circunstâncias estudadas e discutidas anteriormente. As características da evolução profissional de psicólogos e professores são semelhantes, principalmente no tocante aos processos de feminização, funcionarização e proletarização presentes em ambas as carreiras. Entende-se a feminização de uma carreira como a presença maciça de profissionais do sexo feminino, a ponto desta carreira representar uma opção “natural” na escolha vocacional de mulheres. Para NÓVOA (1991), a feminização da carreira docente trouxe consigo “... uma desvalorização relativa da profissão docente.” Historicamente, um dos primeiros campos de atuação profissional de mulheres, a atividade docente evoluiu como carreira exclusivamente feminina, impedindo uma melhoria nas condições sociais e salariais desta categoria, pois no século XIX, a posição social das mulheres não se determinava pelos salários que estas recebiam e sim pelos salários de seus esposos. Apesar de já estarmos quase chegando ao final do séc. XX, quando se trata de lutas e reivindicações salariais parece que a mesma concepção do século passado se faz presente. A profissão de psicólogo também pode ser vista como uma profissão “feminina”. O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio- Econômicos (DIEESE) realizou, em l98l, uma pesquisa com objetivo de traçar o perfil do psicólogo no estado de São Paulo e a análise dos dados revelou que, na
  12. 138 época, essa categoria profissional era composta por 87,6% de mulheres assim como também apontou-se que os psicólogos do sexo masculino possuíam renda mensal maior do que os do sexo feminino. Outro achado interessante deste estudo foi que a maioria das psicólogas era casada e que o maior montante da renda familiar viria do salário do cônjuge. Pode-se perceber que, no que se refere à questão salarial, as psicólogas estão sujeitas ao mesmo tipo de hierarquia social existente no século XIX em relação às professoras, ou seja, figuram em primeiro plano como esposas, mães ou filhas e, somente em segundo plano, podem ser consideradas trabalhadoras, situação tal que acaba por prejudicar a luta destas profissionais por melhores salários e condições mais dignas de trabalho. A grande maioria dos psicólogos exerce atividades de caráter liberal, atuando como autônomos, mas existem muitos profissionais alocados nas redes públicas e estes devem ser vistos como funcionários do Estado e, enquanto tal, muitos de seus direitos trabalhistas acabam não sendo cumpridos, como o controle sobre a elaboração de programas de atuação específicos da área de psicologia e o poder de decisão sobre a quantidade e qualidade dos serviços prestados. Deverá, em geral, sujeitar-se ao estilo de trabalho da instituição, seguir programas de ação muitas vezes impostos de “cima para baixo” pelas instâncias decisórias, já que a autonomia própria do profissional liberal não parece ser respeitada quando esse se encontra vinculado a um sistema público de prestação de serviços. Por sua vez, a história da profissão docente contém um período onde ocorre o que NÓVOA (op. cit.) chama de processo de “funcionarização” desta categoria. Em Portugal, no século XVIII, a Igreja é substituída pelo Estado no controle da escolarização da população, sendo que tal substituição é acompanhada de tentativas de elaboração de um corpo de saberes próprios dos docentes. O processo de estatização do ensino determina que os professores respondam a uma nova ideologia e a sua vinculação trabalhista passa a pertencer
  13. 139 ao Estado. Os docentes acatam essa ideologia, assumem-se como funcionários e este processo de funcionarização torna-se um projeto comum entre Estado e professores. Entretanto, como funcionários, os docentes passam a se diferenciar dos demais membros de sua classe profissional, pois a serviço do Estado, a docência acaba por adquirir uma intencionalidade política. Ainda em Portugal, a partir do século XIX, surgem tensões entre professores e Estado, já que os primeiros reivindicam maior autonomia e idealizam um modelo docente que se localiza entre o “funcionário” e o “profissional liberal”, situação que parece indicar o início de uma crise de identidade profissional dos professores. De acordo com ENGUITA (1991), a crise de identidade da categoria docente é tão aguda que “... nem a categoria nem a sociedade em que estão inseridos conseguem pôr-se de acordo em torno de sua imagem social e menos ainda sobre suas conseqüências práticas em termos de delimitação de campos de competência, organização da carreira docente, etc.” Segundo o mesmo autor, a polêmica sobre a ambivalência da posição docente pode ser reduzida à localização entre a profissionalização e proletarização desta categoria, significando que algumas categorias profissionais, como a categoria docente, possuiriam características comuns a grupos profissionais e grupos proletários. O corpo dos professores, mesmo submetido a uma autoridade patronal, não deixa de reivindicar manutenção e controle de sua autonomia profissional. Dentre os fatores que atuam a favor de uma proletarização da docência estariam: a expansão das empresas privadas no setor educacional, os cortes nos orçamentos destinados à educação e a pouca repercussão dos salários docentes sobre os custos da força de trabalho adulta. Um outro fator favorável à proletarização é o fenômeno da feminização do magistério, ao qual nos referimos acima.
  14. 140 Quanto à profissionalização, o fator mais favorável aos docentes, é o caráter do trabalho educativo, que não pode ser substituído por máquinas e nem pode ser fragmentado. Pela presença destes dois conjuntos de fatores, ENGUITA (op. cit.) acaba por qualificar a docência como uma “semiprofissão”, devido à ambigüidade de seu posicionamento. Acredita-se, porém, que este embate entre profissionalização e proletarização não aconteça somente na área de educação. Psicólogos, terapeutas ocupacionais e até mesmo médicos da rede pública de saúde, também vêm lutando contra um processo de proletarização ou de “semiprofissionalização”, na medida em que ocorre o sucateamento progressivo do serviço público e o conseqüente achatamento de seus salários. Portanto, a partir do momento em que se sujeitam às adversas condições de trabalho das instituições públicas, especialmente nos setores de educação e saúde, professores e psicólogos situam-se na categoria de “semiprofissionais”. Diante deste quadro não muito animador, ao se discutir as características comuns da posição sócio-ocupacional de professores e psicólogos, lançam-se algumas propostas de solução para que ambas as categorias possam ser capazes de anular ou minimizar o efeito dos fatores desfavoráveis, relacionados a um verdadeiro processo de profissionalização. Um dos caminhos para a efetivação do processo de profissionalização da categoria docente, seria a implantação de cursos de formação inicial e continuada de acordo com uma abordagem reflexiva, onde profissionais aprendessem a partir de sua própria prática, em processos denominados de “reflexão - na - ação” e “sobre - a - ação”, conforme proposto por SCHÖN(1992), um dos autores que mais vêm investigando esses conceitos. Cabe aqui destacar como característica fundamental deste tipo de ensino o fato de que a prática leva à criação de um conhecimento específico e ligado à ação (GARCIA, op. cit.).
  15. 141 MARCELO (in VILLA, 1988) alicerça-se em SCHÖN para afirmar que a reflexão sobre a ação é necessária para a construção do conhecimento docente. Somente a partir da construção de conhecimentos específicos, advindo da prática e da reflexão na prática docente e sobre a prática docente, será possível que os professores consolidem-se como categoria profissional. É necessário a reformulação dos atuais programas de formação inicial e continuada de professores, de modo que estes passem a valorizar o ato de reflexão do educador sobre sua prática. Considerando que os cursos de Psicologia procuram formar seus alunos baseados em estágios e discussões aprofundadas sobre as experiências vivenciadas na prática, os psicólogos, em geral, poderiam contribuir mais para a formação de professores através, por exemplo, da participação em debates sobre essa temática e na reformulação dos cursos de formação docente. Os psicólogos poderiam e deveriam participar da elaboração de projetos de formação docente de acordo com o modelo “clínico”, baseado em sua atuação necessariamente reflexiva e na exigência de reflexão posterior sobre a prática psicológica como uma atividade cotidiana do profissional de psicologia, seja através de encontros com outros profissionais da área, de sua própria introspecção ou em supervisões com profissionais mais experientes e habilitados. Se professores e psicólogos conseguissem sair de seu tradicional isolamento e passassem a trocar experiências sobre seus estilos de atuação, objetivos de trabalho, dificuldades e conflitos vividos no cotidiano das instituições, teriam muito a aprender e ensinar e, mais ainda, a auxiliar na melhoria da qualidade de ensino. Existem questões educacionais, como o fenômeno do fracasso escolar, que ultrapassam os limites da sala de aula ou da escola, atingindo inclusive os profissionais da saúde e que vêm determinando o encaminhamento de uma grande quantidade de alunos para avaliações diagnósticas, especialmente psicodiagnósticos. A possibilidade de reflexão conjunta de psicólogos – enquanto agentes educativos responsáveis pelo recebimento e resolução de queixas de
  16. 142 baixo aproveitamento acadêmico de alunos – e professores – os maiores responsáveis por tais encaminhamentos – poderia suscitar uma nova compreensão desta problemática e agilizar a busca de novas soluções institucionais, possivelmente mais abrangentes quanto a sua resolutividade. É preciso que os docentes reflitam sobre a concepção arraigada de que o baixo rendimento acadêmico é causado, exclusivamente, por fatores extra- escolares ou que o aluno é responsável pelo seu mau desempenho escolar, porque é doente, pobre ou porque vêm de uma família “desestruturada”. É necessário que os professores reflitam sobre o seu discurso e, fundamentalmente, sobre a sua prática diante da problemática do fracasso escolar. É necessário que reflitam sobre as implicações ideológicas, ou seja, até que ponto seu discurso e sua prática poderiam estar reforçando a estigmatização, a discriminação e segregação de uma parcela da população que, normalmente, não se insere no modelo de indivíduo valorizado pela sociedade. Por outro lado, é preciso que os psicólogos realizem a mesma tarefa, pois também estão sujeitos a apresentarem um discurso e uma atuação altamente contraditória, onde há dicotomia entre teoria e prática e, apesar de uma formação a princípio mais reflexiva, podem acabar por reforçar concepções errôneas acerca dos fenômenos psicológicos e das relações humanas. Os órgãos centrais, responsáveis pela administração e coordenação de programas de ação, tanto no setor de saúde como de educação, deveriam possibilitar um entrosamento ou integração entre os seus diferentes profissionais, especialmente daqueles que compõem as interfaces no enfrentamento de fenômenos, como no caso do fracasso escolar. Ressalta-se que, na falta de programas que favoreçam um processo de integração desses profissionais, os dirigentes das instituições deveriam apoiar as possíveis iniciativas individuais nesta direção. Somente através da discussão das questões polêmicas do cotidiano das práticas profissionais, como ponto de partida, existirá a possibilidade, de um lado, da mudança do quadro de total imobilismo em que se encontram os
  17. 143 “funcionários” da saúde e da educação diante de sua própria condição de “semiprofissionais” e do desserviço prestado à população, assim como a alteração das suas concepções e, conseqüentemente, de suas atitudes com relação a diferentes problemáticas, como é o caso do fracasso escolar.
  18. 143 “funcionários” da saúde e da educação diante de sua própria condição de “semiprofissionais” e do desserviço prestado à população, assim como a alteração das suas concepções e, conseqüentemente, de suas atitudes com relação a diferentes problemáticas, como é o caso do fracasso escolar.
  19. 143 “funcionários” da saúde e da educação diante de sua própria condição de “semiprofissionais” e do desserviço prestado à população, assim como a alteração das suas concepções e, conseqüentemente, de suas atitudes com relação a diferentes problemáticas, como é o caso do fracasso escolar.
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