1. 70 MAIO/JUNHO 2014
RISMA SÍNTESEP
PAULO CANÔA
CEO da Adecco Brasil e
presidente do Clube de Executivos
Estrangeiros do WTC Business
Club em São Paulo
paulo.canoa@adecco.com
I IIIII IV
BRASIL: CHEGAR, VER E
VENCER! SERÁ ASSIM TÃO
FÁCIL? TALVEZ, MAS SE
FORMOS «ANTIFRÁGEIS»!
Em cenários económicos pouco favoráveis, as empresas e os
profissionais são tentados a olhar para outras oportunidades
noutras geografias. Para nós, portugueses, o Brasil aparece
sempre como um dos principais destinos alternativos.
Porém, o mundo empresarial e laboral no Brasil não é o
mesmo que nos agrada tanto quando falamos de férias,
futebol e samba. É possível ter sucesso, mas necessitamos
de estar muito bem preparados e informados para o que
nos espera. Aqui, tudo é difícil, mas nada é impossível!
H
á alguns anos, ficou céle-
bre a sigla BRIC − utiliza-
da por Jim O’Brien para se
referir aos países emergen-
tes que, no seu entender,
maior potencial de desen-
volvimento apresentavam.
Falamos de Brasil, Rússia, Índia e China.
Num cenário de entusiasmo económi-
co e notoriedade dos BRIC, com taxas de
crescimento do PIB elevadas − 7,5% em
2010, no Brasil −, muitas empresas multi-
nacionais investiram em capital financeiro
e humano, reforçando os seus investimen-
tos e equipas nestes países, com especial
enfoque no «nosso» Brasil, o primeiro dos
BRIC!
As crises económicas e crescimento do
desemprego noutras geografias − incluin-
do Portugal − determinaram um aumento
da emigração e os vistos de trabalho para
estrangeiros no Brasil cresceram de forma
significativa, juntamente com o aumento
do investimento direto estrangeiro. A che-
gada ao Brasil de executivos renomados e
com provas dadas noutros países − incluin-
do Portugal − também aumentou muito.
Mas será que a chegada, a adaptação e
a implementação de metodologias de tra-
balho, liderança e management no Brasil
foram ou são assim tão fáceis? Será que é
só chegar, ver e vencer?
Lamentavelmente, não.
As caraterísticas do Brasil tornam-no
num dos países emergentes mais difíceis
− arrisco mesmo afirmar «o mais difícil»
− de ter êxito empresarial rápido. Por isso,
são bem conhecidas as desilusões de mul-
tinacionais que, «perdendo a paciência» (e
muito dinheiro investido),batem «em reti-
rada» depois do entusiasmo inicial.E onde
também muitos executivos de topo veem
2. 71MAIO/JUNHO 2014
perder a sua reputação.
São várias as caraterísticas que servem
de aviso para quem se quer aventurar a
investir ou fazer carreira neste grande país.
E é muito importante estar preparado para
as enfrentar. Observemos algumas:
recursos humanos. É difícil encon-
trar no mundo um ambiente de traba-
lho que, em termos médios, seja mais
«simpático e acolhedor». Naturalmen-
te, o colaborador brasileiro (e popula-
ção brasileira) foge de relações tensas,
conversas sérias ou notícias más no seu
quotidiano. Quem trabalha no Brasil
conhece bem o que significam respostas
(a perguntas muito objetivas) que come-
çam com expressões do género: «Veja
bem…», «Na verdade…» ou «Então…»
− bengalas oratórias muito utilizadas
para comunicar (ou não), de uma forma
suave, más notícias ou maus resultados.
Sabemos todos o que isto pode signi-
ficar em termos de eficiência e eficá-
cia de trabalho: comunicação subjetiva,
ineficácia nos diagnósticos e «surpre-
sas» no quotidiano de uma empresa,
dificultando a organização, forma-
ção de equipas e atingimento de resul-
tados estáveis e de forma rápida.
Aqualificaçãomédiadosrecursoshuma-
nos brasileiros deixa também muito a
desejar, apesar da evolução dos últimos
anos. A escassez de quadros intermédios
qualificados é um desafio para as empre-
sas que pretendem formar equipas fortes
e estáveis.Um profissional de nível inter-
médio na área financeira e fiscal (ou de
vendas), com conhecimentos de inglês,
pode receber mais que um chefe de con-
tabilidade (ou de vendas) ou mesmo um
diretor financeiro (ou diretor comer-
cial) em muitas empresas em Portugal.
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Tenho vindo a notar que esta política de recur-
sos humanos dá resultados surpreendentes.
Aliás, sou cada vez mais admirador dos recur-
sos humanos quando percebo que a lingua-
gem que a empresa fala para o interior e exte-
rior é resultado desse esforço.
Durante o ano, visito algumas empresas para os
divertir de algum modo, na esperança que me
divirtam também a mim. E basta um minuto
a olhar para a assistência para perceber se vai
ser fácil ou se estou metido em sarilhos. Feliz-
mente, em 95% dos casos, o público está co-
migo, embora isso não queira dizer que eu não
o tenha de conquistar. Lembro-me de há me-
ses na Exponor apresentar um evento. Quando
cheguei ao palco, perguntei: «Bom dia. Gostava
de vos fazer uma primeira pergunta. Vocês são
fixes? É que se não são temos um grave pro-
blema, porque eu vou estar a apresentar esta
convenção desde as 10 da manhã até às 6 da
tarde, não me tramem.» O público riu-se e
percebi que estavam dispostos a deixarem-se
conquistar.
A verdade é esta, somos responsáveis pelos
amigos que temos, porque podemos escolher
quem queremos ter ao nosso lado. E para as
empresas isto vale também. Os trabalhadores
das empresas são o reflexo da política de recur-
sos e das escolhas que estes determinam. Por
isso é que há empresas felizes e outras tristes
e amarguradas. O mundo precisa de pessoas
e líderes que saibam vender a esperança e um
líder que não acredite nisto devia estar a plantar
inhames no Magrebe.
Há uns anos, Odete Fachada, poderosa con-
sultora de gestores, perguntou-me: «Você tem
funcionários?». «Tenho cinco», respondi. Ao
que ela me perguntou: «E quanto, de 1 a 10, lhes
dá pelo seu trabalho?» Respondi: «8.» Odete
rematou: «Isso é quanto você vale enquanto
gestor de pessoas.» Desde aí esta pergunta
persegue-me e deveria perseguir todos os ges-
tores. E, agora que sei disto, posso revelar-vos
que à mesma pergunta responderia com um
convicto 9. Mas haveremos de chegar ao 10.
A PERGUNTA: QUANTO VALEM
OS TRABALHADORES DA VOSSA
EMPRESA, DE 1 A 10?
FERNANDO ALVIM
Apresentador do
programa «Prova Oral»
na Antena 3
UM OUTRO OLHAR
3. 72 MAIO/JUNHO 2014
O apetite – e a correspondente escas-
sez – por bons profissionais é tão gran-
de que influencia, e muito, o turnover
nas empresas: mais um desafio na ges-
tão de RH;
burocracia, complexidade e morosidade.
O Brasil é um dos países mais complexos
em termos burocráticos,administrativos,
tributários e laborais. No estudo Doing
Business do World Bank, que compara,
entre outras variáveis, o tempo que uma
empresa necessita para cumprir as suas
obrigações fiscais, o Brasil é o pior país
do mundo entre os 182 países do estu-
do: são necessárias mais de 2600 horas
por ano, em Portugal 275 e em Espa-
nha 167. Podemos, assim, afirmar que
tratar de impostos no Brasil é 10 vezes
mais difícil e exigente que em Portugal
e 15 vezes mais difícil que em Espanha.
O Brasil é o recordista absoluto no
mundo em processos laborais. Em 2012,
tramitaram em tribunal 7 milhões de
processos. A razão é devida à moldura
gigantesca das leis laborais: a Constitui-
ção tem 67 dispositivos na área traba-
lhista e 14 regras transitórias. A Con-
solidação das Leis do Trabalho (CLT)
incorpora quase mil artigos desdobrados
em centenas de parágrafos. Os Códigos
Civil e Penal têm dezenas de dispo-
sitivos no campo do trabalho. Isto só
para mencionar as disposições laborais.
Considerando todas as áreas, foi cria-
do nas últimas duas décadas o número
absurdamente elevado de 4,2 milhões de
leis, ou seja, mais de 1150 leis por dia.
Mesmo com os melhores profissio-
nais do mundo é difícil cumprir a
100% todas as complexas (e volá-
teis) disposições legais existentes.
Isto explica o porquê de o Bra-
sil ser também o país onde o nível
de contingências laborais e fiscais
nas empresas é dos mais elevados.
O tempo médio para fechar um negó-
cio também é dos mais elevados. Após
uma apresentação de vendas ou visita
comercial, ficamos com a noção (erra-
da) de que tudo correu bem e que esta-
mos prestes a fechar um excelente negó-
cio e nos apetece abrir uma garrafa de
champanhe e celebrar. Mas... falta assi-
nar o contrato, faltam os detalhes e
estes podem demorar anos! Por maior
ou menor que seja o negócio, é sempre
muito demorado fechá-lo!
situação económica.Para além dos desa-
fios acima, é importante ainda refe-
rir os recentes dados económicos que
72 MAIO/JUNHO 2014
O colega que partilhou esta história pediu ao candidato que estava a entrevistar para a
área de marketing se ele podia apresentar alguma coisa que o fizesse ser inesquecível.
O candidato foi direto ao objetivo do pedido e disse que tinha um dente falso, tendo
sacado imediatamente do dente e colocado em cima da mesa da entrevista!
De facto foi inesquecível, pois o entrevistador nunca mais se esqueceu deste candidato
e passou a pensar duas vezes antes de replicar esta questão aos candidatos seguintes
que entrevistou…
CANDIDATO INESQUECÍVEL!
Partilhe connosco as suas histórias divertidas através
do e-mail recursosmesmohumanos@gmail.com
Recursos MESMO Humanos
RISMA SÍNTESEP I IIIII IV
«
A escassez de quadros
intermédios qualificados
é um desafio para as
empresas que pretendam
formar equipas
fortes e estáveis
4. 73MAIO/JUNHO 2014
podem não ser tão otimistas como
há uns anos. Vá ao Google e introdu-
za as palavras «Economist cover Brazil»
e compare as capas desta conceitua-
da revista em setembro de 2013 com
a de há quatro anos e veja como evo-
luiu a economia e o Cristo Redentor.
O PIB brasileiro nos últimos trimestres
de 2013 e de 2012 envergonha qualquer
economia emergente. Saindo de um
PIB em 2010 de 7,5%, está agora a lutar
para conseguir uns meros 2%, apesar de
ser a sede de um dos maiores eventos do
mundo. Em 2012, o Brasil cresceu ape-
nas 0,9%.
Quem consegue sobreviver ou ser bem-
-sucedido no desenvolvimento dos seus
negócios, carreira ou gestão da sua empre-
sa neste ambiente económico e legislativo
tão complexo?
O Brasil é um país fantástico e com
um enorme potencial. É um mercado de
210 milhões de habitantes e consumido-
res, mas as regras de sucesso nos negócios,
de management e leadership não podem ser
as mesmas num ambiente tão complexo e
desafiador.
Desengane-se quem pensa que por ter
sido bem-sucedido num ou mais países
poderá, com facilidade, replicar o suces-
so no Brasil, aplicando as mesmas regras e
estilo de gestão e liderança.
O Brasil é um país onde tudo é difícil,
mas nada é impossível. E é esta segun-
da parte da frase que nos deve manter
motivados e em que devemos continuar a
apostar. Mas a parte do «difícil» requer as
melhores caraterísticas do líder e do cola-
borador estrangeiro que queira por aqui
vencer.
Os líderes e colaboradores que são bem-
-sucedidos noutros ambientes de negó-
cio podem também consegui-lo no Brasil,
mas deverão estar bem preparados para os
desafios da sociedade empresarial e econó-
mica brasileira.
Mais do que capacidade de trabalho,
motivação ou resiliência − caraterísti-
ca muito apreciada nos últimos anos −, os
líderes e profissionais terão de ser também
«antifrágeis»,termo inovador utilizado por
Nassim Taleb no seu último livro, cuja lei-
tura recomendo vivamente.
Resilientes são os líderes que, quando
encontram dificuldades, se mantêm esta-
velmente fortes. Antifrágeis são aqueles
que,quando enfrentam dificuldades,ficam
ainda mais fortes. É esta caraterística que
pode garantir mais rapidamente o sucesso
de um profissional no Brasil!