1) O documento discute a questão da transposição de fusos cartográficos em trabalhos de geodésia e topografia. 2) Explica que quando se mapeia uma área que cruza fusos, as coordenadas de alguns pontos podem aparecer em fusos diferentes. 3) Fornece recomendações para lidar com essa situação, como converter as coordenadas para o mesmo fuso para fins de cálculos e relatórios.
Cartografia aula 9 - sistemas de coordenadas - utm
Transposicao de-fusos
1. TRANSPOSIÇÃO DE FUSOS
A questão da transposição de fusos tem sido um dos problemas cartográficos mais suscitandes de
indagações por parte dos profissionais da engenharia da mensuração, quando dos trabalhos
geodésicos de posicionamento com GPS ou numa poligonação eletrônica com transporte de
coordenadas.
1 - O que fazer quando estou levantando uma poligonal de uma fazenda, e o meu GPS acusa que
mudei de fuso?
2 - Como calcular a área e executar os desenhos no meu sistema CAD, se as coordenadas de
vários pontos próximos uns dos outros, ora estão no fuso no qual iniciei a poligonal, ora estão no
fuso contíguo?
3 - Como calcular as coordenadas e editar o desenho de um eixo (Estrada, Oleoduto, Eletrificação
etc.), que podem iniciar num fuso e terminar em out ro?
4 - Como locar uma sequencia de pontos geodésicos de um mesmo projeto, (assentamento do
INCRA, por exemplo), se o projeto está exatamente nos limites de um fuso?
Estas questões nos tem chegado com muita frequëncia ao longo de nossa carreira como profes sor
de geodésia e topografia, e, por isso, resolvemos colocar neste artigo, algumas das
recomendações e até mesmo de soluções que temos oferecido.
FUSO CARTOGRÁFICO
Em primeiro lugar, existe uma certa confusão quanto ao verdadeiro entendimento do que seja
"fuso", em termos cartográficos.
O sistema de fusos é uma sub-divisão do equador terrestre em faixas de 6° de amplitude,
contadas e numeradas a partir do anti-meridiano de Greenwich (180°), no sentido anti-horário e
adotado pelo sistema UTM como base de orientação dos cálculos cartográficos, no que tange ao
sistema de projeção e eixos plano-retangulares.
São contados e numerados de 1 a 60 e identificados conforme o exemplo a seguir:
Fuso 1 (180° a 174°)
Fuso 2 (174° a 168°)
--------------------
--------------------
Fuso 30 (6° a 0°)
Fuso 31 (0° a 6°)
--------------------
--------------------
Fuso 59 (168° a 174°)
Fuso 60 (174° a 180°)
O Brasil é coberto por 8 fusos, mais especificamente, pelos fusos 18 (78° a 72°) até o fuso 25
(36° a 30°), perfazendo uma amplitude total de 48°.
Existem muitas outras implicações para o entendimento do sistema de fusos cartográficos no que
tange a sua história, sua relação com a "carta do mundo ao milionésico" e a história da
cartografia brasileira, mas isto não é assunto para o momento.
SISTEMA DE EIXOS
O Brasil adota o sistema UTM para o desenvolvimento dos cálculos geodésicos e a projeção
conforme de Gauss, como o sistema de projeção adequado para a cartografia brasileira. Isto
porque o próprio sistema UTM foi desenvolvido para ser aplicado na projeção conforme de Gauss.
2. Com algumas pequenas adaptações, este é o nosso sistema de cálculos geodésicos e
cartográficos.
Uma das característica do sistema UTM e que nos interessa neste estudo, é a adoção dos
meridianos centrais (MC) e do equador, como o sistema de eixos específico para cada fuso, ou
seja, o fuso 22 (54° a 48°) tem como sistema de eixos, o seu meridiano central (51°) e o
equador.
Outra característca é a adoção dos valores 500000 ms (500 Kms), para o meridiano central e
10000000 de metros (10000 Kms), para o equador, de tal forma que a orígem do sistema de
eixos de cada fuso, fica no cruzamento do respectivo MC com o equador e já tem, como
coordenadas de orígem, E=500000 e N=10000000), isto para ponto ao sul do equador. Para o
emisfério norte, o valor de N não sofre incrementação, ou seja as coordenadas de origem são: E
= 500000 e N = 0.
E e N significam, "para ESTE" e "para NORTE", respctivamente.
Desta forma, garantem-se as coordenadas sempre positivas, tanto do lado ESTE como OESTE do
fuso, tanto no hemisfério sul quanto no hemisfério norte.
Um ponto, portanto, a OESTE do MC de um fuso qualquer e a 120000 ms de distância (120 Kms)
e ainda a 3000000 ms do equador (3000 Kms), teria suas coordenadas em E= 380000,000 e N=
7000000,000. Este mesmo ponto do lado ESTE teria as coordenadas E=620000,000 e N=
7000000,000.
TRANSPOSIÇÃO DE FUSOS
Cada posicionamento geodésico, portanto, deve estar referenciado ao sistema de eixo que lhe é
correspondente, segundo o fuso ao qual pertença.
Os sistemas de GPS, quando em uso no campo, automaticamente registram as coordenadas
planas segundo o fuso dominante para cada momento, e quando estamos trabalhando nas
extremidades de um fuso, este fato pode causar certo desconforto ao operador menos avisado.
Ocorre na verdade, que o Sistema GPS registra o posicionamento em termos de coordenadas
geográficas (Latitude e Longitude), mais especificamente em WGS_84, porém, devidamente
configurado, apresenta estas coordenadas já convertidas para o nosso ambiente mais comum,
qual seja, em coordenadas planas relacionadas ao fuso dominante, e no sistema SAD_69,
ocorrendo daí, momentos em que as coordenadas planas apresentadas estão referenciadas ao
fuso adjacente.
Citamos o GPS, tendo em vista o seu uso mais generalizado, mas o mesmo fenômeno pode
ocorrer no momento dos cálculos de uma poligonação com transporte de coordenadas, em
que o calculista sabe que aquele ponto seguinte já pertence ao fuso contíguo.
AO QUESTIONAMENTO MOTIVADOR DESTE ARTIGO...
Em resposta às questões colocadas inicialmente, propomos as seguintes soluções:
1 - O que fazer quando estou levantando uma poligonal de uma fazenda, e o meu GPS acusa que
mudei de fuso?
Nada. Continue trabalhando. No momento do pós-processamento, quando do cálculo das áreas ,
desenhos, edição de memoriais e relatórios, tenha em mente o conceito que acabamos de
colocar.
Para efeito de cálculos o fuso pode ser expandido em até 30´.
Após os cálculos relacione os pontos sabidamente do fuso seguinte ao seu respect ivo MC.
3. 2 - Como calcular a área e executar os desenhos no meu sistema CAD, se as coordenadas de
vários pontos próximos uns dos outros, ora estão no fuso no qual iniciei a poligonal, ora estão no
fuso contíguo?
Se o problema for só a questão de áreas, desenhos e relatórios, proceda como descrito acima.
3 - Como calcular as coordenadas e editar o desenho de um eixo (Estrada, Oleoduto, Eletrificação
etc.), que podem iniciar num fuso e terminar em outro após longos quilômetros?
No caso de uma poligonação elet rônica com transporte de coordenadas, onde o "caminhamento"
ultrapassa em muitos quilômetros um fuso adjacente, deve-se trabalhar com transporte de
coordenadas geográficas e, posteriormente, para efeito de relatórios, cada ponto pode ser
transformado em coordenadas planas, segundo o sistema UTM e considerado o fuso ao qual
pertença.
4 - Como locar uma seqüência de pontos geodésicos de um mesmo projeto, (assentamento do
INCRA, por exemplo), se o projeto está exatamente nos limites de um fuso?
Para que o projeto tenha sido desenvolvido exatamente na extremidade de um fuso,
forçosamente o projetista deve ter considerado a origens das coordenadas em função do fuso
dominante. Dai, basta organizar o projeto de locação nestas condições. Se o projeto é
apresentado, parte num fuso, parte no outro, para efeito de locação, as coordenadas do fuso
adjacente devem ser convertidas para o fuso dominante
EXEMPLO NUMÉRICO
Sejam dois pontos dados pelas suas coordenadas geográficas, no caso, valores inteiros até o
minutos para simplificar o entendimento.
Ponto 1
Latitude
Longitude
Altitude
=
=
=
24°58'00" Sul
47°57'00" Wgr
500 metros
Ponto 2
Latitude
Longitude
Altitude
=
=
=
25°00'00" Sul
47°59'00" Wgr
570 metros
Os dois pontos, pela análise pura e simples de quem trabalha com geodésia, estão localizados a
esquerda (OESTE) do meridiano central do FUSO 23.
O calculo das coordenadas planas destes pontos, com relação ao FUSO 23, resulta:
Ponto 1: E = 202149.7198 N = 7235495.2505
Ponto 2: E = 198863.5349 N = 7231727.3877
Os elementos técnicos desta base geodésica (1 para 2), resultam:
Azimute plano...: 221°05´37",2645
Azimute elips....: 42°20´26",0526
Azimute geogr...: 222°20´26",0526
Dist plana.........: 4.999,580 metros
Dist elips..........: 4.996,043 metros
Dist Topográfica: 4.996,953 metros (inclinada)
4. Fator K.............: 1.00070791618
Ang. Red..........: 0°00´02",8703
Convergência meridiana em 1 C = 1°14´45",9178
Os mesmos dois pontos, por estarem próximos do meridiano de 48°, limítrofe entre os FUSOS
(22 e 23), e talvez por força de projeto, podem ser referenciados ao FUSO 22, cujo MC vale 51°,
resultando:
Ponto 1: E = 807952.9810 N = 7235271.7674
Ponto 2: E = 804503.1199 N = 7231652.8204
Da mesma forma, os elementos técnicos desta base geodésica (1 para 2), nesta nova referência,
resultam:
Azimute plano...: 223°37´47",0904
Azimute elips....: 42°20´26",0419
Azimute geogr...: 222°20´26",0419
Dist plana.........: 4.999,834
Dist elips..........: 4.996,043
Dist Topográfica: 4.996,953
Fator K.............: 1.00075831537
Ang. Red..........: -0°00´02",8292
Convergência meridiana C = -1°17´18",2191
Estudos:
1 - Ao observador menos avisado, a primeira vista, ocorre um fenômeno interessante, qual seja,
a diferença entre os azimutes planos da base, quando esta está referenciada a um ou outro
FUSO.
Isto ocorre porque o azimute plano é decorrente da Convergência Meridiana (CM), bem
como, do Ângulo de redução na base.
Para que o azimute geográfico permaneça inalterado, os valores da CM e do ângulo de
redução variam, provocando uma alteração no Azimute Plano. Isto é consequencia da
"Projeção conforme de Gauss", que por sua vez é variante da "Projeção Transversa de
Mercator".
No caso dos cálculos geodésicos e cartográficos, segundo o sistema UTM, a projeção
adotada é a "Projeção Conforme de Gauss". O sistema UTM é apenas uma metolologia de
cálculos, não é um sistema de projeções. Por conseguinte, não existem coordenadas UTM,
mas sim, "Coordenadas Plano Retangulares", calculadas, eventualmente, pelo sistema
UTM.
Como o próprio nome diz, a projeção de Gauss é "Conforme", ou seja, os valores
angulares (Azimutes, Ângulos entre alinhamentos, Rumos etc.), calculados a partir de
coordenadas, guardam uma "conformidade" ou ainda, uma "igualdade", com os mesmos
valores medidos no campo. As deformidades ficam por conta dos valores lineares, que são
controlados pelos limites impostos para os FUSOS.
2 - Uma observação seguinte fica por conta da diferença ocasional, entre os azimutes elipsóidicos
e geográficos (Norte verdadeiro) que deveriam ser iguais nas duas situações. Esta diferença, da
ordem de 0",0101 (Um centésimo de segundo sexagesimal), ocorre em função da "violação" das
regras, ou seja, as equações dos cálculos geodésicos, segundo o sistema UTM para a projeção
conforme de Gauss, foram desenvolvidas para o limite de fusos de 6°. Ao ultrapassarmos estes
limites, mesmo que, no máximo, os 30´ permitidos, os efeitos, embora pequenos, se
apresentam.
3 - O valor da CM "aparenta" uma anulação porque existe a troca de sinais, mas isto é um
engano. Embora o valor da convergência meridiana esteja diretamente agregado ao cálculo do
5. azimute plano, o que realmente interfere no resultado final é a inversão da curvatura da
transformada representativa da meridiana local, além, é claro, da curvatura da transformada da
base em questão (sempre voltadas para o MC do fuso dominante).
4 - As distâncias variam, por sua vez, em função do plano de projeção. Quanto maior a distância
da base com relação ao MC do fuso, maior a deformação. Observe-se, neste exercício, o fator K
do fuso 22 que é maior do que o K do fuso 23.
5 - O fato mais importante a ser observado, é o valor da distância topográfica inclinada, que
permanece igual nas duas situações. Melhor dizendo, permanece inalterada em qualquer
situação.
Conclusões:
Existem várias ocasiões no exercício da profissão do mensurador em que deparamos com
a situação de transposição de fusos. Hoje, com o advento do computador e do GPS, isto se
resolve facilmente, desde que o profissional seja realmente competente e conheça
profundamente os preceitos geodésicos e cartográficos.
Abre aspas (")
A lei 10.267, prescreve, entre tantas outras coisas, a exigência de um
profissional habilitado para o exercício do georreferenciamento de projetos
referentes ao novo CNIR (Cadastro Nacional de Imóveis Rurais). Nada mais
justo, porém, esta mesma lei impõe que o memorial descritivo seja elaborado a
partir das coordenadas georreferenciadas. Isto é um erro, e temos combatido
esta atrocidade no sentido de fazerem ver, quem de direito, que os valores
lineares calculados a partir de coordenadas planas de projeção, a exemplo deste
exercício, variam conforme a posição do projeto dentro do FUSO, ao passo que a
distância topográfica permanece inalterada, não importando o posicionamento
do projeto.
Ao apresentarmos, em cartório, um memorial descritivo a partir das coordenadas
planas de projeção cartográfica, estaremos mentindo, pasmem, amparados por
lei.
A obra em si pode e deve ser georreferenciada, em pelo menos um ponto, mas o
memorial e consequentemente a área, jamais deverá ser elaborado a partir das
coordenadas planas de projeção cartográfica. Esta é nossa posição.
Fecha aspas(")
Nos projetos de medições de glebas (poligonais fechadas), para os cálculos de distâncias e
áreas e edição de memoriais, o profissional deve trabalhar sempre com a referência de um fuso,
mesmo com relação à grafação dos valores das quadriculas na edição de uma carta
georreferenciada. Se for necessário, por exigências do projeto, pode editar um relatório técnico
contendo as coordenadas referenciadas aos FUSOS reais.
Nos projetos de poligonais longitudinais (polígonos abertos), havendo a transposição de
fusos por longos quilômetros, deve-se operar a técnica aqui mencionada para o momento da
transição e continuar os cálculos considerando-se o novo FUSO.
Djacir Ramos
Eng. Agrimensor
Consultor para assuntos geodésicos e de georreferenciamento.