Estratégia não é um processo lógico e tradicional de planejamento porque, quando se trata de problemas de estratégia, não se sabe se a alternativa escolhida dará resultado porque a maioria das empresas estão em setores oligopolísticos constituidos de competidores cujas reações são imprevisíveis. Na realidade, a concepção de uma estratégia, em geral, não resulta de um processo lógico, mas sim, caracteriza-se como um ato de criatividade do estrategista. Nos dias de hoje, a principal tarefa de todos os membros de uma organização, não apenas de seus altos dirigentes, deveria ser a de dedicar uma parcela de seu tempo à concepção e implantação continua de estratégias capazes de trazer vantagem competitiva para a empresa e, assim, permitir sua sobrevivência.
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Estratégia empresarial
1. Estratégia empresarial
Flavio Farah*
(Este texto é baseado nas obras de Michael Porter e de Sérgio Baptista Zaccarelli)
A concepção de estratégia
A maioria dos setores econômicos são oligopólios. Oligopólio é um setor econômico que contém
poucas empresas, cada uma das quais detém uma significativa participação de mercado. O fato de
cada empresa possuir uma parcela expressiva do mercado acarreta uma interdependência entre elas.
As empresas integrantes de um oligopólio são interdependentes no sentido de que qualquer mudan-
ça na participação de mercado de uma delas afeta a participação das outras, as quais, por essa razão,
tendem a reagir a essa mudança. As decisões e ações econômicas de uma empresa influenciam as
decisões e ações das demais.
Em um oligopólio, existe uma rivalidade entre os competidores, rivalidade que costuma assumir a
forma de uma disputa cujo objetivo é melhorar a posição relativa de um concorrente dentro do se-
tor. A rivalidade ocorre porque um ou mais competidores sentem-se pressionados a melhorar sua
posição ou porque percebem uma oportunidade nesse sentido. Na busca de uma melhoria de sua po-
sição relativa dentro do setor em que atua, uma empresa executa certas ações que são denominadas
movimentos competitivos. Os movimentos competitivos podem assumir formas como concorrência
de preços, batalhas de publicidade, introdução de produtos e aumento dos serviços ou das garantias
ao cliente. As firmas oligopolistas concorrem com base na qualidade, design do produto, serviço ao
cliente, propaganda etc.1
Em tais condições, estratégia não pode ser definida como um problema lógico. A diferença entre
problemas lógicos e problemas de estratégia é que, nos primeiros, a implementação do curso de
ação escolhido acarreta a solução do problema, enquanto que, nos segundos, não se sabe se a alter-
nativa escolhida dará certo porque a empresa está em um setor oligopolístico constituido de compe-
tidores cujas reações são imprevisíveis. Os problemas estratégicos, portanto, caracterizam-se pela
incerteza.2
Estratégia não é um processo de planejamento tradicional porque, no processo tradicio-
nal, a escolha de um certo curso de ação leva ao objetivo pretendido, ao passo que, em se tratando
de estratégia, não faz sentido fixar metas quantitativas devido à incerteza que caracteriza o proces-
so. A expressão planejamento estratégico perdeu o sentido e o antigo processo de planejamento es-
tratégico tornou-se inadequado devido à constatação de que, na realidade, a concepção de uma
estratégia, em geral, não resulta de um processo lógico, mas sim, caracteriza-se como um ato de
criatividade do estrategista. O que pode e deve ser planejado é a execução/implantação da estratégia
anteriormente concebida.
O que restou do antigo planejamento estratégico4
Estabelecer a missão e os objetivos da empresa. Etapa eliminada. É inútil estabelecer a missão da
empresa, pois os altos executivos não são capazes de distinguir a missão de sua empresa da de seus
concorrentes. Também não se dá mais atenção à fixação de objetivos porque: (a) para que os objeti-
vos de uma empresa fossem atingidos seria necessário que os concorrentes concordassem, o que
não acontece; (b) no tocante à obtenção de sucesso no jogo competitivo, os objetivos são os mes-
mos para todas as empresas – obter ou aumentar a vantagem competitiva e eliminar a desvantagem
competitiva.
2. Identificar ameaças e oportunidades. Esta etapa continua sendo importante. A diferença é que,
agora, dá-se muita atenção aos eventos de curto e curtíssimo prazo, em razão da instabilidade cada
vez maior do ambiente empresarial. Se surgir um fato novo no ambiente, todos os níveis da empresa
devem estar preparados para agir rapidamente. Isso aumenta a importância do curto prazo e diminui
a do longo prazo.
Identificar pontos fortes e fracos. A estratégia moderna prefere utilizar os termos vantagem e des-
vantagem competitiva em lugar de pontos fortes e fracos. A diferença não é somente de terminolo-
gia. A identificação de vantagens e desvantagens competitivas é feita (a) em comparação com os
concorrentes e (b) do ponto de vista dos clientes e consumidores. Qualquer característica da empre-
sa que não seja percebida pelos clientes e consumidores como uma vantagem em relação aos com-
petidores não é uma vantagem competitiva.
Elaborar alternativas estratégicas e eleger uma delas. No antigo planejamento estratégico, pen-
sava-se na elaboração de alternativas estratégicas como um processo lógico de solução de proble-
mas. Na moderna estratégia, reconhece-se que a criação de estratégias competitivas não é um pro-
cesso lógico, mas um processo criativo em que a principal ferramenta é a chamada intuição intelec-
tual. Esse é o tipo de intuição que intervém quando enxergamos repentinamente a solução de um
problema, quando um cientista descobre a teoria capaz de explicar um fenômeno ou quando um
profissional de publicidade concebe, para uma campanha, um tema poderoso capaz de convencer o
consumidor a preferir o produto que será anunciado. Outra diferença é que na abordagem antiga
passava-se à formulação de estratégias sem considerar as estratégias em curso, como se elas não
existissem. A estratégia moderna toma como ponto de partida as estratégias vigentes, procurando
corrigi-las ou melhorá-las sempre que necessário.
Alocar recursos e adaptar a organização. Na estratégia moderna, a taxa de retorno do investimen-
to não serve de base para a tomada de decisões estratégicas em razão da incerteza que caracteriza o
processo. Os investimentos devem ser analisados do ponto de vista da competitividade, dando-se
prioridade à avaliação de seu potencial de criação de vantagem competitiva. Na abordagem estraté-
gica moderna, os empregados não são meros espectadores da criação e implementação de estraté-
gias, mas participantes ativos e conscientes do processo. Essa participação tem potencial motivador.
Avaliar resultados. Na abordagem antiga, esta última etapa servia para verificar se os objetivos es-
tavam sendo atingidos e efetuar correções, caso necessário. Modernamente, sabendo-se que estraté-
gia não é um problema de lógica, o feedback torna-se inútil porque não fornece qualquer indicação
sobre a correção a ser feita. Ademais, a estratégia deve ser corrigida a qualquer momento, sempre
que houver mudança nas condições de mercado.
Vantagem competitiva e estratégia competitiva
Pode-se definir estratégia como qualquer ação planejada pela empresa destinada a criar uma vanta-
gem competitiva ou eliminar uma desvantagem competitiva. Vantagem competitiva, por sua vez,
significa oferecer aos clientes, de forma duradoura, um valor maior que o oferecido pelos competi-
dores. Pode-se oferecer maior valor: a) oferecendo mais benefícios do que os competidores, pelo
mesmo custo; ou b) proporcionando os mesmos benefícios por um custo menor; ou c) ofertando be-
nefícios muito maiores, de modo que mais do que compensem um custo mais alto.3
3. Vantagem competitiva é qualquer característica que distingue uma empresa ou produto em relação
a seus concorrentes e que é percebida pelos clientes como uma vantagem sobre os competidores.
Vantagem competitiva é uma característica da empresa ou do produto que faz a companhia ter su-
cesso na competição com os concorrentes. Esse sucesso, por sua vez, significa garantir a sobrevi-
vência da organização a longo prazo em condições satisfatórias para acionistas, empregados, clien-
tes, fornecedores, governo e comunidade. Uma vantagem competitiva pode ser temporária ou dura-
doura.
Exemplos de características que podem constituir uma vantagem competitiva incluem:
Qualidade do produto
Preço
Características estéticas (beleza)
Facilidade de aquisição
Prazo de entrega
Garantia
Serviços ao cliente
Imagem positiva da empresa
Custos internos inferiores
Custos externos inferiores
Patentes, direitos autorais ou de propriedade industrial
Funcionários talentosos
Pode-se, então, definir estratégia competitiva como qualquer ação planejada pela empresa com o
objetivo de criar uma vantagem competitiva. Dado o conceito de vantagem competitiva exposto aci-
ma, bem como os respectivos exemplos, pode-se listar como possíveis estratégias competitivas as
seguintes ações:
Mudança ou nova concepção de processos
Mudanças na qualidade de produtos existentes
Lançamento de novos produtos em mercados existentes
Lançamento de produtos revolucionários para criar novos mercados
Mudanças de estratégias de vendas
Concepção de novos canais de distribuição
4. Mudanças estéticas em produtos
Mudanças de preços em produtos
Aumento de garantia
Aumento ou melhoria de serviços ao cliente
Pesquisa e desenvolvimento
Aperfeiçoamento dos processos de recrutamento, seleção e treinamento de funcionários
Cultura de inovação
Considerando que os exemplos de estratégia competitiva oferecidos acima envolvem todas as áreas
de uma empresa e que a concepção de uma estratégia não resulta de um processo lógico, mas sim,
caracteriza-se como um ato de criatividade do estrategista, tem-se que uma empresa só conseguirá
sobreviver se criar continuamente estratégias competitivas para hoje e para amanhã. Sua sobrevi-
vência, portanto, dependerá da implantação de uma cultura de inovação, caracterizada pelos seguin-
tes valores:
Iniciativa
Criatividade
Inovação
Experimentação
Assunção de riscos
Flexibilidade
Trabalho em equipe
Rapidez
Os valores de uma cultura de inovação expressam-se pelas seguintes práticas, entre outras:
As normas e regulamentos são escritos ou verbais, não exaustivos e não detalhados
As comunicações são escritas ou verbais. A comunicação é vertical, horizontal e lateral
Existem poucos cargos, cujas responsabilidades são definidas de forma ampla e flexível, ou seja,
os cargos são generalistas
A relação de autoridade é menos rígida e descentralizada. Os funcionários podem ter vários che-
fes ao longo do tempo ou ter dois chefes em um dado momento
5. A menor especialização dos cargos resulta em uma estrutura organizacional com pequeno núme-
ro de departamentos e, consequentemente, pequeno número de níveis hierárquicos
O trabalho em equipe é incentivado e desenvolvido
A exposição de ideias é incentivada
As equipes possuem autonomia
Existem mecanismos para troca, disseminação e compartilhamento de novos conhecimentos
As pessoas são incentivadas a criar e experimentar o novo, finalidade para a qual recebem auto-
nomia, tempo e recursos materiais e tecnológicos
Não se punem erros ou fracassos porque são tidos como fatores de aprendizagem e de inovação
As pessoas são incentivadas a questionar todas as práticas, crenças e valores da empresa
Conclusão
Nos dias de hoje, a competição não ocorre de modo cadenciado, em bases anuais, mas sim, conti-
nuamente, em um ritmo frenético, sem prazos pré-determinados. Em tais condições, a principal ta-
refa das organizações deveria ser a de conceber e implantar continuamente estratégias capazes de
lhes trazer vantagem competitiva e, assim, permitir sua sobrevivência. Essa deveria ser uma tarefa
contínua de todos os membros da organização e não apenas dos altos dirigentes. Assim, todos os
integrantes de uma empresa deveriam dedicar uma parcela de seu tempo à tarefa criativa que real-
mente determina a sobrevivência da organização a longo prazo: a concepção e implantação de estra-
tégias competitivas.
Notas
1
PORTER, Michael E. Estratégia competitiva: Técnicas para análise de indústrias e da concorrência. 7ª ed. Rio de
Janeiro: Campus, 1991. p. 34 ; p. 97.
2
ZACCARELLI, Sérgio B. Estratégia e sucesso nas empresas. São Paulo: Saraiva, 2000.
3
PORTER, Michael E. Vantagem competitiva: Criando e sustentando um desempenho superior. Rio de Janeiro:
Campus, 1989. p. XV.
4
ZACCARELLI, Sérgio B. Idem. pp. 223-229.
* Flavio Farah é Mestre em Administração de Empresas, Professor Universitário e autor do livro Ética na Gestão
de Pessoas. Contato: farah@flaviofarah.com