1. ESTADO DE SANTA CATARINA
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
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Gabinete Desembargador Jorge Luiz de Borba
Petição n. 8000506-98.2017.8.24.0000 de Criciúma
Requerente : Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Promotor : Luiz Fernando Góes Ulysséa (Promotor)
Requerido : Município de Criciúma
Proc. Município : Patricia Tatiana Schmidt (OAB: 15034/SC)
Relator(a) : Desembargador Jorge Luiz de Borba
DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA
O Ministério Público do Estado de Santa Catarina postula a
atribuição de efeito suspensivo à apelação que interpôs à sentença de extinção,
sem resolução do mérito, da ação civil pública n. 0902112-23.2014.8.24.0020.
Alega que, diferentemente do que se colocou na sentença
recorrida, não há "perda de objeto" e que, como por meio dela se revogou a
liminar anteriormente deferida, há veemente risco ao meio ambiente tendo em
vista a possibilidade de a municipalidade se omitir em fiscalizar os lançamentos
diários de esgoto no Rio Linha Anta e em seus afluentes.
É a síntese do essencial.
Trata-se de pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de
apelação (art. 1.012, § 3º, I e § 4º, do CPC/2015) interposto pelo ora postulante à
sentença assim fundamentada:
Vistos etc.
Cuida-se de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado
de Santa Catarina em face do Município de Criciúma, narrando, em síntese,
que foi constatado o lançamento de efluentes domésticos e cloacais a céu
aberto no bairro Imigrantes, neste Município de Criciúma, mais especificamente
na Rua Domingos de Villa, esquina com a Rua João Manuel Debrandino, os
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quais atingem o Rio Linha Anta.
Narrou que tal situação é do conhecimento do réu, que deveria exigir a
adoção de soluções individuais pelos moradores já que a rede pública de
esgoto ainda não atende aquela região.
Requereu a procedência do pedido para condenar o Município de
Criciúma a identificar todas as ligações irregulares/clandestinas de esgoto na
rede pluvial, ou a céu aberto, que atinjam o Rio Linha Anta, lacrando-as.
O Município de Criciúma foi notificado para manifestação preliminar, tendo
apresentado informações, sendo a liminar então deferida (páginas 105/106).
Citado, o Município de Criciúma contestou (páginas 150/159), alegando
preliminarmente sua ilegitimidade passiva, atribuindo à CASAN a
responsabilidade pela obrigação referida na exordial. No mérito, informou que
está implantando uma rede pública de esgotamento sanitário, mas que ainda
assim encaminhou a fiscalização ao local para solução do problema. Pugnou ao
final pela improcedência do pedido.
Houve réplica.
Foi proferida decisão saneadora (páginas 241/242), afastando a preliminar
e determinando a prestação de informações pela Casan e pelo réu.
Após outras providências, vieram os autos conclusos.
É o relatório.
Decido.
Não obstante estarem em andamento as providências para realização da
prova pericial, é sabido que o magistrado, ao prolatar a sentença, deve
considerar eventual alteração dos fatos que influenciem no julgamento do
mérito (art. 493 do CPC).
É o caso dos autos, pois sobreveio questão que torna desnecessária a
produção de prova pericial e permite o julgamento imediato do feito.
Ocorre que na ação civil pública de autos n. 0900399-76.2015.8.24.0020
já houve deliberação judicial no tocante à questão do saneamento básico em
todo o território municipal, desde a regularização das ligações clandestinas ou
irregulares até a ligação à rede pública, nos seguintes termos:
"[...]
1) efetue a fiscalização e regularização dos sistemas individuais e das
ligações à rede pública de esgotamento sanitário, nos seguintes termos:
[...]
1.2) na bacia do Rio Linha Anta, em que a rede pública está em fase de
conclusão, o prazo de 18 (dezoito) meses para tomada das medidas
descritas acima contará a partir da conclusão da obra, desde que a
conclusão ocorra no prazo máximo de 12 (doze) meses; do contrário, se
neste interregno a rede pública na referida bacia não estiver em pleno
funcionamento, deverão ser exigidas soluções individuais;
[...]"
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Como se pode observar, a matéria, no que envolve a microbacia do Rio
Linha Anta (abrangendo portanto toda a área mencionada na inicial), foi
esgotada naquela ACP, acarretando nesta a perda superveniente de objeto,
dispensando nova manifestação deste juízo sobre ponto já decidido.
Ante o exposto, reconheço a falta de interesse de agir ante a perda
superveniente de objeto e, consequentemente, JULGO EXTINTO o processo
nos termos do art. 485, VI, do CPC.
Sem custas nem honorários (art. 18 da Lei n. 7.347/85).
Oficie-se ao Exmo. Sr. Des. Rel. do agravo de instrumento de autos n.
8000430-74.2017.8.24.0000 dando ciência da presente sentença.
É incontroverso que o Município de Criciúma ainda não cumpriu
aquilo que se determinou liminarmente em decisão que, aliás, foi objeto do
Agravo de Instrumento n. 0116868-96.2015.8.24.0000, desprovido por decisão
desta Câmara com base nos seguintes argumentos:
Trata-se de agravo de instrumento em que se questiona a determinação
de que o agravante, o Município de Criciúma, realizasse "vistoria no local sub
judice com o intuito de averiguar a existência de ligações
irregulares/clandestinas junto à galeria pluvial existentes naquela região,
lacrando-as se encontradas" (fl. 61), listando "os proprietários dos imóveis
responsáveis pelas ligações irregulares/clandestinas que porventura sejam
encontradas no local, tudo no prazo máximo de 30 dias" (fl. 61).
Isso porque, segundo se colhe da exordial da ação civil pública de origem,
"no Bairro Imigrantes, mais especificamente na Rua Domingos de Villa, esquina
com a Rua João Manuel Debrandino, está ocorrendo o lançamento a céu aberto
de efluentes domésticos e cloacais, e que esses efluentes estão terminando por
atingir o Rio Linha Anta" (fl. 9). A alegação tem suporte em vistoria e parecer
técnico efetivados por agentes da Fundação Municipal do Meio Ambiente de
Criciúma – Famcri.
Segundo o Parquet, a investigação ordenada por meio da decisão aqui
recorrida é necessária "para que se saiba quem está fazendo desse Rio a sua
fossa séptica e/ou sumidouro" (fl. 10), evitando com isso um "possível surto de
cólera, problemas com o borrachudo e outras doenças provenientes da água
parada ou do próprio Rio, ou ainda do próprio esgoto a 'céu aberto' que passa
pela via pública (ibidem).
No agravo de instrumento, a municipalidade não nega os fatos em
questão e tece considerações imprecisas sobre o suposto custo de semelhante
vistoria, que oneraria em demasia os cofres públicos. Além disso, afirma que
cumpre o seu papel como supervisor do saneamento básico e que a efetiva
responsável pelo meio ambiente no âmbito de seu território seria a Famcri.
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Ora, de um lado, a alegação a respeito do alto custo da medida não
encontra respaldo em nenhum elemento probatório. De outro lado, a assertiva
de que cumpriria – em termos gerais – a sua função como gestor do
saneamento básico não o desincumbe de solucionar a pendência específica
retratada na exordial. Por fim, a Famcri é autarquia vinculada à administração
municipal e, conquanto por certo poderá auxiliar o agravante no cumprimento
da ordem questionada, a sua existência não serve como justificativa para a
municipalidade esquivar-se de suas responsabilidades perante o meio
ambiente.
Quanto ao prazo, como bem enfatizou o recorrido em suas contrarrazões,
verifica-se que já foi elastecido para 120 (cento e vinte) dias em decisão
posteriormente lançada na actio originária, o que se aproxima em muito dos 180
(cento e oitenta) dias sugeridos no recurso.
Ademais, desde o interlocutório recorrido, datado de dezembro de 2014,
já decorreram mais de dois anos e meio e, aparentemente, ao menos do que se
colhe da movimentação processual colhida do SAJ-PG, não há informação
quanto ao cumprimento da expressa ordem.
No mais, adotam-se como razão de decidir os bem lançados fundamentos
pelos quais o Exmo. Sr. Des. Subst. Luiz Zanelato, nestes autos, indeferiu a
antecipação da tutela recursal:
A tutela concedida pelo juízo a quo encontra respaldo constitucional, pois,
visa a proteção do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, no qual se insere a proteção à flora e à fauna, previsto no art.
225 da Constituição da República, que assim estabelece:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-
se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo
para as presentes e futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder
Público:
[...];
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que
coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies
ou submetam os animais a crueldade. (grifou-se).
Deve, portanto, o magistrado, como representante do Poder Judiciário,
pautar as decisões visando a concretização das garantias constitucionais
concernentes aos direitos difusos e coletivos, nos quais o direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado encontra-se encampado.
Com efeito, leciona Romeu Thomé:
O Poder Público é detentor de efetivos meios para "incentivar" a efetiva
preservação do meio ambiente, evitando a concretização do dano ambiental.
(...) É imperioso reconhecer que a preservação do meio ambiente
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ecologicamente equilibrado constitui dever do Estado e esse relevante papel
de proteção ambiental exercido pelo Poder Público não fica restrito apenas à
atuação do Poder Executivo. Nesse sentido, o princípio onze da Declaração
do Tio/92: "Os Estados deverão promulgar leis eficazes sobre o meio
ambiente". O dever de intervenção do Estado na preservação do meio
ambiente incumbe aos três Poderes da República, em todas as esferas de
atuação. (Manual de Direito Ambiental. 2.Ed. Salvador: Juspodivm, 2012, p.
79/80).
Ora, sendo a proteção do meio ambiente saudável e equilibrado dever de
todos, inclusive, com a interferência do Poder Judiciário, descabido o
argumento do agravante de que não dispõe de meios para efetivar a medida
determinada, pois, não foi omisso e a competência para realizar tal ato seria
da Fundação Municipal do Meio Ambiente.
Os autos relatam a existência de esgoto a céu aberto junto à galeria
pluvial localizada na Rua Domingos de Villa, ou seja, o problema ambiental é
ainda mais grave, pois, afeto à própria saúde pública, sendo perfeitamente
legal a determinação da medida em face da municipalidade, ante sua inércia
em resolvê-lo, seja por si ou por meio de suas secretarias, autarquias ou
concessionárias.
Não se olvida que o município não só pode, mas deve, distribuir suas
funções entre os diversos entes em que se desdobra a estrutura da
administração pública, a fim de cumprir o princípio constitucional da
eficiência, todavia, não pode se valer de tal permissivo para se esquivar de
suas obrigações, notadamente, quanto àquelas de proteção constitucional,
como o meio ambiente, a saúde e a educação. Se o agravante entende que
a Fundação Municipal do Meio Ambiente é quem detém condições de
cumprir a obrigação, é dotado dos meios administrativos de coerção para
determinar que o faça.
Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência de nossa Corte de Justiça:
AGRAVO POR INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DECISÃO
DETERMINANDO A TOMADA DE PROVIDÊNCIAS PARA RECUPERAÇÃO
DO RIO ARAÚJO, LOCALIZADO NO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ,
CONSISTENTES NO IMPEDIMENTO DE EVENTUAIS INVASÕES,
DESVIOS E ATERROS, ALÉM DO DESASSOREAMENTO E LIMPEZA DE
TODO O CURSO, COM A RETIRADA DE ENTULHO E LIXO,
PROMOVENDO-SE, AINDA, O REFLORESTAMENTO DO ENTORNO COM
VEGETAÇÃO DE FLORA NATIVA. PROCESSUAL CIVIL. ANÁLISE
VERTICALMENTE SUMARIZADA E NÃO EXAURIENTE, RESTRITA AO
ACERTO OU DESACERTO DO PRONUNCIAMENTO JUDICIAL
COMBATIDO. IMPOSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO DAS ASSERTIVAS
RELACIONADAS A RESPONSABILIDADE DO MUNICÍPIO DE
FLORIANÓPOLIS NO AVENTADO DANO AMBIENTAL PORQUANTO NÃO
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APRECIADAS EM PRIMEIRO GRAU DE JURISDIÇÃO, SOB PENA DE
SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. Tratando-se de agravo por instrumento,
somente se admite a análise do pronunciamento judicial combatido sob a
ótica do acerto ou desacerto do ato hostilizado, desautorizado o exame
aprofundado acerca do mérito da ação em trâmite na origem, sob pena de
supressão de instância. MÉRITO. IRRESIGNAÇÃO DO MUNICÍPIO DE
SÃO JOSÉ, SOB O FUNDAMENTO DE SER DA CASAN,
CONCESSIONÁRIA DO SERVIÇO PÚBLICO DE ÁGUA E ESGOTAMENTO
SANITÁRIO, A RESPONSABILIDADE PELA DEGRADAÇÃO DO MEIO
AMBIENTE. INCONSISTÊNCIA DAS ALEGAÇÕES. OMISSÃO DO ENTE
PÚBLICO MUNICIPAL NA FISCALIZAÇÃO DO CUMPRIMENTO DAS
NORMAS AMBIENTAIS E DO CONTRATO DE CONCESSÃO. DEVER DE
FISCALIZAR ORIUNDO DO PODER DE POLÍCIA. OBRIGAÇÃO
CONSTITUCIONAL DE PROTEGER O MEIO AMBIENTE. DECISÃO
ESCORREITA. DEFESA DO INTERESSE DA COLETIVIDADE. APLICAÇÃO
DO PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO. [...]. (TJSC, Agravo de Instrumento n.
2012.020756-0, de São José, rel. Des. Carlos Adilson Silva, j. 21-5-2013).
Dessa forma, não se descarta que a referida fundação poderia constar do
polo passivo da lide, o que não é objeto deste recurso, mas impossível
excluir a responsabilidade do município em solucionar um problema
ambiental grave, cuja ciência possui há mais de dois anos. Pouco crível,
ainda, supor que não houve omissão por parte do agravante em permitir que
problema tão grosseiro persista por tantos anos.
Aliás, destaca-se que nas informações prestadas ao juízo de origem,
conforme se extrai de consulta realizada no Sistema de Automação do
Judiciário (SAJ), o recorrente, ao contrário do que sustenta neste recurso,
afirmou que a responsabilidade pela solução do problema é da CASAN.
Possível perceber, portanto, que a municipalidade tenta, de toda forma,
esquivar-se de sua obrigação em manter o meio ambiente equilibrado.
No que toca ao prazo de trinta dias para a execução da medida, não
obstante os argumentos do recorrente, verifica-se que a ação civil pública é
datada de 19-2-2013 (fl. 28-v), ou seja, há mais de dois anos que a
municipalidade tem conhecimento dos fatos, sem, contudo, realizar medida
efetiva para solucioná-lo. Ora, se o problema é anterior ao ano de 2013, ao
recorrente já foi concedido prazo bastante extenso para que o resolvesse
voluntariamente, porém, pelo que refletem os autos, prefere a inércia. Aliás,
destaca-se que não colacionou ao presente agravo de instrumento qualquer
documento hábil a demonstrar a razão do prazo ser exíguo, ônus que lhe
incumbia a teor do que dispõe o art. 525, II do CPC (fls. 66-69).
Ante o exposto, o recurso deve ser conhecido mas desprovido (grifos do
original).
Data venia, sem que haja o efetivo cumprimento daquilo que aqui
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se pretende, inviável cogitar da perda do interesse de agir; a mera existência de
uma outra demanda, cujo escopo abrangeria a medida colimada nesta actio –
específica quanto ao deságue de esgoto no Rio Linha Anta, em Criciúma –, em
tese pode ensejar litispendência, continência ou coisa julgada, mas não a "perda
de objeto".
Ademais, a revogação da liminar antes deferida traz consigo risco
de graves danos ao meio-ambiente, pois com isso, implicitamente, está-se
autorizando temporariamente se renovem os lançamentos de resíduos sólidos no
rio em questão.
Assim, em vista da relevância na fundamentação recursal e no risco
de dano grave ao meio-ambiente, estão preenchidos os requisitos do art. 1.012,
§ 4º, do CPC/2015.
Ante o exposto, defiro o pedido retro e atribuo efeito suspensivo ao
apelo interposto na ação civil pública n. 0902112-23.2014.8.24.0020, mantendo-
se os efeitos da liminar anteriormente deferida até o julgamento do recurso.
Comunique-se ao MM. Juízo a quo.
Intimem-se e, esvaído o prazo recursal, arquivem-se, com as baixas
cadastrais de estilo.
Florianópolis, 16 de outubro de 2017
Desembargador Jorge Luiz de Borba
Relator
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