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TEMA CENTRAL: O REGIME CONSTITUCIONAL DAS
ASSOCIAÇÕES CIVIS
Ayres Britto
CONSULTORIA JU RÍD ICA E ADVOCACIA
—A validade da proteção associativo-civil de veículos automotores de
propriedade privada
—A insubmissão das associações civis de proteção veicular ao regime
jurídico-securitário propriamente dito
Natureza do estudo: parecer jurídico
Consulente: Federação Nacional das Associações de Benefícios
Parecerista: Carlos Ayres Britto
Ayres Britto
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Parecer Jurídico
1. A natureza do estudo. 2. O objeto da consulta e
respectiva autora. 3. O quadro factual-jurídico
subjacente à consulta. 4. Os quesitos da consulente.
5. A parelha temática da consulta e sua matriz
constitucional. 6. A liberdade de associação como
direito tão fundamental quanto individual e ainda de
exercício coletivo. 7. As associações civis de
proteção veicular como ponto constitucional de
confluência dos direitos fundamentais da liberdade
e da propriedade privada. 8. Os conteúdos positivos
da liberdade de associação. 9. A liberdade de
associação em caráter pleno e sua direta
conformação constitucional quanto às respectivas
finalidades. 10. A liberdade de associação como
direta emanação ou conteúdo do princípio da
dignidade humana. 11. O sentido não econômico
das associações. 12. Os seguros privados enquanto
atividade financeira e específico ramo de negócio.
13. A matriz constitucional dos seguros privados e
sua disciplina complementarmente legal. 14. O
Decreto-lei n” 73/66 e o Sistema Nacional de
Seguros Privados. 15. O seguro como fórmula
contratual de transferência intersubjetiva de riscos
mediante paga. 16. A fundamental distinção entre
contrato de seguro e a forma associativo-civil de
proteção patrimonial privada. 17. A confirmação
sistêmica e teleológica da distinção entre seguros e
associações e associações de proteção veicular. 18.
Respostas pontuais aos quesitos dos consulentes.
19. FECHO.
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1. A natureza do estudo
1.1. O estudo, que ora inicio, é constitutivo de parecer jurídico. Assim
entendido o ponto de vista resultante da objetiva descrição dessa ou daquela
figura de Direito Positivo. Descrição puramente objetiva dessa ou daquela
figura de Direito Positivo, sim, feita na perspectiva da identificação do
respectivo regime jurídico. Sem se confundir, todavia, nem com decisão judicial
nem com postulação perante qualquer instância pública já situada do lado de fora do
PoderJudiciário mesmo.
1.2. Quanto ao conceito de regime jurídico, faço-o no sentido técnico
de modo normativo de ser de qualquer tema da vida que o Direito
Positivo venha a tomar alvo de suas abstratas enunciações. Venha a
tomar alvo ou conteúdo desse ou daquele dispositivo em apartado, ou então
já imerso no sistema de comandos em que ele, Direito Positivo, afinal se
constitui. Com o que passam a se identificar tema da vida a conhecer por
modo técnico e figura de Direito a revelar por modo objetivo. Imparcial,
portanto.
2. O objeto da consulta e respectiva autora
Identifico o objeto da consulta e sua autora. Esta, a Federação Nacional
das Associações de Benefícios (“Fenaben”), associação de Direito totalmente
privado, com sede administrativa no Município mineiro de Contagem. Aquele,
consistente no exame de constitucionaHdade das chamadas associações civis
de proteção de veículos automotores de propriedade privada. Associações de
proteção veicular, assim comumente referidas para dar conta das pessoas
jurídicas de direito privado: a) que tenham por objeto social a tutela
financeiro-coletiva de veículos dos respectivos associados; b) desprovidas de
qualquer finalidade lucrativa por parte delas próprias, associações civis
particulares. Mais precisamente, trata-se de entidades associativas privadas que
se constituem com o fito de assumir, assim por modo coletivo, as
consequências financeiras de eventuais furtos, roubos, incêndios ou então
colisão de veículos automotores de propriedade particular. Eventos lesivos,
portanto, da propriedade veicular que os respectivos associados detenham a
título jurídico privado.
3. O quadro factual-jurídico subjacente à consulta
3.1. Quanto ao espectro factual-jurídico subjacente ao presente esmdo,
narra a consulente que as associações em causa adotam dois modelos de
operação, ora isolada, ora conjugadamente. O primeiro deles, constituído por
um fundo mútuo ou mediante contribuições periódicas dos próprios
associados. Já o segundo, esse toma a forma de rateio dos prejuízos advindos
de eventos danosos e efetivamente apurados. Contribuições e aportes
individuais, contudo, a serem graduados de acordo com o valor dos veículos
de propriedade de cada associado.
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3.2. Prossegue a consulente para informar que a Superintendência de
Seguros Privados (“Susep”) e o Ministério Público Federal vêm ajuizando
ações civis públicas para o fim da declaração judicial da ilicitude de toda
associação civil que tenha por objeto a sobredita proteção veicular privada.
Isso por suposta violação aos arts. 757 do Código Civil e 24 do Decreto-lei n°
73/1966. Dispositivos que, segundo as duas tipologias de instâncias
acionantes, condicionam a exploração comercial de seguros ã prévia/
autorização estatal e à incidência de um peculiar regime jurídico securitário.
Eis o teor de ambos os enunciados normativos, na ordem em que citados:
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“Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do
prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos
predeterminados.
Parágrafo único. Somente pode ser parte, no contrato de seguro, como segurador, entidade
para tal fim legalmente autorÍ2ada”
“Art 24. Poderão operar em seguros privados apenas Sociedades Anônimas ou
Cooperativas, devidamente autorizadas.
Parágrafo único. As Sociedades Cooperativas operarão unicamente em seguros agrícolas,
de saúde e de acidentes do trabalho.”
4. Os quesitos da consulente
Pois bem, nesse inicial contexto fático-normativo da minha atuação
como parecerista, já se percebe que o nógórdio a desatar reside na comparação
entre a forma associativa de proteção contra danos à propriedade privada e o
regime jurídico das atividades securitárias. Exame que há de afunilar para a
ministração de respostas pontuais aos quesitos formulados pela própria
consulente. Ei-los:
I - “Do ponto de vista da materialidade jurídica, há identidade entre o
contrato de seguro, de um lado, e, de outro, o ingresso e a efetiva
participação em uma associação de proteção veicular?”
II —“A proteção patrimonial mútua e recíproca entre associados traduz
uma finalidade social lícita?”
III —“As associações de proteção veicular devem ser submetidas à
fiscalização pela SUSEP?”
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5. A parelha temática da consulta e sua matriz constitucional
É precisamente à luz da narrativa e da quesitação feitas pela própria
consulente que passo a tecer considerações técnicas sobre o tema central da
consulta. Tema que, no rigor dos termos, consiste na diferenciação jurídica
entre a liberdade de associação e o complexo das normas atinentes ao
chamado Direito dos Seguros. Dando-se que uma e outra matéria têm na
própria Constimição Federal a sua primeira enunciação normativa. Vale dizer:
é na Lei das Leis brasileiras que liberdade de associação e ramo securitário do
Direito encontram seu imediato lócus de positivação jurídica. Donde a
reprodução dos seguintes e pertinentes dispositivos:
“Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se
aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar;
XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de
autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento;
(...)
XIX - as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades
suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado;
XX - ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado;
XXI - as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para
representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente;
(•••)
LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:
(...)
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b) organÍ2ação sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em
funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou
associados”.
“Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá,
na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este
determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.
(...)
§ 2“A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo.”
“Art. 21. Compete à União:
(...)
VIII - administrar as reservas cambiais do País e fiscalizar as operações de natureza
financeira, especialmente as de crédito, câmbio e capitalização, bem como as de seguros e
de previdência privada;”
“Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
(...)
VII - política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores”.
“Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:
(...)
V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobihários;”
6. A liberdade de associação como direito tão fundamental quanto
individual e ainda de exercício coletivo
6.1. Da leitura de todos esses dispositivos, salto, de imediato, para a
revelação do regime constitucional das associações. O que faço para assentar,
de saída, que elas são pessoas jurídicas civis ou não mercantis,
voluntariamente constituídas. Espontaneamente constituídas por pessoas
físicas, em seu formato mais simples. E no uso da autonomia de vontade em
que se se constitui a liberdade individual de se autodeterminar juridicamente.
Logo, as associações como direta expressão da liberdade individual que se
consorcia com outra(s) para o alcance de um objetivo comum.
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6.2. Cuida-se, em necessário complemento cognitivo, da figura jurídica
da “associação” como pessoa jurídica plural ou coletiva. Não como pessoa ou
sujeito individual de Direito. Pessoa coletiva que titulari2a direitos, suporta
deveres e contrai obrigações em seu próprio nome. A significar um
personalizado centro de imputação jurídica, em linguagem kelseniana^. Um
sujeito coletivo de direitos, remarque-se. Ou pessoa coletiva que detém o
status de entidade ou sujeito jurídico por si mesmo, com seus órgãos internos
de deliberação e execução. Mas isso como produto, pronto e acabado, do
exercício de uma liberdade assim fundamental como individual, a que se dá o
preciso nome de liberdade... “de associação” (inc. XVII do art. 5° da C.F.).
Mais exatamente falando, cuida-se da liberdade que se outorga “aos brasileiros
e aos estrangeiros residentes no País” (cabeça do art. 5°) para congregarem-se
em torno de objetivos tão comuns a todos eles quanto juridicamente lícitos.
Vedados os de caráter paramilitar. Daí Pontes de Miranda falar das
associações como “coligação voluntária de algumas ou de muitas pessoas
físicas, por tempo longo, com o intuito de alcançar algum fim (lícito), sob
direção unificante”^.
’ Ver KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 6 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
2 FERREIRA MENDES, Gilmar; MÁRTIRES COELHO, Inocêndo; GONET BRANCO, Paulo Gustavo,
Curso de Direito Constituáonal, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 365.
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6.3. Também de se reiterar, ainda tecnicamente, que essa liberdade de
organÍ2ação coletiva homenageia a atuação formalmente plural dos indivíduos.
É a Constituição a reconhecer que não apenas o indivíduo sozinho ou isolado
dos outros é que merece protagonizar direitos, deveres e obrigações. A
coletividade que se forma de pessoas namrais portadoras de reclamos ou
pretensões comuns é uma coletividade que, por igual, se faz digna de amparo
e promoção diretamente constitucionais. Ela mesma, coletividade, como um
desdobramento ou uma das muitas formas de expressão da personalidade
individual, a atestar que certos objetivos lícitos somente serão alcançados, ou
então mais facilmente realizados, se a respectiva procura se der em regime de
permanente colaboração entre pessoas físicas ou naturais. Que é um típico
regime de válida enturmação ou lícito agir gregário, portanto.
7. As associações civis de proteção veicular como ponto constitucional
de confluência dos direitos fundamentais da liberdade e da propriedade
privada
7.1. Daqui já se desata o claro entendimento de que o direito de se
associar é do tipo individual, mas de exercício necessariamente plural ou
coletivo. Direito da espécie individual, porque seu pressuposto de gozo é tão-
somente a condição de ser humano. O fato da humanidade que reside em
cada pessoa natural, independentemente do desempenho de qualquer papel
social que ela venha a desempenhar. Direito de exercício necessariamente
entuTwado, então, pois ninguém se associa consigo mesmo para nenhuma ,
/
finalidade da vida em concreto.
7.2. No caso da associação que se faz objeto da consulta, ajunte-se que
se cuida de congregação humana para a melhor disposição individual desse
outro bem jurídico de nome “propriedade”, nos termos do inciso XXII do
art. 5° da Constituição. Propriedade ou, mais exatamente, “propriedade
privada”, já agora conforme o enunciado que se lê no inciso II do artigo
constimcional de n° 170. Saltando à evidência que a propriedade privada é
autêntico bem de personalidade, no clássico sentido de que, sem a garantia de
sua “inviolabilidade”, a vida humana se reduziria a subvida. O indivíduo, a
sub-indivíduo. O cidadão, a subcidadão. Tudo de parelha com igual garantia
da inviolabilidade dos bens jurídicos da “liberdade” mesma, da “igualdade” e
da “segurança”, na precisa dicção do caput do art. 5° da Magna Carta Federal,
verbir.
“Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se
aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)”■
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7.3. Com esse necessário visual englobado dos dois direitos
fundamentais (liberdade de associação e propriedade privada), porquanto, no
caso, em essencial imbricação de funcionalidade, já posso retornar aos
mencionados incisos XVIII, XIX e XX do art. 5° da Lei Fundamental. Faço-
o, todavia, no tópico entrante de idéias, para poder interpretá-los com mais
acentuado foco. Mais acenmado foco e segundo a mesma lógica do
imbricamento operacional dos encarecidos bens jurídicos da liberdade de
associação e da propriedade privada.
8. Os conteúdos positivos da liberdade de associação
10
8.1. Deveras, todos esses dispositivos constitucionais (incisos XVIII,
XIX e XX do art. 5° da Constituição) se interpenetram em congruente
funcionalidade. São rigorosamente constitutivos de um amálgama de
faculdades jurídicas^. Um todo pro-indiviso, então, a partir do dado essencial de
que a espécie de liberdade com que trabalha a Constituição é expressamente
clausulada como “plena” (inciso XVII). O que explica o reconhecimento dela,
liberdade de associação, como um plexo de situações jurídicas ativas tão
particulares quanto predispostas a uma titularidade que independe, para o seu
efetivo gozo, de autorização estatal. Plexo ou conjunto de direitos, atente-se,
já acompanhado da respectiva garantia de que o Estado tampouco interferirá
no funcionamento desse mesmo tipo de associação. Sabido que interferir é se
imiscuir ou se intrometer nos assuntos internos de cada uma delas, tanto
quanto intervir é assumir a respectiva direção. Donde apenas incumbir ao
Poder Público operar como instância de registro formal de cada unidade
associativo-civil. Não como instância propriamente autorizativa da
constituição em si de tais personificações coletivo-privadas. Torno a
transcrever o comando constitucional:
“Art. 5“ (...)
XVIII —a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de
autorÍ2ação, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento”.
8.2. Nesse mesmo diapasão protetivo-promocional é que segue a
Constituição para colocar as associações civis a salvo, também, da dissolução
ou suspensão de suas atividades por modo tão compulsório quanto inopinado
e autoritário. Isso por força do inc. XIX do mesmo art. 5°, segundo o qual “as
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3 FERREIRA MENDES, Gümar; MÁRTIRES COELHO, Inocêncio; GONET BRANCO, Paulo Gustavo,
Curso deDireito Constituáonal, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 393.
11
associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas
atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o
trânsito em julgado”. Sucedendo que, a essa nova garantia, se somam todas as
outras inerentes ao processo judicial, notadamente o devido processo legal
(inc. LIV do art. 5°), o contraditório e a ampla defesa (inc. LV, iguaknente do
art. 5°).
8.3. Cogita-se, destarte, de uma liberdade de dupla face: perante o
Estado mesmo e para optar por uma pluralidade de organização privada, com
os respectivos e também variados objetos. Liberdade como autonomia de
vontade ou direito de se autodeterminar em tema de criação de cada entidade
associativa, já foi dito. Por conseguinte, direito de criar e pôr em atividade essa
pessoa jurídica de nome associação e de dirigi-la a partir de uma determinada
estmtura administrativa também livremente formatada. Mas não é só. A
liberdade como autonomia de vontade ainda se manifesta no plano da filiação
e da desfiliação, mormente na enfatizada perspectiva funcional com o bem
jurídico-fundamental da propriedade privada. Confira-se:
“Art. 5“ (...)
XX —ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado”
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9. A liberdade de associação em caráter pleno e sua direta conformação
constitucional quanto às respectivas finalidades
9.1. Convém repetir o juízo: a Constituição qualifica a liberdade de
associação com o timbre da plenitude. Com a definitiva marca —devido a que
12
também cláusula pétrea, nos termos do inciso IV do § 4° do art. óO'^- de uma
inteireza de desfrute que só encontra limites no próprio texto constimcional.
É o que se lê do inc. XVII do art. 5°, que volto a transcrever para a perpétua
memória de tão categórica asserção: “é plena a liberdade de associação para
fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar”.
9.2. O que se vê, portanto, desse tão peregrino quanto altissonante
dispositivo jurídico é que a Magna Carta brasileira franqueia aos particulares
toda iniciativa de associativismo civil que não transborde para o campo das
organizações paramilitares. Somente isso. Impondo tal vedação, lógico, por se
referir a tipos de associações atentatórias à noção elementar de Estado de
Direito. Mais até, afrontosa da ideia mesma do “Estado Democrático de
Direito” que se lê desde a cabeça do artigo introdutório dela própria.
Constituição Federal^. Assim como dispõe o inciso XElV" do mesmíssimo art.
5°, que faz da “ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem
constitucional e o Estado Democrático” um delito da espécie inafiançável e
imprescritível.
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“Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
§ 4° Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir;
!-(...)
IV - os direitos e garantias individuais.”
* “Art. 1° A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do
Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I -(...)”
^“Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e
aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
I -(...)
XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a
ordem constitucional e o Estado Democrático;”
13
10. A liberdade de associação como direta emanação ou conteúdo do
princípio da dignidade humana
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10.1. Também daqui já se desprende o nítido entendimento de que as
associações civis se põem como instituições servientes da robustez do
princípio da “dignidade da pessoa humana” (inc. III do art. 1° da
Constituição^). Sendo certo que o princípio da dignidade da pessoa humana,
como explícito fundamento da República Federativa do Brasil, traduz o
formal reconhecimento de que a humanidade de cada um de nós já é título de
legitimação suficiente para sua positivação constimcional como fonte de
direitos fundamentais. Positivado reconhecimento que não é senão o Direito
Constimcional brasileiro a se autoconferir a láurea de documento jurídico
civÜizado. Humanista. Democrático, enfim®.
10.2. O engate lógico das coisas já toma assento: associação é fórmula
jurídica de expressão e expansão da personalidade humana. De incremento
das potencialidades individuais e de reforço eficacial da liberdade de ação em
geral. Com a vantagem de ter por base constimtiva uma coletividade de
pessoas namrais estavelmente coligadas. O que já serve como instrumento
normativo de promoção da solidariedade e da cooperação, na medida em que
tal associação lícita de pessoas se faz é na alentadora perspectiva de um mais
otimizado somatório de conhecimentos e experiências. Uma comunhão de
esforços ou uma congregação subjetiva para o que? Para uma objetiva
agregação de direitos de personalidade e até de princípios fundamentais (como
^“Art. 1“ A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do
Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos;
III - a dignidade da pessoa humana;”
8
Ver AYRES BRITTO, Carlos. O humanismo como categoria constitucional. 1. ed. 3. reimp. Belo Horizonte:
Fórum, 2016
14
O nunca demasiadamente encarecido princípio da dignidade da pessoa
humana). Espécie de affectio soáetatis que, no tocante às associações, ostenta um
relevante ponto de especificidade operacional: o caráter necessariamente não-
econômico de suas ações e finalidades.
11. O sentido não econôntico das associações
11.1. Com efeito, na acepção limpidamente constitucional de que venho
cuidando, a associação par excellence é aquela que não faz de suas ações e
finalidades sociais um mister econômico; ou, pelo menos, que não
desempenha atividades econômicas como um fim em si mesmo^. Sabido que
são os empresários (e as sociedades empresárias) os protagonistas típicos das
atividades negociais. São eles que, por vocação e tino mercantil, fazem da
produção econômica uma atividade regular e passível de profissionalização.
Um meio de vida e uma razão de viver. A implicar o processo de
metamorfose jurídica da livre iniciativa empresarial em empresa
empiricamente estabelecida. Donde a Constituição erigir a figura jurídica da
empresa a papel central no enredo normativo da “Ordem Econômica e
Financeira” (Título VII da Lei Maior). É o que resulta dos seguintes
dispositivos constitucionais: inc. IX do art. 170; §§ 1“ (e seu inc. II), 2° e 3°,
todos do art. 173; inc. I do parágrafo único do art. 175; §1®do art. 176; §1° do
art. 177; art. 179'^
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ROBERTO GONÇALVES, Carlos. Dinito CivilBrasileiro. 8* ed. São Paulo, Saraiva; 2010, p. 234.
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorÍ2ação do trabalho humano e na hvre iniciativa, tem por
fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes
princípios:
IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que
tenham sua sede e administração no País. (Redação dada pela Emenda Constitucional n° 6, de 1995)”.
15
Ayres Britto
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11.2. Por desígnio constitucional, então, é a empresa a instituição
juridicamente vocacionada para a exploração direta das atividades econômicas
{caput do art. 173). Exploração no sentido da combinação otimizada dos
chamados fatores da produção, residentes em capital, trabalho, natureza,
conhecimento e tecnologia, marcadamente. Mais até do que isso, um tipo de
organização dos fatores de produção pré-ordenado a ganhos pecuniários
redutíveis ao substantivo “lucros”. Por definição.
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo
Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse
coletivo, conforme definidos em lei.
§1” A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas
subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialÍ2ação de bens ou de prestação de
serviços, dispondo sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional n° 19, de 1998)
II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações
civis, comerciais, trabalhistas e tributários; (Incluído pela Emenda Constitucional n" 19, de 1998)
III-(...)
§ 2“ As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não
extensivos às do setor privado.
§ 3“A lei regulamentará as relações da empresa pública com o Estado e a sociedade.
Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão,
sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.
Parágrafo único. A lei disporá sobre:
I - o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu
contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou
permissão;
Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica
constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à
União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra.
§ 1° A pesquisa e a lavra de reciursos minerais e o aproveitamento dos potenciais a que se refere o "caput"
deste artigo somente poderão ser efetuados mediante autorização ou concessão da União, no interesse
nacionaL por brasileiros ou empresa constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no
País, na forma da lei, que estabelecerá as condições específicas quando essas atividades se desenvolverem em
faixa de fronteira ou terras indígenas. (Redação dada pela Emenda Constitucional n“ 6, de 1995)
Art. 177. Constituem monopóUo da União:
I -(...)
§ 1° A União poderá contratar com empresas estatais ou privadas a realização das atividades previstas nos
incisos I a IV deste artigo observadas as condições estabelecidas em lei. (Redação dada pela Emenda
Constitucional n“ 9, de 1995)
16
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11.3. Nesse ritmo argumentativo, fácil é confirmar o entendimento de
que a associação (por não ser empresa) tem como nota característica a índole
não-empresária de sua finalidade social. O que não impede o exercício da
atividade produtiva enquanto meio para a consecução dos objetivos
associativos. Por essa elementar consideração que o art. 53 do Código Civil
brasileiro conceitua a associação como “a união de pessoas que se organÍ2em
para fins não econômicos”. Dando-se que o exercício da liberdade de
associação opera numa ambiência constitucional apartada dos princípios e
regras que informam a ordem econômica e financeira. A exceção ficando por
conta do §2° do art. 174, segundo o qual “A lei apoiará e estimulará o
cooperativismo e outras formas de associativismo”. Sem que isso implique,
entretanto, o reconhecimento de um caráter empresarial à estrutura das
associações. Ao contrário, o que se extrai do dispositivo constitucional é a
proclamação jurídica de que a união de esforços individuais, desde que
reciprocamente orientados em tomo de um ente associativo, traduz um modo
tão legítimo quanto especiabnente eficaz de obtenção de utilidades materiais.
Um modo não mercadológico —porquanto associativo-civil em sentido
próprio —de cadastro de bens e prestação de serviços. Com o que se tem
serviços, bens e vantagens materiais a serem administrados, direta ou
indiretamente, pela iniciativa de cada associado. Gerenciamento tão endógeno
quanto voltado para o consumo (igualmente interno) daqueles que integram o
círculo social formalmente constituído em associação. Tratando-se, nesse
sentido, de um modelo autorreferido —e não inter-referente, como é próprio
das empresas - de atuação produtiva ou economicamente material. Um modo,
ainda por cima, de mais ampliada compleição sistêmica, pois o instituto da
associação já serve à vitaüzação do princípio da dignidade da pessoa humana,
como pude dizê-lo logo acima. Não por outra razão o §2° do art. 174 da
17
Constituição Federal impõe à lei apoiar e estimular o associativismo. Assim
por modo normativamente destacado.
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12. Os seguros privados enquanto atividade financeira e específico
ramo de negócio
12.1. Avanço. Avanço na direção do segundo bloco temático, retratado
no ramo securitário do Direito. Ramo que também deita raÍ2es na Lei Maior,
nomeadamente nos dispositivos que tenho como necessário tomar a
transcrever. São eles, agora por modo focado ou apartado do conjunto
anteriormente reproduzido;
“Art. 21. Compete à União:
(...)
VIII - administrar as reservas cambiais do País e fiscalizar as operações de natureza
financeira, especialmente as de crédito, câmbio e capitalização, bem como as de seguros e
de previdência privada;”
“Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
(...)
VII - poHtica de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores;”
“Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:
(...)
V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários;”
12.2. Dessa nova reprodução de textos normativo-constitucionais,
tenho que uma primeira exegese se impõe: os seguros traduzem um bem
delimitado tipo de atividade econômica. Noutro falar, os seguros compõem
um ramo autônomo de negócio ou atividade empresarial, tendo por objeto
um bem da vida intra comertium. Mercantil, por definição constitucional. Aberto
18
à exploração econômica ou afazer negociai. Tipo de atividade que, na própria
Constituição, é inerente ao ambiente de mercado. Isso porque tanto os arts.
21 e 22 quanto o art. 153 inserem todos eles (os misteres securitários) no
mesmo contexto normativo das atividades financeiras (Capítulo IV do Título
VII da Constituição). Daí a citação igualmente constitucional às operações de
crédito, câmbio, transferência de valores e capitalização, todas elas a ter na
gestão ou disponibiüzação do dinheiro o dado elementar do processo
produtivo ou agenciamento econômico. Exatamente o que sucede com a
relação jurídica securitária, em que o dinheiro, na figura contratual do
/
“prêmio”, ocupa com centralidade a dinâmica negociai. E o que tento expHcar
um pouco mais à frente. Não sem antes comentar os termos da disciplina legal
da atividade de oferta de seguros, justamente, e de sua focada matriz
constitucional.
13. A matriz constitucional dos seguros privados e sua disciplina
complementarmente legal
13.1. Com este novo mister analítico, assento que é o Decreto-lei n° 73,
de 21 de novembro de 1966, que dispõe sobre o “Sistema Nacional de
Seguros Privados” e “regula as operações de seguros e resseguros”. Diploma
que foi constitucionalmente recepcionado com o status de lei complementar.
Isso nos termos da redação originária do inc. II do art. 192 da Constituição e
do caput mesmo art. 192, já pela dicção da Emenda Constitucional de n°
40, de 2003, litteris-,
“Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o
desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, será regulado
em lei complementar, que disporá, inclusive, sobre:
!-(...)
Ayres Britto
CONSULTORIAJURÍDICA E ADVOCACIA
19
Ayres Britto
CONSULTORIAJURÍDICA E ADVOCACIA
II - autorização e funcionamento dos estabelecimentos de seguro, previdência e
capitalização, bem como do órgão oficial fiscaüzador e do órgão oficial ressegurador;” (sem
os destaques originalmente)
“Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o
desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as
partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis
complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas
instituições que o integram. (Redação dada pela Emenda Constitucional n” 40, de 2003)”
(igualmente não destacado no original)
13.2. Ora bem, ao franquear à lei complementar a regulamentação do
sistema financeiro nacional —e assim dos seguros, especificamente —, o artigo
constitucional de n° 192 nada mais fez do que relançar, embora por modo
centrado, a possibilidade de a lei sujeitar essa ou aquela atividade econômica
sujeita à autorização estatal. Possibilidade já avançada pela parte final do
parágrafo único do art. 170; à lei cabendo, tão somente, nominar essa ou
aquela atividade que, mesmo de feição econômica, reclame autorização do
Poder Público para a sua empírica exploração. Mas entenda-se: atividade
econômica sujeita a ato autorizativo do Estado apenas quanto ao
preenchimento de certos requisitos para, justamente, sua concreta exploração.
Não quanto à possibilidade de a lei passar a dizer o que seja e o que não seja
de natureza econômica, porque tal qualificação a Constituição já o fez. E já o
fez pela facilitada técnica da exclusão: o que não estiver constimcionalmente
definido como de exclusivo senhorio ou titularidade estatal, remanesce como
atividade passível de exploração econômica privada. Simples assim. Confira-
se:
“jrt. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre
iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça
social, observados os seguintes princípios (...);
20
I -(•••);
IX
Parágrafo único. E assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica,
independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei”
14. O Decreto-lei n”73/66 e o Sistema Nacional de Seguros Privados
14.1. Muito bem. E do Decreto-lei n° 73/66, quais os juízos técnicos
dele defluentes? Quais os elementos que se inscrevem na compostura
normativa do instituto? Instimto jurídico em que o seguro consiste? Minha
particular resposta, do ângulo daquilo que tenho como de maior préstimo para
o equacionamento das questões formuladas na consulta:
I —a atividade securitária opera debaixo de um Sistema Nacional de
Seguros Privados (art. 8°^^). Sistema constituído: a) por um Conselho
Nacional de Seguros Privados —CNSP; b) pela Superintendência de
Seguros Privados - SUSEP; c) pelos resseguradores; d) pelas sociedades
autorizadas a operar em seguros privados; e) pelos corretores
habilitados;
Ayres Britto
CONSULTORIA JU RÍD ICA E ADVOCACIA
a) do Conselho Nacional de Seguros Privados - CNSP;
b) da Superintendência de Seguros Privados - SUSEP;
c) dos resseguradores; (Redação dada pela Lei Complementar n° 126, de 2007)
d) das Sociedades autorizadas a operar em seguros privados;
e) dos corretores habilitados.”
21
II - a relação jurídica de seguro é de natureza contratual (arts. 9” e 10^,
a significar uma relação interpartes ou bilateral, fundada no ajuste de
vontades em torno de certos bens jurídicos;
III — como instrumento de vinculação jurídica entre partes, os
contratos de seguro são, ainda, sinalagmáticos; ou seja, estabelecem
obrigações e direitos recíprocos. O que já implica a ideia de
onerosidade, pois à fruição da garantia securitária há de corresponder,
sempre, o pagamento pecuniário de nome “prêmio” (art. 12^;
IV - estão habilitadas a explorar o ramo dos seguros privados somente
as pessoas jurídicas estruturadas sob a forma de sociedade anônima ou
cooperativa, e desde que devidamente autorizadas pelo CNSP e
permanentemente fiscalizadas pela SUSEP (art. 24^'*, conjugado com a
ahnea “a” do art. 36'^ e o art.
Ayres Britto
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Art 9° Os seguros serão contratados mediante propostas assinadas pelo segurado, seu representante legal
ou por corretor habilitado, com emissão das respectivas apólices, ressalvado o disposto no artigo seguinte.
Art 10. E autorizada a contratação de seguros por simples emissão de bilhete de seguro, mediante sohcitação
verbal do interessado.
13 A •
Art 12. A obrigação do pagamento do prêmio pelo segurado vigerá a partir do dia previsto na apóhce ou
bilhete de seguro, ficando suspensa a cobertura do seguro até o pagamento do prêmio e demais encargos.
Parágrafo único. Qualquer indenização decorrente do contrato de seguros dependerá de prova de pagamento
do prêmio devido, antes da ocorrência do sinistro.
*“*Art 24. Poderão operar em seguros privados apenas Sociedades Anônimas ou Cooperativas, devidamente
autorizadas.
Parágrafo único. As Sociedades Cooperativas operarão únicamente em seguros agrícolas, de saúde e de
acidentes do trabalho.
Art 36. Compete à SUSEP, na qualidade de executora da política traçada pelo CNSP, como órgão
fiscalizador da constituição, organização, funcionamento e operações das Sociedades Seguradoras:
a) processar os pedidos de autorização, para constituição, organização, funcionamento, fusão, encampação,
grupamento, transferência de controle acionário e reforma dos Estatutos das Sociedades Seguradoras, opinar
sôbre os mesmos e encaminhá-los ao CNSP;
Art 74. A autorização para funcionamento será concedida através de Portaria do Ministro da Indústria e do
Comércio, mediante requerimento firmado pelos incorporadores, dirigido ao CNSP e apresentado por
intermédio da SUSEP.
22
14.2. À guisa de síntese, desprende-se da chamada lei de seguros que a
atividade securitária se desenvolve num ambiente de mercado intensamente
regulamentado, a partir de interações contratuais onerosas. Relações jurídico-
contramais, sim, a pressupor um ponto de unidade jurídica entre interesses
materiais contrapostos. De um lado, interesses puramente financeiros ou
lucrativos ou remuneratórios da pessoa jurídica da seguradora; de outro, os
mais diversos interesses patrimoniais, a garantir como específico objeto de
disposição jurídica por parte do segurado.
15. O seguro como fórmula contratual de transferência intersubjetiva de
riscos mediante paga
15.1. Neste penúltimo ponto de ponto de enfrentamento cognitivo do
tema, impõe-se-me projetar meu olhar interpretativo para o art. 757 do
Código Civil. Dispositivo que principia a disciplina do seguro enquanto
contrato típico ou nominado, fazendo-o, precisamente, pela revelação de sua
natureza assim bilateral como contraprestacional ou sinalagmática. Ei-lo:
Ayres Britto
CONSULTORIA JURÍDICA E ADVOCACIA
Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio,
a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos
predeterminados.
15.2. De pronto, anoto que o contrato de seguro entrelaça,
necessariamente, sujeitos de direito que figuram nas contrapostas posições de
segurador e segurado. Sendo que o segurador há de ser “entidade para tal fim
legalmente autorizada”, agora por força do parágrafo único do mesmo art.
757. Já no plano conteudístico ou de pura substância, a avença entre partes se
pecubariza pelo toma-lá-da-cá entre uma prestação pecuniária (de nome prêmio,
repiso) e uma outra mais complexa e que não é senão a garantia de um
23
determinado interesse do segurado: os riscos de dano pessoal ou então
patrimonial, devidamente preestabelecidos ou estipulados. Garantia, a seu
turno, a abranger não somente a cobertura do dano efetivamente apurado,
como também a mera assunção do risco. Com o que o simples se prontificar à
cobertura dos prejuízos que venham a se materializar já passa a configurar
uma postura de centrada valia jurídico-contratual. Dando causa, por si só, à
exigibilidade do prêmio. Não é outro o sentido do art. 764 da Lei Civil: “Salvo
disposição especial, o fato de se não ter verificado o risco, em previsão do
qual se faz o seguro, não exime o segurado de pagar o prêmio”.
Ayres Britto
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15.3. De mdo isso deflui novo e também claro entendimento
dogmático: o de que o negócio jurídico-securitário tem por objeto a
transferência de riscos ou eventuais prejuízos contratualmente hipotetizados,
passíveis de cobertura por aquele feedback do prêmio e da reparação
pecuniária.^^. Sentido em que a parte titular do interesse segurado
(previamente garantido, portanto) se previne do risco ou dano potencial que
lhe rondava o patrimônio jurídico, substituindo-o por uma dívida financeira e
antecipadamente quantificada. Ao passo que a entidade seguradora toma para
si esse mesmo risco ou dano potencial que factualmente circunda bens e
interesses jurídicos de outrem, obrigando-se a cobri-lo in totum.
16. A fundamental distinção entre contrato de seguro e a forma
associativo-civil de proteção patrimonial privada
16.1. Bem compreendida a compostura normativa do contrato de
seguro, penso tecnicamente equivocado identifica-la com o instituto do
associativismo para o fim de proteção patrimonial tão mútua quanto privada.
17
OLIVEIRA SILVA, Ivan de. Curso deDireito doSeguro. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 105.
24
O juízo que toma corpo, neste patamar de assimilação cognitiva do tema, é de
que não há qualquer nesga de parentesco jurídico ou afinidade material entre
as duas figuras de Direito. Assim no plano normativo em geral como no
tocante às especificidades da legislação securitária, contrato de seguro e
proteção veicular associativa são como água e óleo: não se misturam. Isso
pelas seguintes e complementares razões:
I —do ponto de vista normativo ou da estrutura identitário-jurídica das
coisas, o contrato de seguro veicula típica relação de troca. Uma relação
em que a oferta da garantia implica a assunção do risco. Um elemento
contramal a puxar o outro (sempre no pressuposto do pagamento do
prêmio), mas sem que ambos figurem na mesma esfera jurídico-
patrimonial. Pelo contrário: é pela outorga (remunerada) da garantia ao
segurado que a seguradora passa o incorporar o risco ou dano potencial
que pairava sobre o patrimônio jurídico do co-contratante. Dando-se,
portanto, um verdadeiro câmbio de posições jurídicas entre os
contraentes, a revelar núcleos patrimoniais estanques ou distintos;
Ayres Britto
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II —já nas associações de proteção veicular, o caso é de uma pluralidade
de relações jurídicas, todas elas enfeixadas na pessoa jurídico-
associativa. Com o que se trata, na essência, de um complexo vínculo
de mutuaüsmo jurídico, pelo qual os associados conjugam esforços
financeiros (via mensalidades ou rateios ex posf) em torno da garantia
dos interesses de todos. E por essa precisa ou exata razão comungam,
todos eles, dos riscos sobre cada qual dos patrimônios garantidos.
Numa frase, não há propriamente um liame contratual sinalagmático. O
que se tem nas associações de proteção veicular são vínculos de
sobreposição jxirídica, a ter como ponto de unidade a figura da
25
associação e por base normativa não um instrumento contratual, mas
uma ordenação estatutária. Denotando-se, com isso, o entrelaçamento
patrimonial entre todos aqueles que, voluntária e vaüdamente, venham
a aderir aos quadros associativos privados;
Ayres Britto
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16.2. Em resumo, o ato jurídico de associação às entidades que se
dedicam à proteção veicular de seus integrantes nada tem a ver com a figura
contratual de que versa o art. 757 do Código Civil. Distinção conceituai que,
por si só, bastaria ao juízo de legitimidade de tal objeto associativo e
responderia pela insubmissão da atividade de proteção veicxolar à fiscalização
da SUSEP. Afinal, não se tratando de relação propriamente securitária, deixam
de incidir as regras de restrição negociai que se leem no parágrafo único do
mesmo art. 757 do diploma civil e no art. 24 do Decreto-lei n“ 73/66.
17. A confirmação sistêmica e teleológica da distinção entre seguros e
associações e associações de proteção veicular
17.1. Um derradeiro ponto de exploração descritiva ainda é de se fazer.
Refiro-me às razões de ordem sistêmica e teleológica (as duas em congruente
incidência) que confirmam a não aderência do modelo associativo de proteção
veicular ao bloco de normatividade securitária. E que não subjazem, às
associações, a racionalidade econômica e a amplitude negociai que
singularizam as operações de seguros. Conforme assentado, os seguros
compõem um centrado ramo de negócio, desenvolvido no mais ampliado
horizonte econômico do mercado. Sobremais, as seguradoras portam-se como
unidades negociais estranhas à infinidade de riscos difúsamente assumidos,
mediante um sem número de contratos bilaterais. Justamente por isso é que
operam (as seguradoras) com base em rigorosos métodos amariais.
26
submetidos à profilática disciplina normativa e à efetiva fiscalÍ2ação estatal.
Funcionando o Estado —nessa hipótese e pela insuperável visão de conjunto
que lhe é inerente —como agente garantidor da saúde financeira e da higide2
jurídica da amplíssima rede de relações securitárias por todo o País, de modo a
neutralÍ2ar o risco de um colapso sistêmico da atividade de oferta de seguros.
17.2. Nada disso, reconheça-se, prospera ou subsiste no arranjo
associativo de resguardo patrimonial. Aqui, o que se tem é um ambiente
restrito e concentrado, em que os riscos e as respectivas garantias são
compartilhados a partir do pleno conhecimento do universo patrimonial
envolvido. O que se dá pela adesão voluntária a uma relação jurídica de base,
de índole estatutária. Vínculo estatutário pelo qual se desenvolve um peculiar
formato de autogestão de riscos. Um válido modelo de garantia recíproca,
elaborado e tocado pelos associados e para os associados, com processos
deliberativos tão transparentes quanto participativos. Sempre sob o olhar atento
do próprio dono. Donde se falar que as associações operam por dentro
(endogenamente, diz-se) às relações jurídicas a que visam garantir. Não
comparecendo, portanto, o leitmotiv que é próprio do mercado de seguros.
Ayres Britto
CONSULTORIA JURÍDICA E ADVOCACIA
17.3. Concluo este último segmento de idéias com o registro de que os
debates realizados durante a III Jornada de Direito Civil do Conselho da
Justiça Federal produziram o Enunciado n° 185, em tudo e por tudo
convergente com o entendimento aqui perfilhado. Vale a respectiva leitura:
“Enunciado 185: Art. 757: A disciplina dos seguros do Código Civil e as normas da
previdência privada que impõem a contratação exclusivamente por meio de entidades
legalmente autorizadas não impedem a formação de grupos restritos de ajuda mútua,
caracterizados pela autogestão.”
27
Ayres Britto
CONSULTORIA JU RÍD ICA E ADVOCACIA
18. Respostas pontuais aos quesitos da consulente
Tudo isso posto, passo a responder aos três quesitos a mim dirigidos
pela consulente:
I —Primeira pergunta: “Do ponto de vista da materialidade jurídica,
há identidade entre o contrato de seguro, de um lado, e, de outro, o
ingresso e a efetiva participação em uma associação de proteção
veicular?”
Resposta: Não! Contrato de seguro e a livre adesão a uma associação
de proteção veicular traduzem fenômenos jurídicos rigorosamente
distintos. O primeiro consiste na mais típica ou clássica forma de
vinculação jurídica entre partes, a formalmente se viabilizar por ajuste
de vontades. Ajuste que, in casu, gira em tomo do câmbio das seguintes
prestações contramais: a) o pagamento pecuniário do prêmio, pelo
segurado; b) a garantia de um interesse jurídico do segurado em face de
riscos pré-determinados, já por conta da seguradora. A associação à
entidade de proteção veicular, de sua banda, passa pela adesão a uma
relação jurídica de base, sob a qual se compartilham plurilateralmente
riscos e garantias.
II - Segunda pergunta: “A proteção patrimonial mútua e recíproca
entre associados traduz uma finalidade social lícita?”
Resposta: Sim! Considerando que tal objeto associativo não se
enquadra no conceito legal de seguro, não há, no Ordenamento
Jurídico brasileiro, qualquer óbice à organização associativa de proteção
veicular privada. Incidindo diretamente ao caso a plena e constitucional
28
liberdade de associação que vem altissonantemente estampada no inc.
XVII do art. 5° da Constituição.
Ayres Britto
CONSULTORIA JU RÍD ICA E ADVOCACIA
III —Terceira pergunta: “As associações de proteção veicular devem
ser submetidas à fiscalização pela SUSEP?”
Resposta: Não! Pela mesma distinção conceituai entre operação
securitária e associação para proteção patrimonial recíproca, não
compete à SUSEP ou a outro órgão ou ente do Sistema Nacional de
Seguros Privados fiscalizar ou, por qualquer forma, interferir no
fiancionamento das associações de proteção veicular privada. Isso
porque o art. 1° do Decreto-lei n“ 73/66 restringe o seu alcance
normativo às “operações de seguros privados”. Pelo que incide,
também, o inc. XVIII do mesmo art. 5° da Magna Carta.
19. FECHO
Este o meu parecer jurídico, data vênia de opinião em contrário.
izembro de 2016
Carlos Ayres^^ritto
OAB/DF n° 40.040
CARLOS AYRES BRITTO, mestre e doutor pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo —PUC/SP,
é membro da Academia Brasileira de Letras Jurídicas e da Academia Internacional de Direito e Economia.
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Parecer Jurídico - AAAPV

  • 1. TEMA CENTRAL: O REGIME CONSTITUCIONAL DAS ASSOCIAÇÕES CIVIS Ayres Britto CONSULTORIA JU RÍD ICA E ADVOCACIA —A validade da proteção associativo-civil de veículos automotores de propriedade privada —A insubmissão das associações civis de proteção veicular ao regime jurídico-securitário propriamente dito Natureza do estudo: parecer jurídico Consulente: Federação Nacional das Associações de Benefícios Parecerista: Carlos Ayres Britto
  • 2. Ayres Britto CONSULTORIAJURÍDICA E ADVOCACIA Parecer Jurídico 1. A natureza do estudo. 2. O objeto da consulta e respectiva autora. 3. O quadro factual-jurídico subjacente à consulta. 4. Os quesitos da consulente. 5. A parelha temática da consulta e sua matriz constitucional. 6. A liberdade de associação como direito tão fundamental quanto individual e ainda de exercício coletivo. 7. As associações civis de proteção veicular como ponto constitucional de confluência dos direitos fundamentais da liberdade e da propriedade privada. 8. Os conteúdos positivos da liberdade de associação. 9. A liberdade de associação em caráter pleno e sua direta conformação constitucional quanto às respectivas finalidades. 10. A liberdade de associação como direta emanação ou conteúdo do princípio da dignidade humana. 11. O sentido não econômico das associações. 12. Os seguros privados enquanto atividade financeira e específico ramo de negócio. 13. A matriz constitucional dos seguros privados e sua disciplina complementarmente legal. 14. O Decreto-lei n” 73/66 e o Sistema Nacional de Seguros Privados. 15. O seguro como fórmula contratual de transferência intersubjetiva de riscos mediante paga. 16. A fundamental distinção entre contrato de seguro e a forma associativo-civil de proteção patrimonial privada. 17. A confirmação sistêmica e teleológica da distinção entre seguros e associações e associações de proteção veicular. 18. Respostas pontuais aos quesitos dos consulentes. 19. FECHO.
  • 3. Ayres Britto CONSULTORIA JURÍDICA E ADVOCACIA 1. A natureza do estudo 1.1. O estudo, que ora inicio, é constitutivo de parecer jurídico. Assim entendido o ponto de vista resultante da objetiva descrição dessa ou daquela figura de Direito Positivo. Descrição puramente objetiva dessa ou daquela figura de Direito Positivo, sim, feita na perspectiva da identificação do respectivo regime jurídico. Sem se confundir, todavia, nem com decisão judicial nem com postulação perante qualquer instância pública já situada do lado de fora do PoderJudiciário mesmo. 1.2. Quanto ao conceito de regime jurídico, faço-o no sentido técnico de modo normativo de ser de qualquer tema da vida que o Direito Positivo venha a tomar alvo de suas abstratas enunciações. Venha a tomar alvo ou conteúdo desse ou daquele dispositivo em apartado, ou então já imerso no sistema de comandos em que ele, Direito Positivo, afinal se constitui. Com o que passam a se identificar tema da vida a conhecer por modo técnico e figura de Direito a revelar por modo objetivo. Imparcial, portanto. 2. O objeto da consulta e respectiva autora Identifico o objeto da consulta e sua autora. Esta, a Federação Nacional das Associações de Benefícios (“Fenaben”), associação de Direito totalmente privado, com sede administrativa no Município mineiro de Contagem. Aquele, consistente no exame de constitucionaHdade das chamadas associações civis de proteção de veículos automotores de propriedade privada. Associações de proteção veicular, assim comumente referidas para dar conta das pessoas
  • 4. jurídicas de direito privado: a) que tenham por objeto social a tutela financeiro-coletiva de veículos dos respectivos associados; b) desprovidas de qualquer finalidade lucrativa por parte delas próprias, associações civis particulares. Mais precisamente, trata-se de entidades associativas privadas que se constituem com o fito de assumir, assim por modo coletivo, as consequências financeiras de eventuais furtos, roubos, incêndios ou então colisão de veículos automotores de propriedade particular. Eventos lesivos, portanto, da propriedade veicular que os respectivos associados detenham a título jurídico privado. 3. O quadro factual-jurídico subjacente à consulta 3.1. Quanto ao espectro factual-jurídico subjacente ao presente esmdo, narra a consulente que as associações em causa adotam dois modelos de operação, ora isolada, ora conjugadamente. O primeiro deles, constituído por um fundo mútuo ou mediante contribuições periódicas dos próprios associados. Já o segundo, esse toma a forma de rateio dos prejuízos advindos de eventos danosos e efetivamente apurados. Contribuições e aportes individuais, contudo, a serem graduados de acordo com o valor dos veículos de propriedade de cada associado. Ayres Britto CONSULTORIAJURÍDICA E ADVOCACIA 3.2. Prossegue a consulente para informar que a Superintendência de Seguros Privados (“Susep”) e o Ministério Público Federal vêm ajuizando ações civis públicas para o fim da declaração judicial da ilicitude de toda associação civil que tenha por objeto a sobredita proteção veicular privada. Isso por suposta violação aos arts. 757 do Código Civil e 24 do Decreto-lei n° 73/1966. Dispositivos que, segundo as duas tipologias de instâncias acionantes, condicionam a exploração comercial de seguros ã prévia/
  • 5. autorização estatal e à incidência de um peculiar regime jurídico securitário. Eis o teor de ambos os enunciados normativos, na ordem em que citados: Ayres Britto CONSULTORIA JURÍDICA E ADVOCACIA “Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados. Parágrafo único. Somente pode ser parte, no contrato de seguro, como segurador, entidade para tal fim legalmente autorÍ2ada” “Art 24. Poderão operar em seguros privados apenas Sociedades Anônimas ou Cooperativas, devidamente autorizadas. Parágrafo único. As Sociedades Cooperativas operarão unicamente em seguros agrícolas, de saúde e de acidentes do trabalho.” 4. Os quesitos da consulente Pois bem, nesse inicial contexto fático-normativo da minha atuação como parecerista, já se percebe que o nógórdio a desatar reside na comparação entre a forma associativa de proteção contra danos à propriedade privada e o regime jurídico das atividades securitárias. Exame que há de afunilar para a ministração de respostas pontuais aos quesitos formulados pela própria consulente. Ei-los: I - “Do ponto de vista da materialidade jurídica, há identidade entre o contrato de seguro, de um lado, e, de outro, o ingresso e a efetiva participação em uma associação de proteção veicular?” II —“A proteção patrimonial mútua e recíproca entre associados traduz uma finalidade social lícita?”
  • 6. III —“As associações de proteção veicular devem ser submetidas à fiscalização pela SUSEP?” Ayres Britto CONSULTORIAJURÍDICA E ADVOCACIA 5. A parelha temática da consulta e sua matriz constitucional É precisamente à luz da narrativa e da quesitação feitas pela própria consulente que passo a tecer considerações técnicas sobre o tema central da consulta. Tema que, no rigor dos termos, consiste na diferenciação jurídica entre a liberdade de associação e o complexo das normas atinentes ao chamado Direito dos Seguros. Dando-se que uma e outra matéria têm na própria Constimição Federal a sua primeira enunciação normativa. Vale dizer: é na Lei das Leis brasileiras que liberdade de associação e ramo securitário do Direito encontram seu imediato lócus de positivação jurídica. Donde a reprodução dos seguintes e pertinentes dispositivos: “Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar; XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento; (...) XIX - as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado; XX - ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado; XXI - as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente; (•••) LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por: (...)
  • 7. Ayres Britto CONSULTORIA JU RÍD ICA E ADVOCACIA b) organÍ2ação sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados”. “Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. (...) § 2“A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo.” “Art. 21. Compete à União: (...) VIII - administrar as reservas cambiais do País e fiscalizar as operações de natureza financeira, especialmente as de crédito, câmbio e capitalização, bem como as de seguros e de previdência privada;” “Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: (...) VII - política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores”. “Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: (...) V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobihários;” 6. A liberdade de associação como direito tão fundamental quanto individual e ainda de exercício coletivo 6.1. Da leitura de todos esses dispositivos, salto, de imediato, para a revelação do regime constitucional das associações. O que faço para assentar, de saída, que elas são pessoas jurídicas civis ou não mercantis, voluntariamente constituídas. Espontaneamente constituídas por pessoas físicas, em seu formato mais simples. E no uso da autonomia de vontade em que se se constitui a liberdade individual de se autodeterminar juridicamente.
  • 8. Logo, as associações como direta expressão da liberdade individual que se consorcia com outra(s) para o alcance de um objetivo comum. Ayres Britto CONSULTORIA JU RÍD ICA E ADVOCACIA 6.2. Cuida-se, em necessário complemento cognitivo, da figura jurídica da “associação” como pessoa jurídica plural ou coletiva. Não como pessoa ou sujeito individual de Direito. Pessoa coletiva que titulari2a direitos, suporta deveres e contrai obrigações em seu próprio nome. A significar um personalizado centro de imputação jurídica, em linguagem kelseniana^. Um sujeito coletivo de direitos, remarque-se. Ou pessoa coletiva que detém o status de entidade ou sujeito jurídico por si mesmo, com seus órgãos internos de deliberação e execução. Mas isso como produto, pronto e acabado, do exercício de uma liberdade assim fundamental como individual, a que se dá o preciso nome de liberdade... “de associação” (inc. XVII do art. 5° da C.F.). Mais exatamente falando, cuida-se da liberdade que se outorga “aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País” (cabeça do art. 5°) para congregarem-se em torno de objetivos tão comuns a todos eles quanto juridicamente lícitos. Vedados os de caráter paramilitar. Daí Pontes de Miranda falar das associações como “coligação voluntária de algumas ou de muitas pessoas físicas, por tempo longo, com o intuito de alcançar algum fim (lícito), sob direção unificante”^. ’ Ver KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 6 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. 2 FERREIRA MENDES, Gilmar; MÁRTIRES COELHO, Inocêndo; GONET BRANCO, Paulo Gustavo, Curso de Direito Constituáonal, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 365.
  • 9. Ayres Britto CONSULTORIA JURÍDICA E ADVOCACIA 6.3. Também de se reiterar, ainda tecnicamente, que essa liberdade de organÍ2ação coletiva homenageia a atuação formalmente plural dos indivíduos. É a Constituição a reconhecer que não apenas o indivíduo sozinho ou isolado dos outros é que merece protagonizar direitos, deveres e obrigações. A coletividade que se forma de pessoas namrais portadoras de reclamos ou pretensões comuns é uma coletividade que, por igual, se faz digna de amparo e promoção diretamente constitucionais. Ela mesma, coletividade, como um desdobramento ou uma das muitas formas de expressão da personalidade individual, a atestar que certos objetivos lícitos somente serão alcançados, ou então mais facilmente realizados, se a respectiva procura se der em regime de permanente colaboração entre pessoas físicas ou naturais. Que é um típico regime de válida enturmação ou lícito agir gregário, portanto. 7. As associações civis de proteção veicular como ponto constitucional de confluência dos direitos fundamentais da liberdade e da propriedade privada 7.1. Daqui já se desata o claro entendimento de que o direito de se associar é do tipo individual, mas de exercício necessariamente plural ou coletivo. Direito da espécie individual, porque seu pressuposto de gozo é tão- somente a condição de ser humano. O fato da humanidade que reside em cada pessoa natural, independentemente do desempenho de qualquer papel social que ela venha a desempenhar. Direito de exercício necessariamente entuTwado, então, pois ninguém se associa consigo mesmo para nenhuma , / finalidade da vida em concreto.
  • 10. 7.2. No caso da associação que se faz objeto da consulta, ajunte-se que se cuida de congregação humana para a melhor disposição individual desse outro bem jurídico de nome “propriedade”, nos termos do inciso XXII do art. 5° da Constituição. Propriedade ou, mais exatamente, “propriedade privada”, já agora conforme o enunciado que se lê no inciso II do artigo constimcional de n° 170. Saltando à evidência que a propriedade privada é autêntico bem de personalidade, no clássico sentido de que, sem a garantia de sua “inviolabilidade”, a vida humana se reduziria a subvida. O indivíduo, a sub-indivíduo. O cidadão, a subcidadão. Tudo de parelha com igual garantia da inviolabilidade dos bens jurídicos da “liberdade” mesma, da “igualdade” e da “segurança”, na precisa dicção do caput do art. 5° da Magna Carta Federal, verbir. “Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)”■ Ayres Britto CONSULTORIA JURÍDICA E ADVOCACIA 7.3. Com esse necessário visual englobado dos dois direitos fundamentais (liberdade de associação e propriedade privada), porquanto, no caso, em essencial imbricação de funcionalidade, já posso retornar aos mencionados incisos XVIII, XIX e XX do art. 5° da Lei Fundamental. Faço- o, todavia, no tópico entrante de idéias, para poder interpretá-los com mais acentuado foco. Mais acenmado foco e segundo a mesma lógica do imbricamento operacional dos encarecidos bens jurídicos da liberdade de associação e da propriedade privada. 8. Os conteúdos positivos da liberdade de associação 10
  • 11. 8.1. Deveras, todos esses dispositivos constitucionais (incisos XVIII, XIX e XX do art. 5° da Constituição) se interpenetram em congruente funcionalidade. São rigorosamente constitutivos de um amálgama de faculdades jurídicas^. Um todo pro-indiviso, então, a partir do dado essencial de que a espécie de liberdade com que trabalha a Constituição é expressamente clausulada como “plena” (inciso XVII). O que explica o reconhecimento dela, liberdade de associação, como um plexo de situações jurídicas ativas tão particulares quanto predispostas a uma titularidade que independe, para o seu efetivo gozo, de autorização estatal. Plexo ou conjunto de direitos, atente-se, já acompanhado da respectiva garantia de que o Estado tampouco interferirá no funcionamento desse mesmo tipo de associação. Sabido que interferir é se imiscuir ou se intrometer nos assuntos internos de cada uma delas, tanto quanto intervir é assumir a respectiva direção. Donde apenas incumbir ao Poder Público operar como instância de registro formal de cada unidade associativo-civil. Não como instância propriamente autorizativa da constituição em si de tais personificações coletivo-privadas. Torno a transcrever o comando constitucional: “Art. 5“ (...) XVIII —a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorÍ2ação, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento”. 8.2. Nesse mesmo diapasão protetivo-promocional é que segue a Constituição para colocar as associações civis a salvo, também, da dissolução ou suspensão de suas atividades por modo tão compulsório quanto inopinado e autoritário. Isso por força do inc. XIX do mesmo art. 5°, segundo o qual “as Ayres Britto CONSULTORIAJURÍDICA E ADVOCACIA 3 FERREIRA MENDES, Gümar; MÁRTIRES COELHO, Inocêncio; GONET BRANCO, Paulo Gustavo, Curso deDireito Constituáonal, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 393. 11
  • 12. associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado”. Sucedendo que, a essa nova garantia, se somam todas as outras inerentes ao processo judicial, notadamente o devido processo legal (inc. LIV do art. 5°), o contraditório e a ampla defesa (inc. LV, iguaknente do art. 5°). 8.3. Cogita-se, destarte, de uma liberdade de dupla face: perante o Estado mesmo e para optar por uma pluralidade de organização privada, com os respectivos e também variados objetos. Liberdade como autonomia de vontade ou direito de se autodeterminar em tema de criação de cada entidade associativa, já foi dito. Por conseguinte, direito de criar e pôr em atividade essa pessoa jurídica de nome associação e de dirigi-la a partir de uma determinada estmtura administrativa também livremente formatada. Mas não é só. A liberdade como autonomia de vontade ainda se manifesta no plano da filiação e da desfiliação, mormente na enfatizada perspectiva funcional com o bem jurídico-fundamental da propriedade privada. Confira-se: “Art. 5“ (...) XX —ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado” Ayres Britto CONSULTORIA JU RÍD ICA E ADVOCACIA 9. A liberdade de associação em caráter pleno e sua direta conformação constitucional quanto às respectivas finalidades 9.1. Convém repetir o juízo: a Constituição qualifica a liberdade de associação com o timbre da plenitude. Com a definitiva marca —devido a que 12
  • 13. também cláusula pétrea, nos termos do inciso IV do § 4° do art. óO'^- de uma inteireza de desfrute que só encontra limites no próprio texto constimcional. É o que se lê do inc. XVII do art. 5°, que volto a transcrever para a perpétua memória de tão categórica asserção: “é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar”. 9.2. O que se vê, portanto, desse tão peregrino quanto altissonante dispositivo jurídico é que a Magna Carta brasileira franqueia aos particulares toda iniciativa de associativismo civil que não transborde para o campo das organizações paramilitares. Somente isso. Impondo tal vedação, lógico, por se referir a tipos de associações atentatórias à noção elementar de Estado de Direito. Mais até, afrontosa da ideia mesma do “Estado Democrático de Direito” que se lê desde a cabeça do artigo introdutório dela própria. Constituição Federal^. Assim como dispõe o inciso XElV" do mesmíssimo art. 5°, que faz da “ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático” um delito da espécie inafiançável e imprescritível. Ayres Britto CONSULTORIA JURÍDICA E ADVOCACIA “Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: § 4° Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir; !-(...) IV - os direitos e garantias individuais.” * “Art. 1° A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I -(...)” ^“Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I -(...) XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;” 13
  • 14. 10. A liberdade de associação como direta emanação ou conteúdo do princípio da dignidade humana Ayres Britto CONSULTORIA JURÍDICA E ADVOCACIA 10.1. Também daqui já se desprende o nítido entendimento de que as associações civis se põem como instituições servientes da robustez do princípio da “dignidade da pessoa humana” (inc. III do art. 1° da Constituição^). Sendo certo que o princípio da dignidade da pessoa humana, como explícito fundamento da República Federativa do Brasil, traduz o formal reconhecimento de que a humanidade de cada um de nós já é título de legitimação suficiente para sua positivação constimcional como fonte de direitos fundamentais. Positivado reconhecimento que não é senão o Direito Constimcional brasileiro a se autoconferir a láurea de documento jurídico civÜizado. Humanista. Democrático, enfim®. 10.2. O engate lógico das coisas já toma assento: associação é fórmula jurídica de expressão e expansão da personalidade humana. De incremento das potencialidades individuais e de reforço eficacial da liberdade de ação em geral. Com a vantagem de ter por base constimtiva uma coletividade de pessoas namrais estavelmente coligadas. O que já serve como instrumento normativo de promoção da solidariedade e da cooperação, na medida em que tal associação lícita de pessoas se faz é na alentadora perspectiva de um mais otimizado somatório de conhecimentos e experiências. Uma comunhão de esforços ou uma congregação subjetiva para o que? Para uma objetiva agregação de direitos de personalidade e até de princípios fundamentais (como ^“Art. 1“ A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos; III - a dignidade da pessoa humana;” 8 Ver AYRES BRITTO, Carlos. O humanismo como categoria constitucional. 1. ed. 3. reimp. Belo Horizonte: Fórum, 2016 14
  • 15. O nunca demasiadamente encarecido princípio da dignidade da pessoa humana). Espécie de affectio soáetatis que, no tocante às associações, ostenta um relevante ponto de especificidade operacional: o caráter necessariamente não- econômico de suas ações e finalidades. 11. O sentido não econôntico das associações 11.1. Com efeito, na acepção limpidamente constitucional de que venho cuidando, a associação par excellence é aquela que não faz de suas ações e finalidades sociais um mister econômico; ou, pelo menos, que não desempenha atividades econômicas como um fim em si mesmo^. Sabido que são os empresários (e as sociedades empresárias) os protagonistas típicos das atividades negociais. São eles que, por vocação e tino mercantil, fazem da produção econômica uma atividade regular e passível de profissionalização. Um meio de vida e uma razão de viver. A implicar o processo de metamorfose jurídica da livre iniciativa empresarial em empresa empiricamente estabelecida. Donde a Constituição erigir a figura jurídica da empresa a papel central no enredo normativo da “Ordem Econômica e Financeira” (Título VII da Lei Maior). É o que resulta dos seguintes dispositivos constitucionais: inc. IX do art. 170; §§ 1“ (e seu inc. II), 2° e 3°, todos do art. 173; inc. I do parágrafo único do art. 175; §1®do art. 176; §1° do art. 177; art. 179'^ Ayres Britto CONSULTORIA JURÍDICA E ADVOCACIA ROBERTO GONÇALVES, Carlos. Dinito CivilBrasileiro. 8* ed. São Paulo, Saraiva; 2010, p. 234. Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorÍ2ação do trabalho humano e na hvre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. (Redação dada pela Emenda Constitucional n° 6, de 1995)”. 15
  • 16. Ayres Britto CONSULTORIA JURÍDICA E ADVOCACIA 11.2. Por desígnio constitucional, então, é a empresa a instituição juridicamente vocacionada para a exploração direta das atividades econômicas {caput do art. 173). Exploração no sentido da combinação otimizada dos chamados fatores da produção, residentes em capital, trabalho, natureza, conhecimento e tecnologia, marcadamente. Mais até do que isso, um tipo de organização dos fatores de produção pré-ordenado a ganhos pecuniários redutíveis ao substantivo “lucros”. Por definição. Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. §1” A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialÍ2ação de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional n° 19, de 1998) II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários; (Incluído pela Emenda Constitucional n" 19, de 1998) III-(...) § 2“ As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado. § 3“A lei regulamentará as relações da empresa pública com o Estado e a sociedade. Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. Parágrafo único. A lei disporá sobre: I - o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão; Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra. § 1° A pesquisa e a lavra de reciursos minerais e o aproveitamento dos potenciais a que se refere o "caput" deste artigo somente poderão ser efetuados mediante autorização ou concessão da União, no interesse nacionaL por brasileiros ou empresa constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no País, na forma da lei, que estabelecerá as condições específicas quando essas atividades se desenvolverem em faixa de fronteira ou terras indígenas. (Redação dada pela Emenda Constitucional n“ 6, de 1995) Art. 177. Constituem monopóUo da União: I -(...) § 1° A União poderá contratar com empresas estatais ou privadas a realização das atividades previstas nos incisos I a IV deste artigo observadas as condições estabelecidas em lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional n“ 9, de 1995) 16
  • 17. Ayres Britto CONSULTORIA JU RÍD ICA E ADVOCACIA 11.3. Nesse ritmo argumentativo, fácil é confirmar o entendimento de que a associação (por não ser empresa) tem como nota característica a índole não-empresária de sua finalidade social. O que não impede o exercício da atividade produtiva enquanto meio para a consecução dos objetivos associativos. Por essa elementar consideração que o art. 53 do Código Civil brasileiro conceitua a associação como “a união de pessoas que se organÍ2em para fins não econômicos”. Dando-se que o exercício da liberdade de associação opera numa ambiência constitucional apartada dos princípios e regras que informam a ordem econômica e financeira. A exceção ficando por conta do §2° do art. 174, segundo o qual “A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo”. Sem que isso implique, entretanto, o reconhecimento de um caráter empresarial à estrutura das associações. Ao contrário, o que se extrai do dispositivo constitucional é a proclamação jurídica de que a união de esforços individuais, desde que reciprocamente orientados em tomo de um ente associativo, traduz um modo tão legítimo quanto especiabnente eficaz de obtenção de utilidades materiais. Um modo não mercadológico —porquanto associativo-civil em sentido próprio —de cadastro de bens e prestação de serviços. Com o que se tem serviços, bens e vantagens materiais a serem administrados, direta ou indiretamente, pela iniciativa de cada associado. Gerenciamento tão endógeno quanto voltado para o consumo (igualmente interno) daqueles que integram o círculo social formalmente constituído em associação. Tratando-se, nesse sentido, de um modelo autorreferido —e não inter-referente, como é próprio das empresas - de atuação produtiva ou economicamente material. Um modo, ainda por cima, de mais ampliada compleição sistêmica, pois o instituto da associação já serve à vitaüzação do princípio da dignidade da pessoa humana, como pude dizê-lo logo acima. Não por outra razão o §2° do art. 174 da 17
  • 18. Constituição Federal impõe à lei apoiar e estimular o associativismo. Assim por modo normativamente destacado. Ayres Britto CONSULTORIAJURÍDICA E ADVOCACIA 12. Os seguros privados enquanto atividade financeira e específico ramo de negócio 12.1. Avanço. Avanço na direção do segundo bloco temático, retratado no ramo securitário do Direito. Ramo que também deita raÍ2es na Lei Maior, nomeadamente nos dispositivos que tenho como necessário tomar a transcrever. São eles, agora por modo focado ou apartado do conjunto anteriormente reproduzido; “Art. 21. Compete à União: (...) VIII - administrar as reservas cambiais do País e fiscalizar as operações de natureza financeira, especialmente as de crédito, câmbio e capitalização, bem como as de seguros e de previdência privada;” “Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: (...) VII - poHtica de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores;” “Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: (...) V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários;” 12.2. Dessa nova reprodução de textos normativo-constitucionais, tenho que uma primeira exegese se impõe: os seguros traduzem um bem delimitado tipo de atividade econômica. Noutro falar, os seguros compõem um ramo autônomo de negócio ou atividade empresarial, tendo por objeto um bem da vida intra comertium. Mercantil, por definição constitucional. Aberto 18
  • 19. à exploração econômica ou afazer negociai. Tipo de atividade que, na própria Constituição, é inerente ao ambiente de mercado. Isso porque tanto os arts. 21 e 22 quanto o art. 153 inserem todos eles (os misteres securitários) no mesmo contexto normativo das atividades financeiras (Capítulo IV do Título VII da Constituição). Daí a citação igualmente constitucional às operações de crédito, câmbio, transferência de valores e capitalização, todas elas a ter na gestão ou disponibiüzação do dinheiro o dado elementar do processo produtivo ou agenciamento econômico. Exatamente o que sucede com a relação jurídica securitária, em que o dinheiro, na figura contratual do / “prêmio”, ocupa com centralidade a dinâmica negociai. E o que tento expHcar um pouco mais à frente. Não sem antes comentar os termos da disciplina legal da atividade de oferta de seguros, justamente, e de sua focada matriz constitucional. 13. A matriz constitucional dos seguros privados e sua disciplina complementarmente legal 13.1. Com este novo mister analítico, assento que é o Decreto-lei n° 73, de 21 de novembro de 1966, que dispõe sobre o “Sistema Nacional de Seguros Privados” e “regula as operações de seguros e resseguros”. Diploma que foi constitucionalmente recepcionado com o status de lei complementar. Isso nos termos da redação originária do inc. II do art. 192 da Constituição e do caput mesmo art. 192, já pela dicção da Emenda Constitucional de n° 40, de 2003, litteris-, “Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, será regulado em lei complementar, que disporá, inclusive, sobre: !-(...) Ayres Britto CONSULTORIAJURÍDICA E ADVOCACIA 19
  • 20. Ayres Britto CONSULTORIAJURÍDICA E ADVOCACIA II - autorização e funcionamento dos estabelecimentos de seguro, previdência e capitalização, bem como do órgão oficial fiscaüzador e do órgão oficial ressegurador;” (sem os destaques originalmente) “Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram. (Redação dada pela Emenda Constitucional n” 40, de 2003)” (igualmente não destacado no original) 13.2. Ora bem, ao franquear à lei complementar a regulamentação do sistema financeiro nacional —e assim dos seguros, especificamente —, o artigo constitucional de n° 192 nada mais fez do que relançar, embora por modo centrado, a possibilidade de a lei sujeitar essa ou aquela atividade econômica sujeita à autorização estatal. Possibilidade já avançada pela parte final do parágrafo único do art. 170; à lei cabendo, tão somente, nominar essa ou aquela atividade que, mesmo de feição econômica, reclame autorização do Poder Público para a sua empírica exploração. Mas entenda-se: atividade econômica sujeita a ato autorizativo do Estado apenas quanto ao preenchimento de certos requisitos para, justamente, sua concreta exploração. Não quanto à possibilidade de a lei passar a dizer o que seja e o que não seja de natureza econômica, porque tal qualificação a Constituição já o fez. E já o fez pela facilitada técnica da exclusão: o que não estiver constimcionalmente definido como de exclusivo senhorio ou titularidade estatal, remanesce como atividade passível de exploração econômica privada. Simples assim. Confira- se: “jrt. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios (...); 20
  • 21. I -(•••); IX Parágrafo único. E assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei” 14. O Decreto-lei n”73/66 e o Sistema Nacional de Seguros Privados 14.1. Muito bem. E do Decreto-lei n° 73/66, quais os juízos técnicos dele defluentes? Quais os elementos que se inscrevem na compostura normativa do instituto? Instimto jurídico em que o seguro consiste? Minha particular resposta, do ângulo daquilo que tenho como de maior préstimo para o equacionamento das questões formuladas na consulta: I —a atividade securitária opera debaixo de um Sistema Nacional de Seguros Privados (art. 8°^^). Sistema constituído: a) por um Conselho Nacional de Seguros Privados —CNSP; b) pela Superintendência de Seguros Privados - SUSEP; c) pelos resseguradores; d) pelas sociedades autorizadas a operar em seguros privados; e) pelos corretores habilitados; Ayres Britto CONSULTORIA JU RÍD ICA E ADVOCACIA a) do Conselho Nacional de Seguros Privados - CNSP; b) da Superintendência de Seguros Privados - SUSEP; c) dos resseguradores; (Redação dada pela Lei Complementar n° 126, de 2007) d) das Sociedades autorizadas a operar em seguros privados; e) dos corretores habilitados.” 21
  • 22. II - a relação jurídica de seguro é de natureza contratual (arts. 9” e 10^, a significar uma relação interpartes ou bilateral, fundada no ajuste de vontades em torno de certos bens jurídicos; III — como instrumento de vinculação jurídica entre partes, os contratos de seguro são, ainda, sinalagmáticos; ou seja, estabelecem obrigações e direitos recíprocos. O que já implica a ideia de onerosidade, pois à fruição da garantia securitária há de corresponder, sempre, o pagamento pecuniário de nome “prêmio” (art. 12^; IV - estão habilitadas a explorar o ramo dos seguros privados somente as pessoas jurídicas estruturadas sob a forma de sociedade anônima ou cooperativa, e desde que devidamente autorizadas pelo CNSP e permanentemente fiscalizadas pela SUSEP (art. 24^'*, conjugado com a ahnea “a” do art. 36'^ e o art. Ayres Britto CONSULTORIA JU RÍD ICA E ADVOCACIA Art 9° Os seguros serão contratados mediante propostas assinadas pelo segurado, seu representante legal ou por corretor habilitado, com emissão das respectivas apólices, ressalvado o disposto no artigo seguinte. Art 10. E autorizada a contratação de seguros por simples emissão de bilhete de seguro, mediante sohcitação verbal do interessado. 13 A • Art 12. A obrigação do pagamento do prêmio pelo segurado vigerá a partir do dia previsto na apóhce ou bilhete de seguro, ficando suspensa a cobertura do seguro até o pagamento do prêmio e demais encargos. Parágrafo único. Qualquer indenização decorrente do contrato de seguros dependerá de prova de pagamento do prêmio devido, antes da ocorrência do sinistro. *“*Art 24. Poderão operar em seguros privados apenas Sociedades Anônimas ou Cooperativas, devidamente autorizadas. Parágrafo único. As Sociedades Cooperativas operarão únicamente em seguros agrícolas, de saúde e de acidentes do trabalho. Art 36. Compete à SUSEP, na qualidade de executora da política traçada pelo CNSP, como órgão fiscalizador da constituição, organização, funcionamento e operações das Sociedades Seguradoras: a) processar os pedidos de autorização, para constituição, organização, funcionamento, fusão, encampação, grupamento, transferência de controle acionário e reforma dos Estatutos das Sociedades Seguradoras, opinar sôbre os mesmos e encaminhá-los ao CNSP; Art 74. A autorização para funcionamento será concedida através de Portaria do Ministro da Indústria e do Comércio, mediante requerimento firmado pelos incorporadores, dirigido ao CNSP e apresentado por intermédio da SUSEP. 22
  • 23. 14.2. À guisa de síntese, desprende-se da chamada lei de seguros que a atividade securitária se desenvolve num ambiente de mercado intensamente regulamentado, a partir de interações contratuais onerosas. Relações jurídico- contramais, sim, a pressupor um ponto de unidade jurídica entre interesses materiais contrapostos. De um lado, interesses puramente financeiros ou lucrativos ou remuneratórios da pessoa jurídica da seguradora; de outro, os mais diversos interesses patrimoniais, a garantir como específico objeto de disposição jurídica por parte do segurado. 15. O seguro como fórmula contratual de transferência intersubjetiva de riscos mediante paga 15.1. Neste penúltimo ponto de ponto de enfrentamento cognitivo do tema, impõe-se-me projetar meu olhar interpretativo para o art. 757 do Código Civil. Dispositivo que principia a disciplina do seguro enquanto contrato típico ou nominado, fazendo-o, precisamente, pela revelação de sua natureza assim bilateral como contraprestacional ou sinalagmática. Ei-lo: Ayres Britto CONSULTORIA JURÍDICA E ADVOCACIA Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados. 15.2. De pronto, anoto que o contrato de seguro entrelaça, necessariamente, sujeitos de direito que figuram nas contrapostas posições de segurador e segurado. Sendo que o segurador há de ser “entidade para tal fim legalmente autorizada”, agora por força do parágrafo único do mesmo art. 757. Já no plano conteudístico ou de pura substância, a avença entre partes se pecubariza pelo toma-lá-da-cá entre uma prestação pecuniária (de nome prêmio, repiso) e uma outra mais complexa e que não é senão a garantia de um 23
  • 24. determinado interesse do segurado: os riscos de dano pessoal ou então patrimonial, devidamente preestabelecidos ou estipulados. Garantia, a seu turno, a abranger não somente a cobertura do dano efetivamente apurado, como também a mera assunção do risco. Com o que o simples se prontificar à cobertura dos prejuízos que venham a se materializar já passa a configurar uma postura de centrada valia jurídico-contratual. Dando causa, por si só, à exigibilidade do prêmio. Não é outro o sentido do art. 764 da Lei Civil: “Salvo disposição especial, o fato de se não ter verificado o risco, em previsão do qual se faz o seguro, não exime o segurado de pagar o prêmio”. Ayres Britto CONSULTORIA JU RÍD ICA E ADVOCACIA 15.3. De mdo isso deflui novo e também claro entendimento dogmático: o de que o negócio jurídico-securitário tem por objeto a transferência de riscos ou eventuais prejuízos contratualmente hipotetizados, passíveis de cobertura por aquele feedback do prêmio e da reparação pecuniária.^^. Sentido em que a parte titular do interesse segurado (previamente garantido, portanto) se previne do risco ou dano potencial que lhe rondava o patrimônio jurídico, substituindo-o por uma dívida financeira e antecipadamente quantificada. Ao passo que a entidade seguradora toma para si esse mesmo risco ou dano potencial que factualmente circunda bens e interesses jurídicos de outrem, obrigando-se a cobri-lo in totum. 16. A fundamental distinção entre contrato de seguro e a forma associativo-civil de proteção patrimonial privada 16.1. Bem compreendida a compostura normativa do contrato de seguro, penso tecnicamente equivocado identifica-la com o instituto do associativismo para o fim de proteção patrimonial tão mútua quanto privada. 17 OLIVEIRA SILVA, Ivan de. Curso deDireito doSeguro. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 105. 24
  • 25. O juízo que toma corpo, neste patamar de assimilação cognitiva do tema, é de que não há qualquer nesga de parentesco jurídico ou afinidade material entre as duas figuras de Direito. Assim no plano normativo em geral como no tocante às especificidades da legislação securitária, contrato de seguro e proteção veicular associativa são como água e óleo: não se misturam. Isso pelas seguintes e complementares razões: I —do ponto de vista normativo ou da estrutura identitário-jurídica das coisas, o contrato de seguro veicula típica relação de troca. Uma relação em que a oferta da garantia implica a assunção do risco. Um elemento contramal a puxar o outro (sempre no pressuposto do pagamento do prêmio), mas sem que ambos figurem na mesma esfera jurídico- patrimonial. Pelo contrário: é pela outorga (remunerada) da garantia ao segurado que a seguradora passa o incorporar o risco ou dano potencial que pairava sobre o patrimônio jurídico do co-contratante. Dando-se, portanto, um verdadeiro câmbio de posições jurídicas entre os contraentes, a revelar núcleos patrimoniais estanques ou distintos; Ayres Britto CONSULTORIAJURÍDICA E ADVOCACIA II —já nas associações de proteção veicular, o caso é de uma pluralidade de relações jurídicas, todas elas enfeixadas na pessoa jurídico- associativa. Com o que se trata, na essência, de um complexo vínculo de mutuaüsmo jurídico, pelo qual os associados conjugam esforços financeiros (via mensalidades ou rateios ex posf) em torno da garantia dos interesses de todos. E por essa precisa ou exata razão comungam, todos eles, dos riscos sobre cada qual dos patrimônios garantidos. Numa frase, não há propriamente um liame contratual sinalagmático. O que se tem nas associações de proteção veicular são vínculos de sobreposição jxirídica, a ter como ponto de unidade a figura da 25
  • 26. associação e por base normativa não um instrumento contratual, mas uma ordenação estatutária. Denotando-se, com isso, o entrelaçamento patrimonial entre todos aqueles que, voluntária e vaüdamente, venham a aderir aos quadros associativos privados; Ayres Britto CONSULTORIAJURÍDICA E ADVOCACIA 16.2. Em resumo, o ato jurídico de associação às entidades que se dedicam à proteção veicular de seus integrantes nada tem a ver com a figura contratual de que versa o art. 757 do Código Civil. Distinção conceituai que, por si só, bastaria ao juízo de legitimidade de tal objeto associativo e responderia pela insubmissão da atividade de proteção veicxolar à fiscalização da SUSEP. Afinal, não se tratando de relação propriamente securitária, deixam de incidir as regras de restrição negociai que se leem no parágrafo único do mesmo art. 757 do diploma civil e no art. 24 do Decreto-lei n“ 73/66. 17. A confirmação sistêmica e teleológica da distinção entre seguros e associações e associações de proteção veicular 17.1. Um derradeiro ponto de exploração descritiva ainda é de se fazer. Refiro-me às razões de ordem sistêmica e teleológica (as duas em congruente incidência) que confirmam a não aderência do modelo associativo de proteção veicular ao bloco de normatividade securitária. E que não subjazem, às associações, a racionalidade econômica e a amplitude negociai que singularizam as operações de seguros. Conforme assentado, os seguros compõem um centrado ramo de negócio, desenvolvido no mais ampliado horizonte econômico do mercado. Sobremais, as seguradoras portam-se como unidades negociais estranhas à infinidade de riscos difúsamente assumidos, mediante um sem número de contratos bilaterais. Justamente por isso é que operam (as seguradoras) com base em rigorosos métodos amariais. 26
  • 27. submetidos à profilática disciplina normativa e à efetiva fiscalÍ2ação estatal. Funcionando o Estado —nessa hipótese e pela insuperável visão de conjunto que lhe é inerente —como agente garantidor da saúde financeira e da higide2 jurídica da amplíssima rede de relações securitárias por todo o País, de modo a neutralÍ2ar o risco de um colapso sistêmico da atividade de oferta de seguros. 17.2. Nada disso, reconheça-se, prospera ou subsiste no arranjo associativo de resguardo patrimonial. Aqui, o que se tem é um ambiente restrito e concentrado, em que os riscos e as respectivas garantias são compartilhados a partir do pleno conhecimento do universo patrimonial envolvido. O que se dá pela adesão voluntária a uma relação jurídica de base, de índole estatutária. Vínculo estatutário pelo qual se desenvolve um peculiar formato de autogestão de riscos. Um válido modelo de garantia recíproca, elaborado e tocado pelos associados e para os associados, com processos deliberativos tão transparentes quanto participativos. Sempre sob o olhar atento do próprio dono. Donde se falar que as associações operam por dentro (endogenamente, diz-se) às relações jurídicas a que visam garantir. Não comparecendo, portanto, o leitmotiv que é próprio do mercado de seguros. Ayres Britto CONSULTORIA JURÍDICA E ADVOCACIA 17.3. Concluo este último segmento de idéias com o registro de que os debates realizados durante a III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal produziram o Enunciado n° 185, em tudo e por tudo convergente com o entendimento aqui perfilhado. Vale a respectiva leitura: “Enunciado 185: Art. 757: A disciplina dos seguros do Código Civil e as normas da previdência privada que impõem a contratação exclusivamente por meio de entidades legalmente autorizadas não impedem a formação de grupos restritos de ajuda mútua, caracterizados pela autogestão.” 27
  • 28. Ayres Britto CONSULTORIA JU RÍD ICA E ADVOCACIA 18. Respostas pontuais aos quesitos da consulente Tudo isso posto, passo a responder aos três quesitos a mim dirigidos pela consulente: I —Primeira pergunta: “Do ponto de vista da materialidade jurídica, há identidade entre o contrato de seguro, de um lado, e, de outro, o ingresso e a efetiva participação em uma associação de proteção veicular?” Resposta: Não! Contrato de seguro e a livre adesão a uma associação de proteção veicular traduzem fenômenos jurídicos rigorosamente distintos. O primeiro consiste na mais típica ou clássica forma de vinculação jurídica entre partes, a formalmente se viabilizar por ajuste de vontades. Ajuste que, in casu, gira em tomo do câmbio das seguintes prestações contramais: a) o pagamento pecuniário do prêmio, pelo segurado; b) a garantia de um interesse jurídico do segurado em face de riscos pré-determinados, já por conta da seguradora. A associação à entidade de proteção veicular, de sua banda, passa pela adesão a uma relação jurídica de base, sob a qual se compartilham plurilateralmente riscos e garantias. II - Segunda pergunta: “A proteção patrimonial mútua e recíproca entre associados traduz uma finalidade social lícita?” Resposta: Sim! Considerando que tal objeto associativo não se enquadra no conceito legal de seguro, não há, no Ordenamento Jurídico brasileiro, qualquer óbice à organização associativa de proteção veicular privada. Incidindo diretamente ao caso a plena e constitucional 28
  • 29. liberdade de associação que vem altissonantemente estampada no inc. XVII do art. 5° da Constituição. Ayres Britto CONSULTORIA JU RÍD ICA E ADVOCACIA III —Terceira pergunta: “As associações de proteção veicular devem ser submetidas à fiscalização pela SUSEP?” Resposta: Não! Pela mesma distinção conceituai entre operação securitária e associação para proteção patrimonial recíproca, não compete à SUSEP ou a outro órgão ou ente do Sistema Nacional de Seguros Privados fiscalizar ou, por qualquer forma, interferir no fiancionamento das associações de proteção veicular privada. Isso porque o art. 1° do Decreto-lei n“ 73/66 restringe o seu alcance normativo às “operações de seguros privados”. Pelo que incide, também, o inc. XVIII do mesmo art. 5° da Magna Carta. 19. FECHO Este o meu parecer jurídico, data vênia de opinião em contrário. izembro de 2016 Carlos Ayres^^ritto OAB/DF n° 40.040 CARLOS AYRES BRITTO, mestre e doutor pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo —PUC/SP, é membro da Academia Brasileira de Letras Jurídicas e da Academia Internacional de Direito e Economia. 29