O documento contém várias poesias curtas que abordam temas como amor, natureza, paz e escrita. As poesias variam em tom e estilo, desde poemas de amor até reflexões sobre a criação literária.
3. ESSÊNCIA
Uma mão vazia
Em que nada se pode ler,
O reflexo de um dia
Sem amanhecer,
Um movimento sempre parado,
Um Romeu nunca amado,
Um olhar estático,
Um poema nada enfático,
Um actor pouco dramático,
Um pássaro que não pia,
Um observador que não via,
Um poeta que não sente,
Um político que mente,
Um sábio sem ciência,
Uma mnemónica que esqueci,
Uma mãe sem paciência
O perto ali...
Tudo sem essência,
É como eu sem ti.
Maria João Rodrigues, 9º ano, Concurso de
Poesia de Gaia Nascente, ESOD/1999-2000
4. O TEU OLHAR
O teu olhar,
O mais belo que eu já vi,
Vicia-me de maneira tal
Que não penso em nada senão em
ti...
Brilhantes...
Incandescentes...
Os teus lindos olhos
Encantam toda a gente!
Sou incapaz de resistir
A tão doce olhar...
Não o consigo impedir,
Quero-te amar!
Miguel Nuno Rodrigues, 7º ano
Concurso de Poesia de Gaia Nascente, ESOD/1999-2000
5. VAIDADE
Sonho que sou a Poetisa eleita,
Aquela que diz tudo e tudo sabe,
Que tem a inspiração pura e perfeita,
Que reúne num verso a imensidade!
Sonho que um verso meu tem claridade
Para encher o mundo! E que deleita
Mesmo aqueles que morrem de saudade!
Mesmo os de alma profunda e insatisfeita!
Sonho que sou Alguém cá neste mundo...
Aquela de saber vasto e profundo,
Aos pés de quem a Terra anda curvada!
E quando mais no céu eu vou sonhando,
E quando mais no alto ando voando,
Acordo do meu sonho... E não sou nada!...
Florbela Espanca, Sonetos
6. NÃO POSSO ADIAR O AMOR
Não posso adiar o amor para outro século
não posso
ainda que o grito sufoque na garganta
ainda que o ódio estale e crepite e arda
sob montanhas cinzentas
e montanhas cinzentas
Não posso adiar este abraço
que é uma arma de dois gumes
amor e ódio
Não posso adiar
ainda que a noite pese séculos sobre as costas
e a aurora indecisa demore
não posso adiar para outro século a minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de libertação
Não posso adiar o coração
A. Ramos Rosa, Viagem através duma Nebulosa
13. Funeral Blues, 1936
Stop all the clocks, cut off the telephone,
prevent the dog from barking with a juicy bone,
silence the pianos and, with muffled drums,
bring out the coffin, let the mourners come.
Let airplanes circle moaning overhead
scribbling on the sky the message: he's dead.
Put crepe-bows round the white necks of the public doves,
let the traffic policemen wear black cotton gloves.
He was my North, my South, my East and West,
my working week, my Sunday rest,
my noon, my midnight, my talk, my song.
I thought that love would last forever; I was wrong.
The stars are not wanted now, put out every one.
Pack up the moon, dismantle the sun.
Pull away the ocean and sweep up the wood.
For nothing now can ever come to any good.
W. H. Auden
16. DIA DA ÁRVORE
Cortaram uma árvore
E a terra chorou
Cortaram outra árvore
E a terra chorou
E tantas árvores mais...
E a terra chorou
Chorar tanto também cansa
Quem pode enxugar as lágrimas
Da terra cansada?
Nem as mãos de uma criança...
Matilde Rosa Araújo, Fadas Verdes
17. SEGREDO
Sei um ninho.
E o ninho tem um ovo.
E o ovo, redondinho,
Tem lá dentro um passarinho
Novo.
Mas escusam de me atentar:
Nem o tiro, nem o ensino.
Quero ser um bom menino
E guardar
Este segredo comigo.
E ter depois um amigo
Que faça o pino
A voar...
Miguel Torga, Poesia Completa
18. POEMA DA MINHA NATUREZA
Crescem as flores no seu dever biológico,
e as cores que patenteiam, por sua natureza,
só podem ser aquelas, e não outras.
Vermelhas, amarelas, cor de fogo,
lilases, carmesins, azuis, violetas,
assim, e só assim,
tudo conforme a sua natureza.
Ásperas são as folhas, macias, recortadas
ou não, tudo conforme;
e o aprumo como tal,
ou rasteiras, ou leves, ou pesadas, animais.
É como os
tudo no seu dever, Em cada qual, por sua natureza,
por sua natureza. todo o dever se cumpre.
Comem, dejetam, dormem,
fazem amor nas horas competentes,
lutam, caçam, agridem,
rosnam à Lua, trinam, assobiam,
escondem-se, espreitam, fogem, amarinham,
dançam, mudam de pele, agacham-se, disfarçam-se,
tudo conforme a sua natureza.
António Gedeão, Obra Completa
Assim eu penso, e amo, e sofro, e vou andando.
20. Frutos
Eugénio de Andrade, Aquela Nuvem e Outra
21. MISTÉRIOS DA ESCRITA
Escrevi a palavra flor.
Um girassol nasceu
no deserto de papel.
Era um girassol
como é um girassol.
Endireitou o caule,
sacudiu as pétalas
e perfumou o ar.
Voltou a cabeça
à procura do sol
e deixou cair dois grãos de pólen
sobre a mesa.
Depois cresceu até ficar
com a ponta de uma pétala
fora da Natureza.
Álvaro Magalhães, O Limpa-palavras e outros Poemas
24. óleo de Carlos Alberto Santos
O Mostrengo, Fernando Pessoa
25.
26. POEMA EM P
A Paula
pede a paz.
Os pardais Os prédios
os peixes as praias
os pandas os pastos
as plantas as pontes
as pedras as piscinas
pedem a paz. pedem a paz.
Os palhaços O planeta
os polícias pede a paz.
os pintores
os padeiros Políticos,
os poetas não ponham na panela
pedem a paz. a pomba da paz.
Luísa Ducla Soares