O crescimento populacional em Meca levou o governo saudita a promover grandes projetos de construção que estão remodelando o centro histórico da cidade de forma controversa. Críticos alegam que as novas torres de luxo estão empurrando os pobres para fora do centro e comercializando a experiência religiosa, enquanto as autoridades dizem que é necessário para acomodar os peregrinos. A divisão entre ricos e pobres ameaça o ideal tradicional de igualdade na cidade sagrada.
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Meca
1. Crescimento divide cidade sagrada muçulmana entre ricos e pobres ‐ 03/01/2011 ‐ The New York Times Página 1 de 3
03/01/2011 -
Crescimento divide cidade sagrada muçulmana entre ricos e
pobres
Nicolai Ourossoff
Jidda (Arábia Saudita)
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Peregrinos rezam no Monte Arafat, perto da cidade sagrada de Meca
Isso é um absurdo arquitetônico. Pouco ao sul da Grande Mesquita, em Meca, o mais sagrado local do mundo muçulmano, a
construção de uma imitação kitsch do Big Ben de Londres está quase concluída. Chamada de Torre do Relógio Real de Meca,
ela será um dos prédios mais altos do mundo, a peça central de um complexo que abriga um shopping center gigantesco, um
hotel de 800 quartos e um salão de orações para vários milhares de pessoas. O edifício enorme, uma cópia ostensiva do
original, ampliado em uma escala grotesca, será decorado com inscrições em árabe e terá no topo uma cobertura em forma de
crescente que dá a impressão de ser uma concessão cínica ao passado arquitetônico islâmico. Para abrir espaço para o
edifício, o governo saudita demoliu uma fortaleza otomana do século 18 e aplainou a colina na qual ela estava situada.
A torre é apenas um dos vários projetos de construção no centro de Meca, desde linhas de trens a arranha-céus luxuosos,
hotéis e uma enorme ampliação da própria Grande Mesquita. Essas obras estão remodelando o centro histórico de Meca de
uma forma que muitos aqui acham estarrecedora, e elas têm gerado críticas enérgicas incomuns ao autoritário governo
saudita.
“Isso é a comercialização da casa de Deus”, acusa Sami Angawi, um arquiteto saudita que fundou um centro de pesquisa que
estuda questões de planejamento urbano vinculadas ao hajj, e que é um dos mais ferrenhos críticos dessas obras. “Quanto
mais perto da mesquita, mais caros são os apartamentos. Nas torres mais caras, a pessoa pode desembolsar milhões de
dólares por um contrato de leasing de 25 anos”, diz ele. “Para poder ver a mesquita, paga-se o triplo”.
Autoridades sauditas dizem que o boom na área de construção – e as demolições associadas a isso – é necessário para
abrigar o número crescente de pessoas que fazem peregrinação a Meca durante o hajj, um número que subiu para quase três
milhões nos últimos 12 meses. Como não muçulmano, eu não recebi permissão para visitar a cidade, mas muitos muçulmanos
com quem eu conversei – incluindo arquitetos, preservacionistas e até mesmo autoridades governamentais – acreditam que o
motivo real por trás desses planos é o dinheiro: o desejo de lucrar com alguns dos imóveis mais valiosos do mundo. E eles
acrescentam que isso foi facilitado pela interpretação do islamismo especialmente estrita da Arábia Saudita, que vê como
corruptos grande parte da história após o período de Maomé e os artefatos por ela produzidos, o que significa que construções
centenárias podem ser destruídas impunemente.
Essa mentalidade está dividindo a cidade sagrada de Meca – e a própria experiência de peregrinação – ao longo de linhas de
classe bastante visíveis, fazendo com que os ricos fiquem nos altos edifícios com ar condicionado em volta da Grande
Mesquita e os pobres sejam empurrados cada vez mais para a periferia.
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