1. O documento apresenta os principais conceitos e princípios do direito tributário brasileiro, como a legalidade tributária, anterioridade, isonomia, capacidade contributiva e outros.
2. Aborda também os diferentes tipos de tributos no Brasil, como impostos, taxas, contribuições e a competência da União, estados e municípios para instituí-los.
3. Discorre ainda sobre temas como obrigação tributária, responsabilidade, lançamento, prescrição, garantias de crédito tributário e administração tributária.
1. 1
ANOTAÇÕES DE TRIBUTÁRIO E FINANCEIRO
Princípio da Legalidade Tributária 03
Princípio da Anterioridade Tributária 06
Princípio da Isonomia Tributária 09
Princípio da Capacidade contributiva 11
Princípio da Irretroatividade Tributária 14
Princípio da Uniformidade Geográfica 17
Princípio do Não Confisco 18
Princípio da Não Limitação ao Tráfego 19
Princípio da Não-cumulatividade 19
Imunidades Tributárias 20
Sistema Tributário Nacional 29
Conceito de Tributo 32
Classificação dos Tributos 40
Competência 43
Fontes do Direito Tributário 50
Interpretação e Integração 53
Obrigação Tributária 56
Responsabilidade Tributária 63
Lançamento 75
Suspensão da Exigibilidade do Crédito Tributário 78
Prescrição e Decadência 88
Exclusão do Crédito Tributário 99
Garantias do Crédito Tributário 102
Administração Tributária 104
Impostos em Espécie 111
Importação e Exportação 112
IPI 117
2. 2
IOF 123
IR 125
ICMS 132
ITCMD 150
IPVA 152
IPTU e ITBI 154
ISSQN 158
Execução Fiscal, Ação cautelar fiscal, Arrolamento 159
Direito Financeiro 178
Receitas públicas 179
LC 101/00 – Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) 182
Lei do Orçamento (Lei 4320/64) 189
Repartição de Receitas Tributárias 216
3. 3
DIREITO TRIBUTÁRIO
Introdução
O estudo do Direito Tributário deve ater-se, principalmente, à CF/88 (arts.
145 a 162), à EC 42/03 e ao CTN (mormente a partir do art. 96, com as
alterações até a LC 118/05).
A CF/88, em matéria tributária, pode ser sistematizada em três partes:
princípios, imunidades e tributos. As duas primeiras constituem as chamadas
limitações ao poder de tributar.
Princípio da Legalidade Tributária
Está no art. 150, I, CF/88, c.c. art. 97, I e II, do CTN. A lei, como regra,
deve impor a tributação. As pessoas jurídicas de Direito Público (União, Estados,
DF e Municípios), dotadas de poder de tributar, só poderão criar ou majorar
tributos por lei. Isto decorre da colocação de Pontes de Miranda, pela qual é “o
povo tributando a si mesmo”, por intermédio do Poder Legislativo. Essa máxima
advém diretamente da titularidade do poder, da soberania pelo povo (art. 1º,
parágrafo único, CF/88), a ser representado, na democracia semidireta, por meio
dos seus delegados – vereadores, deputados e senadores. Nesse passo, a lei
como um produto dessa vontade, é a única idônea a materializar o poder de
tributar. Como se verá na análise do desiderato da reserva legal, em regra, a
norma instituidora da exação será a lei ordinária. Ademais, a jurisprudência é
pacífica em considerar que iniciativa de lei tributária é concorrente entre todos os
legitimados. Ao contrário de diplomas orçamentários, de iniciativa exclusiva do
Executivo, os tributários podem ser oferecidos também pelo Legislativo, como já
disse o STF1
.
Reserva Legal, também chamada de tipicidade fechada, cerrada ou
regrada, ou de estrita legalidade constitui uma relação taxativa pela qual a lei
“stricto sensu” institui o tributo, assim como aquela que tipifica crimes e comina
penas (arts. 5º, XXXIX, CF/88, e 1º, CP). Com efeito, há certas matérias que a
Constituição determina que só podem ser viabilizadas por lei em sentido estrito.
Esse tratamento mais rigoroso corresponde exatamente ao ditame em análise,
qual o seja da reserva de lei. Dessa feita, a lei que institui o tributo deve
estabelecer, obrigatoriamente, os seguintes elementos (art. 97, III a VII, CTN):
alíquota, base de cálculo, sujeito passivo, multa e fato gerador. Já o prazo
para pagamento pode ser estipulado por norma infralegal (decreto), conquanto
não previsto no rol “numerus clausus” dos incisos do art. 97, CTN2
.
Para Cassone (2004, p. 169), de regra, somente a lei ordinária é apta a
instituir tributo, pois “a Constituição fixa a regra-matriz de incidência, e a Lei
1
STF, ADIn 3809/ES, rel. Min. Eros Grau, j. 14.6.2007, citando precedentes no mesmo sentido: ADIn 3205/MS (DJU de
17.11.2006); ADIn 2659/SC (DJU de 6.2.2004); ADIn 2548/PR (DJU de 15.6.2007); ADIn 3312/MT (DJU de 23.3.2007) –
Informativo do STF n° 471.
2
Esta é a posição pacificada na doutrina, escudada pelo STF.
4. 4
Complementar estabelece normas gerais”3
. Entretanto, o autor admite, em sede
de exceção, a criação de exação por LC ou por EC. Nesse raciocínio também
estabeleceu o constituinte, vez que União pode instituir, por lei complementar4
,
outros quatro tributos:
1.Impostos sobre grandes fortunas (art. 153, VII, CF/88)5
.
2.Empréstimos compulsórios (art. 148, “caput”, CF/88).
3.Impostos residuais (art. 154, I, CF/88) – diversos daqueles já instituídos
pelo constituinte. Na criação da nova exação, a União deverá observar,
além da forma específica da LC, a inexistência de “bis in idem” de base
de cálculo e de fato gerador e o princípio da não-cumulativa. Os outros
entes federados não detém essa competência residual para instituir
novos tributos.
4.Contribuições previdenciárias residuais (art. 195, § 4º, CF/88) – além
daquelas já expressamente antevistas pelo legislador constitucional.
Nenhuma dessas quatro exações pode nascer por medida provisória (art.
62, § 1º, III, CF/88).
Exceções à legalidade (art. 153, § 1º, CF/88) – há quatro impostos
federais que refugam à estrita legalidade, prevista no art. 97, I a VII, CF/88,
encontrando-se expressamente ressalvados pelo constituinte:
1. Importação;
2. Exportação;
3. IPI;
4. IOF.
São tributos que regulam o mercado e a economia, chamados de
extrafiscais. Na batuta do Direito Econômico, com fulcro na doutrina de Grau
(1975), a extrafiscalidade é autêntica manifestação de intervenção estatal
econômica, na modalidade indireta por indução. A extrafiscalidade tem a função
de fomentar ou de desencorajar condutas por parte dos agentes econômicos.
Além da fiscalidade (função arrecadatória), os impostos mencionados possuem a
extrafiscalidade (capacidade regulatória do mercado)6
. O Poder Executivo pode
3
Como adequadamente explana Vittorio Cassone, Direito Tributário: fundamentos constitucionais da tributação,
classificação dos tributos, interpretação da legislação tributária, doutrina, prática e jurisprudência, atualizado até a EC nº
42, de 19-12-2003, 16ª ed., São Paulo, Atlas, 2004, p. 36, a LC em matéria tributária é o CTN. Inicialmente nascido sob a
alcunha de LO, subiu de “status” pelo Ato Complementar 36/67, disposição essa atinente e posterior à própria Carta de 1967.
Posteriormente, a opção do legislador foi referendada pela chancela do Excelso Pretório, do qual o autor destaca o RE 93850
de 1982, da lavra do Min. Moreira Alves. Por fim, o constituinte de 1988 recepcionou o diploma também como LC, mantendo
a posição anterior (art. 146, CF/88).
4
Trata-se da chamada reserva constitucional de lei complementar, tantas vezes invocada pelo constituinte e lembrada pela
doutrina de Direito Constitucional. Exige quorum privilegiado para a aprovação, correspondente à maioria absoluta da Casa
Legislativa (art. 69, CF/88), diferentemente da LO.
5
Consoante será exposto em passagem abaixo, há posição na doutrina, liderada por Roque Antônio Carrazza, Curso de Direito
Constitucional Tributário, 2ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 1991, que defende a não submissão do imposto sobre
fortunas à reserva constitucional de lei complementar.
6
Como lembra Maximilianus Cláudio Américo Führer e Maximiliano Roberto Ernesto Führer, Resumo de Direito Tributário,
8ª ed., São Paulo, Malheiros, 2001, p. 17, a palavra fisco vem do latim “fiscus”, que designa cesta de junco ou vime, a qual era
usada para amassar uvas ou para guardar dinheiro. “Conta-se que os agentes romanos passavam entre os negociantes a cesta de
5. 5
aumentar ou diminuir a alíquota por decreto, porque há uma exceção à
legalidade. Por meio de delegação, o Presidente da República pode autorizar
outra autoridade pública a estabelecer os mencionados percentuais tributários,
como Ministros de Estado ou Superintendentes de órgãos ou entidades públicas
encarregadas da capacidade tributária ativa.
A EC 33/01 trouxe mais duas exceções:
CIDE-combustíveis – é a contribuição de intervenção no domínio
econômico (art. 177, § 4º, I, “b”, C/88). Neste caso, sendo tributo federal,
as alíquotas são alteradas por ato do Poder Executivo da União. A
contribuição em comento não pode ser confundida pela CIDE-remessas
para o exterior, instituída pela Lei 10168/01 (SABBAG, 2004, p. 84).
Essa sim deve observar a legalidade em todos seus parâmetros.
ICMS-combustível (art. 155, § 4º, IV, “c”, CF/88) – como se trata de
tributo estadual, as alíquotas são disciplinadas por ato do Poder
Executivo estadual7
.
Esse, à luz de convênios assinados pelos secretários de Fazenda (no
âmbito do CONFAZ – art. 155, § 5º, CF/88), autorizados por LC,
estipulará originalmente a alíquota, podendo depois alterá-la como lhe
aprouver, o que confronta com o art. 97, IV, CTN8
.
Obs.: com a EC 32/01, MP pode aumentar ou diminuir tributos no Brasil
(art. 62, § 2º, CF/88). Nota-se que o legislador constituinte restringiu o fenômeno
a impostos. Ex.: pode haver, sem problemas, aumento de ITR por MP. Segundo a
CF/88, a MP é medida idônea para criar e aumentar impostos. Todavia, tal
restrição a “impostos” não desfruta de endosso na interpretação do STF. A corte
entende viável a MP em outras espécies de tributos. Ex.: MP 164/04, a qual
instituiu a PIS-Importação e a COFINS-Importação, que são contribuições. Dessa
feita, onde a LO puder dispor, a MP também o será, ainda em matéria tributária e
a despeito da disposição literal do art. 62, § 2º, CF/88, na leitura do Excelso
Pretório.
No diapasão, importante destacar que, onde LC versar, a MP não irá
incidir (art. 62, § 1º, III, CF/88), Aquela trata de matérias delicadas, enquanto essa
visa imediatismo de eficácia (relevância e urgência). Ex.: não pode surgir
empréstimo compulsório por meio de MP.
O princípio da legalidade está esculpido no art. 150, I, CF/88, prevendo o
constituinte que a majoração e a modificação do tributo deve ser feito por meio de
lei. O art. 97, CTN, minudencia o dispositivo constitucional, porque traz os
elementos do tributo sujeitos à reserva legal (base de cálculo, alíquota, sujeitos
passivo e ativo e fato imponível). É o que configura o tipo tributário ou tipicidade
vime para que depositassem ali a participação (forçada) de César. No sentido figurado, fiscus tomou o significado de Fazenda
Pública”.
7
Originalmente, a alíquota do ICMS-combustível é estabelecida pelo Executivo estadual, não nascendo por via de lei.
8
A única hipótese genuína, sob o aspecto técnico, de exceção à legalidade está esculpida no art. 155, § 4º, IV, CF/88, porque o
ato definido pelo convênio, com firma dos representantes de cada Estado-membro (por meio dos Secretários de Fazenda, com
delegação dada pelo Governador), tem o condão “per se” de estabelecer a alíquota do ICMS, não ficando sujeita à ratificação
ou reapreciação pelas Assembléias Legislativas. Isso não ocorre nas demais espécies normativas previstas como exceções à
legalidade.
6. 6
cerrada. Todo componente tributário que não estiver no rol do art. 97, CTN, não
se sujeita obrigatoriamente ao regime da legalidade estrita. Ex.: mudança no
prazo de pagamento não se sujeita à legalidade restrita9
.
A alteração da base de cálculo, em princípio, só pode ser feita por meio de
lei (art. 97, § 1º, CTN). Entretanto, essa assertiva não é absoluta, porque pode
não implicar necessariamente em majoração do tributo correspondente. Quando
essa mudança importar em mera atualização monetária, não está sujeita à
legalidade estrita (art. 97, § 2º, CTN). Ex.: revisão do valor venal de imóveis de
acordo com o mercado para cobrança de IPTU ou de ITR.
De regra, a lei que altera o tributo é ordinária, inclusive para contribuições.
Todavia, há dois instrumentos legislativos que têm força de LO: a MP e a LD.
Ambas podem criar ou majorar tributos. O art. 62, § 1º, CF/88, limita o uso da MP
em algumas matérias, mas seu § 2º expressamente autoriza, desde que
observadas suas próprias balizas, a criação ou majoração de exações. No
mesmo sentido, as limitações da LD estão no art. 68, § 1º, CF/88, ausentando-se
a disciplina tributária. A MP é espécie normativa de competência exclusiva do
Presidente da República. Tem prazo de vigência de 60 dias, podendo ser
prorrogada por igual período uma única vez (art. 62, § 7º, CF/88). Ao final do
interregno total, a MP pode ser convertida em LO por decisão do CN (art. 62, §
1º, III). Ao revés, na LD, o CN dá autorização ao Presidente da República para
legislar sobre determinado assunto, mediante prévio requerimento desse (art. 68,
“caput”, CF/88).
Pergunta: a participação nos lucros e resultados (art. 7º, XI, CF/88) e a
indenização devida por acordo em plano de demissão voluntária (PDV) são
tributadas pelo imposto de renda?
Resposta: a indenização paga em detrimento de PDV não é tributada por
IR (Súmula 215 do STJ).
Princípio da Anterioridade Tributária
O Princípio da Anterioridade consubstancia uma “vacatio legis” especial
para a vigência de lei tributária que modifique ou crie exação.
Inexoravelmente, é inevitável a aplicação da anterioridade tributária, para
conferir tempo ao sujeito passivo para o pagamento (art. 150, III, “b”, e “c”,
CF/88). Com a postergação da exigência, é possível afirmar que a há importante
sinônimo para o postulado: eficácia diferida. Os detentores do poder de tributar só
podem exigir tributo no exercício financeiro posterior àquele em que foi publicada
a lei instituidora. Exercício financeiro corresponde ao ano fiscal ou civil, indo de 1º
de janeiro a 31 de dezembro de cada ano. Tanto o princípio da anterioridade
(preconizado pela Constituição) quanto a segurança jurídica – tantas vezes
invocada pela doutrina – trazem à baila a proibição da tributação surpresa
(SABBAG, 2004).
9
STF, RE’s 182.971 e 193.531.
7. 7
O tema em comento não pode ser confundido com o princípio da
anualidade, cuja dicção sinaliza a necessária previsão do tributo na lei
orçamentária. Nota-se que a exigência do princípio da anterioridade é outra:
publicação prévia da lei. Assim, o sistema constitucional tributário não hospeda a
anualidade, pela qual a exigência do tributo só era possível se sua receita
correspondente estivesse previsto na lei orçamentária (Súmula 66 do STF)10
.
Exceções à anterioridade anual (art. 150, § 1º, parte inicial, CF/88):
II, IE, IPI, IOF, IEG (art. 154, II, CF/88) e Empréstimo Compulsório
especial (art. 148, I, CF/88), sendo os dois últimos instituídos em
situações de emergência, de guerra ou de calamidade pública,
enquanto os demais se deferem à extrafiscalidade (regulação do
mercado e da economia);
ICMS e CIDE combustíveis (arts. 155, § 4º, IV, “c”, “in fine”, e 177, § 4º,
I, “b”, CF/88), acrescidos pela EC 33/01, tendo também o cunho
extrafiscal.
Com exceção dos mencionados tributos inerentes a situações calamitosas
(IEG e empréstimo compulsório especial), as demais correspondem também às
ressalvas da legalidade. Essas são as exações que podem ter sua alíquota
alterada por ato do Executivo (art. 153, § 1º, CF/88).
Antes da EC 42/03, só havia a anterioridade anual, pela qual a lei que
criasse ou majorasse tributos só poderia entrar em vigor a partir do primeiro dia
do ano seguinte ao de sua publicação. Inspirado no limite dado pela
noventalidade, o constituinte derivado incluiu-o concomitantemente à
anterioridade anual, devendo o tributo observar ambas as regras. Foi a inclusão
do art. 150, III, “c”, CF/88, pela EC 42/03, cujo objetivo foi melhorar a segurança
jurídica deferida ao contribuinte. A produção de efeitos da nova lei tributária fica
postergada até que sejam perfeitos os 90 dias de sua publicação.
De fato, a EC 42/03 trouxe à baila a obediência a um novo período de
anterioridade de 90 dias, entre a lei e a exigência do gravame. É a chamada
anterioridade qualificada (privilegiada, nonagesimal ou noventalidade), prevista
no art. 150, III, “c”, CF/88. Foi extraída de construção constitucional sobre as
contribuições sociais (art. 195, § 6º, CF/88). Como foi instituto acrescido por
emenda de 2003, passou a ter eficácia a partir de 2004. Todos os aumentos ou
criações de tributos nos meses de janeiro a setembro ensejarão exigência em 1º
de janeiro do ano seguinte. Caso haja a situação nos meses de outubro a
dezembro, a exigência poderá ser em data posterior a 1º de janeiro do ano
seguinte.
Exceções à anterioridade nonagesimal (art. 150, § 1º, parte final, CF/88):
II, IE, IR, IOF, IEG, Empréstimo Compulsório espcial, os quais poderão
ser exigidos no dia seguinte à sua instituição;
Alterações na base de cálculo do IPTU e do IPVA.
10
Súmula 66 do STF: “É legítima a cobrança do tributo que houver sido aumentado após o orçamento, mas antes do início do
respectivo exercício financeiro”.
8. 8
No tocante ao II, IE, IOF, IEG e empréstimo compulsório especial, é
perfeitamente compreensível a intenção do constituinte, dada a extrafiscalidade
na essência desses tributos. Eles compreendem idênticas exações em relação às
ressalvas à anterioridade anual, com exceção daquelas trazidas pela EC 33/01 –
CIDE-combustível e ICMS-combustível – e da exclusão do IPI. Todavia, quanto
ao IR e às alterações da base de cálculo do IPTU e do IPVA, é incompreensível a
razão de torná-los imunes à noventalidade.
Dessa forma, o IPI é exceção da anterioridade anual, só que ele não faz
parte da lista de exceções aos 90 dias (anterioridade nonagesimal). A partir de
2004, o IPI que for majorado não poderá ser cobrado no dia seguinte, só 90 dias
depois. Assim como o IPI, a CIDE-combustível e o ICMS-combustível também
respeitam a anterioridade nonagesimal, pois não se encontram no rol das
exceções.
Já o IR e as alterações da base de cálculo do IPVA e do IPTU, uma vez
majorados em 31 de dezembro, poderão ser exigidos em 1º do janeiro do ano
seguinte, perpetuando um condenável expediente.
Obs.: como o STF interpreta o instituto da isenção como regra de
incidência (e não de não-incidência), ou seja, lei que venha a revogar isenção
não precisa observar a anterioridade, seja essa ordinária ou qualificada. A
isenção, como aventa Nogueira (1999, p. 167), é uma situação em que o
legislador obstou abstratamente o fato gerador, impondo-lhe uma intributabilidade
no plano normativo. Já a imunidade é uma espécie de isenção qualificada pelo
constituinte, o qual impede, já no Texto Maior, que o legislador infraconstitucional
inclua tal hipótese no campo da incidência do gravame. No ponto, é possível
dizer que se trata de regra de não-incidência. Já a alíquota zero opera o mesmo
reflexo suspensivo atinente à isenção. No entanto, essa paralisação da
subsunção do fato gerador se encontra no plano fático, não no legislativo-
abstrato, vindo também a constituir hipótese de incidência.
Princípio da anterioridade e a MP – segundo o art. 62, § 2º, CF/88, argüi-
se quando se deve pagar o imposto criado ou majorado por MP. Resposta: dever-
se-á o imposto no ano seguinte ao da conversão da MP em lei. A MP tem 60 dias
de vigência, prorrogável por igual período, para ser transformada em lei. A partir
de 2004, é possível entender que deve haver também a contagem dos 90 dias, a
partir da conversão da MP em lei, de modo a ensejar a exigência do tributo em
meados de março do ano seguinte. Todavia, a matéria ainda não está pacificada
pelo STF. No tocante às taxas, a anterioridade se aplica de igual maneira: é
contada a partir da conversão da MP em lei. O art. 62, § 2º, CF/88, faz menção
literal a imposto. Portanto, em caso de MP que majore taxa, não deverá ter
aplicação o dispositivo.
Em melhores termos, as outras espécies tributárias (mormente
contribuições), ao contrário, terão termo inicial na sua publicação, porque o art.
62, § 2º, CF/88, se refere expressamente a impostos. Caso não haja a conversão
em lei, o pagamento do tributo majorado não implica em direito à restituição, visto
que, durante o mencionado lapso, a exação era assim exigida “ex vi” da MP
vigente.
9. 9
Contribuição previdenciária e anterioridade – aplica-se a anterioridade
nonagesimal às contribuições sociais, também conhecida como noventena,
nonagentídio, noventalidade, período de eficácia mitigada ou de anterioridade
especial (art. 195, § 6º, CF/88). No caso, a contribuição para seguridade social
pode ser exigida em 90 dias a partir da edição da MP que instituiu a exação ou
que a alterou, como já disse o Supremo. Mas o que seria modificar a contribuição
previdenciária? Seria alterar o prazo de pagamento? Segundo o STF, a mudança
no prazo de exigência da contribuição social não representa alteração substancial
que venha a ensejar a aplicação dos 90 dias do art. 195, § 6º, CF/88.
A CPMF foi criada por meio da EC 12/96, devendo observar a
anterioridade nonagesimal. Em suas sucessivas prorrogações, esse comando
não foi exprimido (EC 37/02). O STF se pronunciou no sentido de que não se
aplica o princípio da noventalidade, porque não se trata de instituição ou
modificação de tributo11
. O que persiste é mera prorrogação, não estando
abrangida pela contingência dos 90 dias. A anterioridade em tela é chamada
mitigada, porque reduzida em relação às demais exações (art. 150, III, “b”,
CF/88).
Anterioridade e IR – pelo fato do STF acolher a Teoria Retrospectiva
(Súmula 584 do STF)12
, não coadunando com o sistema de bases correntes, nas
palavras de Aliomar Baleeiro, como se fosse um “filme em andamento”, segundo
Sacha Calmon Navarro Coelho, a alíquota aplicada é aquela vigente por ocasião
da entrega da declaração.
Anterioridade e revogação de isenções – a isenção é uma dispensa legal
do pagamento do tributo (obrigação principal). Segundo o STF, se houver isenção
revogada sem prazo certo e condição específica (isenção incondicionada), a
revogação não observa a anterioridade. Em contrário senso, a isenção deverá se
pautar pela anterioridade tributária. A regra não alcança a disposição do art. 104,
III, CTN, ou seja, tratando-se de imposto sobre renda ou patrimônio, a isenção
deve observar a anterioridade anual. Isenção concedida com prazo certo e sob
condição específica é considerada irrevogável durante seu curso, tendo natureza
de direito adquirido para o Excelso Pretório.
Princípio da Isonomia Tributária
Está previsto no art. 150, II, CF/88. O legislador constituinte de 88 fez
menção à ISONOMIA em diversos dispositivos da Carta: preâmbulo, art. 5º,
“caput”, I, art. 3º, IV, arts. 150, II, etc. A doutrina chama a isonomia de
“superprincípio”, justamente porque se encontra presente sob diferentes ângulos
no Documento Maior. De fato, a isonomia específica (tributária) decorre da
isonomia genérica (“todos são iguais perante a lei” – art. 5º, “caput”, parte inicial,
CF/88), como disse Oliveira e Horvath (2003, p. 76). Por seu postulado (art. 150,
II, CF/88), todos que realizam o fato gerador devem arcar com o ônus da
11
STF, 2666/DF, rel. Min. Ellen Gracie.
12
Súmula 584 do STF: “Ao Imposto de Renda calculado sobre os rendimentos do ano-base, aplica-se a lei vigente no exercício
financeiro em que deve ser apresentada a declaração”.
10. 10
tributação. A lei tributária não pode atribuir tratamento desigual a contribuintes
que se encontrem na mesma situação.
É fácil perceber que o legislador pretendeu onerar o contribuinte, a partir
da perspectiva da hipótese de incidência realizada, menosprezando os aspectos
extrínsecos ao fato imponível. Ademais, é evidente a predileção do legislador
pelo critério objetivo que marca o princípio, uma vez que as características
subjetivas atreladas ao contribuinte são desimportantes. Assim, há maior
possibilidade de realização da justiça fiscal, tentando-se onerar igualmente os
iguais e desigualmente os dessemelhantes.
O princípio em tela, como se nota, respalda-se na “interpretação objetiva
do fato gerador” ou na utilização do ditame do “non olet”, que significa “não
cheira”13
. Esta cláusula permite, destarte, que se tributem quaisquer pessoas,
independentemente da ilicitude da atividade, da incapacidade civil (arts. 118 e
126, CTN), ou de outros fatores que, à primeira vista, poderiam excluir a
responsabilidade tributária. Por exemplo, no art. 126, I a III, CTN, fica patente que
a capacidade tributária passiva é plena e independe da capacidade civil das
pessoas naturais, da regularidade da constituição de pessoa jurídica ou de achar-
se a pessoa sujeita a restrições de ordem civil, empresarial, administrativa ou
profissional, ainda que não possa administrar seu patrimônio. Um menor pode ser
contribuinte, mas não terá a obrigação de recolher a exação (pagamento), porque
o legislador conferiu responsabilidade tributária aos seus pais (art. 134, I, CTN).
De igual forma, o traficante de entorpecentes, quando aufere renda, realizando o
fato gerador, deve IR ao fisco. Não se pode confundir o poder de punir do Estado
– decorrente do sistema penal – com o poder de tributar, o qual visa angariar
divisas para o aparelho estatal. A hipótese de incidência para a lei tributária é
auferir renda, independentemente da forma como foi efetivada. Do
comportamento do traficante, haverá duas conseqüências distintas:
responsabilidade penal em face da conduta criminalmente ilícita e incidência da
tributação sobre a renda14
. Isso não quer dizer que o tributo recairá sobre
condutas ilícitas ou imorais, porque o fato gerador não pode assim o ser. A causa
do fato gerador pode ser ilegal, mas a essência da hipótese de incidência não. A
fundamentação legal reside no art. 118, I, CTN, além, no caso em tela, do art.
153, § 2º, I, CF/88 (universalidade do IR).
Há possibilidade de “ressalvas” a este postulado, desde que previstas
explícita ou implicitamente na CF. Note os exemplos:
a.STF: afastar o princípio em razão de extrafiscalidade. Ex.: isenção de IPI
para taxistas.
13
Na Roma antiga, o imperador Vespasiano resolveu tributar o uso dos sanitários públicos. Seu filho, Tito, contestou o pai
sobre a atitude. O monarca respondeu-lhe com uma simples expressão: tributo “non olet”. Na realidade, o César quis dizer que
a exação deve ser tratada sob um aspecto objetivo. Se o contribuinte realizar a conduta nela prevista, incidirá a tributação,
independentemente de qual fato esteja se referindo ou da pessoa que o realizou. Esta idéia redundou no tratamento objetivo do
fato gerador, cerne da isonomia tributária. Ademais, caracterizou a cisão entre o direito de punir estatal – direcionado àqueles
que urinassem nos logradouros públicos – e o poder de tributar – o uso dos banheiros públicos. Como resquício da passagem
histórica, permaneceu, para a posteridade, a palavra do soberano latino.
14
STJ, HC 7444, em que são invocados o princípio da isonomia (tratamento igual àqueles que auferiram renda) e a teoria da
interpretação econômica do fato gerador (concretizada a hipótese de incidência, incide a tributação). É o posicionamento
também do STF.
11. 11
b.Art. 151, I, “in fine”, CF/88: afastar o princípio da isonomia em razão da
tributação federal diferenciada para empresas localizadas em áreas
com desequilíbrio socioeconômico. Ex.: Zona Franca de Manaus (futuro
Pólo Industrial da Amazônia Brasileira, de acordo com o PEC 59/04).
O tratamento diferenciado das ME`s e EPP`s não gera ofensa à isonomia,
porque não há situação equivalente para com empresas de maior monta. Ao
revés, trata-se de realização material do princípio em relevo, de sorte a colimar a
igualdade entre aquelas e essas. O próprio constituinte assim disse nos arts. 146,
III, “d”, e 146-A, CF/88, consubstanciados pela LC 123/06.
Análise do postulado da capacidade contributiva ou capacidade
econômica15
Está previsto no art. 145, § 1º, CF/88. É possível estudá-lo como
subprincípio da isonomia. Note o teor do comando: “sempre que possível, os
impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade
econômica de cada um”. A técnica de estabelecimento de alíquotas fiscais
diferenciadas (progressividade) é uma outra forma de efetivar a justiça fiscal. Os
desiguais serão diferentemente tratados. Desta feita, a tributação, segundo a
capacidade econômica, configura correlato da isonomia tributária. A
jurisprudência e a doutrina interpretam este preâmbulo da ordem tributária de
forma a adequar a exação ao seu conteúdo, na medida do possível. Há alguns
tipos tributários que não comportam tal possibilidade, como é o caso do IPI e do
ICMS. Do contrário, o IR se adequa perfeitamente à preceituação do legislador.
Frise-se que tal postulado não é propriamente o princípio da isonomia,
mas um instituto deste decorrente. De fato, o art. 145, § 1º, CF/88 preconiza a
possibilidade de onerar mais gravosamente aqueles que detêm maior riqueza
tributável. Como fora mencionado, note que a expressão, “sempre que possível”
é limitadora, devendo ser compreendida como “sempre que o tributo comportar
tal variabilidade das alíquotas”. Não há dúvida que existem tributos aos quais se
pode aplicar a técnica de variação de alíquotas, buscando a justiça fiscal.
Entretanto, há outros que não se coadunam, em princípio, com tal sistemática
(tributos regressivos). Portanto, a técnica de variação de alíquotas, em uma razão
não proporcional à base de cálculo, recebe o nome de “PROGRESSIVIDADE de
alíquotas”, justificando o comando do art. 145, § 1º, CF/88.
Em tese, a capacidade tributária só cabe aos impostos. Moreira Alves
(apud CASSONE, 2004, p. 201) afirma que “em se tratando de aplicação
extrafiscal de imposto, não está em jogo a capacidade contributiva que só é
levada em conta com relação a impostos pessoais com finalidade fiscal”. É o que
preceitua Tipke e Yamashita (apud CASSONE, 2004, p. 212), ao asseverarem
que “o princípio da capacidade contributiva não se aplica a tributos com finalidade
extrafiscal, que, no entanto, têm sua constitucionalidade controlada pelo princípio
15
Cassone, op. cit., p. 206, diferencia capacidade econômica e contributiva. Atribui o fundamento da primeira no art. 145, § 1º,
CF/88, tal qual explanado na matéria. Aliás, segundo o autor, esta é a terminologia empregada pelo constituinte. No entanto,
confere à segunda fulcro nos arts. 194 e 195, CF/88, ressaltando que se trata capacidade para contribuir para a Seguridade
Social. Não é o entendimento da maioria da doutrina.
12. 12
da proporcionalidade”. Contudo, há julgados que o estendem a outros tributos,
mormente a taxas (STF).
Capacidade econômica e contributiva não são conceitos coincidentes. A
primeira representa aptidão de um sujeito em receber rendimentos e incrementar
o patrimônio próprio. A segunda é uma espécie da primeira, segundo a qual o
sujeito tem capacidade econômica em um nível tal que o torna sujeito à
tributação. Fica caracterizado o “plus” para contribuir para o Estado, pois o nível
de renda assim permite. No âmbito tributário, seria a graduação dos impostos
segundo a potencialidade de riqueza demonstrada pelo sujeito passivo na relação
tributária.
A capacidade contributiva pode ser realizada segundo diferentes técnicas,
destacando-se duas:
Por dedução de despesas essenciais – é o caso daquelas tidas no IR,
segundo a essencialidade estabelecida no seu regulamento.
Progressividade de alíquotas – é o instrumento mais utilizado.
Progressividade fiscal e extrafiscal – a primeira corresponde ao aumento
da alíquota diante da majoração da base de cálculo. Tem por objetivo primeiro a
arrecadação, orientando-se pelo princípio da capacidade contributiva. Na
segunda, não há necessária relação entre o aumento de alíquota e de base de
cálculo. Objetiva realizar um princípio constitucional, não se relacionando com a
capacidade contributiva.
No âmbito da CF/88, a progressividade fiscal é observada no IR, o qual é
necessariamente progressivo (art. 153, § 2º, I, CF/88), no IPTU, tendo em conta
seu uso (residencial, comercial ou industrial), valor e localização, e no IPVA,
progressivo em razão do tipo e da utilização do veículo. Já progressividade
extrafiscal pode ser vislumbrada no IPTU, em face do tempo de subutilização do
imóvel (realização da função social da propriedade mediante alíquotas
progressivas), e no ITR, cujas alíquotas oscilarão devido à produtividade do
imóvel (quanto maior a produtividade, menor a alíquota – regressividade). A
progressividade do ITR é extrafiscal, o que não importa em dizer que ele, em si, é
um tributo extrafiscal.
Dentre as exações mencionadas, é possível destacar três impostos com
previsão explícita de progressividade na CF/88:
1.IR (art. 153, § 2º, I CF/88) – o comando indica três critérios informadores
do IR: generalidade, universalidade e progressividade.
2.IPTU* (art. 156, § 1º, CF/88, com redação conferida pela EC 29/00).
3.ITR* (art. 153, § 4º, I, CF/88, com a redação da EC 42/03).
*Não perca de vista que a progressividade de tais impostos (IPTU e ITR) é
EXTRAFISCAL, uma vez que não visa ao intuito exclusivamente arrecadatório.
Note as explicações abaixo:
ITR – as alíquotas progressivas deverão desestimular a manutenção de
propriedades improdutivas, tal qual se aduz literalmente da vontade do
legislador, exprimida pelo art. 184, § 4º, II, CF/88.
13. 13
IPTU – inicialmente, a progressividade deste impostos visava somente
o cumprimento da função social da propriedade (art. 5º, XXIII, CF/88),
denotando claramente extrafiscalidade. Com base nesta premissa, seria
permitida a tributação maior de um terreno em relação a uma casa (art.
182, § 4º, II, CF/88). Com o fito de aumentar a tributação dos municípios,
o constituinte derivado alterou o dispositivo, a despeito de colocações
inconstitucionais.
A questão se liga ao direito de moradia, elevado constitucionalmente a
direito fundamental (art. 6º, “caput”, CF/88). O crescimento geométrico da
população sugere um gargalo de moradia insuportável a médio e longo
prazo. Percebendo tal entrave, o constituinte previu uma situação de
redistribuição de terras para a habitação e a geração de riqueza. Uma dos
meios de efetivar tal política é a tributação extrafiscal pelo IPTU e ITR. O
escopo é evitar a desapropriação da propriedade, forçando o senhor a
adequar seu domínio à sua função social.
ANTES DEPOIS
O IPTU era progressivo em razão de
um critério: a função social da
propriedade (art. 5º, XXIII, CF/88).
Três novos critérios de
progressividade: localização, valor
e uso do bem imóvel. Foram
somados à função social da
propriedade.
Progressividade no tempo –
conforme se mantivesse o
descumprimento da função social,
haveria aumento do tributo no correr
do tempo.
Progressividade extrafiscal.
Progressividade fiscal e extrafiscal.
Arts. 156, § 1º e 182, § 4º, II, CF/88.
EC
29
de
2000
Art. 156, § 1º, I e II, e 182, § 4º, II,
CF/88, Lei 10252/01, em seus arts.
39 a 41 e 3º a 8º (art. 21, XX,
CF/88)16
.
Observação: após a EC 29/00, em razão dos critérios novos anunciados,
o IPTU ganhou feições de imposto pessoal, contrariando a doutrina e a
jurisprudência majoritárias. Nesse passo, é possível entender que o art. 145, § 1º,
CF/88 (princípio da capacidade contributiva) passou a abranger o IPTU, um
imposto real (não pessoal). Assim, até que o STF se pronuncie, não se pode
assegurar que tal princípio está afeto apenas a impostos pessoais. Desta forma,
a progressividade fiscal teve sua constitucionalidade fortemente contestada,
16
Como o plano diretor é aquele que define a função social da propriedade (art. 182, § 2º, CF/88) e o município com menos de
20 mil não é obrigado a promulgar tal lei (art. 182, § 1º, CF/88), essa pequena localidade não poderá utilizar o IPTU
progressivo por desrespeito à mencionada função. Essa possibilidade só pode ser efetivada mediante prévio plano diretor,
promulgado por meio de lei municipal.
14. 14
porque transforma a exação de real (STF) em pessoal, atingindo a capacidade
contributiva (art. 145, § 1º, CF/88).
Tal comando veda a progressividade do IPTU antes da emenda, salvo se
destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade (Súmula
668 do STF)17
.
Princípio da Irretroatividade Tributária18
Está previsto no art. 150, III, “a”, CF/88. Tal comando anuncia que a lei
tributária deverá abranger fatos geradores posteriores à sua edição. Não perca
de vista que o art. 5º, XXXVI, CF/88 preconiza a irretroatividade genérica,
emanando efeitos à confecção do princípio tributário ora estudado.
É perceptível que a lei deve preceder os fatos geradores aos quais se
referem, sob pena de retroação da norma – anomalia que se pretende coibir.
É vital ao estudioso que conceba a irretroatividade como postulado da
segurança jurídica. Nesse sentido, deve-se inquirir: há exceções a ele previstas
na CF, à semelhança das exceções aos demais princípios? Não, pois as
exceções estão previstas no art. 106, I e II, CTN, o que leva alguns doutrinadores
a crer na sua inconstitucionalidade (ausência de recepção). A lei atual poderá
retroagir/retroceder/retrotrair.
Art. 106, CTN (2 incisos):
I – LEI INTERPRETATIVA – condição para a retroação: nenhuma. É
possível em qualquer caso. A lei interpretativa se limita a aclarar pontos
obscuros, não inovando na ordem posta, sob pena de constituir mera norma
nova. O cuidado que se deve ter é a separação e a hierarquia de poderes, pois o
Legislativo pode estar afastando a função jurisdicional do Judiciário, de modo a
minar a segurança jurídica.
A lei interpretativa poderá ter eficácia retrospectiva. Na verdade, a lei
interpretativa é aquela que retira os pontos obscuros da norma interpretada, sem
criar situação jurídica paradoxal. A doutrina critica tal comando – interpretação
“autêntica” –, sob o argumento de que haveria extrapolação de função do
Legislativo, pois a interpretação caberia ao Judiciário. Evidentes, pois, seriam as
lesões à segurança jurídica e à separação de poderes.
17
Súmula 668 do STF: “É inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido, antes da Emenda Constitucional 29/2000,
alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana”.
18
O princípio da irretroatividade tributária não pode ser confundido ou imiscuído com o ditame da anterioridade. É certo que
ambos caminham lado a lado, em nome da segurança jurídica. No entanto, há de se perceber que cada qual refere-se a
fenômenos jurídicos distintos: enquanto a irretroatividade diz respeito à eficácia da norma, a anterioridade adstringe-se à
vigência da lei. Nesse passo, faz-se premente afirmar que nem mesmo um é sucedâneo do outro, pois protegem bens jurídicos
distintos dentro da ordem constitucional tributária.
Lei Fato Gerador
(anterior) (posterior)
15. 15
Nogueira (1999, p. 85) defende que a lei interpretativa não pode causar
gravames ao contribuinte (criar ou aumentar exações, estabelecer penalidades
ou ônus), devendo limitar-se a dispor sobre suavizações da letra normativa
(eqüidade, remissão, anistia, etc.).
A LC 118/05, em seu art. 3º, pretendeu constituir norma tributária
interpretativa do art. 168, I, CTN, dizendo que o prazo para a repetição de
indébito tributário é de cinco anos. A jurisprudência e a doutrina, já pacificadas,
indicavam o prazo de 10 anos. O comando legislativo pretendeu atingir fatos
geradores até então protocolizados. Em dissonância com o legislador, o STJ
considerou o art. 3º da LC 118/05 como lei inovadora, não como mera
interpretação. Deste modo, conferiu efeito “ex nunc” ao diploma, asseverando
que somente ela é a corte apta a realizar a interpretação da norma federal,
constituindo sua guardiã. Por recente decisão de sua Corte Especial, o STJ
afirmou que o prazo prescricional de cinco anos, erigido pela LC 118/05, só terá
vigor a partir do diploma, não se aplicando a fatos anteriores. Esses estarão
acobertados pelo decênio prescricional para a repetição de indébito, desde que o
termo final não extrapole o lustro posterior à vigência da LC 118/0519
.
II – LEI MAIS BENÉFICA, à luz do Direito Tributário Penal20
– condição:
desde que o ato não esteja definitivamente julgado.
Condição detalhada: a aplicação retroativa da lei mais benéfica ocorrerá
se o ato não estiver definitivamente julgado. Assim, se já tiver ocorrido o trânsito
em julgado da demanda, não se falará em retroatividade, mas sim em
irretroatividade da lei. Só será aplicada a lei mais benigna se houver pendência
de julgamento. Quanto à definição de julgamento definitivo, são líquidas as
opiniões, falando alguns em caráter peremptório jurisdicional (coisa julgada
“stricto sensu”) e outros, em mera decisão administrativa na esfera recursal.
Sabbag (2004, p. 33 e 34) denomina o fenômeno de princípio da benignidade,
retroação benéfica da multa tributária ou “retroatio in mellius”.
O art. 106, II, “c”, CTN, tem por objeto a penalidade mais branda ao
contribuinte como fato de retroação da norma tributária. Observe que a definição
do tributo se aplica ao tempo de ocorrência do fato gerador, sendo certo que o
princípio “tempus regit actum” tem vez também no campo tributário, mesmo que a
lei então vigente à época esteja atualmente revogada (ultratividade). A retroação,
no entanto, poderá alcançar as sanções tributárias, desde que mais benéfica ao
sujeito passivo da relação jurídico-tributária. Entretanto, penalidades já
adimplidas, com crédito tributário extinto, não fazem nascer direito à restituição
em retroação futura.
Observação (análise do art. 144, CTN)21
: o art. 144, “caput”, CTN, apesar
de, na aparência, sugerir uma retroação da lei, de fato, corrobora com o princípio
da irretroatividade, porquanto a lei aplicada no lançamento deve ser aquela
19
STJ, 1ª T., REsp 943.116-SP, rel. Min. José Delgado, j. 19/6/2007, Informativo do STJ n° 324.
20
A retroação da lei mais benigna só ocorrerá quanto a sanções tributárias, não abrangendo redução de alíquotas nem de base
de cálculo.
21
Nogueira (1999, p. 223 a 226), filiando-se à doutrina germânica-suiça, defende o lançamento como mero procedimento
administrativo, de natureza declaratória. Desta feita, em face do princípio da irretroatividade da norma tributária, o lançamento
apresenta efeito “ex tunc”, fazendo aplicar a lei tributária à época da ocorrência do fato gerador.
16. 16
vigente no momento do fato gerador. Não se trata de exceção ao ditame, vez
que, como já fora dito, esta se encontra somente no art. 106, I e II, CTN. Do
mesmo modo, o art. 144, § 1º, CTN, não excepciona o princípio mencionado,
porque a lei, referida no dispositivo, é de natureza formal. Não altera
substancialmente o fato gerador e a obrigação dele decorrente, “per se”, mas sim
aspectos procedimentais quanto ao ato de lançamento.
Observe, portanto, que o art. 144, “caput”, CTN, ratifica a regra constante
do art. 150, III, “a”, CF/88, indicando que a lei deve preceder os fatos geradores
aos quais ela se refere. Nesse passo, perquire-se qual o alcance do art. 144, § 1º,
CTN, segundo o qual se aplicará ao lançamento a lei que ampliar as garantias do
crédito tributário, que aumentar os poderes de investigação, ou que aprimorar os
métodos de apuração do importe devido. Com efeito, trata-se de lei adjetiva ou
formal, adstrita a aspectos rituais de fiscalização. Por conseguinte, tal norma não
se refere propriamente ao cerne do liame obrigacional à luz do fato gerador, o
que lhe daria o rótulo de lei material –, mas à estrutura formal do lançamento.
Importante: há ressalva na parte final do art. 144, § 1º, CTN, indicando a
necessidade de aplicação da “regra” – lei contemporânea do fato gerador. De
fato, há menção à lei que, ampliando as garantias do crédito, atribuiria
responsabilidade a terceiros, o que a reveste de caráter de norma material, e não
formal.
Dica final (o IR e o princípio da irretroatividade): até a década de 80, a
doutrina e a jurisprudência (Súmula 584 do STF, já comentada) entendiam o fato
gerador do IR no contexto estritamente temporal, afastando o enfoque
econômico. Assim, o fato gerador tinha marco temporal preciso – último segundo
do último dia do ano. Nesse contexto, uma lei majoradora do IR em 31/12, por
exemplo, “antecederia” o fato gerador, “respeitando-se” o princípio da
irretroatividade. Tal fenômeno era conhecido como retroatividade imprópria ou
como aplicação da Teoria da Retrospectiva, de fundo alemão. Não obstante o
posicionamento citado, aos poucos a doutrina passou a refletir sobre a
necessidade de ver o fato gerador do IR na perspectiva econômica, isto é, à luz
de um sistema de bases correntes, nas palavras de Aliomar Baleeiro. Por meio
de tal análise, o fato gerador do IR seria a soma algébrica de fatos ou
disponibilidades econômicas, no transcorrer do ano-base (ano-
base=f1+f2+f3+...+fn), até que o movimento, à semelhança de um “filme em
exibição”, como disse Sacha Calmon Navarro Coêlho, chegasse ao seu fim. Note
que se trata de estrutura dualista para o IR: um ano-base de auferimento de
renda e um ano seguinte de entrega de declaração e recolhimento do imposto. É
fácil perceber, destarte, que a doutrina mudou o pensar, adotando
majoritariamente a Teoria do Fato Gerador Complessivo para o IR, ressalvados
casos isolados de pensamento diverso, como Machado (1993), Paulo de Barros
Carvalho e Cassone (2004). A partir de meados da década de 80, alguns
doutrinadores (Luciano Amaro, Ives Gandra da Silva Martins e outros) já
passaram a apregoar o posicionamento do fato complessivo, principalmente em
congressos e seminários jurídicos. O dado curioso está no fato de que a atividade
legislativa que marcou os anos que sucederam a CF/88 pautou-se na obediência
à Teoria do Fato Gerador Complexivo, na esteira da doutrina então majoritária
17. 17
(Lei 9430/96, Lei 8383/91, etc.). Por fim, diga-se que, surpreendentemente, a
Súmula 584 do STF (já comentada) – editada na década de 80, no superado
contexto da “teoria da retrospectiva” – apresenta-se hábil e vigorosa para aquela
corte, em total dissonância com a doutrina majoritária. Esta, como se expendeu,
entende hábil a teoria do fato gerador complessivo.
A Lei 9113/96, que instituiu a CPMF, proibia o uso de informações dela
decorrentes para fiscalização de outras exações, “ex vi” do seu art. 11, § 3º. Essa
disposição se devia ao art. 38, § 1º, Lei 4595/64, a qual determinava que só o
Poder Judiciário poderia quebrar sigilo bancário de pessoa. Esse entendimento
era vigorante à época por leitura jurisprudencial. No entanto, o art. 5º, LC 105/01,
previu a possibilidade de investigação ampla pela autoridade fiscal, o que incluía
dados bancários. A Lei 105/01 alterou a redação do art. 11, § 3º, Lei 9113/96,
adequando-a às colocações da LC 10174/01, de sorte a permitir que dados sobre
CPMF servissem à fiscalização de outros tributos. Quanto a esse poder fiscal
amplo, garantido pelo diploma mais hodierno, em tese, não seria possível
retroação a fatos ocorridos sob a égide do art. 11, § 3º, Lei 9311/96, em letra
original. No entanto, essa retroatividade é permitida, porque a ampliação dos
poderes da Administração Tributária encontra fundamento no art. 144, § 1º, CTN,
segundo jurisprudência pacífica do STJ. Ademais, para fins penais, a corte já
fixou entendimento no sentido da natureza processual do art. 1º, § 3º, III, LC
105/01, o qual alterou o alcance do art. 11, § 3º, Lei 9113/96, tem aplicação
retroativa, não havendo de se falar em ilicitude da prova obtida anteriormente à
vigência do referido diploma complementar22
.
Princípio da Uniformidade Geográfica (art. 151, I, CF/88)
Trata-se de comando previsto em artigo distinto daquele que abarca
quase toda a base principiológica na CF/88 – o seu art. 150. É princípio afeto tão-
somente à União, isto é, à tributação federal.
Compete à União instituir o tributo UNIFORME no Brasil, devendo prever
as mesmas alíquotas em toda a extensão territorial. Assim, tal postulado vem ao
encontro da isonomia e, é claro, do pacto federativo (art. 60, § 4º, I, CF/88).
Há exceção, entretanto, ao princípio em tela, conforme se nota na parte
final do art. 151, I, CF/88: “... incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio
socioeconômico entre as diferentes regiões do país”. Exemplo: Zona Franca de
Manaus (observação: os benefícios fiscais foram prorrogados de 2013 para 2023,
conforme se depreende do art. 92 do ADCT, com redação dada pela EC 42/03).
Para Nogueira (1999), a regra do art. 152, CF/88 – a qual veda a “guerra
fiscal”, promovida pela União, entre os membros da Federação – é um
consectário do princípio da uniformidade geográfica, esculpido no art. 151, I,
CF/88. No diapasão, Baleeiro (apud NOGUEIRA, 1999) afirma que, "em
conseqüência dessa uniformidade, as discriminações dos tributos limitar-se-ão a
critérios pessoais, reais, ou de valor, mas nunca de lugar". Para este renomado
autor, o princípio em pauta presta-se à preservação da unidade territorial do
22
STJ, HC 31.448-SC, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 23/8/2007, Informativo do STJ n° 328.
18. 18
mercado nacional. O STF corrobora com o enunciado do art. 152, CF/88,
especialmente quando se trata de norma estadual referente a ICMS. De fato,
eventuais benefícios fiscais relativos à exação citada devem estar de acordo com
deliberações de convênio celebrado entre todos os Estados, sob pena de macular
o art. 155, § 2º, XII, “g”, CF/8823
. Em recente decisão quanto à redução de base
de cálculo sobre operações com café torrado e moído oriundo do Rio de Janeiro,
o Supremo declarou a disposição inconstitucional, porquanto fere o comando dos
arts. 152 e 155, § 2º, XII, “g”, CF/88 (Convênio CONFAZ 128/94)24
.
O princípio da uniformidade geográfica é decorrente da isonomia, sendo
exprimido no art. 151, I, CF/88. É ditame aplicado diretamente aos entes da
federação, só influenciando na esfera privada de forma reflexa. A União, por meio
de seus tributos federais, não poderá estabelecer discriminação tributária entre as
demais pessoas políticas. Ex.: não é possível IPI menor para automotores no RS
em detrimento dos demais Estados. As exações federais deverão ser uniformes
em todo território nacional. O próprio comando em comento foi excepcionado pelo
próprio constituinte, desde que se justifique pela situação concreta apresentada.
Com efeito, a União pode dar tratamento fiscal diferente para áreas com menos
desenvoltura financeira, com o fito de “promover o equilíbrio do desenvolvimento
sócio-econômico entre as diferentes regiões do País”. Não é mácula à isonomia,
mas sim tentativa de equiparação regional.
Princípio do Não Confisco (art. 150, IV, CF/88)
Nas palavras de Nogueira (1999, p. 126), confisco é “a absorção, pelo
tributo, da totalidade do valor da situação ou do bem tributado, como qualquer
parcela que exceda à medida fixada legalmente”. Na mesma esteira, Carrazza
(1991) diz que “é confiscatório o tributo que, por assim dizer, esgota (ou tem a
potencialidade de esgotar) a riqueza tributável das pessoas, isto é, que não leva
em conta suas capacidades contributivas”. Em outros termos, pode ele ser
entendido como tributação exacerbada, excessiva. De fato, o legislador não
definiu estritamente o termo, deixando ao arbítrio do aplicador do direito sua
configuração. Sabbag (2004, p. 38) preconiza que a caracterização do confisco é
ônus do contribuinte, porquanto ele deve suscitá-lo na esfera jurisdicional. Nesta
esteira, sua consubstanciação depende da análise “in casu”, levando em conta
uma hermenêutica sistemática do setor tributário (entendimento do STF).
Observação: quanto à possibilidade de existência de confisco em multa, o
STF já se manifestou positivamente, assentando o entendimento no direito de
propriedade (art. 5º, XXII, CF/88).
Dessa feita, a definição de confisco não é dada por colocação abstrata,
mas sim no caso concreto, segundo a razoabilidade e a proporcionalidade. Em
princípio, é um desiderato aplicado tão-só a tributos. Destarte, a jurisprudência
23
STF, ADI 1247 MC/PA, DJU 8.9.95; ADI 2021 MC/SP, DJU 25.5.2001; ADI 3936 MC/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, j.
19.9.2007, Informativo do STF n° 480.
24
STF, ADI 3389/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 6.9.2007, Informativo do STF n° 478; ADI 3673/RJ, rel. Min. Joaquim
Barbosa, j. 6.9.2007, Informativo do STF n° 478; ADI 2377 MC/MG, DJU de 7.11.2003; Plenário, RMS 17949/ES, DJU de
27.9.68.
19. 19
majoritária, com fulcro em entendimento do STF e conforme mencionado, diz
esse princípio é extensível às multas25
.
Princípio da Não Limitação ao Tráfego de Pessoas e Coisas (art. 150, V,
CF/88)
A base axiológica deste ditame – erigido em nível constitucional –
encontra tutela na própria Carta de 1988, particularmente no direito individual à
liberdade de locomoção (art. 5º, LV e LXVIII, CF/88). Dessa forma, não pode
haver exação que erija, como fato gerador, a intermunicipalidade ou a
binterestadualidade, no veio do deslocamento de pessoas e bens (SABBAG,
2004, p. 40). O autor ainda indica duas atenuações26
:
A instituição de pedágio, para a conservação das rodovias, vez que o
fato gerador é outro;
A exigência de comprovação de recolhimento de ICMS nos postos fiscais
em fronteiras interestaduais.
Princípio da Não-cumulatividade
É técnica de redução de carga tributária sobre o consumo, desonerando a
cadeia produtiva. Em termos genéricos, a não-cumulatividade se estende ao IPI
(art. 153, § 3º, CF/88), ao ICMS (art. 155, § 2º, II, CF/88), aos impostos residuais
da União (art. 154, I, CF/88), às contribuições sociais residuais federais (art. 195,
§ 4º, CF/88) e às contribuições sociais da União que incidam sobre faturamento,
receita e importação (art. 195, § 12, CF/88). Ex.: não cumulatividade de PIS e
COFINS (Lei 10833/03).
A não-cumulatividade não erige uma regra uniforme para todas as
exações. Cada tributo terá sua regência própria, nos termos do estipulado pelo
constituinte ou pelo legislador infraconstitucional, desde que a desoneração do
consumo seja atingida.
A não cumulatividade do IPI segue uma norma (art. 153, § 3º, II, CF/88): a
cada entrada, há um crédito; a cada saída, um débito. A base de cálculo é o valor
da operação, sendo somado ao tributo incorporado (tributo indireto com
repercussão econômica por transferência ao próximo da cadeia). Ex.: mercadoria
de R$ 100, com alíquota de 4%, sendo vendida por R$ 104. O imposto será pago
mensalmente, compensando-se a diferença entre créditos e débitos. O STF
definiu a extensão da não-cumulatividade do IPI, vinculando o direito a crédito à
tributação da operação anterior, em que pese não haver expressa previsão nesse
sentido no art. 153, § 3º, II, CF/88, ao contrário do ICMS (art. 155, § 2º, II, “a” e
“b”, CF/88). A expressão “imposto cobrado” faz entender que o constituinte quis
permitir a compensação somente na existência de operação anterior. Esse
25
STF, ADIn 2010/DF-MC, em que multa de 300% por não emissão de nota fiscal foi considerada confiscatória.
26
Além desses casos, a doutrina indica outros, de natureza diversa. A cobrança de exação para o ingresso em instância turística
não configura ranhura ao princípio da não-restrição à circulação, porquanto se trata de taxa, com necessária contraprestação.
De igual maneira, a incisão de tributo para o embarque em ônibus interestaduais ou intermunicipais não comporta ferimento ao
ditame do art. 150, V, CF/88.
20. 20
entendimento do Supremo foi alterado, porque, desde 1995, o plenário dava
ganho de causa aos contribuintes. Dessa feita, isenção, não-incidência,
imunidade e alíquota zero na operação anterior não dão direito à compensação
de crédito em IPI, consoante reiterada e hodierna jurisprudência do STF27
.
Como o IPI é imposto de repercussão econômica (transferência ao
próximo da cadeia), a restituição de montante recolhido a mais é dada nos termos
do art. 166, CTN. O comando condiciona a restituição a:
• Prova de que arcou com o ônus do tributo, não o repassando ao próximo
elo da corrente; ou
• Apresentação de autorização do próximo na cadeia a receber a
restituição em seu lugar, no caso de ter havido o repasse, visto que esse
é o contribuinte de fato do IPI e aquele, de direito. O STJ, apesar de
emprestar natureza jurídica de condição da ação de repetição de
indébito ao art. 166, CTN, admite que a justifica seja apresentada
posteriormente ao ajuizamento da demanda, mormente se houve
impossibilidade de fazê-lo antes28
.
O Supremo referenda o comando do art. 166, CTN, por meio de suas
Súmulas 71 e 54629
.
Imunidades Tributárias30
As imunidades tributárias indicam limitações constitucionais ao poder de
tributar, a par dos princípios anteriormente estudados. Trata-se de dispensas
constitucionais de tributos, isto é, normas de intributabilidade que gravitam em
torno da “não-incidência” tributária. Nos termos de Nogueira (1999, p. 167), “a
imunidade é, assim, uma forma de não-incidência pela supressão da
competência impositiva para tributar certos fatos, situações ou pessoas, por
disposição constitucional”.
Com efeito, a imunidade é uma delimitação negativa da competência
tributária, segundo a melhor doutrina. Como é sabido, a competência tributária
traduz-se no poder de instituição do tributo, conferido às entidades impositoras.
Note que estas, ao mesmo tempo em que se valem do poder de criar, devem se
afastar diante do campo imunizante estabelecido e demarcado pelo legislador.
Assim, a norma imunizadora coexiste com a norma de imposição, ambas
previstas na CF/88.
27
STF, RE 353657/PR, rel. Min. Marco Aurélio, j. 25.6.2007, Informativo do STF nº 473; RE 370682/SC, rel. Min. Ilmar
Galvão, j. 25.6.2007.
28
STJ, 2ª T., REsp 962.909-BA, rel. Min. Castro Meira, j. 20/9/2007, Informativo do STJ n° 332.
29
Súmula 71 do STF: “Embora pago indevidamente, não cabe restituição de tributo indireto”. Súmula 546 do STF: “Cabe a
restituição do tributo pago indevidamente, quando reconhecido por decisão, que o contribuinte de jure não recuperou do
contribuinte de facto o quantum respectivo”.
30
Além dos pontos tratados na matéria, Cassone, op. cit., p. 255 e 256, indica alguns outros a serem discutidos quanto às
imunidades: deve se lhes aplicar interpretação extensiva, em acordo com a finalidade da imunidade e com a razoabilidade; é
possível a regulamentação da imunidade por lei infraconstitucional; as obrigações acessórias não são atingidas pela imunidade
(art. 194, parágrafo único, CTN).
21. 21
É importante frisar que as principais imunidades referem-se a impostos
(art. 150, VI, CF/88). Entretanto, há exemplos pertinentes que indicam
imunidades para tributos diversos de impostos. Note:
a.Art. 195, § 7º, CF/8831
– contribuição previdenciária (entidades
beneficentes de assistência social). Observação: a expressão “são
isentas de...” indica impropriedade terminológica para o STF, que vê no
dispositivo nítido exemplo de imunidade.
b.Art. 149, § 2º, I, CF/88 (EC 33/01) – CIDE’s e contribuições
previdenciárias (receitas decorrentes de exportação).
c.Art. 184, § 5º, CF/88 – impostos de todas as pessoas jurídicas
(operações de transferência de imóveis desapropriados para a reforma
agrária). Nesse sentido, o art. 18, “caput”, LC 76/93, isentou tais fatos
também de taxas judiciais e emolumentos cartoriais.
d.Taxas para certidões, para protocolização de certas ações coletivas, etc.
Vamos, agora, às principais imunidades previstas no art. 150, VI, CF/88:
Há quatro alíneas (DECORAR).
São casos de não-incidência de impostos, o que permite concluir pela
normal incidência dos demais tributos (taxas, contribuições de melhoria,
etc.).
1.Alínea “a” (IMUNIDADE RECÍPROCA) – União, Estados, Municípios e
DF não poderão cobrar impostos uns dos outros.
− Elemento teleológico – quis o legislador proteger os entes tributantes
contra a reciprocidade na tributação de impostos. Com efeito, o
imposto é tributo unilateral, indicando um poder de sujeição daquele
que tributa com relação àquele que é tributado. Neste passo, a
provável incidência colocaria em risco o pacto federativo – o próprio
elemento teleológico da imunidade em exame.
− Atenção – a alínea “a” apresenta menção a rol classificatório oriundo
do CTN (arts. 19 a 73) – “impostos sobre patrimônio, renda ou
serviços”. Segundo a literalidade do comando, não deverá haver a
incidência de IPTU, de IPVA, de IR, de ITR e de ISS, por exemplo. A
questão é problemática: e os impostos não pertencentes ao rol
mencionado, tais como II, ICMS, IPI e o IOF? Para o STF e
renomados tributaristas32
, a imunidade deve abranger quaisquer
espécies de impostos, independentemente da limitação
classificatória ora guerreada. Exemplos:
Não-incidência de IOF nas operações financeiras desencadeadas
pelos Municípios (STF).
31
O dispositivo exigiu lei regulamentadora para surtir reflexos, cujo prazo para publicação não foi definido. O STF, no MI
232-1/RJ, rel. Min. Moreira Alves, ajuizado pelo Centro de Cultura, inovou seu entendimento. Adotando uma posição
concretista moderada, fixou prazo para que o legislador se manifestasse acerca da omissão legislativa, findo o qual a própria
corte asseguraria o direito subjetivo em comento – no caso, imunidade de contribuições sociais para entidades beneficentes de
assistência social (art. 195, § 7º, CF/88).
32
Regina Helena Costa, por exemplo, em “Imunidades Tributárias”, editado pela Malheiros.
22. 22
Não-incidência de II nas operações de importação de um
Estado qualquer.
− Análise do art. 150, § 2º, CF/88 – há extensão da imunidade
recíproca às autarquias e fundações públicas, desde que se
cumpram às necessidades essenciais/precípuas da entidade. Não
perca de vista que a condição se atrela tão-só ao § 2º, não existindo
para a alínea “a”. Exemplos:
Uma autarquia, proprietária de bem imóvel utilizado para
finalidade esdrúxula, receberá a tributação de imposto.
Uma empresa pública, por exemplo, a CEF, é alvo normal da
incidência de impostos (Concurso de Advogado da CEF).
DADO JURISPRUDENCIAL RELEVANTE – há certas empresas
públicas que executam atividades revestidas de estatalidade,
apresentando-se com nítida “roupagem” estatal. Nesta medida,
perguntar-se-ia: é válida a extensão da imunidade a elas? Para o STF,
a resposta é afirmativa, valendo a pena ao estudioso consultar
jurisprudência pertinente. Nesse sentido, são a EBCT (Empresa
Brasileira de Correios e Telégrafos), quanto ao serviço postal, com
fulcro no art. 21, X, CF/88, e a INFRAERO (Empresa Brasileira de Infra-
Estrutura Aeroportuária), com base no monopólio estatuído no art. 21,
XII, “c”, CF/8833
.
2.Alínea “b” (IMUNIDADE PARA OS TEMPLOS DE QUALQUER CULTO)
Elemento teleológico – a razão finalística da proteção constitucional
está na liberdade de culto/religiosa (art. 5º, VI, CF/88), que caracteriza
o laico Estado brasileiro (art. 19, I, CF/88). A doutrina majoritária a
considera imunidade subjetiva, mas Cassone (2004, p. 254)
denomina-a de objetiva, pois estaria ligada à atividade e não à pessoa
da entidade religiosa.
Abrangência – a imunidade alberga o templo e seus anexos,
emanando os efeitos da não-incidência para o veículo da igreja, para
a casa do representante religioso, para as rendas obtidas nos eventos
religiosos, etc.
Análise do art. 150, § 4º, c.c. alínea “b” do inciso VI, CF/88 – as
igrejas deverão respeitar o cumprimento da finalidade essencial (§ 4º).
Entretanto, o STF entende ser possível a execução de atividades
inessenciais pelo templo (locação de bens de sua propriedade) e,
mesmo assim, ter a extensão da imunidade de templo ao bem
locado34
. Há condições para isso: prova da inexistência de prejuízo à
livre concorrência; prova da aplicação integral das rendas na
consecução dos objetivos institucionais do templo. Ex.: a Igreja
33
STF, RE 265749/SP, DJU 2.2.2007; RE 357291/PR, DJU 2.6.2006; RE 407099/RS, DJU 6.8.2004; 2ª T., RE 363412
AgR/BA, rel. Min. Celso de Mello, j. 7.8.2007, Informativo do STF n° 475.
34
STF, AgRg RE 205.169-7, 2ª T., rel. Min. Marco Aurélio Mello, DJU 5-6-1998, p. 10. Jurisprudência extraída de Cassone,
op. cit., p. 256.
23. 23
apostólica, uma vez que caracterize vínculo causal à sua função
precípua, pode remeter divisas para o Vaticano, o que não abarca o
envio puro e simples de valores ao Estado Católico.
3.Alínea “c” (IMUNIDADE PARA PARTIDOS POLÍTICOS, ENTIDADES
SINDICAIS DE TRABALHADORES, INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO E
ENTIDADES DE ASSISTÊNCIA SOCIAL)
Natureza – trata-se de imunidade subjetiva35
, destinada a pessoas
jurídicas, sobre as quais não incidirão exações não vinculadas
(impostos).
Elemento teleológico – cabe frisar que, como opção política do
legislador, a regra imunitória prevista na alínea “c” vem ao encontro
dos valores mais relevantes, previstos no texto constitucional. Vamos
detalhá-los, tentando identificar o elemento finalístico de cunho
axiológico, que moveu o constituinte em cada caso:
−Partidos políticos – a regra visa proteger a liberdade política no
Brasil, prevendo a exoneração de impostos sobre os partidos
políticos. Com efeito, o pluralismo político é um dos fundamentos da
nossa Federação (art. 1º, V, CF/88), delineando a necessidade de
tutela àquelas entidades que traduzem politicamente os anseios
plurais dos filiados – e de toda a coletividade. As fundações ligadas
aos partidos também gozam da prerrogativa prevista na Lei Maior.
Ex.: Fundação Pedroso Horta, pertencente ao PMDB. Somente
partidos políticos registrados no TSE serão abarcados pelo benefício
em tela, não incluindo aqueles clandestinos, contrários à ordem
constitucional-democrática posta. Ex.: partido neonazista.
−Entidades sindicais de trabalhadores – objetiva a proteção dos
direitos sociais (art. 7º, CF/88) e, mais precisamente, abrigo àqueles
que ocupam, em tese, o pólo mais fragilizado da relação laboral – os
empregados. Curioso apontar a existência de um ponto de
convergência entre o Direito do Trabalho e o Direito Tributário. No
entanto, é importante firmar que se protegem os sindicados dos
empregados, isto é, as entidades obreiras. Assim, o legislador
admitiu a normal tributabilidade dos sindicatos patronais,
segundo postulam Carrazza (1991), Cassone (2004) e doutrina
majoritária36
. Há vozes minoritárias na doutrina que preconizam
violação à isonomia, em face do discrime aventado, propugnando
pela inclusão dessa entidade no rol dos imunes. É o que professam
Chimenti (2002) e Machado (1993).
−Instituições de educação – idem colocações infra sobre as
expressões “in fine” da alínea “c”.
35
Cassone, op. cit., p. 254 e 255, considera a imunidade prevista no art. 150, VI, “c”, CF/88, como mista, ou seja, aquela
dispensada a determinados bens (renda, patrimônio e serviços) de certas pessoas (partidos políticos, sindicatos de empregados,
instituições de educação e de assistência social).
36
Cf. Ac. 8.872 do TAPR, 3ª Câm. Cív., AC 106.838.000 – Maringá, Juiz conv. Eugenio Achille Grandinetti, j. de 19-8-1997,
publ. Em 5-9-1997, Juis, Saraiva, n. 17.
24. 24
−Entidades de assistência social – ibidem. Além de tudo, no
magistério de Sabbag (2004, p. 51), necessário é lembrar que tais
pessoas também são imunes às contribuições sociais, consoante
comando exprimido no art. 195, § 7º, CF/88.
−Análise das expressões constantes da parte final da alínea “c”:
o“Sem fins lucrativos” – o legislador fez menção a termo pouco
elucidativo – o lucro. De fato, quis mencionar o superávit, isto é, a
diferença entre receitas e despesas financeiras da entidade.
Portanto, a expressão merece uma associação cautelosa, pois o
“lucro”, em tese, estaria ligado de modo imediato às entidades
educacionais e beneficentes, não obstante a mediata ligação a
todas pessoas citadas37
.
o“Atendidos os requisitos da lei” – é fácil perceber que se trata de
condicionamento imposto à norma, o que permite chamá-la de
imunidade condicionada ou limitada (SILVA, 1996). Ademais, há
quem a denomine de “norma não bastante em si mesmas” (Pontes
de Miranda), dependendo de regulamentação futura, segundo
Maria Helena Diniz, de integração, segundo Celso Bastos e Carlos
Ayres Brito, e não auto-aplicável, nas palavras de Rui Barbosa.
Nesse passo, insta inquirir: qual lei será esta? O STF e a doutrina
majoritária, como Machado (1993), Amaro (2006), José Eduardo
Soares de Melo, Misabel Derzi, Paulo de Barros Carvalho,
Chimenti (2002), Cassone (2004) e Sabbag (2004), entendem que
se trata de lei complementar, “ex vi” do art. 146, II, CF/88, que
impõe tal norma às limitações constitucionais ao poder de tributar
(imunidade). No caminho hermenêutico ora trilhado, perguntar-se-
ia: qual lei complementar será esta? É sabido que o CTN (Lei
5172/66) foi concebido como lei ordinária, porém, desde então, em
razão das matérias disciplinadas naquele compêndio, ganhou o
“status” de lei complementar, sendo assim recepcionado pela
CF/88. Portanto, a resposta à pergunta é clara: a lei complementar
que traduz a condição imposta às imunidades será o CTN.
Nesse contexto, o art. 14, I a III, CTN anuncia, em seus três
incisos, os requisitos à fruição da imunidade. São eles:
I. Não distribuição do patrimônio ou renda, a qualquer título
(LC 104/01), entre os mantenedores da entidade. Note que
aquela expressão da CF/88 – “sem fins lucrativos” – deve ser
traduzida à luz deste inciso I. Não se veda o resultado positivo
na entidade, nem mesmo o “animus lucrandi”. O que se quer é o
REINVESTIMENTO daquele resultado nos objetivos
institucionais, vedando-se a apropriação particular do lucro.
Note que as entidades educacionais e assistenciais poderão – e
37
Em sentido contrário, Luciano Amaro, Direito Tributário Brasileiro, 12ª ed., São Paulo, Saraiva, 2006, p. 155, apregoa que
o alcance das expressões se atém somente às entidades educacionais e assistenciais, não havendo de cogitar sua aplicação aos
partidos políticos e sindicatos de trabalhadores.
25. 25
deverão – almejar o resultado financeiro positivo, merecendo
a proteção da imunidade, se cumprirem a exigência ora
analisada. Diga-se, por fim, que o MANTENEDOR da instituição
poderá receber uma contraprestação pelos serviços realizados,
entretanto, os valores não poderão se apresentar como
“distribuição” disfarçada de lucro”. Nesse passo, a análise é
subjetiva, indicando a jurisprudência no sentido da adstrição a
valores de mercado.
II. Não aplicação de recursos fora do país, prejudicando a
manutenção dos objetivos institucionais – trata-se de
requisito óbvio, pois, diante do resultado positivo, é natural que
se apliquem os valores na consecução dos objetivos
institucionais, não os carreando para países estranhos. O
eminente Aliomar Baleeiro cita curioso exemplo de gasto com
universitário, ligado à instituição educacional, em país
estrangeiro. Haveria desrespeito ao inciso em análise? Para o
mestre, não se perderia a imunidade, havendo respeito à
disposição legal. É o caso também de instituição filantrópica
internacional, a qual possui filial no Brasil. Uma vez que
caracterize vínculo causal à sua função precípua, pode remeter
divisas para o exterior, não incluindo o envio desvinculado de
valores ao exterior.
III. Manter a escrituração contábil em dia e hábil a provar o
cumprimento dos requisitos anteriores – sem a
demonstração mencionada, os pressupostos dos incisos I e II
são iníquos.
Observações finais – caso a entidade deixe de cumprir os requisitos
do art. 14, I a III, CTN, passará, imediatamente a ser alvo da
TRIBUTAÇÃO, devendo passar a recolher os impostos. A legislação
pertinente (art. 14, § 1º, CTN) trata o assunto com terminologia
criticável, segundo Amaro (2006) e José Eduardo Soares de Melo,
quando permite à autoridade “cassar” a imunidade, como uma
“punição”, o que não parece de todo apropriado. É, sim, mera
paralisação dos efeitos imunitórios. De fato, Amaro (2006, p. 157)
chama o art. 14, § 1º, CTN de aberrante, conquanto sua redação
parece pretender instituir um Poder de punição à autoridade tributária,
a qual poderá realizar ou não a ação – na expressão “pode fazê-lo” –,
mediante ato discricionário.
Análise do art. 150, § 4º, CF/88 – repetindo comentário supra, o STF
analisa tal comando, afastando a interpretação restritiva, quanto ao rol
classificatório ali inserto – impostos sobre o patrimônio, renda ou
serviços. Ademais, aquela Corte interpreta a expressão “finalidade
essencial” de modo lato, permitindo a extensão da imunidade a bens
ligados a atividades inessenciais (locação, arrendamento, etc),
desde que se cumpram os requisitos já conhecidos, quando dos
comentários retro sobre a imunidade de templos: prova da aplicação
26. 26
integral das rendas nos objetivos institucionais (Ex.: alugueres
recebidos de locação de área pertencente à entidade filantrópica) e da
inexistência de prejuízo à livre concorrência (aferição por meio de
critérios subjetivos). A prova deve ser feita pelo titular da imunidade38
.
A propósito, incidiria o ICMS nas rendas e bens provenientes de
bazares organizados por entidade filantrópica? A 1ª Turma do STF
sempre entendeu que deveria haver a incidência do imposto, em
razão da teoria da repercussão tributária, segundo a qual o ônus
recai sobre o contribuinte de fato (adquirente), e não sobre o
contribuinte de direito (a entidade). A 2ª Turma, por sua vez, entendia
cabível a não incidência. O STF (Pleno), em 2 de fevereiro de 2003,
no RE 210.251-2-SP, decidiu por maioria pela não incidência de ICMS
nas vendas, desde que o lucro fosse reinvestido39
. É a posição
cristalizada na Súmula 724 do STF40
.
Súmula 730 do STF41
– as entidades fechadas de previdência social
serão imunes quando não houver contribuição dos beneficiados, à
luz dos conceitos de universalidade e generalidade. A participação
onerosa do beneficiário no plano de previdência privada, fruto de
relação contratual entre o órgão e a categoria específica, afasta a
imunidade, consoante entendimento já firmado pelo Pretório
Excelso42
.
4.Alínea “d” (IMUNIDADE PARA LIVROS, JORNAIS, PERIÓDICOS E O
PAPEL DESTINADO À SUA IMPRESSÃO)
Natureza – é objetiva, porque está ligada a bens e não pessoas. De
fato, a alínea “d” versa sobre bens e não sobre pessoas, ao contrário
das demais (“a”, “b” e “c”). Nessa medida, é imunidade objetiva ao
afastar a incidência de impostos reais (sobre os bens),
exclusivamente. Vale dizer que a editora, por exemplo, receberá a
carga de impostos sobre si, naturalmente. Em contrário senso, não
incidem sobre o livro e sucedâneos: ICMS, IPI, II, IE, etc. E incidirão,
normalmente: IPVA (carro da editora), IR (renda da venda dos
livros), ITBI (aquisição de prédio pela editora), etc. Mas a regra da
imunidade não inclui atividades ligadas ao bem, como é o caso de ISS
sobre a publicidade nas publicações.
Elemento teleológico – é a difusão do conhecimento e da cultura.
Independe do conteúdo difundido, isto é, a proteção alcança as
revistas pornográficas (material fescenino), aquelas de pouco
38
STF, AgRgRE 106.169-7, rel. Min. Marco Aurélio, DJU e-1, de 5-6-1998, p. 10.
39
STF, Pleno, RE 210.251-2/SP, rel. Min. Ellen Gracie, j. 2-3-2003, DJU 19-11-03; RE 286.692, Informativo do STF nº 220;
RE 237.718-SP, DJU 6.9.2001; RE 235.737-SP, DJU 12.11.2001. No mesmo sentido, defende Amaro, op. cit., p. 154.
40
Súmula 724: “Ainda quando alugado a terceiros, permanece imune ao iptu o imóvel pertencente a qualquer das entidades
referidas pelo art. 150, VI, c, da Constituição, desde que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades essenciais de tais
entidades”.
41
Súmula 730 do STF: “a imunidade tributária conferida a instituições de assistência social sem fins lucrativos pelo art. 150,
vi, c, da constituição, somente alcança as entidades fechadas de previdência social privada se não houver contribuição dos
beneficiários”.
42
STF, RE 202.700/DF.
27. 27
conteúdo informativo, etc. Encontra guarida constitucional nos arts.
5º, IV, IX e XIV, e 220, § 6º, CF/88.
Mídia eletrônica – a doutrina mais abalizada, representada, dentre
outros, por José Eduardo Soares de Melo e por Cassone (2004), e a
jurisprudência vêem a EXTENSÃO da imunidade aos livros na forma
de CD-Rom. Justificam que a imunidade deve ser aferida a partir do
fim da difusão do conhecimento, e não em razão do suporte difusor de
cultura. O art. 2º, parágrafo único, VII, Lei 10753/03 (Lei da Política
Nacional do Livro) equipara o livro em meio digital a livro impresso,
reforçando a tese majoritária.
Lista telefônica – segundo entendimento assentado pelo STF, as
listas telefônicas são imunes, na condição de periódicos,
independentemente da ausência de conteúdo informativo43
. Na
mesma idéia, vêem outras decisões do Excelso Pretório aceitando a
extensão da imunidade a manuais técnicos e apostilas44
.
Insumo – o único insumo protegido pela regra será o PAPEL
destinado à impressão. Entretanto, foi publicada a Súmula 657 do
STF45
, que estendeu a imunidade da alínea “d” aos filmes e papéis
fotográficos necessários à publicação de jornais e revistas. Em
sentido contrário, Chimenti (2001, p. 41) leciona que imunidade a
deve abranger todos os meios indispensáveis à produção dos objetos
imunes, como equipamentos destinados à função. Ex.: imunidade de
II sobre máquinas de impressão de jornais. Não é a posição
cristalizada pelo Excelso Pretório, porquanto este procura conferir
uma interpretação restritiva ao dispositivo46
.
Pergunta: A jurisprudência tem entendido que as imunidades devem ser
interpretadas ampliativamente?
Resposta: a jurisprudência tem admitido sempre a aplicação da
imunidade de forma restritiva, valorizando os direitos fundamentais que lhe são
afetos. Lembre-se que não havendo tributação, a norma imunizante deve ser
observada com bastante rigor e os Tribunais caminham neste sentido.
Pergunta: Uma imunidade pode ser regulamentada por lei ordinária ou
complementar? Ou é auto-aplicável?
Resposta: imunidade acaba sendo implantada por lei ordinária, tendo em
vista ser a Receita Federal o órgão escolhido para certificar tal proteção
constitucional.
Pergunta: Como fica a situação das obrigações acessórias quando há
imunidade: elas são devidas?
43
STF, RE 101.441/RS; RE 199.183, rel. Min. Marco Aurélio, DJU 12.06.1998.
44
STF, RE 183.403-SP, rel. Min. Marco Aurélio, DJU 07.11.2000.
45
Súmula 657 do STF: “A imunidade prevista no art. 150, VI, d, da CF abrange os filmes e papéis fotográficos necessários à
publicação de jornais e periódicos”.
46
STF, RE’s 204.234, 203,859 e 273.308/SP, rel. Min. Moreira Alves, DJU 22.8.2000.
28. 28
Resposta: lembre-se que, se não há tributação, não há obrigação
principal e muito menos acessória, no que diz respeito aos impostos. Caso haja
cobrança de uma contribuição social, por exemplo, a obrigação acessória
persistirá, pois esta modalidade tributária não é abarcada pela imunidade, daí o
teor do art. 9º do CTN. No entanto, o art. 194, parágrafo único, CTN, deixa claro
que as pessoas imunes, assim como as isentas, sujeitam-se à fiscalização
tributária, o que, em tese, engloba as obrigações acessórias.
Pergunta: quanto à imunidade condicionada do art. 150, VI, “c”, CF/88, foi
dito que o art. 14, I a III, CTN, estabelece as condições para o exercício, segundo
o STF e a doutrina majoritária. Entretanto, o art. 12, § 2º, “a”, Lei 9532/97, e o art.
3º, § 2º, III, D. 4382/02, inovam em suas disposições, preceituando condição
inexistente na citada LC. Como compatibilizar os dispositivos?
Resposta: a Constituição Federal estabelece que os requisitos da 'lei'
devem ser cumpridos. O termo lei, sem adjetivo algum, corresponde à figura da
lei ordinária, abarcando assim, as mencionadas disposições citadas por V.Sa.
Não há que se falar em incompatibilidade já que a lei e a LC (CTN) especializarão
o assunto a ser implementado.
Pergunta: o art. 2º, parágrafo único, VIII, Lei 10753/03 (Política Nacional
do Livro) equipara o livro somente às mídias eletrônicas destinadas a deficientes
visuais exclusivamente. Ademais, o "caput" do dispositivo deixa claro que suas
conceituações valem intrinsecamente ao diploma ("para efeitos dessa lei"). Nesse
passo, à guisa do entendimento do STF, a disposição legal não poderia ser
usada como argumento jurídico para extensão da imunidade do art. 150, VI, “d”,
CF/88. A posição está correta?
Resposta: já ocorre uma aplicação extensiva em função de outro
raciocínio. O termo livro quer representar um suporte físico que tanto pode ser
escrito em papel ou digitalizado, nesse sentido o CD-rom recebe seu tratamento
imunizante.
Pergunta: quanto ao art. 156, XI, CTN, há alguma regulamentação ou
aplicação em vigor? Qual? Ela seguiu a orientação do art. 146, III, “b”, CF/88?
Resposta: Não, o assunto deve ser regulado por cada uma das pessoas
políticas interessadas (M, E-m, DF e UF). O inciso XI do art. 156 do CTN foi
incluso pela Lei Complementar n.104/01, respeitando as previsões expressas da
CF, em seu art.146, III.
Pergunta: uma entidade, recebendo certificação de organização social ou
de organização da sociedade civil de interesse público, somente por esse fato,
faz jus à imunidade do art. 150, parágrafo VI, “c”, CF/88? Como é concedida a
imunidade em termos práticos? Por requerimento às Fazendas e autarquias de
capacidade tributária ativa? Basta um requerimento ou deve ser feito a todos?
Resposta: não, uma entidade, recebendo certificação de organização
social ou de organização da sociedade civil de interesse público, somente por
esse fato, não faz jus à imunidade do art. 150, parágrafo VI, “c”, CF/88. Apenas a
entidade assistencial social ou educacional, conforme expressa disposição
constitucional, pode, após ter cumprido os requisitos da lei para receber a
29. 29
concessão da imunidade, receber a concessão imunizante. Deve ser pleiteada
perante a Receita Federal, via requerimento conforme estabelece os
procedimentos da Receita e Lei nº 9532/97, em seus arts. 12 e 13, e Lei
10.637/02.
Sistema Tributário Nacional
Quando se deu a formação do Sistema Tributário Nacional (STN)?
Qual a importância da EC 18/65?
A EC 18/65 foi a criadora do Sistema Tributário Nacional. Transformou a
Carta de 1946, sendo chamada de a grande reforma tributária brasileira (primeira
delas). Criou um regime sistematizado, especialmente voltado para fruição de
algumas liberdades fundamentais, em consonância com o setor fiscal
(NOGUEIRA, 1999, p. 118). Nas negociações entre as forças políticas da época –
com mediação do então presidente do STF, Aliomar Baleeiro –, por ocasião do
golpe de 1964, foram firmados dois pontos: sujeição à Lei de Diretrizes
Orçamentárias (Lei 4320/64) e EC 18/65 (STN). Esta última configurou um marco
no Direito Tributário brasileiro, fazendo nascer uma vertente doméstica moderna
nesse ramo. No Brasil, até tal diploma, não existia equilíbrio entre Estado e
cidadão na atividade fiscal. O princípio da supremacia do interesse público era
levado a cabo exacerbadamente (“I need, I can”). A constitucionalização do
Direito Tributário configurou a positivação de um mecanismo que conferiu
garantias mínimas das liberdades individuais (“ability to pay”): imunidades, regras
rígidas de competência, etc.
Qual é a característica do STN (rigidez x flexibilidade)?
Quanto à rigidez/flexibilidade, o STN segue o mesmo diapasão da própria
Constituição: sendo essa rígida, também o é aquele. Para Cassone (2004, p. 26),
a rigidez em matéria tributária se atém a dois aspectos: instituição constitucional
de impostos e princípios constitucionais tributários. Destarte, há uma grande
crítica a essa premissa da CF/88, porquanto houve mais de 50 emendas em
pouco mais de 15 anos de sua existência. O Poder Constituinte Derivado
Reformador deveria permitir a adaptação dos preceitos inicialmente constituídos
às mudanças sociais ocorridas. Porém, esse Poder deveria ser utilizado “cum
grano salis”. Para refrear o ímpeto do constituinte reformador, foi erigido o
sistema do bicameralismo duplo de 3/5 (art. 60, § 2º, CF/88) para garantir a
necessária rigidez. Não funcionou a contento! Politicamente, a EC
consubstanciou um instrumento de implementação de políticas do Executivo. De
fato, a concepção crítica sugere uma verdadeira flexibilidade da CF/88 e, por
conseqüência, também do STN.
Qual é a estrutura do STN?
A estrutura do STN é quaternária: poder de tributar, competência tributária,
limitações ao poder de tributar (princípios e imunidades) e repartição de receitas
tributárias47
.
47
Eduardo de Moraes Sabbag, Direito Tributário, São Paulo, Prima Cursos Preparatórios, 2004, defende que o Sistema
Tributário Nacional é ternário, composto de princípios, imunidades e tributos.
30. 30
A estrutura do Estado é viabilizada mediante um preço, aduzido
materialmente por meio da tributação. O Estado de Direito enxerga na tributação
a via pela qual ele efetiva suas funções. A coletividade deve contribuir,
coercitivamente, para formar o bolo, de modo a permitir a consecução dos fins da
própria gestão pública. Segundo Carlos Ayres Brito, garantir o mínimo de
existência (de essencialidade) quanto aos direitos fundamentais deve ser a pauta
do Estado (vida digna – mínimo essencial – garantia e efetivação dos direitos
fundamentais – prestação de serviços públicos). O Estado, em uma atividade
administrativa, deve prestar serviços públicos mínimos, de interesse coletivo,
propiciando uma vida digna. Esta tarefa será efetivada por meio da Administração
Pública, a qual pressupõe um custo para agentes, para órgãos e para serviços
respectivos (JERKINS apud DI PIETRO, 2006). Esse arcabouço será mantido
pelas receitas originárias e, principalmente, pela atividade fiscal ou receitas
derivadas (tributação). Dessa feita, o legislador recebe do constituinte o poder de
impor a tributação, de acordo com a capacidade contributiva isonômica: a cada
um na medida de suas possibilidades. O ato de tributação, em sua essência
ontológica, é extorsivo. Dessa forma, somente a chancela do constituinte poderia
garantir-lhe legitimidade. E ela foi efetivada pela instituição do poder de tributar.
PODER DE TRIBUTAR é prerrogativa de impor a tributação, de criar
tributo. É exercido pelos entes políticos (União, Estados, DF e Municípios),
titulares da competência tributária. O instrumento de criação do tributo é a lei.
Neste sentido, somente aquelas pessoas que possuem Poder Legiferante
(Congresso Nacional, Assembléia Legislativa, Câmara Legislativa, Câmara
Municipal) podem instituir tributos. O poder de tributar, à luz do art. 145, “caput”,
CF/88, é uma faculdade. Todavia, a LC 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal),
com o intuito de estabelecer um equilíbrio nas contas públicas, preceitua, em seu
art. 11, “caput”, que a gestão fiscal equilibrada pressupõe, dentre outras medidas,
a criação de tributos. Desta forma, conclui-se que o exercício da competência
tributária é obrigatória, sob pena de renúncia de receita e, em conseqüência, de
responsabilidade fiscal. Considerando que o dispositivo legal está em choque
com o art. 145, “caput”, CF/88, diz-se que padece de inconstitucionalidade. E por
que não há ADIn? Pela razão fática de que o Estado já onera o contribuinte por
demais, criando tributos até mesmo de forma errônea. Deve-se distinguir,
entretanto, o direito potestativo de tornar exigível a obrigação (adequado ao
lançamento) e o direito subjetivo de crédito, que surge depois da exigência.
COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA é o poder recebido do constituinte para
servir ao custeio da máquina estatal, direcionado aos entes políticos – que,
sabendo que não tem o todo, detêm parte dele – para exercê-lo dentro dos limites
de sua circunscrição e mediante determinadas condicionantes (imunidades e
princípios, os quais conformam as limitações ao poder de tributar). Com efeito, a
divisão nacional do poder de tributar é a fatia de competência tributária relegada
a cada um dos entes políticos.
LIMITAÇÃO AO PODER DE TRIBUTAR tem dois objetivos e se faz
mediante dois instrumentos: proteção ao federalismo e aos direitos fundamentais,
havidos por meio das imunidades e dos princípios. Ex.: a imunidade de livros
presta-se a maximizar a divulgação de idéias, exercício de direito fundamental
31. 31
(arts. 5º, IV, IX, XIV, e 220, § 6º, CF/88); assim como é a imunidade de templos
e religiões, porque se presta à liberdade de culto (art. 5º, VI, CF/88). A imunidade
tributária é uma regra de não-incidência da competência tributária, aduzida e
qualificada pela Constituição, tendo como fim promover o federalismo e a
proteção aos direitos fundamentais. À guisa dessas não-incidências, existem as
regulações do poder de tributar, ou seja, regras a determinar como deve ser
exercida a competência tributária, com o mesmo escopo federalista e valorizador
dos direitos humanos.
REPARTIÇÃO DAS RECEITAS TRIBUTÁRIAS – decorre do ranço de
valorizar majoritariamente o Poder Central. Em contrapartida, o constituinte
colimou re-equilibrar a federação, conferindo parte da receita auferida por uns
entes a outros. O poder de tributar foi criado para garantir autonomia financeira à
pessoa política, porque a exploração econômica do patrimônio público é prática
na contramão da tendência moderna e pós-moderna. De forma suplementar ao
poder de tributar, o constituinte institui o mecanismo de repartição das receitas,
para que os maiores entes políticos não fiquem com todas as rendas tributárias.
Neste diapasão, a União deve entregar parte de sua riqueza tributável aos
Estados e aos Municípios. É fato de que toda esta renda, concretamente, é
produzida no município. Fazendo tais considerações, se for o caso de tributo,
cuja receita deva ser repartida com outro ente político, por comando
constitucional, o exercício da competência é coercitivo. Ex.: metade do IPVA
é destinado ao município onde foi emplacado o veículo (art. 158, III, CF/88); 25%
do ICMS é destinado aos municípios do respectivo Estado arrecadador (art. 158,
IV, CF/88); 22,5% do IR forma o Fundo de Participação dos Municípios (art. 159,
I, “b”, CF/88); 21,5% do IR forma o Fundo de Participação dos Estados (art. 159,
I, “a”, CF/88); 3% do IR vai para programas de financiamento do setor produtivo,
destinado às áreas geográficas menos desenvolvidas (Norte, Nordeste e Centro-
Oeste), com o fim de efetivar a idéia da união federativa (art. 159, I, “c”, CF/88);
10% do IPI aos Estados, nas respectivas atividades de exportação de produtos
industrializados (art. 159, II, CF/88).
Entretanto, é cediço postular que a Constituição, em si, não cria tributos,
em qualquer esfera de Poder. A CF/88 somente determina a competência
tributária. As Constituições estaduais e distrital e as leis orgânicas municipais
também não criam as exações nem determinam competências. Quem institui os
tributos é a lei ordinária, em regra, e lei complementar excepcionalmente,
mediante o comando autorizador dado pelo constituinte federal.
O SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL possui dois enfoques:
1ª corrente – será nacional quando suas normas vinculam,
simultaneamente, todos os entes políticos (União, Estados, DF e
Municípios). Ex.: arts. 145 e 150, CF/88. Também é nacional a norma
que vincula determinada categoria de pessoa política. Ex.: arts. 155 e
156, CF/88. Todavia, há normas exclusivamente federais, quando estas
se aplicam exclusivamente à União. Ex.: arts. 148, CF/88.
32. 32
2ª corrente – é integralmente nacional. Quando uma norma da CF/88
dá competência tributária para um ente determinado político,
simultaneamente retira dos demais.
Teoria Geral da Tributação
CONCEITO DE TRIBUTO – etimologicamente, tributo vem do latim
“tributum”, ou seja, aquilo que um Estado (ou tribo) devia a outro em decorrência
de autêntica relação de vassalagem (FÜHRER e FÜHRER, 2001, p. 17). A
definição jurídica de tributo encontra-se no art. 3º, CTN. Tributo é prestação
pecuniária compulsória, pago em moeda ou outro valor que possa nela ser
exprimido, diversa de multa, instituída por lei e cobrada por lançamento.
Prestação pecuniária48
– está ligada à idéia de riqueza, de vantagem
patrimonial. Pecúnia é a moeda corrente (Real) ou o próprio cheque.
Tais formas de pagamento do tributo são usuais, convivendo, por outro
lado, com métodos antiquados de pagamento: vale postal, estampilha,
papel selado, etc. (art. 162, I e II, CTN). Não se admite o tributo “in
natura”, isto é, aquele pago com bens agrícolas, por exemplo. A LC
104/01 inseriu o inciso XI no art. 156 do CTN, ao prever uma nova causa
extintiva do crédito tributário – a dação em pagamento. Trata-se de
instituto oriundo do Direito Privado (art. 356 a 359, CC), indicando a
possibilidade de se entregar um bem distinto daquele anteriormente
avençado, na extinção das obrigações. O CTN prevê a dação tão-só
para bens imóveis. Segundo o art. 146, III, “b”, CF/88, a matéria em
análise deve estar afeta à lei complementar, razão pela qual uma lei
ordinária estadual, por exemplo, estaria impedida de versar sobre o
tema49
. Ademais, uma lei que permitisse a dação por bens móveis
ofenderia a exigência constitucional de licitação para a aquisição de
mercadorias pela Administração (art. 37, XXI, CF/88)50
.
Compulsória – é a eliminação do elemento vontade. Ao sujeito passivo,
não é permitida discricionariedade na prestação ou não do tributo. A
tributação é um ato de agressão patrimonial obrigatório e coercitivo. A
captação da riqueza particular em favor do interesse público não pode
depender da voluntariedade do contribuinte, sob pena de inexistir a
tributação. A vontade não se vincula à formação da relação jurídico-
tributária (obrigação tributária), ao contrário dos demais negócios jurídico
civis, em que a ela é pressuposto de existência.
Nesse passo, a doação (art. 538, CC), por representar uma liberalidade,
poderia sugerir que o tributo decorrente do negócio jurídico não estaria
48
Hugo de Brito Machado, Curso de Direito Tributário, 7ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1993, consegue enxergar, na letra do
art. 3º, CTN, – por meio da expressão “cujo valor nela se possa exprimir” – uma forma de compatibilização com o art. 156, XI,
CTN. Na esteira, consoante comentário a ser aduzido, outros doutrinadores protestam no mesmo sentido, admitindo a dação de
bens móveis como forma de extinção do crédito tributário. Em sentido totalmente oposto, Amaro, op. cit., p. 19 a 21,
depreende ferrenha crítica à redação do art. 3º, CTN, protestando pela impossibilidade absoluta na prestação não pecuniária
referente ao tributo.
49
A Lei 1624/97-DF, contrariando o impedimento sistêmico imposto pela CF/88, regulamentou a matéria de dação em
pagamento de tributos por meio de bens móveis.
50
STF, ADIn 1917-DF, Informativo do STF n° 136.