O documento discute ética e moral, definindo os conceitos e seu desenvolvimento ao longo da história. A filosofia busca a razão, a verdade e a ética para normatizar as relações humanas com base em princípios e valores. A razão é a capacidade de pensar de forma ordenada e a verdade é buscada através da filosofia e do questionamento das certezas estabelecidas.
2. É certo que toda sociedade e todo sistema, cria, realiza uma
moral baseada em valores correspondentes à conduta ilibada
(pura, intocável), ao bem e ao mal, ao certo e ao errado, ao que
é permitido e proibido, abrangendo todos os membros.
Também que essa moral varia de acordo com a cultura e a
sociogênese dessa sociedade.
Desde os primórdios, o homem vem buscando padronizar
comportamentos de forma empírica, baseado nos costumes e
usos.
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Somente a partir de Sócrates se estabeleceu uma sistematização
da filosofia ética ou moral, elaborada com base em princípios de
reflexão intelectual e não somente nos usos e costumes.
Vale ressaltar que toda essa teorização encontra respaldo tão
somente a partir da identificação e construção dos "valores".
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Os conceitos de ética e moral, muitas vezes se confundem,
embora sejam diferentes.
Ambos os termos são provenientes da cultura ocidental, mas
seus significados são extraídos de culturas diferentes.
“Não se aprende filosofia, mas a filosofar".
Kant
A filosofia nos desafia a ir de encontro às dúvidas,
interrogações e questionamentos; a um saber potencializado,
mas não revelado; a uma sabedoria disponibilizada, mas não
sistematizada.
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Em qualquer sentido, a autonomia humana significa poder de
criação individual e coletiva.
À luz na qual cada sociedade e cada indivíduo deverão ser
considerados em sua singularidade.
Vivemos num mundo em que a visão das pessoas está
marcada pela busca dos resultados imediatos do
conhecimento.
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Seguindo essa linha de pensamento, a filosofia seria
realmente "inútil": não serve para nenhuma alteração
imediata de ordem pragmática. Nesse ponto ela é semelhante
à arte.
Onde está a necessidade da filosofia? Está no fato de, por
meio da reflexão, permitir ao homem ter mais de uma
dimensão, além da que é dada pelo agir imediato, no qual o
"homem prático" se encontra mergulhado.
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É a filosofia que dá o distanciamento para a avaliação dos
fundamentos dos atos humanos e dos fins a que eles se
destinam.
Reúne o pensamento fragmentado da ciência e o reconstrói na
sua unidade.
Retoma a ação pulverizada no tempo e procura compreendê-la.
É a possibilidade da transcendência humana, ou seja, a
capacidade que só o homem tem de superar a situação dada e
não escolhida.
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Pela transcendência, o homem surge como ser do projeto,
capaz de libertar e de construir o seu destino.
A filosofia trata de desvendar os labirintos que constroem ou
sacrificam a emancipação humana.
Emancipar o ser humano não garante sua desvinculação do
sistema, mas torna-o livre para si. Assim há necessidade de se
ajustar essa relação do indivíduo com o seu próximo.
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Desde as civilizações primitivas, até os dias de hoje, os
homens vêm em busca de definir regras, leis, estatutos, etc.,
Que normatizem as relações, através de princípios e práxis,
ética e moral.
Visando uma estruturação do pensamento, a filosofia trata a
ética como uma disciplina que norteia os princípios relativos
ao relacionamento do indivíduo consigo mesmo, com o outro e
com a sociedade.
“A vida que não passamos em revista, não vale a pena viver”.
(Sócrates)
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Os três pontos que a filosofia considera:
A razão
A verdade
A ética
A Razão: a filosofia realiza como conhecimento racional
da realidade natural e cultural, das coisas e dos seres
humanos. Dizemos que ela confia na razão e que, hoje, ela
também desconfia da razão.
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Assim, usamos a "razão" para nos referirmos a "motivos" de
alguém. E também para nos referirmos a "causas" de alguma
coisa, de modo que, tanto nós quanto as coisas, parecemos
dotados de "razão", mas em sentido diferente.
Esses poucos exemplos já nos mostram quantos sentidos
diferentes a palavra razão possui: certeza, motivo, causa.
E todos esses sentidos encontram-se presentes na filosofia.
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Na cultura da chamada sociedade ocidental, a palavra razão
origina-se de duas fontes: Do latim ratio e do grego logos.
Estas duas palavras são substantivos derivados de dois verbos,
que têm um sentido muito parecido em latim e em grego.
Logos vem do verbo legein, que quer dizer: contar, reunir,
juntar, calcular.
Ratio vem do verbo reor, que quer dizer: contar, reunir, medir,
juntar, separar, calcular
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Quando medimos, juntamos, separamos, contamos ou
calculamos, pensamos de modo ordenado.
Ratio, logos ou razão significam pensar e falar
ordenadamente, com medida e proporção, com clareza e de
modo compreensível para outros.
Assim, na origem, razão é a capacidade intelectual para pensar
e se exprimir correta e claramente; para pensar e dizer as
coisas tais como são.
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A razão é uma maneira de organizar a realidade pela qual esta
se torna compreensível.
É também, a confiança de que podemos ordenar, organizar as
coisas que são organizáveis e ordenáveis, compreensíveis
nelas mesmas e por elas mesmas, isto é, as próprias coisas
racionais.
A Verdade:
O que é a verdade?
Uma das premissas da filosofia é a busca da verdade.
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Verdade e razão estão intrinsecamente relacionadas, porque
ambas buscam elucidar, clarear, confirmar e definir uma
práxis lúcida na trajetória do ser humano.
Tarefa também árdua essa de definir a verdade.
Em nossa sociedade, é muito difícil despertar nas pessoas o
desejo de buscar a verdade.
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Pode parecer paradoxal que assim seja, pois parecemos viver
numa sociedade que acredita nas ciências e que luta por
escolas; que recebe, durante 24 horas, informações através de
livrarias, bibliotecas, museus, salas de cinema e de teatro,
vídeos, televisão, fotografias e computadores.
A grande variedade e quantidade de veículos
E formas de informação acabam tornando difícil a busca da
verdade. Pois todo mundo acredita que está recebendo, de
modos variados e diferentes, informações científicas,
filosóficas, políticas e artísticas.
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E que tais informações são verdadeiras, sobretudo porque tal
quantidade informativa ultrapassa a experiência vivida pelas
pessoas que, por isso, não têm meios para avaliar o que
recebem.
Outra dificuldade para fazer surgir o desejo da busca da
verdade, em nossa sociedade, vem da propaganda.
A propaganda trata todas as pessoas, crianças, jovens,
adultos, idosos, como crianças extremamente ingênuas e
incrédulas.
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O mundo é sempre um mundo de "faz de conta”.
A propaganda nunca vende um produto dizendo o que ele é e
para que serve.
Ela vende o produto rodeando-o de magias, belezas, dando-
lhe qualidades que são de outras coisas (a criança saudável,
o jovem bonito, o adulto inteligente, o idoso feliz, a casa
agradável, etc), produzindo um eterno “faz de conta”.
Outra dificuldade, para o desejo da busca da verdade, vem da
atitude dos políticos.
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As pessoas confiam, ouvindo seus programas, suas
propostas, seus projetos, enfim, dando-lhes seu voto ou o
vendendo. Depois, sentem-se ludibriadas, não só porque não
são cumpridas as promessas, mas também porque há
corrupção, mau uso do dinheiro público, crescimento das
desigualdades e das injustiças, da miséria e da violência.
A busca da verdade surge do desejo e da necessidade, não só
da dúvida e da incerteza. Nasce também da ação deliberada
contra os preconceitos; contra as idéias e opiniões
estabelecidas; contra crenças que paralisam a capacidade de
pensar e de agir livremente.
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Podemos, dessa maneira, distinguir dois tipos de busca da
verdade:
O primeiro nasce da decepção, da incerteza e da insegurança
e, por si mesmo, exige que saiamos de tal situação
readquirindo certezas.
O segundo é o que nasce da deliberação ou decisão de não
aceitar as certezas e crenças estabelecidas. De ir além delas e
de encontrar explicações, interpretações e significados para a
realidade que nos cerca.
Esse segundo tipo é a busca da verdade na atitude filosófica.
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No entanto, essas dificuldades podem ter o efeito oposto, isto
é, suscitar em muitas pessoas, dúvidas, incertezas,
desconfianças e desilusões que as façam não aceitar o que
lhes é dito.
Muitos começam a não acreditar no que lhes é mostrado.
E como Sócrates, em Atenas, começam a fazer perguntas, a
indagar sobre fatos e pessoas, coisas e situações; a exigir
explicações, liberdade de pensamento e de conhecimento.
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Para essas pessoas, surge o desejo e a necessidade da
busca da verdade.
Essa busca nasce não só da dúvida e da incerteza. Nasce
também da ação deliberada contra os preconceitos, contra
as idéias e opiniões estabelecidas, contra as crenças que
paralisam a capacidade de pensar e de agir
livremente.
A verdade não está com os homens, mas entre os homens.
(Sócrates)
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Podemos oferecer dois tipos de exemplos célebres dessa busca
filosófica.
Já falamos do primeiro: Sócrates, andando pelas ruas e praças
de Atenas indagando aos atenienses o que eram as coisas e
as ideias em que acreditavam.
O segundo exemplo é o do filósofo Descartes.
Descartes começa sua obra filosófica fazendo um balanço de
tudo o que sabia; o que lhe fora ensinado pelos preceptores e
professores, pelos livros, pelas viagens e pelo convívio com
outras pessoas.
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Ele os submete à análise, à dedução, à indução, ao raciocínio e
conclui que, até o momento, há uma única verdade indubitável
que poderá ser aceita e que deverá ser o ponto de partida para a
reconstrução do edifício do saber.
Essa única verdade é: "Penso, logo existo“
Pois, se eu duvidar de que estou pensando, ainda estou
pensando, visto que duvidar é uma maneira de pensar. A
consciência do pensamento aparece, assim, como a primeira
verdade indubitável, que será o alicerce para todos os
conhecimentos futuros.
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AS EXIGÊNCIAS FUNDAMENTAIS DA VERDADE
Se examinarmos as diferentes concepções da verdade, notaremos que
algumas exigências fundamentais são conservadas em todas elas e
constituem o campo da busca do verdadeiro:
1. Compreender as causas da diferença entre o parecer e o ser das
coisas ou dos erros;
2. Compreender as causas e as formas da existência do seres;
3. Compreender os princípios necessários e universais do conhecimento
racional;
4. Compreender as causas e os princípios da transformação dos próprios
conhecimentos;
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5. Separar preconceitos e hábitos do senso comum e a atitude crítica do
conhecimento;
6. Explicar com todos os detalhes os procedimentos empregados para o
conhecimento e os critérios de sua realização;
7. Liberdade de pensamento para investigar o sentido ou a significação
da realidade que nos circunda e da qual fazemos parte;
8. Comunicabilidade, isto é, os critérios, os princípios, os
procedimentos, os percursos realizados, os resultados obtidos, devem
poder ser conhecidos e compreendidos por todos os seres racionais.
Como escreve o filósofo Espinosa, o bem verdadeiro é capaz de
comunicar-se a todos e ser compartilhado por todos;
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9. Transmissibilidade, isto é, os critérios, os princípios,
procedimentos, percursos e resultados do conhecimento
devem poder ser ensinados e discutidos em público. Como
diz Kant, temos o direito ao uso público da razão;
10. Veracidade, isto é, o conhecimento não pode ser
ideologia, ou em outras palavras, não pode ser máscara e
véu para dissimular e ocultar a realidade, servindo aos
interesses da exploração e da dominação entre os homens.
Assim como a verdade exige a liberdade de pensamento para
o conhecimento, também exige que seus frutos propiciem a
liberdade de todos e a emancipação de todos;
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11. A verdade deve ser objetiva, isto é, deve ser compreendida
e aceita universal e necessariamente, sem que isso signifique
que ela seja "neutra" ou “imparcial”. Pois o sujeito do
conhecimento está vitalmente envolvido na atividade do
conhecimento e o conhecimento adquirido pode resultar em
mudanças que afetem a realidade natural, social e cultural.
Como disseram os filósofos Sartre e Merleau-Ponty, somos
"seres em situação" e a verdade está sempre situada nas
condições objetivas em que foi alcançada. E está sempre
voltada para compreender e interpretar a situação na qual
nasceu e à qual volta para trazer transformações.
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Não escolhemos o país, a data, a família e a classe social em
que nascemos - isso é a nossa situação - mas podemos
escolher o que fazer com isso, conhecendo nossa situação e
indagando se ela merece ou não ser mantida.
A verdade é, ao mesmo tempo, frágil e poderosa.
Frágil porque os poderes estabelecidos podem destruí-la,
assim como mudanças teóricas podem substituí-la por outra.
Poderosa, porque a exigência do verdadeiro é o que dá
sentido à existência humana.
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A psicanálise diz que somos produto de nossa história de vida,
marcada pela sexualidade insatisfeita que visa satisfações
imaginárias, sem, no entanto, poder satisfazê-las plenamente.
Na verdade, ao invés de sermos autores e senhores da nossa história,
somos produto dela.
Como já sabemos, nossa psique é um campo de batalha velada,
inconsciente entre desejo e censura.
O id ama o proibido, o superego quer ser amado por reprimir o id.
As neuroses e psicoses são causadas tanto por um id extremamente
fraco e um superego forte, quanto o inverso.
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Do ponto de vista do inconsciente, mentir, matar, seduzir,
destruir e ambicionar, são simplesmente ações amorais. O
inconsciente desconhece valores morais.
No campo da ética, a psicanálise mostrou que uma das fontes
dos sofrimentos psíquicos, que resultam em patologias
mentais e também físicas, é o rigor do superego, que impõe
uma moralidade rígida.
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O que vemos e concluímos é que, quando uma sociedade
reprime os desejos inconscientes, a ponto de não conseguir
meios de expressão, cria duas alternativas distantes da ética:
ou acontece a transgressão violenta de seus valores pelos
sujeitos oprimidos ou a aceitação passiva de uma sociedade
neurótica, que confunde neurose e moralidade.
Vamos mostrar então, de um lado, uma sociedade violenta
que dita normas e exige do sujeito padrão de conduta
impossível; e, de outro, um sujeito violento contra uma
sociedade, buscando o direito de viver transgredindo os
valores estabelecidos.
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A existência ética, se por um lado uniformiza os relacionamentos, por
outro os reprime.
Diante dessa encruzilhada é que nasce o sujeito passivo ou ativo.
PASSIVO é aquele que se deixa governar e arrastar por seus
impulsos, inclinações e paixões, pela opinião alheia, pelo medo dos
outros, pela vontade dos outros, não exercendo sua própria
consciência, vontade, liberdade e responsabilidade - HETERÔNOMO.
ATIVO é aquele que comanda interiormente seus impulsos, seus
desejos, paixões, dialoga consigo e com os outros os sentidos dos
valores e dos seus fins. Consulta sua vontade e razão antes de agir.
Recusa a violência contra si e contra os outros - AUTÔNOMO.
34. A explicação de Freud: O sentimento de culpa seria somente o
efeito de um constrangimento social.
Este sentimento nasce na alma da criança quando seus pais
ralham com ela e não é nada mais que um sentimento de angústia
por perder o amor de seus pais que se tornam, de repente, hostis.
Ninguém pode mais contestar a realidade deste mecanismo, nem
a importância da descoberta de Freud que confirma, aliás, o que a
Bíblia já nos dizia: o quanto o ser humano tem necessidade de se
sentir amado.
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VERDADEIRA OU FALSA CULPA
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Esta explicação permanece válida aos nossos olhos no que
concerne à culpa das crianças, ou daqueles que
permanecem infantis por toda a vida.
É o tipo de culpa, fruto do treinamento que nós encontramos
também nos animais. Os cães demonstram sinais evidentes
de culpa, quando desobedecem, antes mesmo que se ralhe
com eles.
Sentimento de “culpa funcional”
É o que resulta da sugestão social, do medo dos tabus, do
medo da perda do amor de outrem.
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Sentimento de “culpa-valor”
Resulta de valores próprios e da consciência clara de ter violado um
padrão original, e é um autojulgamento feito com liberdade.
Haveria então, uma oposição completa entre estes dois mecanismos
geradores de culpa: um, agindo por sugestão social, outro, por
convicção moral.
Odier preparou cuidadosamente tabelas que guiassem o diagnóstico
diferencial entre estas duas ordens de fenômeno.
A psicoterapia reconhece a existência de uma culpa “autêntica”, ao
lado da culpa “neurótica” e “irreal” (Grundlos).
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A culpa autêntica:
Carrega sempre uma violação de uma relação humana, e
constitui uma ferida do relacionamento eu/tu. É então uma
culpa em direção do outro.
Freudianos mostram a frequência da culpa-inferioridade; os
Jungianos, a recusa da aceitação integral de si mesmo.
À luz da Bíblia, a verdadeira culpa nos parece como uma culpa
em relação a Deus, uma ruptura da ordem de dependência do
homem em relação a Deus.
Assim a verdadeira culpa dos homens surge em relação às
coisas que Deus lhes reprova no secreto dos seus corações.
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Só eles mesmos podem saber quais são estas coisas.
Geralmente são coisas totalmente diferentes daquelas
que os homens reprovam.
Mesmo nas crianças pode-se observar, ao lado das
culpas infantis “funcionais”, descritas por Freud, culpas
bem distintas, que são culpas verdadeiras, autênticas.
A criança manifesta uma culpa violenta e pede para ser
punida.
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Quanto mais a criança cresce, mais se desenvolverá nela o
senso autônomo da verdadeira culpa. E é na medida em que
ela ordenar a sua vida, e a sua conduta, que se livrará das
falsas culpas provocadas pelos parâmetros da sociedade e
pelas reprovações de seus pais.
Encontramos na Bíblia muitas histórias que escandalizam os
moralistas. Exemplos de condutas consideradas como
culpadas pela sociedade , pela lei e, mesmo aparentemente,
pela lei de Deus; e que são apresentadas como não culpáveis
e, às vezes, até mesmo como obediência heróica a uma
ordem pessoal de Deus.
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Assim, a lei de Deus proclama: “não matarás” (Ex. 20:13),
mas vemos, na Bíblia, muitos homens que mataram sob a
ordem de Deus.
Exemplo: o caso de um doente cíclico que passa
alternativamente por fases de excitação e de depressão.
PERÍODO DE EXCITAÇÃO:
Ele comete, sem ter o mínimo remorso, toda sorte de faltas
morais das quais vai se penitenciar de maneira excessiva no
período de depressão.
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Mas não podemos, por outro lado, negar a autenticidade
dos remorsos que ele “curte” na depressão.
Em todo caso, dizer-lhe que é uma “falsa culpa” doentia
não trará nenhum conforto.
Inversamente, se ele passa bruscamente da depressão a uma
nova fase de excitação:
Ele experimenta uma melhora tão maravilhosa que descreve
como uma verdadeira experiência espiritual.
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Com um tom de sinceridade, impressionante, ele diz que
enfim compreendeu a graça divina e que não duvidará dela
nunca mais.
Mas não podemos, por outro lado, sustentar que toda
experiência do perdão de deus seja patológica!
Com o exercício da medicina, tornamo-nos muito prudentes
diante deste grande mistério do sentimento de culpa.
Devemos estar atentos a todo o trabalho do psicoterapeuta
para descobrir como é importante que o homem se liberte da
sociedade, e de suas pressões
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Assim, por exemplo, muitas pessoas sentem prazer especial
em usar um palavrão ou uma gíria.
É um protesto contra a dominação opressiva dos bons
costumes, um grito sadio de independência em relação à
pressão social.
Todas as pessoas que estão ao nosso redor chamam-nos a
fazer o papel de justiceiros;
Chamam-nos para servirmos de testemunhas.
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Um casal em conflito inevitavelmente se dirigirá a nós para sermos um
árbitro.
Um se queixa de seu irmão, um filho de seu pai, um operário do seu
mestre de obras ou de seu patrão, um patrão de seu concorrente.
São pedidos apaixonados ou indignados que acumulam detalhes
peremptórios. Se nos recusamos a julgar, consideramo-nos covardes,
pactuando com o mal, surdos ao grito da consciência. Em todos esses
inumeráveis conflitos, em todas essas reprimendas e acusações que os
homens lançam uns aos outros, há uma verdadeira intenção de culpar
os outros, de convencer de culpa aquele que eles julgam, de fazê-los
reconhecer seus erros.
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Se recusarmos a nos associar a este empreendimento de
culpabilização, eles nos acusarão de sermos culpados, de
trairmos a justiça, a moral, a verdade, permanecendo mudos
enquanto eles são odiosamente violentados.
Não existe vida sem conflito; não existe conflito sem culpa.
Tentamos constantemente nos tranquilizar.
Evocamos a sabedoria popular:
“Não se faz omelete sem quebrar os ovos”.
46. 46
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Evocamos a psicologia, que se esforça por considerar
friamente a agressividade como uma simples força da
natureza, isenta de toda carga moral, a qual causa mais dano
quando reprimida do que quando expressada.
Evocamos, também, doutrinas clínicas e existencialistas.
Todas estas tentativas aparecem como a própria prova da
culpa secreta de que todos os homens sofrem, por causa dos
conflitos que opõem constantemente uma pessoa a outra, e
contra a qual todos procuram se defender. Mas é o próprio
jesus cristo que diz estas palavras: “Não julgueis...” (Mt 7:1).
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Quando alguém apela ao nosso julgamento, ele tem medo. Quando
alguém sente que é mal compreendido, isto significa que ele se sente
julgado, que não vemos as coisas como ele, que o julgamos culpado
quando ele se sente inocente.
Porque as acusações e as reprimendas enchem o mundo, todos se
sentem constantemente criticados ou, pelo menos, ameaçados de
julgamento.
“Em 1880”, escreve jean guitton, “poder-se-ia resumir os resultados
da análise moral por esta fórmula: mesmo os culpados são inocentes.
Em 1945, seria necessário inverter os termos: mesmo os inocentes
são culpados... Nós estamos na época dos juízes”.
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Vejam a filosofia e a literatura atuais todas carregadas de
consciência pesada.
Os romances, as novelas, as peças de teatro, os filmes:
todos giram em torno do problema da culpa: culpa formal e a
impossibilidade de determinar quem é verdadeiramente
culpado, e a culpa profunda, difusa, acerba, a culpa de
existir, e as revoltas que ela suscita.
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Há mais de 2.500 anos os gregos afirmavam que a repetição
de bons hábitos era capaz de tornar um homem virtuoso.
A educação grega, a paidéia, era um longo processo
educativo que visava formar um cidadão que fizesse da vida
pública um exercício das virtudes humanas e conduzisse a
cidade rumo ao bem.
Então, resta-nos perguntar:
O que a psicanálise nos propõe?
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O que a psicanálise propõe é uma nova moral sexual que harmonize,
tanto quanto for possível, o desejo inconsciente, as formas de
satisfazê-los e a vida social.
Essa moral, evidentemente, só pode ser realizada pela consciência e
pela vontade livre, de sorte que a psicanálise procura fortalecê-la
como instância moderadora do id e superego.
Somos eticamente livres e responsáveis.
Não porque possamos fazer tudo quanto queiramos, nem porque
queiramos tudo quanto possamos fazer, mas porque aprendemos a
discriminar as fronteiras entre o permitido e o proibido, tendo como
critério ideal, a ausência da violência interna e externa.