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MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA
COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS
Reclamação no Agravo de Instrumento n. 4032450-55.2018.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina
EXCELENTÍSSIMA SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA, RELATORA DA
ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL N. 548/DF
URGENTE – Início do ano letivo catarinense previsto para 11/2/2019
“Liberdade – essa palavra que o sonho humano alimenta
Que não há ninguém que explique, e ninguém que não entenda”
(Cecília Meirelles)
RECLAMAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PUBLICAÇÃO EM REDES SOCIAIS, POR DEPUTADA
ESTADUAL ELEITA, CONCLAMANDO ESTUDANTES DO ESTADO DE SANTA CATARINA A
FILMEM OU GRAVEM “TODAS AS MANIFESTAÇÕES POLÍTICO-PARTIDÁRIAS OU
IDEOLÓGICA [SIC]” DE “PROFESSORES DOUTRINADORES” QUE “NÃO CONTERÃO SUA
IRA” DIANTE DO RESULTADO FINAL DAS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS DE 2018. PLEITO
LIMINAR DE SUSPENSÃO DA VEICULAÇÃO DO COMUNICADO.
DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE DETERMINA A SUSPENSÃO DA PUBLICAÇAO. AGRAVO
DE INSTRUMENTO PELA DEMANDADA. DECISÃO MONOCRÁTICA DO TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DE SANTA CATARINA QUE DEFERE EFEITO SUSPENSIVO, AUTORIZANDO QUE A
MENSAGEM VOLTE A SER VEICULADA.
DESCUMPRIMENTO DA LIMINAR REFERENDADA PELO PLENARIO DO STF NA MEDIDA
CAUTELAR NA ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL N.
548/DF. INOBSERVÂNCIA AO FUNDAMENTO JURÍDICO-CONSTITUCIONAL (RATIO
DECIDENDI) QUE EMBASOU A MEDIDA DEFERIDA EM SEDE DE CONTROLE
CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE, CALCADA NA LIBERDADE DE APRENDER E
ENSINAR E NO PLURALISMO DE IDEIAS (ART. 206, II E III, DA CR).
PRESENÇA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES PARA O DEFERIMENTO DA LIMINAR NA
RECLAMAÇÃO. FUMUS BONI IURIS. INCOMPATIBILIDADE ENTRE OS PRESSUPOSTOS
JURÍDICOS DA DECISÃO RECLAMADA E A INTERPRETAÇÃO CONFERIDA PELO STF AO
ART. 206, II E III, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. PERICULUM IN MORA. IMINÊNCIA DO
INÍCIO DO ANO LETIVO NO ESTADO. RISCO DE QUE AS ATIVIDADES DE ENSINO E
APRENDIZAGEM SE INICIEM SOB O SIGNO DO CONSTRANGIMENTO DE DOCENTES E
DISCENTES NO SISTEMA DE ENSINO.
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, no uso
de suas atribuições constitucionais e legais, por seu Coordenador de
Recursos Cíveis, Procurador de Justiça que estas razões subscreve, vem,
perante Vossa Excelência, com fundamento nos arts. 102, I, “l”, da
Constituição da República c/c com os arts. 988, II e III, e 989, § 6º, II, do
Código de Processo Civil (CPC) apresentar
RECLAMAÇÃO COM PEDIDO DE LIMINAR
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por entender que a decisão monocrática prolatada pela Desembargadora
Maria do Rocio Luz Santa Ritta, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina,
nos autos do Agravo de Instrumento n. 4032450-55.2018.8.24.0000
(Doc. 1 – Anexo) (Ação Civil Pública n. 0917862-27.2018.8.24.0023), da
Comarca da Capital/SC, em que este Órgão figura como agravado, sendo
agravante ANA CAROLINE CAMPAGNOLO1
, dispôs contra a autoridade
da decisão liminar referendada pelo Tribunal Pleno dessa Corte Suprema
no julgamento da Medida Cautelar na Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental n. 548/DF, nos termos das razões adiante
aduzidas.
1 SÍNTESE DOS FATOS
No dia 29 de outubro de 2018, um dia após a definição do resultado das
eleições presidenciais brasileiras, a deputada estadual eleita para a legislatura 2019-
2022 da Assembleia Legislativa de Santa Catarina, Ana Caroline Campagnolo,
divulgou, em uma de suas contas nas Redes Sociais, na Internet (Facebook)2
,
comunicado direcionado ao “estudante catarinense”, instigando a gravação e a
filmagem para fins de “denúncia” de “professores doutrinadores” que emitissem
manifestações político-partidárias ou ideológicas, conforme imagem anexa (Doc. 3 –
Anexo) com o seguinte conteúdo:
ATENÇÃO, ESTUDANTE CATARINENSE!
Segunda-feira, 29 de outubro, é o dia em que os professores doutrinadores estarão inconformados
e revoltados. Muitas deles não conterão sua ira e farão da sala de aula um auditório cativo para
suas queixas político-partidárias em virtude da vitória de Bolsonaro.
Filme ou grave todas as manifestações político-partidárias ou ideológica.
DENUNCIE!
Envie o vídeo e as informações para (49) 98853 3588, descreva o nome do professor, o nome da
escola e a cidade. Garantimos o anonimato dos denunciantes.
POR UMA ESCOLA SEM PARTIDO / DEPUTADA ESTADUAL ELEITA EM SANTA CATARINA ANA
CAROLINE CAMPAGNOLO / EDUCAÇÃO DE QUALIDADE DE VERDADE
1 Brasileira, divorciada, professora, Deputada Estadual eleita em 2018, inscrita no CPF n. 061.313.819-84 e no RG n.
4.959.278, residente e domiciliada à Rua Rio de Janeiro 2199-E, apartamento 301, bloco L, no Barreirinho, Chapecó/SC. A
partir de 1º de fevereiro de 2019, exerce mandato parlamentar na Assembleia Legislativa de Santa Catarina – Palácio Barriga
Verde, Rua Doutor Jorge Luz Fontes, 310, Florianópolis/SC.
2 https://www.facebook.com/photo.php?fbid=1578990362200714&set=a.105479926218439*type=3&theater Ac. em 31.1.19.
2
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Diante do conteúdo da publicação, o Ministério Público do Estado de
Santa Catarina, pela 25ª Promotoria de Justiça da Comarca da Capital/SC, visando
à garantia da liberdade de aprender e ensinar e do pluralismo de ideias nas escolas
catarinenses, propôs Ação Civil Pública, com pedido de tutela de urgência, em que
formulou os seguintes pedidos cautelares:
56. Ante o exposto, o Ministério Público de Santa Catarina, através de seu representante, requer a
concessão de tutela de urgência antecipada consistente em expedição de ordem judicial, inaudita
altera parte:
a) à Requerida para que se abstenta de implementar e/ou manter de qualquer modalidade de
serviço formal ou informal, de controle ideológico das atividades dos professores e alunos das
escolas públicas e privadas do Sistema de Ensino do Estado de Santa Catarina e dos Sistemas de
Ensino dos Municípios Catarinenses, em especial dos estabelecimentos públicos, por si ou por
interposta pessoa e sob qualquer pretexto;
b) à Requerida para que se abstenha de produzir e/ou promover e/ou compartilhar e/ou divulgar,
nas redes sociais da Rede Mundial de Computadores denominada Internet, em especial em
contas no Instagram e Facebook, bem como através de contas de WhatsApp ou aplicativos
similares, suas ou de terceiros, de qualquer aviso ou comunicado dirigido a estudantes ou outros
integrantes das comunidades escolares (pais e responsáveis de alunos, profissionais da
educação, professores) estimulando a formulação de denúncias, anônimas ou não, através de
canais formais ou informais, especialmente através de telefone e/ou mediante mensagens
eletrônicas divulgadas através de e-mails e/ou outros aplicativos;
c) à Requerida para que remova de sua conta na Rede Social denominada Facebook na internet a
publicação que motivou a presente ação judicial e/ou qualquer outra postagem com conteúdo
similar, ou que represente ameaça a qualquer integrante das comunidades escolares,
especialmente professores, e publique na mesma conta informação sobre a decisão judicial
liminar, ora pleiteada, proibindo-a de divulgar o serviço ilícito de denúncias contra professores, até
decisão final de mérito; e
d) à operadora de telefonia Claro S. A. Brasil, à qual está associado o número de celular (49)
98853-3588, para que, no prazo de 24 horas, determine o bloqueio deste número, impedindo-o de
originar ou receber chamadas de voz, bem como chamadas de SMS; (Doc. 4, Anexo – fls. 19-20)
Ato contínuo, o Juiz de Direito da Vara da Infância e da Juventude da
Comarca da Capital deferiu parcialmente os pedidos de ordem liminar, determinando
à requerida que:
(i) se abstenha de criar, manter incentivar ou promover qualquer modalidade particular de serviço
de denúncia das atividades de servidores públicos, atividade própria das ouvidorias criadas pela
Administração Pública;
(ii) retire de imediato da publicação de p. 23, publicada em seu perfil do “Facebook” as seguintes
frases; “Filme ou grave todas as manifestações político-partidárias ou ideológicas que humilhem
ou ofendam sua liberdade de crença e consciência. DENUNCIE! Envie o vídeo e as informações
para (49) 98853 3588, descreva o nome do professor, o nome da escola e a cidade. Garantimos o
anonimato dos denunciantes”, e “Alunos que sentirem seus direitos violados podem usar
gravadores ou câmeras para registrar os fatos”. (Doc. 5, Anexo – fl. 9)
Inconformada com o teor da decisão, a requerida interpôs Agravo de
Instrumento, no qual também requereu a antecipação dos efeitos da tutela recursal
(Doc. 6 – Anexo), que lhe foi deferida por decisão monocrática da lavra da
Desembargadora Maria do Rocio Luz Santa Ritta, assim prolatada:
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Examinando o texto proposto pela requerida, professora e hoje Deputada eleita, vamos observar
que a mesma pretende se colocar como um canal de denúncias dos estudantes, garantido o
anonimato acaso queiram, quanto a “manifestações político-partidárias ou ideológicas que
humilhem ou ofendam sua liberdade de crença e consciência”.
Se coloca a requerida como uma espécie de “ouvidora social” no combate a que se propõe a toda
espécie de abuso ou excesso que se venha a praticar em sala de aula, a partir da transgressão
pelo professor dos limites constitucionais que lhe são deferidos para o exercício de sua docência.
[...]
Portanto, em linha de princípio, neste estágio inicial de juízo de delibação, não vislumbro nenhuma
ilegalidade na iniciativa da agravante, Deputada estadual eleita, de colocar seu futuro gabinete
como meio social condensador do direito que todo cidadão possui, estudantes inclusive, de
peticionar a qualquer órgão público denunciando ato que entenda ilegal praticado por
representante do Estado, sobretudo quando se tratar de ofensas e humilhações em proselitismo
político-partidário travestido de conteúdo educacional ministrado em sala de aula.
[...]
Sem antecipar posição de mérito, porquanto a imparcialidade restaria afetada, sem que fossem
ouvidos todos os envolvidos nessa relevante questão, reafirmo que a liberdade do professor de
ensinar já está garantida pela Constituição, tanto quanto ali também está satisfatoriamente
previsto o não-direito, a quem quer que seja, de produzir ofensas e humilhações, especialmente
contra vulneráveis, como tal, à criança e ao adolescente, que não dispensam a proteção do
Estado.
[...]
Diante do exposto, concedo o efeito suspensivo pretendido, fazendo retornar a expressão omitida
na página do Facebook. (Doc. 7 – Anexo, fls. 2-3/4/7-8)
Em resumo, são esses os fatos que envolvem a presente Reclamação, os
quais indicam que a decisão prolatada pela Desembargadora relatora do Agravo de
Instrumento n. 4032450-55.2018.8.24.0000 deve ser cassada pelo Supremo Tribunal
Federal.
2 CABIMENTO DA RECLAMAÇÃO
2.1 Requisitos constitucionais e legais que autorizam o expediente
Inicialmente, imperativo demonstrar o cabimento da Reclamação, com
abrigo na alínea “l” do art. 102-A, I, da Constituição da República:
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição,
cabendo-lhe:
I – processar e julgar, originariamente:
[...]
l) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas
decisões;
Mais recentemente, o Código de Processo Civil reforçou o cabimento da
Reclamação aqui proposta – ampliando sensivelmente, inclusive, suas hipóteses de
manejo – nos seguintes termos:
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LEI N. 13.105, DE 16 DE MARÇO DE 2015 (CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – CPC)
Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para:
[...]
II - garantir a autoridade das decisões do tribunal;
III – garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo
Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
[...]
§ 4º As hipóteses dos incisos III e IV compreendem a aplicação indevida da tese jurídica e sua não
aplicação aos casos que a ela correspondam
Note-se, ademais, que o citado art. 988, por seu § 5º, II, afasta a
necessidade de esgotamento das instâncias ordinárias na hipótese de Reclamação
ajuizada com o objetivo de garantir a autoridade das decisões do tribunal, bem como
a observância de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de
constitucionalidade, pelo que a via direta de acesso à jurisdição dessa Corte se
mostra adequada à hipótese.
2.2 Cabimento da Reclamação contra decisões liminares
Ainda quanto ao cabimento da Reclamação na hipótese vertente, é de se
ressaltar que o fato de a decisão reclamada haver sido proferida em sede de tutela
de urgência recursal não inviabiliza o manejo do presente meio de impugnação.
Assim, mesmo que a decisão reclamada tenha a marca da precariedade,
o pleito de sua suspensão e posterior cassação é legítimo, dado que partiu de
premissa jurídico-constitucional em tudo avessa ao que assentou o Supremo
Tribunal Federal por ocasião do referendo à liminar prolatada no bojo da ADPF n.
548/DF.
Nessa linha, a título meramente exemplificativo, pode-se mencionar a
decisão liminar prolatada na Reclamação n. 25.369/DF pelo saudoso Ministro Teori
Zavaski, quando cassou decisão monocrática da lavra de Desembargador do
Tribunal de Justiça de Santa Catarina que havia antecipado os efeitos de tutela
recursal buscada em Agravo de Instrumento, em iter processual bastante
assemelhado àquele que aqui se desenha. Vejamos:
Por outro lado, está evidenciado o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, na medida
em que a manutenção do ato reclamado impede seja pleiteada a renovação das atuais
autorizações ou permissões de exploração de serviço de táxi – cujos prazos de exploração estão
expirando –, o que colocará imediatamente em situação de ilegalidade os particulares que ainda
exploram o serviço nessas condições, acarretando prejuízos à sua subsistência, bem assim ao
interesse público. De fato, conforme apontado pelo reclamante à fl. 6, mantido o ato reclamado, é
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possível que, no caso de eventual provimento do recurso extraordinário acima referido, não mais
existam licenças de exploração do serviço de táxi outorgadas com base no art. 64 da Lei
Complementar Municipal 85/2001 que possam se beneficiar dessa decisão.
4. Ante o exposto, defiro a liminar para suspender a eficácia da decisão de antecipação dos efeitos
da tutela proferida no Agravo de Instrumento 8000296-81.2016.8.24.0000, em trâmite no Tribunal
de Justiça do Estado de Santa Catarina. Solicitem-se informações à autoridade reclamada. Cite-se
o Ministério Público do Estado de Santa Catarina para contestar. Após, à Procuradoria-Geral da
República para parecer.3
Como se vê, considerando que o objeto primordial das reclamações é a
preservação da integridade do sistema decisório e a uniformidade da tutela objetiva
da constitucionalidade de atos judiciais, revela-se legítimo o ajuizamento de
Reclamação, ainda que em face de decisões liminares.
3 TEMPESTIVIDADE DA RECLAMAÇÃO
Conforme se infere do enunciado da Súmula 734 do STF (“Não cabe
reclamação quando já houver transitado em julgado o ato judicial que se alega tenha
desrespeitado decisão do Supremo Tribunal Federal”) e do art. 988, § 5º, I, do CPC,
a Reclamação deve ser protocolada anteriormente ao trânsito em julgado do ato
judicial impugnado.
No caso, a decisão reclamada, concessiva de efeito suspensivo a Agravo
de Instrumento, ainda se encontra em fase de comunicações processuais, pendendo
inclusive o prazo para eventual interposição de recursos e devendo, ainda, ser
confirmada ou não pelo órgão colegiado respectivo (Doc. 8 – Anexo).
4 DAS RAZÕES PARA PROVIMENTO DA PRESENTE RECLAMAÇÃO
A decisão que se busca cassar, como já mencionado, antecipou os efeitos
de tutela recursal pleiteada em sede de Agravo de Instrumento para sustar eficácia
de decisão interlocutória que havia determinado à demandada a remoção, das redes
sociais, do comunicado em que incitava os estudantes catarinenses a filmar, gravar
e denunciar manifestações de professores que emitissem opiniões contrárias ao
então Presidente eleito, Jair Messias Bolsonaro, inclusive remetendo tais
“denúncias” a linha de telefone específica.
Contudo, ao assim decidir, a insigne relatora da matéria no Tribunal de
Justiça de Santa Catarina abriu margem à revisão de seu pronunciamento, vez que
3 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Rcl 25.369/DF, Rel. Min. Teori Zavaski, Decisão Monocrática, DJe n. 217, divulgado em
10/10/2016.
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simultaneamente deixou de observar a liminar referendada pelo Plenário do STF no
bojo da ADPF n. 548/DF e negou aplicabilidade à tese jurídica que embasou a
medida liminar deferida em sede de controle concentrado de constitucionalidade.
Evidenciam-se, portanto, os permissivos da reclamação previstos pelos
arts. 988, II, III e § 4º, do CPC, como se demonstrará a seguir.
4.1 Breve retrospectiva da decisão liminar deferida pela Ministra Cármen Lúcia
e referendada pelo Plenário do STF na ADPF n. 548/DF
Como é de amplo conhecimento, o pleito que teve lugar em outubro de
2018 foi marcado por tensões políticas e eleitorais, oriundas da polarização do
debate e englobando as mais variadas vertentes partidárias e/ou ideológicas.
Nesse cenário, a semana que antecedeu o segundo turno das eleições
presidenciais foi palco de uma série de ações policiais, avalizadas por unidades da
Justiça Eleitoral, em diversas universidades brasileiras, com o objetivo de apreender
materiais e obstar atos e manifestações que suspostamente indicariam preferências
eleitorais em favor dos candidatos em disputa.
O quadro descrito motivou a propositura, pela Procuradora-Geral da
República, em 26 de outubro de 2018, de Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental com pedido liminar ao escopo de “evitar e reparar lesão a preceitos
fundamentais resultantes de atos do Poder Público tendentes a executar ou
autorizar buscas e apreensões, assim como proibir o ingresso e interrupção de
aulas, palestras, debates ou atos congêneres e promover a inquirição de docentes,
discentes e de outros cidadãos que estejam em local definido como universidade
pública ou privada” (Doc. 9 – Anexo, fl. 2).
Em 27 de outubro de 2018, reconhecendo a urgência do pleito e a
juridicidade de seus fundamentos, a Ministra Cármen Lúcia deferiu a medida liminar
pleiteada pela PGR, nos seguintes termos:
14. Pelo exposto, em face da urgência qualificada comprovada no caso, dos riscos advindos da
manutenção dos atos indicados na peça inicial da presente arguição de descumprimento de
preceito fundamental e que poderiam se multiplicar em face da ausência de manifestação judicial a
eles contrária, defiro a medida cautelar para, ad referendum do Plenário deste Supremo Tribunal
Federal, suspender os efeitos de atos judiciais ou administrativos, emanado de autoridade pública
que possibilite, determine ou promova o ingresso de agentes públicos em universidades públicas e
privadas, o recolhimento de documentos, a interrupção de aulas, debates ou manifestações de
docentes e discentes universitários, a atividade disciplinar docente e discente e a coleta irregular
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de depoimentos desses cidadãos pela prática de manifestação livre de ideias e divulgação do
pensamento nos ambientes universitários ou em equipamentos sob a administração de
universidades públicas e privadas e serventes a seus fins e desempenhos. (Doc. 10 – Anexo, fls.
14-15)
Na semana seguinte, em 31 de outubro de 2018, o Plenário dessa Corte
Suprema referendou a liminar, como se colhe do seguinte extrato:
O Tribunal, por unanimidade, reconheceu adequada a utilização da arguição de descumprimento
de preceito fundamental, seja porque respeitado, no caso, o princípio da subsidiariedade, seja,
ainda, porque processualmente viável a impugnação, por seu intermédio, de decisões judiciais
ou de interpretações judiciais de textos normativos. Em seguida, o Tribunal, também por votação
unânime, referendou, integralmente, a decisão proferida pela Relatora, Ministra Cármen Lúcia,
decisão essa que se reveste de efeito vinculante e de eficácia contra todos (suspendendo-se os
efeitos de atos judiciais ou administrativos, emanados de autoridade pública que possibilitem,
determinem ou promovam o ingresso de agentes públicos em universidades públicas e privadas,
o recolhimento de documentos, a interrupção de aulas, debates ou manifestações de docentes
e discentes universitários, a atividade disciplinar docente e discente e a coleta irregular de
depoimentos desses cidadãos pela prática de manifestação livre de ideias e divulgação do
pensamento nos ambientes universitários ou em equipamentos sob a administração de
universidades públicas e privadas e serventes a seus fins e desempenhos). O Ministro Gilmar
Mendes, que também referendou a decisão da Relatora, propôs, sem adesão dos demais
Ministros, outras medidas indicadas no voto que proferiu. Falaram: pela requerente, a Dra. Raquel
Elias Ferreira Dodge, Procuradora-Geral da República; pelo amicus curiae AMB - Associação dos
Magistrados Brasileiros, o Dr. Alberto Pavie Ribeiro; pelo amicus curiae ANDES - Sindicato
Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior, a Dra. Monya Ribeiro Tavares; pelo
amicus curiae FASUBRA-SINDICAL – Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-
Administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil, o Dr. Cláudio Santos; pelo
amicus curiae CONTEE - Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de
Ensino, a Dra. Sarah Campos; e, pelo amicus curiae ANDIFES – Associação Nacional dos
Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior, o Dr. Claudismar Zupiroli. Antecipou seu
voto, acompanhando a Relatora, o Ministro Dias Toffoli, Presidente. Ausente, justificadamente, o
Ministro Luiz Fux. Não votou o Ministro Marco Aurélio. Presidiu, este julgamento, o Ministro Celso
de Mello. (Doc. 11 – Anexo)
Feito esse breve relato, apontam-se as razões que, no entender deste
Órgão, recomendam a cassação da decisão reclamada.
4.2 Não aplicação da ratio decidendi da ADPF n. 548/DF quanto aos arts. 206, II
e III, da Constituição da República (arts. 988, III e § 4º, do CPC)
Cumpre destacar que, dando concretude ao que o texto original da
Constituição da República já estatuía por seu art. 102, I, “l”, o Código de Processo
Civil, nos arts. 988, II, e § 4º, expressamente legitimou o uso da Reclamação como
meio de garantir o respeito a decisões do Supremo Tribunal Federal em sede de
controle concentrado de constitucionalidade, em reforço à tutela objetiva da ordem
constitucional.
Por essa via, é de se enfatizar, torna-se possível o controle judicial, pelo
guardião da Constituição, da aplicação indevida da tese jurídica e de sua não
aplicação aos casos que a ela correspondam.
Dito isso, observa-se que a decisão reclamada, ao deferir o efeito
suspensivo pedido pela agora parlamentar, consignou que “não vejo, sob o ponto de
vista jurídico, qualquer impedimento a que um particular – em especial uma
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Deputada, representante legítimo do Povo – venha desempenhar o papel
responsável de intérprete de reclamos de violência, seja qual for a sua fonte,
porquanto, encontrar-se-á exercendo a cidadania” (Doc. 7 – Anexo, fl. 4), que “não
vislumbro nenhuma ilegalidade na iniciativa da agravante, Deputada estadual eleita,
de colocar seu futuro gabinete como meio social condensador do direito que todo
cidadão possui, estudantes inclusive, de peticionar a qualquer órgão público
denunciando ato que entenda ilegal praticado por representante do Estado” (Doc. 7
– Anexo, fl. 4) e que “Não há direito que se sobreponha ao direito do ofendido,
porquanto não há direito de ofender, de humilhar, de violentar crença ou
consciência, muito menos em ambiente dedicado ao desenvolvimento da criança e
do adolescente” (Doc. 7 – Anexo, fl. 5).
Aduziu, ainda, em linhas gerais, que o comunicado da deputada visa, em
verdade, defender as crianças e adolescentes, que já é hora de discutir o
monitoramento de salas de aula, e que, embora existam projetos de lei a respeito de
“escola livre” e “escola sem partido” em tramitação, a contenda não se relaciona
primordialmente à discussão sobre a neutralidade ideológica nas escolas.
Em primeiro lugar, há que se esclarecer que a decisão judicial de primeiro
grau que determinou a remoção da mensagem postada nas redes sociais em
momento algum dispôs sobre restrições ao direito de estudantes a noticiar ofensas,
infrações ou atos incompatíveis com as funções de docentes.
Isso porque o objeto da Ação Civil Pública em questão esteve desde o
nascedouro bastante circunscrito, no que toca ao questionamento do conteúdo
divulgado: não se trata de mensagem instrutiva sobre o direito de petição em geral,
mas, como demonstra a própria postagem (Doc. 3 – Anexo), incitação direcionada a
um típico específico de manifestação do pensamento, qual seja, a de “professores
doutrinadores” que, por “queixas político-partidárias em virtude da vitória do
Presidente Bolsonaro”, emitam “manifestações político-partidárias ou ideológicas”.
Trocando em miúdos, o conteúdo veiculado não foi de índole geral,
tampouco instrutiva, mas ao intento de estimular estudantes de todo o Estado de
Santa Catarina a filmar ou gravar professores que emitissem opinião discordante
daquelas defendidas pelo Presidente então eleito.
Ademais, como consignou a própria decisão reclamada, em que pese se
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tratar de um particular, a demandada é “uma Deputada, representante legítimo do
Povo” (Doc. 7 – Anexo, fl. 4) – condição que fez questão de enfatizar durante todo o
processo e no próprio comunicado que instituiu o dito canal de denúncias.
Ou seja, ainda que à época se tratasse de pessoa em vias de assumir
mandato eletivo, trata-se de alguém que representa, de fato, o povo, mas também
um dos poderes fundamentais da República – o Legislativo –, e nesse sentido suas
ações e discursos igualmente carregam o sentido de autoridade: são ouvidos com
ainda mais peso pelos destinatários.
E é aí que o fundamento jurídico-constitucional lançado na respeitável
decisão reclamada colide com a compreensão firmada na liminar da ADPF n.
548/DF acerca do art. 206, II e III, da Constituição da República, e da garantia da
pluralidade de ideias e da liberdade de ensino e aprendizado no sistema de
educação, uma vez que a postagem sob questionamento, por si e por seus efeitos,
incita e estimula o constrangimento e a censura a professores e alunos cujas visões
de mundo ou de governo não convirjam com as do atual Presidente da República.
Veja-se o que constou da liminar deferida na multimencionada ADPF:
Dispõem os incs. II e III do art. 206 e o art. 207 da Constituição do Brasil:
“Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
...
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; III -
pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e
privadas de ensino;”
…
Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão
financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e
extensão...”.
As normas constitucionais acima transcritas harmonizam-se, como de outra forma não seria, com
os direitos às liberdades de expressão do pensamento, de informar-se, de informar e de ser
informado, constitucionalmente assegurados, para o que o ensino e a aprendizagem conjugam-se
assegurando espaços de libertação da pessoa, a partir de ideias e compreensões do mundo
convindas ou desavindas e que se expõem para convencer ou simplesmente como exposição do
entendimento de cada qual.
A autonomia é o espaço de discricionariedade deixado constitucionalmente à atuação normativa
infralegal de cada universidade para o excelente desempenho de suas funções constitucionais.
Reitere-se: universidades são espaços de liberdade e de libertação pessoal e política. Seu título
indica a pluralidade e o respeito às diferenças, às divergências para se formarem consensos,
legítimos apenas quando decorrentes de manifestações livres. Discordâncias são próprias das
liberdades individuais. As pessoas divergem, não se tornam por isso inimigas. As pessoas criticam.
10
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Não se tornam por isso não gratas. Democracia não é unanimidade. Consenso não é imposição.
Daí ali ser expressamente assegurado pela Constituição da República a liberdade de aprender e
de ensinar e de divulgar livremente o pensamento, porque sem a manifestação garantida o
pensamento é ideia engaiolada. (Doc. 10 – Anexo, fls. 13-14)
Se é certo que a decisão tinha por referente concreto a situação das
Universidades, não menos o é que, por sua própria topografia constitucional, o art.
206 dispõe sobre princípios do ensino em geral, não se restringindo, nesse sentido,
ao ensino superior e abarcando, portanto, a liberdade e o pluralismo que devem
orientar os processos pedagógicos e os ambientes de estudo em todos os níveis.
Destarte, a ratio decidendi presente na liminar – referendada por todos os
Ministros presentes à sessão plenária que a analisou – não comporta limitação à
questão universitária, de sorte que o “canal de denúncias” instituído pela deputada,
da mesma forma que os atos impugnados na ADPF n. 548/DF, pode implicar, qual
apurado naquela Ação Constitucional, “a interrupção de aulas, debates ou
manifestações de docentes e discentes universitários, a atividade disciplinar docente
e discente e a coleta irregular de depoimentos desses cidadãos pela prática de
manifestação livre de ideias e divulgação do pensamento”.
Em sendo autorizada a manutenção de tal “canal de denúncias” e a
propagação do teor do comunicado em litígio, somar-se-ão às preocupações
cotidianas dos docentes – que já não são poucas – o risco de se verem expostos
por figura pública em canais de ampla repercussão, ao alvedrio do conhecido
“tribunal das redes sociais”, sempre que alguma lição ministrada ou opinião
manifestada seja entendida como avessa às ideias, às declarações ou políticas
instituídas pelo Presidente da República ou por membros de sua agremiação
partidária.
Frise-se, ainda, que a garantia da liberdade de expressão – essencial a
todas as democracias – não vem a socorrer a hipótese vertente em relação ao
comunicado divulgado, dado que a mensagem não constitui mera expressão de
pensamento ou ideia, mas convocação a atos concretos de denúncia.
E, sabe-se, quando manifestações verbais ou discursos potencialmente
se transubstanciam na prática de atos colidentes com a ordem constitucional, a
liberdade de expressão não é salvaguarda, como ilustram os crimes de incitação ao
11
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crime (art. 286) e instigação a suicídio (art. 122, CP).
O mesmo vale para o sistema de responsabilidade civil individual ou
coletiva em casos de ofensa à honra, cabendo ainda mencionar os parâmetros
dados à liberdade de expressão pelo STF por ocasião do julgamento, ainda, o
precedente do caso Ellwanger4
.
É exatamente o caso: professores e estudantes, num contexto em que tal
tipo de incitação seja difundia, ingressarão diariamente nos estabelecimentos de
ensino sob o signo da autocensura, ante a perspectiva de que qualquer
manifestação destoante da linha ideológica da deputada seja gravada ou filmada e a
ela remetida a título de denúncia (!).
Gize-se, também, que a questão dos limites constitucionais ao exercício
da docência e da exigência de neutralidade no ensino não é secundária ao deslinde
do feito, como quer a decisão reclamada.
Com efeito, a análise do chamado veiculado pela deputada é
indissociável de tal debate como premissa do raciocínio jurídico que subjaz à Ação
Civil Pública – inclusive pelo fato de que a própria parlamentar insere no rodapé do
texto a expressão “por uma escola sem partido” (Doc. 3 – Anexo).
A demandada, portanto, apresenta-se e vincula seu chamado à matriz
ideológica do assim chamado Projeto Escola Sem Partido, que tem o objetivo
anunciado de garantir a neutralidade política e ideológica no ensino – e cuja
discussão ainda há de se travar de modo legítimo nos espaços públicos e foros
parlamentares próprios.
Contudo, não se pode deixar de registrar, pela aderência ao presente
caso, que o Ministro Luis Roberto Barroso, ao deferir medida liminar na Ação Direta
de Inconstitucionalidade n. 5.537/AL, entendeu pela plausibilidade da alegação de
ofensa à Constituição por projetos de lei que, ao intento de evitar práticas de
doutrinação, acabam por restringir a pluralidade de ideias e a liberdade de ensino e
aprendizado nas escolas. Vejamos:
II. Inconstitucionalidades materiais da Lei 7.800/2016 do Estado de Alagoas:
4 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 82.424/RS, Rel. Min. Moreira Alves, Rel. p/ acórdão Min. Maurício Corrêa, Tribunal
Pleno, j. 17/9/2003, DJ p. em 19/3/2004.
12
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5. Violação do direito à educação com o alcance pleno e emancipatório que lhe confere a
Constituição. Supressão de domínios inteiros do saber do universo escolar. Incompatibilidade
entre o suposto dever de neutralidade, previsto na lei, e os princípios constitucionais da liberdade
de ensinar, de aprender e do pluralismo de ideias (CF/1988, arts. 205, 206 e 214).
6. Vedações genéricas de conduta que, a pretexto de evitarem a doutrinação de alunos, podem
gerar a perseguição de professores que não compartilhem das visões dominantes. Risco de
aplicação seletiva da lei, para fins persecutórios. Violação ao princípio da proporcionalidade
(CF/1988, art. 5º, LIV, c/c art. 1º).
7. Plausibilidade do direito e perigo na demora reconhecidos. Deferimento da cautelar.5
Na decisão acima, que inclusive e paradoxalmente integra a
fundamentação do comando judicial reclamado, consignou o relator que “o
pluralismo ideológico e a promoção dos valores da liberdade são assegurados na
Constituição e em todas as normas internacionais antes mencionadas, sem que haja
menção, em qualquer uma delas, à neutralidade como princípio diretivo”.6
Perde-se, portanto, com a orientação policialesca do chamado difundido
pela demandada nas redes sociais, a própria riqueza do convívio humano que
permite que alunos, famílias, professores e coordenadores pedagógicos discutam
livremente sobre seu processo de ensino e aprendizagem, eis que toda matéria que
envolva tema político passa a correr o risco de cair na vala comum da “denúncia”.
Em conclusão, portanto, a mensagem veiculada amplamente por redes
sociais, além de instigar denúncias em relação a fatos que nem sequer constituem
infrações, tumultua o sistema de ensino, fomenta a criação de ambientes
inquisitoriais em salas de aula e constrange o exercício legítimo e autônomo da
pluralidade de ideias e da liberdade de ensino, em afronta ao art. 206, II e III, da
Constituição da República, na extensão hermenêutica que embasa a decisão
prolatada na ADPF n. 548/DF.
Considerando, então, que a quem se asseguram os fins devem ser
garantidos os meios, a presente Reclamação é, neste momento, o único meio capaz
de efetivar as normas do art. 206, II e III, da Constituição da República, no sistema
educacional catarinense.
4.3 Inobservância à liminar referendada pelo Plenário do STF nos autos da
ADPF n. 548/DF (art. 988, II, do CPC)
5 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI n. 5.537/AL, Rel. Min. Luis Roberto Barroso, Decisão Monocrática, DJ6 n. 56,
divulgado em 22/3/2017, pp. 2-3.
6 Idem, p. 21.
13
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Importa mencionar, ainda, que além da hipótese tratada no item anterior,
o pedido de cassação da decisão reclamada encontra respaldo, também, na
previsão do art. 988, II, do CPC, na medida em que fica caracterizada a
inobservância ao que se dispôs na liminar deferida na ADPF n. 548/DF.
Como já se afirmou, é fato que a liminar abarcou ordens mandamentais
voltadas à garantia da liberdade de ensino e da pluralidade de ideias nos ambientes
universitários.
É de se registrar, entretanto, que os debates havidos quando do
referendo da decisão pelo Plenário do STF não excluíram a priori a possibilidade de
extensão de seus efeitos às escolas – o que só deixou de ocorrer porque os fatos
arrolados na peça vestibular pela PGR limitavam-se aos eventos ocorridos em
estabelecimentos de ensino superior.
Durante a sessão plenária, contudo, houve expressa menção à questão
das escolas, e, mais, foi abordado o específico episódio da veiculação da
mensagem pela parlamentar demandada, e que agora dá azo ao ajuizamento da
presente Reclamação.
Essa circunstância foi amplamente difundida pelos veículos de imprensa
que acompanham a atuação do STF, cuja página oficial relatou:
O ministro Gilmar Mendes também votou pela confirmação da liminar, mas em maior extensão,
propondo outras medidas para proteger a liberdade de cátedra e as liberdades acadêmicas
inclusive no âmbito das relações privadas, individuais ou institucionais. O ministro registrou o
caso de incitação à violação à liberdade de cátedra pela deputada estadual eleita Ane
Caroline Campagnolo (PSL/SC), que abriu um canal para que alunos denunciem
professores que supostamente estejam fazendo manifestações político-partidárias em sala
de aula. “Mostra-se inadmissível que, justamente no ambiente que deveria imperar o livre debate
de ideias, se proponha um policiamento político-ideológico da rotina acadêmica”, destacou
Mendes. “A política encontra na universidade uma atmosfera favorável que deve ser preservada.
Eventuais distorções na atuação política realizada no âmbito das universidades mereceriam ser
corrigidas não pela censura, mas pela ampliação da abertura democrática”, enfatizou.7
(sem grifo
no original)
Na coluna do jornalista Fausto Macedo, d’O Estado de São Paulo, os
jornalistas Moraes Moura e Teo Cury publicaram o seguinte:
Canal. Para o ministro Gilmar Mendes, é “inadmissível que justamente num ambiente em que
deveria imperar o livre debate de ideias se proponha um policiamento político ideológico da rotina
acadêmica”.
Em seu voto, Gilmar criticou a postura da deputada estadual eleita em Santa Catarina, Ana
Caroline Campagnolo (PSL), que abriu um canal informal de denúncias na internet para fiscalizar
7 http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=394447. Acessado em 31.1.19.
14
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professores em sala de aula a partir desta segunda-feira, 29. Campagnolo pede que vídeos e
informações sejam repassados para o seu número de celular com o nome do docente, da escola e
da cidade.
“Devemos dar resposta, não só em relação a eventuais atos estatais, como vimos, mas também
atos decorrentes de eventuais iniciativas privadas, hoje perpetradas no âmbito da internet, e que
causam pânico, terror, causam medo às pessoas”, comentou Gilmar, ao comentar o caso de Santa
Catarina.8
O mesmo foi noticiado pelo portal da Revista Veja, em matéria de
Leonardo Lellis:
Para o ministro Gilmar Mendes, é “inadmissível que justamente num ambiente em que deveria
imperar o livre debate de ideias se proponha um policiamento político ideológico da rotina
acadêmica”. Ele ainda criticou a iniciativa da deputada estadual eleita em Santa Catarina, Ana
Caroline Campagnolo (PSL), que estimulou denúncias anônimas contra professores através de
seu número de celular. O Ministério Público de Santa Catarina quer que ela seja condenada a
pagar cerca de R$ 70 mil de indenização por danos morais coletivos.
“Devemos dar resposta, não só em relação a eventuais atos estatais, como vimos, mas também
atos decorrentes de eventuais iniciativas privadas, hoje perpetradas no âmbito da internet, e que
causam pânico, terror, causam medo às pessoas”, comentou Gilmar Mendes, ao comentar o caso
de Santa Catarina.9
Ainda conforme relatos da imprensa, a sugestão de estender os efeitos
da decisão ao caso em comento apenas não foi acatada por uma questão formal de
ordem processual, uma vez que faltavam elementos trazidos pela parte autora para
apontar concretamente a situação semelhante.
Desse modo, considerando o espaço que agora se abre para que tais
informações oficialmente integrem os autos, torna-se viável caracterizar o ato judicial
impugnado como forma indireta de descumprimento do comando liminar emanado
na ADPF n. 548/DF.
E, em reforço à possibilidade de compreensão mais extensa dos efeitos
da decisão paradigmática, anote-se que a admissão da CONTEE (Confederação
Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino)10
na condição de
amicus curiae na ADPF n. 548/DF (Doc. 11 – Anexo) sinaliza para o fato de que a
compreensão sobre o art. 206 da Constituição da República lá expendida
transcende os estabelecimentos de ensino superior e resguarda a liberdade e o
pluralismo de ideias em todos os níveis de ensino.
8https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/stf-derruba-acoes-de-policiais-nas-universidades-e-reafirma-liberdade-
academica-nas-instituicoes/ Acessado em 31.1.19
9 https://veja.abril.com.br/politica/stf-proibe-atuacao-contra-liberdade-de-expressao-em-universidades/ Acessado em 31.1.19
10 “A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino – CONTEE é uma entidade sindical de
terceiro grau que congrega 88 sindicatos e 10 federações de professores(as) e técnicos(as) e administrativos(as) do setor
privado de ensino, da educação infantil à superior – representando atualmente cerca de 1 milhão de trabalhadores(as)
brasileiros(as).” Fonte: http://contee.org.br/apresentacao/ Acessado em 31.1.19.
15
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COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS
Ante o exposto, considerando-se que houve indireto descumprimento da
decisão liminar referendada pelo Plenário do STF na Ação Constitucional citada,
reitera-se o pedido de cassação da decisão reclamada, agora pela via autorizada no
art. 988, II, do CPC.
5 PEDIDO DE LIMINAR
Além do que foi até aqui sustentado, entende-se que a hipótese vertente,
como meio de assegurar a tutela jurisdicional efetiva, comporta o deferimento de
medida liminar, nos lindes do art. 989, II, do CPC, inclusive inaudita altera parte, vez
que a evidência das razões de direito neste recurso expostas e a iminência de
danos irreparáveis se faz presente. Vejamos.
5.1 Fumus boni iuris
O fumus boni iuris a autorizar a tutela de urgência reside, na linha do que
se demonstrou nos itens 4.2 e 4.3, na congruência entre o contexto, os dispositivos
constitucionais e os fundamentos (ratio decidendi) que indicam que a decisão
reclamada exorbitou da compreensão assentada no STF, sobre a matéria,
especialmente na medida liminar deferida na ADPF n. 548/DF e, em reforço, na
decisão proferida na ADI 5.537/AL.
Cuida-se, em ambos os casos, de iniciativas que constrangem o exercício
da liberdade de aprender e ensinar, limitam indevidamente o pluralismo de ideias e
impõem mecanismos expressos ou velados de censura que obstaculizam as
finalidades constitucionais sumariadas no Capítulo III, Seção I, de nossa Lei Maior.
5.2 Periculum in mora
Caracterizado o fumus boni iuris, cumpre agora expor os elementos que
consubstanciam a urgência deste pleito e impõem a concessão da liminar aqui
requerida, ante o risco de danos irreparáveis ou de difícil reparação.
A uma, tem-se que o Estado de Santa Catarina se encontra às vésperas
do início do ano letivo, estando o retorno às aulas na rede estadual aprazado para a
16
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COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS
data de 11 de fevereiro de 2019 (Doc. 2 – anexo).
Desse modo, há inegável e iminente risco de que o ano escolar principie
sob o signo do constrangimento às atividades docente e discente, acentuado pelo
fato de que a beneficiária da decisão reclamada, agora no exercício de mandato
eletivo, estará autorizada – como todos os seus pares – a seguir instigando
“denúncias” e expondo o ambiente das salas de aula à mesma tensão polarizada
que caracterizou o último pleito.
A duas, considerando que a publicação da decisão reclamada é bastante
recente, a possibilidade de reversão, no próprio Tribunal de origem, do
pronunciamento impugnado, revela-se delongada, dada a necessidade de cumprir
todo o plexo de comunicações processuais de rigor e tendo em vista a incerteza do
momento em que eventual insurgência será pautada pelos órgãos julgadores na
Corte Catarinense.
A três, há que se considerar a repercussão nacional do fato, que desde
sua ocorrência vem sendo replicado por particulares em outros Estados da
federação, a exemplo de publicações versadas em Ação Civil Pública ajuizada pelo
Ministério Público do Estado de Minas Gerais, na Comarca de Juiz de Fora (doc. 12
– anexo). A decisão ora reclamada encoraja e estimula diversos segmentos da
sociedade a adotarem mecanismos semelhantes, guiados pela imposição de suas
preferências ideológicas, em especial no Estado de Santa Catarina.
Por fim, nenhum prejuízo haverá à parlamentar ou à sociedade na
suspensão da veiculação das mensagens, uma vez que seguem resguardados os
meios convencionais de que as escolas e secretarias de educação – além do próprio
Poder Judiciário – já dispõem para avaliar possíveis atos de discriminação, ofensas
ou quaisquer outras infrações civis, penais e/ou administrativas eventualmente
praticadas nos estabelecimentos de ensino.
Assim, a fim de evitar que o ano de 2019 seja inaugurado, nas escolas
catarinenses, sob ameaças à pluralidade de ideias e à liberdade de ensino e
aprendizagem, é que se clama pelo deferimento da liminar nestes autos, para sustar
a eficácia da decisão reclamada.
6 PEDIDOS
17
MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA
COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS
Pelo exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA
CATARINA requer:
a) a suspensão liminar da decisão reclamada na forma do art. 989, II, do
CPC, ante a relevância da fundamentação do recurso e a necessidade de evitar
dano grave ou de difícil reparação decorrente da veiculação massiva do conteúdo
em litígio às vésperas do início do ano letivo, de molde a revogar o efeito suspensivo
concedido pelo pronunciamento aqui impugnado;
b) sejam requisitadas informações à autoridade julgadora na origem, a serem
prestadas no prazo de 10 (dez) dias (art. 989, I, do CPC);
c) a citação da beneficiária da decisão, ANA CAROLINE CAMPAGNOLO11
, para
apresentar contestação à presente Reclamação no prazo de 15 (quinze) dias (art.
989, II, do CPC);
d) abra-se vista dos autos à Procuradoria-Geral da República;
e) seja julgada procedente a presente Reclamação, para cassar a decisão
exorbitante, na forma do art. 992 do CPC, estabelecendo-se como medida
adequada à solução da controvérsia a vedação da prática de qualquer ato
administrativo ou jurisdicional que implique autorização à veiculação da mensagem
em litígio ou de qualquer outro conteúdo que instigue a “gravação” ou “filmagem” de
opiniões de docentes e seu envio por “canal de denúncias”.
Florianópolis, 4 de fevereiro de 2019.
Rogê Macedo Neves
Procurador de Justiça
Coordenador de Recursos Cíveis
ROL DE DOCUMENTOS DO ANEXO
1 – Íntegra dos autos do Agravo de Instrumento n. 4032450-55.2018.8.24.0000,
do Tribunal de Justiça de Santa Catarina;
11 Já qualificada na nora de rodapé n. 1.
18
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COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS
2 – Calendário Escolar da rede pública do Estado de Santa Catarina;
3 – Imagem publicada por Ana Caroline Campagnolo em sua rede social
Facebook, com o conteúdo do chamado ao canal de denúncias;
4 – Inicial da Ação Civil Pública proposta pela 25ª Promotoria de Justiça da
Comarca da Capital/SC
5 – Decisão interlocutória prolatada pelo Juiz de Direito da Vara da Infância e
Juventude da Comarca da Capital/SC;
6 – Agravo de Instrumento interposto por Ana Caroline Campagnolo;
7 – Decisão monocrática proferida pela Desembargadora Maria do Rocio Luz
Santa Ritta (decisão reclamada);
8 – Movimentação atual do Agravo de Instrumento n. 4032450-
55.2018.8.24.0000 no TJSC;
9 – Inicial da ADPF proposta pela Procuradoria-Geral da República;
10 – Decisão liminar proferida pela Ministra Cármen Lúcia na ADPF n. 548/DF;
11 – Admissão de amici curiae na ADPF n. 548/DF.
12 – Inicial de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado de
Minas Gerais.
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Ação Civil Pública com pedido de tutela de urgência para que o Estado estenda...
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4032450 55.2018.8.24.0000

  • 1. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS Reclamação no Agravo de Instrumento n. 4032450-55.2018.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina EXCELENTÍSSIMA SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA, RELATORA DA ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL N. 548/DF URGENTE – Início do ano letivo catarinense previsto para 11/2/2019 “Liberdade – essa palavra que o sonho humano alimenta Que não há ninguém que explique, e ninguém que não entenda” (Cecília Meirelles) RECLAMAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PUBLICAÇÃO EM REDES SOCIAIS, POR DEPUTADA ESTADUAL ELEITA, CONCLAMANDO ESTUDANTES DO ESTADO DE SANTA CATARINA A FILMEM OU GRAVEM “TODAS AS MANIFESTAÇÕES POLÍTICO-PARTIDÁRIAS OU IDEOLÓGICA [SIC]” DE “PROFESSORES DOUTRINADORES” QUE “NÃO CONTERÃO SUA IRA” DIANTE DO RESULTADO FINAL DAS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS DE 2018. PLEITO LIMINAR DE SUSPENSÃO DA VEICULAÇÃO DO COMUNICADO. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE DETERMINA A SUSPENSÃO DA PUBLICAÇAO. AGRAVO DE INSTRUMENTO PELA DEMANDADA. DECISÃO MONOCRÁTICA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA QUE DEFERE EFEITO SUSPENSIVO, AUTORIZANDO QUE A MENSAGEM VOLTE A SER VEICULADA. DESCUMPRIMENTO DA LIMINAR REFERENDADA PELO PLENARIO DO STF NA MEDIDA CAUTELAR NA ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL N. 548/DF. INOBSERVÂNCIA AO FUNDAMENTO JURÍDICO-CONSTITUCIONAL (RATIO DECIDENDI) QUE EMBASOU A MEDIDA DEFERIDA EM SEDE DE CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE, CALCADA NA LIBERDADE DE APRENDER E ENSINAR E NO PLURALISMO DE IDEIAS (ART. 206, II E III, DA CR). PRESENÇA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES PARA O DEFERIMENTO DA LIMINAR NA RECLAMAÇÃO. FUMUS BONI IURIS. INCOMPATIBILIDADE ENTRE OS PRESSUPOSTOS JURÍDICOS DA DECISÃO RECLAMADA E A INTERPRETAÇÃO CONFERIDA PELO STF AO ART. 206, II E III, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. PERICULUM IN MORA. IMINÊNCIA DO INÍCIO DO ANO LETIVO NO ESTADO. RISCO DE QUE AS ATIVIDADES DE ENSINO E APRENDIZAGEM SE INICIEM SOB O SIGNO DO CONSTRANGIMENTO DE DOCENTES E DISCENTES NO SISTEMA DE ENSINO. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, por seu Coordenador de Recursos Cíveis, Procurador de Justiça que estas razões subscreve, vem, perante Vossa Excelência, com fundamento nos arts. 102, I, “l”, da Constituição da República c/c com os arts. 988, II e III, e 989, § 6º, II, do Código de Processo Civil (CPC) apresentar RECLAMAÇÃO COM PEDIDO DE LIMINAR
  • 2. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS por entender que a decisão monocrática prolatada pela Desembargadora Maria do Rocio Luz Santa Ritta, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, nos autos do Agravo de Instrumento n. 4032450-55.2018.8.24.0000 (Doc. 1 – Anexo) (Ação Civil Pública n. 0917862-27.2018.8.24.0023), da Comarca da Capital/SC, em que este Órgão figura como agravado, sendo agravante ANA CAROLINE CAMPAGNOLO1 , dispôs contra a autoridade da decisão liminar referendada pelo Tribunal Pleno dessa Corte Suprema no julgamento da Medida Cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 548/DF, nos termos das razões adiante aduzidas. 1 SÍNTESE DOS FATOS No dia 29 de outubro de 2018, um dia após a definição do resultado das eleições presidenciais brasileiras, a deputada estadual eleita para a legislatura 2019- 2022 da Assembleia Legislativa de Santa Catarina, Ana Caroline Campagnolo, divulgou, em uma de suas contas nas Redes Sociais, na Internet (Facebook)2 , comunicado direcionado ao “estudante catarinense”, instigando a gravação e a filmagem para fins de “denúncia” de “professores doutrinadores” que emitissem manifestações político-partidárias ou ideológicas, conforme imagem anexa (Doc. 3 – Anexo) com o seguinte conteúdo: ATENÇÃO, ESTUDANTE CATARINENSE! Segunda-feira, 29 de outubro, é o dia em que os professores doutrinadores estarão inconformados e revoltados. Muitas deles não conterão sua ira e farão da sala de aula um auditório cativo para suas queixas político-partidárias em virtude da vitória de Bolsonaro. Filme ou grave todas as manifestações político-partidárias ou ideológica. DENUNCIE! Envie o vídeo e as informações para (49) 98853 3588, descreva o nome do professor, o nome da escola e a cidade. Garantimos o anonimato dos denunciantes. POR UMA ESCOLA SEM PARTIDO / DEPUTADA ESTADUAL ELEITA EM SANTA CATARINA ANA CAROLINE CAMPAGNOLO / EDUCAÇÃO DE QUALIDADE DE VERDADE 1 Brasileira, divorciada, professora, Deputada Estadual eleita em 2018, inscrita no CPF n. 061.313.819-84 e no RG n. 4.959.278, residente e domiciliada à Rua Rio de Janeiro 2199-E, apartamento 301, bloco L, no Barreirinho, Chapecó/SC. A partir de 1º de fevereiro de 2019, exerce mandato parlamentar na Assembleia Legislativa de Santa Catarina – Palácio Barriga Verde, Rua Doutor Jorge Luz Fontes, 310, Florianópolis/SC. 2 https://www.facebook.com/photo.php?fbid=1578990362200714&set=a.105479926218439*type=3&theater Ac. em 31.1.19. 2
  • 3. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS Diante do conteúdo da publicação, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina, pela 25ª Promotoria de Justiça da Comarca da Capital/SC, visando à garantia da liberdade de aprender e ensinar e do pluralismo de ideias nas escolas catarinenses, propôs Ação Civil Pública, com pedido de tutela de urgência, em que formulou os seguintes pedidos cautelares: 56. Ante o exposto, o Ministério Público de Santa Catarina, através de seu representante, requer a concessão de tutela de urgência antecipada consistente em expedição de ordem judicial, inaudita altera parte: a) à Requerida para que se abstenta de implementar e/ou manter de qualquer modalidade de serviço formal ou informal, de controle ideológico das atividades dos professores e alunos das escolas públicas e privadas do Sistema de Ensino do Estado de Santa Catarina e dos Sistemas de Ensino dos Municípios Catarinenses, em especial dos estabelecimentos públicos, por si ou por interposta pessoa e sob qualquer pretexto; b) à Requerida para que se abstenha de produzir e/ou promover e/ou compartilhar e/ou divulgar, nas redes sociais da Rede Mundial de Computadores denominada Internet, em especial em contas no Instagram e Facebook, bem como através de contas de WhatsApp ou aplicativos similares, suas ou de terceiros, de qualquer aviso ou comunicado dirigido a estudantes ou outros integrantes das comunidades escolares (pais e responsáveis de alunos, profissionais da educação, professores) estimulando a formulação de denúncias, anônimas ou não, através de canais formais ou informais, especialmente através de telefone e/ou mediante mensagens eletrônicas divulgadas através de e-mails e/ou outros aplicativos; c) à Requerida para que remova de sua conta na Rede Social denominada Facebook na internet a publicação que motivou a presente ação judicial e/ou qualquer outra postagem com conteúdo similar, ou que represente ameaça a qualquer integrante das comunidades escolares, especialmente professores, e publique na mesma conta informação sobre a decisão judicial liminar, ora pleiteada, proibindo-a de divulgar o serviço ilícito de denúncias contra professores, até decisão final de mérito; e d) à operadora de telefonia Claro S. A. Brasil, à qual está associado o número de celular (49) 98853-3588, para que, no prazo de 24 horas, determine o bloqueio deste número, impedindo-o de originar ou receber chamadas de voz, bem como chamadas de SMS; (Doc. 4, Anexo – fls. 19-20) Ato contínuo, o Juiz de Direito da Vara da Infância e da Juventude da Comarca da Capital deferiu parcialmente os pedidos de ordem liminar, determinando à requerida que: (i) se abstenha de criar, manter incentivar ou promover qualquer modalidade particular de serviço de denúncia das atividades de servidores públicos, atividade própria das ouvidorias criadas pela Administração Pública; (ii) retire de imediato da publicação de p. 23, publicada em seu perfil do “Facebook” as seguintes frases; “Filme ou grave todas as manifestações político-partidárias ou ideológicas que humilhem ou ofendam sua liberdade de crença e consciência. DENUNCIE! Envie o vídeo e as informações para (49) 98853 3588, descreva o nome do professor, o nome da escola e a cidade. Garantimos o anonimato dos denunciantes”, e “Alunos que sentirem seus direitos violados podem usar gravadores ou câmeras para registrar os fatos”. (Doc. 5, Anexo – fl. 9) Inconformada com o teor da decisão, a requerida interpôs Agravo de Instrumento, no qual também requereu a antecipação dos efeitos da tutela recursal (Doc. 6 – Anexo), que lhe foi deferida por decisão monocrática da lavra da Desembargadora Maria do Rocio Luz Santa Ritta, assim prolatada: 3
  • 4. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS Examinando o texto proposto pela requerida, professora e hoje Deputada eleita, vamos observar que a mesma pretende se colocar como um canal de denúncias dos estudantes, garantido o anonimato acaso queiram, quanto a “manifestações político-partidárias ou ideológicas que humilhem ou ofendam sua liberdade de crença e consciência”. Se coloca a requerida como uma espécie de “ouvidora social” no combate a que se propõe a toda espécie de abuso ou excesso que se venha a praticar em sala de aula, a partir da transgressão pelo professor dos limites constitucionais que lhe são deferidos para o exercício de sua docência. [...] Portanto, em linha de princípio, neste estágio inicial de juízo de delibação, não vislumbro nenhuma ilegalidade na iniciativa da agravante, Deputada estadual eleita, de colocar seu futuro gabinete como meio social condensador do direito que todo cidadão possui, estudantes inclusive, de peticionar a qualquer órgão público denunciando ato que entenda ilegal praticado por representante do Estado, sobretudo quando se tratar de ofensas e humilhações em proselitismo político-partidário travestido de conteúdo educacional ministrado em sala de aula. [...] Sem antecipar posição de mérito, porquanto a imparcialidade restaria afetada, sem que fossem ouvidos todos os envolvidos nessa relevante questão, reafirmo que a liberdade do professor de ensinar já está garantida pela Constituição, tanto quanto ali também está satisfatoriamente previsto o não-direito, a quem quer que seja, de produzir ofensas e humilhações, especialmente contra vulneráveis, como tal, à criança e ao adolescente, que não dispensam a proteção do Estado. [...] Diante do exposto, concedo o efeito suspensivo pretendido, fazendo retornar a expressão omitida na página do Facebook. (Doc. 7 – Anexo, fls. 2-3/4/7-8) Em resumo, são esses os fatos que envolvem a presente Reclamação, os quais indicam que a decisão prolatada pela Desembargadora relatora do Agravo de Instrumento n. 4032450-55.2018.8.24.0000 deve ser cassada pelo Supremo Tribunal Federal. 2 CABIMENTO DA RECLAMAÇÃO 2.1 Requisitos constitucionais e legais que autorizam o expediente Inicialmente, imperativo demonstrar o cabimento da Reclamação, com abrigo na alínea “l” do art. 102-A, I, da Constituição da República: CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I – processar e julgar, originariamente: [...] l) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões; Mais recentemente, o Código de Processo Civil reforçou o cabimento da Reclamação aqui proposta – ampliando sensivelmente, inclusive, suas hipóteses de manejo – nos seguintes termos: 4
  • 5. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS LEI N. 13.105, DE 16 DE MARÇO DE 2015 (CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – CPC) Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para: [...] II - garantir a autoridade das decisões do tribunal; III – garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; [...] § 4º As hipóteses dos incisos III e IV compreendem a aplicação indevida da tese jurídica e sua não aplicação aos casos que a ela correspondam Note-se, ademais, que o citado art. 988, por seu § 5º, II, afasta a necessidade de esgotamento das instâncias ordinárias na hipótese de Reclamação ajuizada com o objetivo de garantir a autoridade das decisões do tribunal, bem como a observância de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade, pelo que a via direta de acesso à jurisdição dessa Corte se mostra adequada à hipótese. 2.2 Cabimento da Reclamação contra decisões liminares Ainda quanto ao cabimento da Reclamação na hipótese vertente, é de se ressaltar que o fato de a decisão reclamada haver sido proferida em sede de tutela de urgência recursal não inviabiliza o manejo do presente meio de impugnação. Assim, mesmo que a decisão reclamada tenha a marca da precariedade, o pleito de sua suspensão e posterior cassação é legítimo, dado que partiu de premissa jurídico-constitucional em tudo avessa ao que assentou o Supremo Tribunal Federal por ocasião do referendo à liminar prolatada no bojo da ADPF n. 548/DF. Nessa linha, a título meramente exemplificativo, pode-se mencionar a decisão liminar prolatada na Reclamação n. 25.369/DF pelo saudoso Ministro Teori Zavaski, quando cassou decisão monocrática da lavra de Desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina que havia antecipado os efeitos de tutela recursal buscada em Agravo de Instrumento, em iter processual bastante assemelhado àquele que aqui se desenha. Vejamos: Por outro lado, está evidenciado o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, na medida em que a manutenção do ato reclamado impede seja pleiteada a renovação das atuais autorizações ou permissões de exploração de serviço de táxi – cujos prazos de exploração estão expirando –, o que colocará imediatamente em situação de ilegalidade os particulares que ainda exploram o serviço nessas condições, acarretando prejuízos à sua subsistência, bem assim ao interesse público. De fato, conforme apontado pelo reclamante à fl. 6, mantido o ato reclamado, é 5
  • 6. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS possível que, no caso de eventual provimento do recurso extraordinário acima referido, não mais existam licenças de exploração do serviço de táxi outorgadas com base no art. 64 da Lei Complementar Municipal 85/2001 que possam se beneficiar dessa decisão. 4. Ante o exposto, defiro a liminar para suspender a eficácia da decisão de antecipação dos efeitos da tutela proferida no Agravo de Instrumento 8000296-81.2016.8.24.0000, em trâmite no Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Solicitem-se informações à autoridade reclamada. Cite-se o Ministério Público do Estado de Santa Catarina para contestar. Após, à Procuradoria-Geral da República para parecer.3 Como se vê, considerando que o objeto primordial das reclamações é a preservação da integridade do sistema decisório e a uniformidade da tutela objetiva da constitucionalidade de atos judiciais, revela-se legítimo o ajuizamento de Reclamação, ainda que em face de decisões liminares. 3 TEMPESTIVIDADE DA RECLAMAÇÃO Conforme se infere do enunciado da Súmula 734 do STF (“Não cabe reclamação quando já houver transitado em julgado o ato judicial que se alega tenha desrespeitado decisão do Supremo Tribunal Federal”) e do art. 988, § 5º, I, do CPC, a Reclamação deve ser protocolada anteriormente ao trânsito em julgado do ato judicial impugnado. No caso, a decisão reclamada, concessiva de efeito suspensivo a Agravo de Instrumento, ainda se encontra em fase de comunicações processuais, pendendo inclusive o prazo para eventual interposição de recursos e devendo, ainda, ser confirmada ou não pelo órgão colegiado respectivo (Doc. 8 – Anexo). 4 DAS RAZÕES PARA PROVIMENTO DA PRESENTE RECLAMAÇÃO A decisão que se busca cassar, como já mencionado, antecipou os efeitos de tutela recursal pleiteada em sede de Agravo de Instrumento para sustar eficácia de decisão interlocutória que havia determinado à demandada a remoção, das redes sociais, do comunicado em que incitava os estudantes catarinenses a filmar, gravar e denunciar manifestações de professores que emitissem opiniões contrárias ao então Presidente eleito, Jair Messias Bolsonaro, inclusive remetendo tais “denúncias” a linha de telefone específica. Contudo, ao assim decidir, a insigne relatora da matéria no Tribunal de Justiça de Santa Catarina abriu margem à revisão de seu pronunciamento, vez que 3 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Rcl 25.369/DF, Rel. Min. Teori Zavaski, Decisão Monocrática, DJe n. 217, divulgado em 10/10/2016. 6
  • 7. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS simultaneamente deixou de observar a liminar referendada pelo Plenário do STF no bojo da ADPF n. 548/DF e negou aplicabilidade à tese jurídica que embasou a medida liminar deferida em sede de controle concentrado de constitucionalidade. Evidenciam-se, portanto, os permissivos da reclamação previstos pelos arts. 988, II, III e § 4º, do CPC, como se demonstrará a seguir. 4.1 Breve retrospectiva da decisão liminar deferida pela Ministra Cármen Lúcia e referendada pelo Plenário do STF na ADPF n. 548/DF Como é de amplo conhecimento, o pleito que teve lugar em outubro de 2018 foi marcado por tensões políticas e eleitorais, oriundas da polarização do debate e englobando as mais variadas vertentes partidárias e/ou ideológicas. Nesse cenário, a semana que antecedeu o segundo turno das eleições presidenciais foi palco de uma série de ações policiais, avalizadas por unidades da Justiça Eleitoral, em diversas universidades brasileiras, com o objetivo de apreender materiais e obstar atos e manifestações que suspostamente indicariam preferências eleitorais em favor dos candidatos em disputa. O quadro descrito motivou a propositura, pela Procuradora-Geral da República, em 26 de outubro de 2018, de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental com pedido liminar ao escopo de “evitar e reparar lesão a preceitos fundamentais resultantes de atos do Poder Público tendentes a executar ou autorizar buscas e apreensões, assim como proibir o ingresso e interrupção de aulas, palestras, debates ou atos congêneres e promover a inquirição de docentes, discentes e de outros cidadãos que estejam em local definido como universidade pública ou privada” (Doc. 9 – Anexo, fl. 2). Em 27 de outubro de 2018, reconhecendo a urgência do pleito e a juridicidade de seus fundamentos, a Ministra Cármen Lúcia deferiu a medida liminar pleiteada pela PGR, nos seguintes termos: 14. Pelo exposto, em face da urgência qualificada comprovada no caso, dos riscos advindos da manutenção dos atos indicados na peça inicial da presente arguição de descumprimento de preceito fundamental e que poderiam se multiplicar em face da ausência de manifestação judicial a eles contrária, defiro a medida cautelar para, ad referendum do Plenário deste Supremo Tribunal Federal, suspender os efeitos de atos judiciais ou administrativos, emanado de autoridade pública que possibilite, determine ou promova o ingresso de agentes públicos em universidades públicas e privadas, o recolhimento de documentos, a interrupção de aulas, debates ou manifestações de docentes e discentes universitários, a atividade disciplinar docente e discente e a coleta irregular 7
  • 8. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS de depoimentos desses cidadãos pela prática de manifestação livre de ideias e divulgação do pensamento nos ambientes universitários ou em equipamentos sob a administração de universidades públicas e privadas e serventes a seus fins e desempenhos. (Doc. 10 – Anexo, fls. 14-15) Na semana seguinte, em 31 de outubro de 2018, o Plenário dessa Corte Suprema referendou a liminar, como se colhe do seguinte extrato: O Tribunal, por unanimidade, reconheceu adequada a utilização da arguição de descumprimento de preceito fundamental, seja porque respeitado, no caso, o princípio da subsidiariedade, seja, ainda, porque processualmente viável a impugnação, por seu intermédio, de decisões judiciais ou de interpretações judiciais de textos normativos. Em seguida, o Tribunal, também por votação unânime, referendou, integralmente, a decisão proferida pela Relatora, Ministra Cármen Lúcia, decisão essa que se reveste de efeito vinculante e de eficácia contra todos (suspendendo-se os efeitos de atos judiciais ou administrativos, emanados de autoridade pública que possibilitem, determinem ou promovam o ingresso de agentes públicos em universidades públicas e privadas, o recolhimento de documentos, a interrupção de aulas, debates ou manifestações de docentes e discentes universitários, a atividade disciplinar docente e discente e a coleta irregular de depoimentos desses cidadãos pela prática de manifestação livre de ideias e divulgação do pensamento nos ambientes universitários ou em equipamentos sob a administração de universidades públicas e privadas e serventes a seus fins e desempenhos). O Ministro Gilmar Mendes, que também referendou a decisão da Relatora, propôs, sem adesão dos demais Ministros, outras medidas indicadas no voto que proferiu. Falaram: pela requerente, a Dra. Raquel Elias Ferreira Dodge, Procuradora-Geral da República; pelo amicus curiae AMB - Associação dos Magistrados Brasileiros, o Dr. Alberto Pavie Ribeiro; pelo amicus curiae ANDES - Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior, a Dra. Monya Ribeiro Tavares; pelo amicus curiae FASUBRA-SINDICAL – Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico- Administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil, o Dr. Cláudio Santos; pelo amicus curiae CONTEE - Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino, a Dra. Sarah Campos; e, pelo amicus curiae ANDIFES – Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior, o Dr. Claudismar Zupiroli. Antecipou seu voto, acompanhando a Relatora, o Ministro Dias Toffoli, Presidente. Ausente, justificadamente, o Ministro Luiz Fux. Não votou o Ministro Marco Aurélio. Presidiu, este julgamento, o Ministro Celso de Mello. (Doc. 11 – Anexo) Feito esse breve relato, apontam-se as razões que, no entender deste Órgão, recomendam a cassação da decisão reclamada. 4.2 Não aplicação da ratio decidendi da ADPF n. 548/DF quanto aos arts. 206, II e III, da Constituição da República (arts. 988, III e § 4º, do CPC) Cumpre destacar que, dando concretude ao que o texto original da Constituição da República já estatuía por seu art. 102, I, “l”, o Código de Processo Civil, nos arts. 988, II, e § 4º, expressamente legitimou o uso da Reclamação como meio de garantir o respeito a decisões do Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado de constitucionalidade, em reforço à tutela objetiva da ordem constitucional. Por essa via, é de se enfatizar, torna-se possível o controle judicial, pelo guardião da Constituição, da aplicação indevida da tese jurídica e de sua não aplicação aos casos que a ela correspondam. Dito isso, observa-se que a decisão reclamada, ao deferir o efeito suspensivo pedido pela agora parlamentar, consignou que “não vejo, sob o ponto de vista jurídico, qualquer impedimento a que um particular – em especial uma 8
  • 9. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS Deputada, representante legítimo do Povo – venha desempenhar o papel responsável de intérprete de reclamos de violência, seja qual for a sua fonte, porquanto, encontrar-se-á exercendo a cidadania” (Doc. 7 – Anexo, fl. 4), que “não vislumbro nenhuma ilegalidade na iniciativa da agravante, Deputada estadual eleita, de colocar seu futuro gabinete como meio social condensador do direito que todo cidadão possui, estudantes inclusive, de peticionar a qualquer órgão público denunciando ato que entenda ilegal praticado por representante do Estado” (Doc. 7 – Anexo, fl. 4) e que “Não há direito que se sobreponha ao direito do ofendido, porquanto não há direito de ofender, de humilhar, de violentar crença ou consciência, muito menos em ambiente dedicado ao desenvolvimento da criança e do adolescente” (Doc. 7 – Anexo, fl. 5). Aduziu, ainda, em linhas gerais, que o comunicado da deputada visa, em verdade, defender as crianças e adolescentes, que já é hora de discutir o monitoramento de salas de aula, e que, embora existam projetos de lei a respeito de “escola livre” e “escola sem partido” em tramitação, a contenda não se relaciona primordialmente à discussão sobre a neutralidade ideológica nas escolas. Em primeiro lugar, há que se esclarecer que a decisão judicial de primeiro grau que determinou a remoção da mensagem postada nas redes sociais em momento algum dispôs sobre restrições ao direito de estudantes a noticiar ofensas, infrações ou atos incompatíveis com as funções de docentes. Isso porque o objeto da Ação Civil Pública em questão esteve desde o nascedouro bastante circunscrito, no que toca ao questionamento do conteúdo divulgado: não se trata de mensagem instrutiva sobre o direito de petição em geral, mas, como demonstra a própria postagem (Doc. 3 – Anexo), incitação direcionada a um típico específico de manifestação do pensamento, qual seja, a de “professores doutrinadores” que, por “queixas político-partidárias em virtude da vitória do Presidente Bolsonaro”, emitam “manifestações político-partidárias ou ideológicas”. Trocando em miúdos, o conteúdo veiculado não foi de índole geral, tampouco instrutiva, mas ao intento de estimular estudantes de todo o Estado de Santa Catarina a filmar ou gravar professores que emitissem opinião discordante daquelas defendidas pelo Presidente então eleito. Ademais, como consignou a própria decisão reclamada, em que pese se 9
  • 10. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS tratar de um particular, a demandada é “uma Deputada, representante legítimo do Povo” (Doc. 7 – Anexo, fl. 4) – condição que fez questão de enfatizar durante todo o processo e no próprio comunicado que instituiu o dito canal de denúncias. Ou seja, ainda que à época se tratasse de pessoa em vias de assumir mandato eletivo, trata-se de alguém que representa, de fato, o povo, mas também um dos poderes fundamentais da República – o Legislativo –, e nesse sentido suas ações e discursos igualmente carregam o sentido de autoridade: são ouvidos com ainda mais peso pelos destinatários. E é aí que o fundamento jurídico-constitucional lançado na respeitável decisão reclamada colide com a compreensão firmada na liminar da ADPF n. 548/DF acerca do art. 206, II e III, da Constituição da República, e da garantia da pluralidade de ideias e da liberdade de ensino e aprendizado no sistema de educação, uma vez que a postagem sob questionamento, por si e por seus efeitos, incita e estimula o constrangimento e a censura a professores e alunos cujas visões de mundo ou de governo não convirjam com as do atual Presidente da República. Veja-se o que constou da liminar deferida na multimencionada ADPF: Dispõem os incs. II e III do art. 206 e o art. 207 da Constituição do Brasil: “Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: ... II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;” … Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão...”. As normas constitucionais acima transcritas harmonizam-se, como de outra forma não seria, com os direitos às liberdades de expressão do pensamento, de informar-se, de informar e de ser informado, constitucionalmente assegurados, para o que o ensino e a aprendizagem conjugam-se assegurando espaços de libertação da pessoa, a partir de ideias e compreensões do mundo convindas ou desavindas e que se expõem para convencer ou simplesmente como exposição do entendimento de cada qual. A autonomia é o espaço de discricionariedade deixado constitucionalmente à atuação normativa infralegal de cada universidade para o excelente desempenho de suas funções constitucionais. Reitere-se: universidades são espaços de liberdade e de libertação pessoal e política. Seu título indica a pluralidade e o respeito às diferenças, às divergências para se formarem consensos, legítimos apenas quando decorrentes de manifestações livres. Discordâncias são próprias das liberdades individuais. As pessoas divergem, não se tornam por isso inimigas. As pessoas criticam. 10
  • 11. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS Não se tornam por isso não gratas. Democracia não é unanimidade. Consenso não é imposição. Daí ali ser expressamente assegurado pela Constituição da República a liberdade de aprender e de ensinar e de divulgar livremente o pensamento, porque sem a manifestação garantida o pensamento é ideia engaiolada. (Doc. 10 – Anexo, fls. 13-14) Se é certo que a decisão tinha por referente concreto a situação das Universidades, não menos o é que, por sua própria topografia constitucional, o art. 206 dispõe sobre princípios do ensino em geral, não se restringindo, nesse sentido, ao ensino superior e abarcando, portanto, a liberdade e o pluralismo que devem orientar os processos pedagógicos e os ambientes de estudo em todos os níveis. Destarte, a ratio decidendi presente na liminar – referendada por todos os Ministros presentes à sessão plenária que a analisou – não comporta limitação à questão universitária, de sorte que o “canal de denúncias” instituído pela deputada, da mesma forma que os atos impugnados na ADPF n. 548/DF, pode implicar, qual apurado naquela Ação Constitucional, “a interrupção de aulas, debates ou manifestações de docentes e discentes universitários, a atividade disciplinar docente e discente e a coleta irregular de depoimentos desses cidadãos pela prática de manifestação livre de ideias e divulgação do pensamento”. Em sendo autorizada a manutenção de tal “canal de denúncias” e a propagação do teor do comunicado em litígio, somar-se-ão às preocupações cotidianas dos docentes – que já não são poucas – o risco de se verem expostos por figura pública em canais de ampla repercussão, ao alvedrio do conhecido “tribunal das redes sociais”, sempre que alguma lição ministrada ou opinião manifestada seja entendida como avessa às ideias, às declarações ou políticas instituídas pelo Presidente da República ou por membros de sua agremiação partidária. Frise-se, ainda, que a garantia da liberdade de expressão – essencial a todas as democracias – não vem a socorrer a hipótese vertente em relação ao comunicado divulgado, dado que a mensagem não constitui mera expressão de pensamento ou ideia, mas convocação a atos concretos de denúncia. E, sabe-se, quando manifestações verbais ou discursos potencialmente se transubstanciam na prática de atos colidentes com a ordem constitucional, a liberdade de expressão não é salvaguarda, como ilustram os crimes de incitação ao 11
  • 12. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS crime (art. 286) e instigação a suicídio (art. 122, CP). O mesmo vale para o sistema de responsabilidade civil individual ou coletiva em casos de ofensa à honra, cabendo ainda mencionar os parâmetros dados à liberdade de expressão pelo STF por ocasião do julgamento, ainda, o precedente do caso Ellwanger4 . É exatamente o caso: professores e estudantes, num contexto em que tal tipo de incitação seja difundia, ingressarão diariamente nos estabelecimentos de ensino sob o signo da autocensura, ante a perspectiva de que qualquer manifestação destoante da linha ideológica da deputada seja gravada ou filmada e a ela remetida a título de denúncia (!). Gize-se, também, que a questão dos limites constitucionais ao exercício da docência e da exigência de neutralidade no ensino não é secundária ao deslinde do feito, como quer a decisão reclamada. Com efeito, a análise do chamado veiculado pela deputada é indissociável de tal debate como premissa do raciocínio jurídico que subjaz à Ação Civil Pública – inclusive pelo fato de que a própria parlamentar insere no rodapé do texto a expressão “por uma escola sem partido” (Doc. 3 – Anexo). A demandada, portanto, apresenta-se e vincula seu chamado à matriz ideológica do assim chamado Projeto Escola Sem Partido, que tem o objetivo anunciado de garantir a neutralidade política e ideológica no ensino – e cuja discussão ainda há de se travar de modo legítimo nos espaços públicos e foros parlamentares próprios. Contudo, não se pode deixar de registrar, pela aderência ao presente caso, que o Ministro Luis Roberto Barroso, ao deferir medida liminar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5.537/AL, entendeu pela plausibilidade da alegação de ofensa à Constituição por projetos de lei que, ao intento de evitar práticas de doutrinação, acabam por restringir a pluralidade de ideias e a liberdade de ensino e aprendizado nas escolas. Vejamos: II. Inconstitucionalidades materiais da Lei 7.800/2016 do Estado de Alagoas: 4 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 82.424/RS, Rel. Min. Moreira Alves, Rel. p/ acórdão Min. Maurício Corrêa, Tribunal Pleno, j. 17/9/2003, DJ p. em 19/3/2004. 12
  • 13. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS 5. Violação do direito à educação com o alcance pleno e emancipatório que lhe confere a Constituição. Supressão de domínios inteiros do saber do universo escolar. Incompatibilidade entre o suposto dever de neutralidade, previsto na lei, e os princípios constitucionais da liberdade de ensinar, de aprender e do pluralismo de ideias (CF/1988, arts. 205, 206 e 214). 6. Vedações genéricas de conduta que, a pretexto de evitarem a doutrinação de alunos, podem gerar a perseguição de professores que não compartilhem das visões dominantes. Risco de aplicação seletiva da lei, para fins persecutórios. Violação ao princípio da proporcionalidade (CF/1988, art. 5º, LIV, c/c art. 1º). 7. Plausibilidade do direito e perigo na demora reconhecidos. Deferimento da cautelar.5 Na decisão acima, que inclusive e paradoxalmente integra a fundamentação do comando judicial reclamado, consignou o relator que “o pluralismo ideológico e a promoção dos valores da liberdade são assegurados na Constituição e em todas as normas internacionais antes mencionadas, sem que haja menção, em qualquer uma delas, à neutralidade como princípio diretivo”.6 Perde-se, portanto, com a orientação policialesca do chamado difundido pela demandada nas redes sociais, a própria riqueza do convívio humano que permite que alunos, famílias, professores e coordenadores pedagógicos discutam livremente sobre seu processo de ensino e aprendizagem, eis que toda matéria que envolva tema político passa a correr o risco de cair na vala comum da “denúncia”. Em conclusão, portanto, a mensagem veiculada amplamente por redes sociais, além de instigar denúncias em relação a fatos que nem sequer constituem infrações, tumultua o sistema de ensino, fomenta a criação de ambientes inquisitoriais em salas de aula e constrange o exercício legítimo e autônomo da pluralidade de ideias e da liberdade de ensino, em afronta ao art. 206, II e III, da Constituição da República, na extensão hermenêutica que embasa a decisão prolatada na ADPF n. 548/DF. Considerando, então, que a quem se asseguram os fins devem ser garantidos os meios, a presente Reclamação é, neste momento, o único meio capaz de efetivar as normas do art. 206, II e III, da Constituição da República, no sistema educacional catarinense. 4.3 Inobservância à liminar referendada pelo Plenário do STF nos autos da ADPF n. 548/DF (art. 988, II, do CPC) 5 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI n. 5.537/AL, Rel. Min. Luis Roberto Barroso, Decisão Monocrática, DJ6 n. 56, divulgado em 22/3/2017, pp. 2-3. 6 Idem, p. 21. 13
  • 14. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS Importa mencionar, ainda, que além da hipótese tratada no item anterior, o pedido de cassação da decisão reclamada encontra respaldo, também, na previsão do art. 988, II, do CPC, na medida em que fica caracterizada a inobservância ao que se dispôs na liminar deferida na ADPF n. 548/DF. Como já se afirmou, é fato que a liminar abarcou ordens mandamentais voltadas à garantia da liberdade de ensino e da pluralidade de ideias nos ambientes universitários. É de se registrar, entretanto, que os debates havidos quando do referendo da decisão pelo Plenário do STF não excluíram a priori a possibilidade de extensão de seus efeitos às escolas – o que só deixou de ocorrer porque os fatos arrolados na peça vestibular pela PGR limitavam-se aos eventos ocorridos em estabelecimentos de ensino superior. Durante a sessão plenária, contudo, houve expressa menção à questão das escolas, e, mais, foi abordado o específico episódio da veiculação da mensagem pela parlamentar demandada, e que agora dá azo ao ajuizamento da presente Reclamação. Essa circunstância foi amplamente difundida pelos veículos de imprensa que acompanham a atuação do STF, cuja página oficial relatou: O ministro Gilmar Mendes também votou pela confirmação da liminar, mas em maior extensão, propondo outras medidas para proteger a liberdade de cátedra e as liberdades acadêmicas inclusive no âmbito das relações privadas, individuais ou institucionais. O ministro registrou o caso de incitação à violação à liberdade de cátedra pela deputada estadual eleita Ane Caroline Campagnolo (PSL/SC), que abriu um canal para que alunos denunciem professores que supostamente estejam fazendo manifestações político-partidárias em sala de aula. “Mostra-se inadmissível que, justamente no ambiente que deveria imperar o livre debate de ideias, se proponha um policiamento político-ideológico da rotina acadêmica”, destacou Mendes. “A política encontra na universidade uma atmosfera favorável que deve ser preservada. Eventuais distorções na atuação política realizada no âmbito das universidades mereceriam ser corrigidas não pela censura, mas pela ampliação da abertura democrática”, enfatizou.7 (sem grifo no original) Na coluna do jornalista Fausto Macedo, d’O Estado de São Paulo, os jornalistas Moraes Moura e Teo Cury publicaram o seguinte: Canal. Para o ministro Gilmar Mendes, é “inadmissível que justamente num ambiente em que deveria imperar o livre debate de ideias se proponha um policiamento político ideológico da rotina acadêmica”. Em seu voto, Gilmar criticou a postura da deputada estadual eleita em Santa Catarina, Ana Caroline Campagnolo (PSL), que abriu um canal informal de denúncias na internet para fiscalizar 7 http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=394447. Acessado em 31.1.19. 14
  • 15. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS professores em sala de aula a partir desta segunda-feira, 29. Campagnolo pede que vídeos e informações sejam repassados para o seu número de celular com o nome do docente, da escola e da cidade. “Devemos dar resposta, não só em relação a eventuais atos estatais, como vimos, mas também atos decorrentes de eventuais iniciativas privadas, hoje perpetradas no âmbito da internet, e que causam pânico, terror, causam medo às pessoas”, comentou Gilmar, ao comentar o caso de Santa Catarina.8 O mesmo foi noticiado pelo portal da Revista Veja, em matéria de Leonardo Lellis: Para o ministro Gilmar Mendes, é “inadmissível que justamente num ambiente em que deveria imperar o livre debate de ideias se proponha um policiamento político ideológico da rotina acadêmica”. Ele ainda criticou a iniciativa da deputada estadual eleita em Santa Catarina, Ana Caroline Campagnolo (PSL), que estimulou denúncias anônimas contra professores através de seu número de celular. O Ministério Público de Santa Catarina quer que ela seja condenada a pagar cerca de R$ 70 mil de indenização por danos morais coletivos. “Devemos dar resposta, não só em relação a eventuais atos estatais, como vimos, mas também atos decorrentes de eventuais iniciativas privadas, hoje perpetradas no âmbito da internet, e que causam pânico, terror, causam medo às pessoas”, comentou Gilmar Mendes, ao comentar o caso de Santa Catarina.9 Ainda conforme relatos da imprensa, a sugestão de estender os efeitos da decisão ao caso em comento apenas não foi acatada por uma questão formal de ordem processual, uma vez que faltavam elementos trazidos pela parte autora para apontar concretamente a situação semelhante. Desse modo, considerando o espaço que agora se abre para que tais informações oficialmente integrem os autos, torna-se viável caracterizar o ato judicial impugnado como forma indireta de descumprimento do comando liminar emanado na ADPF n. 548/DF. E, em reforço à possibilidade de compreensão mais extensa dos efeitos da decisão paradigmática, anote-se que a admissão da CONTEE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino)10 na condição de amicus curiae na ADPF n. 548/DF (Doc. 11 – Anexo) sinaliza para o fato de que a compreensão sobre o art. 206 da Constituição da República lá expendida transcende os estabelecimentos de ensino superior e resguarda a liberdade e o pluralismo de ideias em todos os níveis de ensino. 8https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/stf-derruba-acoes-de-policiais-nas-universidades-e-reafirma-liberdade- academica-nas-instituicoes/ Acessado em 31.1.19 9 https://veja.abril.com.br/politica/stf-proibe-atuacao-contra-liberdade-de-expressao-em-universidades/ Acessado em 31.1.19 10 “A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino – CONTEE é uma entidade sindical de terceiro grau que congrega 88 sindicatos e 10 federações de professores(as) e técnicos(as) e administrativos(as) do setor privado de ensino, da educação infantil à superior – representando atualmente cerca de 1 milhão de trabalhadores(as) brasileiros(as).” Fonte: http://contee.org.br/apresentacao/ Acessado em 31.1.19. 15
  • 16. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS Ante o exposto, considerando-se que houve indireto descumprimento da decisão liminar referendada pelo Plenário do STF na Ação Constitucional citada, reitera-se o pedido de cassação da decisão reclamada, agora pela via autorizada no art. 988, II, do CPC. 5 PEDIDO DE LIMINAR Além do que foi até aqui sustentado, entende-se que a hipótese vertente, como meio de assegurar a tutela jurisdicional efetiva, comporta o deferimento de medida liminar, nos lindes do art. 989, II, do CPC, inclusive inaudita altera parte, vez que a evidência das razões de direito neste recurso expostas e a iminência de danos irreparáveis se faz presente. Vejamos. 5.1 Fumus boni iuris O fumus boni iuris a autorizar a tutela de urgência reside, na linha do que se demonstrou nos itens 4.2 e 4.3, na congruência entre o contexto, os dispositivos constitucionais e os fundamentos (ratio decidendi) que indicam que a decisão reclamada exorbitou da compreensão assentada no STF, sobre a matéria, especialmente na medida liminar deferida na ADPF n. 548/DF e, em reforço, na decisão proferida na ADI 5.537/AL. Cuida-se, em ambos os casos, de iniciativas que constrangem o exercício da liberdade de aprender e ensinar, limitam indevidamente o pluralismo de ideias e impõem mecanismos expressos ou velados de censura que obstaculizam as finalidades constitucionais sumariadas no Capítulo III, Seção I, de nossa Lei Maior. 5.2 Periculum in mora Caracterizado o fumus boni iuris, cumpre agora expor os elementos que consubstanciam a urgência deste pleito e impõem a concessão da liminar aqui requerida, ante o risco de danos irreparáveis ou de difícil reparação. A uma, tem-se que o Estado de Santa Catarina se encontra às vésperas do início do ano letivo, estando o retorno às aulas na rede estadual aprazado para a 16
  • 17. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS data de 11 de fevereiro de 2019 (Doc. 2 – anexo). Desse modo, há inegável e iminente risco de que o ano escolar principie sob o signo do constrangimento às atividades docente e discente, acentuado pelo fato de que a beneficiária da decisão reclamada, agora no exercício de mandato eletivo, estará autorizada – como todos os seus pares – a seguir instigando “denúncias” e expondo o ambiente das salas de aula à mesma tensão polarizada que caracterizou o último pleito. A duas, considerando que a publicação da decisão reclamada é bastante recente, a possibilidade de reversão, no próprio Tribunal de origem, do pronunciamento impugnado, revela-se delongada, dada a necessidade de cumprir todo o plexo de comunicações processuais de rigor e tendo em vista a incerteza do momento em que eventual insurgência será pautada pelos órgãos julgadores na Corte Catarinense. A três, há que se considerar a repercussão nacional do fato, que desde sua ocorrência vem sendo replicado por particulares em outros Estados da federação, a exemplo de publicações versadas em Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais, na Comarca de Juiz de Fora (doc. 12 – anexo). A decisão ora reclamada encoraja e estimula diversos segmentos da sociedade a adotarem mecanismos semelhantes, guiados pela imposição de suas preferências ideológicas, em especial no Estado de Santa Catarina. Por fim, nenhum prejuízo haverá à parlamentar ou à sociedade na suspensão da veiculação das mensagens, uma vez que seguem resguardados os meios convencionais de que as escolas e secretarias de educação – além do próprio Poder Judiciário – já dispõem para avaliar possíveis atos de discriminação, ofensas ou quaisquer outras infrações civis, penais e/ou administrativas eventualmente praticadas nos estabelecimentos de ensino. Assim, a fim de evitar que o ano de 2019 seja inaugurado, nas escolas catarinenses, sob ameaças à pluralidade de ideias e à liberdade de ensino e aprendizagem, é que se clama pelo deferimento da liminar nestes autos, para sustar a eficácia da decisão reclamada. 6 PEDIDOS 17
  • 18. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS Pelo exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA requer: a) a suspensão liminar da decisão reclamada na forma do art. 989, II, do CPC, ante a relevância da fundamentação do recurso e a necessidade de evitar dano grave ou de difícil reparação decorrente da veiculação massiva do conteúdo em litígio às vésperas do início do ano letivo, de molde a revogar o efeito suspensivo concedido pelo pronunciamento aqui impugnado; b) sejam requisitadas informações à autoridade julgadora na origem, a serem prestadas no prazo de 10 (dez) dias (art. 989, I, do CPC); c) a citação da beneficiária da decisão, ANA CAROLINE CAMPAGNOLO11 , para apresentar contestação à presente Reclamação no prazo de 15 (quinze) dias (art. 989, II, do CPC); d) abra-se vista dos autos à Procuradoria-Geral da República; e) seja julgada procedente a presente Reclamação, para cassar a decisão exorbitante, na forma do art. 992 do CPC, estabelecendo-se como medida adequada à solução da controvérsia a vedação da prática de qualquer ato administrativo ou jurisdicional que implique autorização à veiculação da mensagem em litígio ou de qualquer outro conteúdo que instigue a “gravação” ou “filmagem” de opiniões de docentes e seu envio por “canal de denúncias”. Florianópolis, 4 de fevereiro de 2019. Rogê Macedo Neves Procurador de Justiça Coordenador de Recursos Cíveis ROL DE DOCUMENTOS DO ANEXO 1 – Íntegra dos autos do Agravo de Instrumento n. 4032450-55.2018.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina; 11 Já qualificada na nora de rodapé n. 1. 18
  • 19. MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA COORDENADORIA DE RECURSOS CÍVEIS 2 – Calendário Escolar da rede pública do Estado de Santa Catarina; 3 – Imagem publicada por Ana Caroline Campagnolo em sua rede social Facebook, com o conteúdo do chamado ao canal de denúncias; 4 – Inicial da Ação Civil Pública proposta pela 25ª Promotoria de Justiça da Comarca da Capital/SC 5 – Decisão interlocutória prolatada pelo Juiz de Direito da Vara da Infância e Juventude da Comarca da Capital/SC; 6 – Agravo de Instrumento interposto por Ana Caroline Campagnolo; 7 – Decisão monocrática proferida pela Desembargadora Maria do Rocio Luz Santa Ritta (decisão reclamada); 8 – Movimentação atual do Agravo de Instrumento n. 4032450- 55.2018.8.24.0000 no TJSC; 9 – Inicial da ADPF proposta pela Procuradoria-Geral da República; 10 – Decisão liminar proferida pela Ministra Cármen Lúcia na ADPF n. 548/DF; 11 – Admissão de amici curiae na ADPF n. 548/DF. 12 – Inicial de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais. 19