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A ILHA DO TESOURO
Robert Louis Stevenson




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A ILHA DO TESOURO
Robert Louis Stevenson




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A ILHA DO TESOURO
       Robert Louis Stevenson




 
EM certo dia do ano de mil setecentos e tantos, um velho
marinheiro moreno, com uma cicatriz no rosto, bateu com
o seu bordão ferrado à porta da estalagem “Almirante
Benbow”.

Disse rudemente ao estalajadeiro, meu pai, que lhe trou-
xesse um copo de rum, pediu notícias da freguesia, man-
dou em seguida o empregado levar-lhe a bagagem e atirou
sobre a mesa três ou quatro moedas de ouro.

Durante os dias seguintes, o Capitão - assim queria o es-
tranho hóspede que lhe chamassem - outra coisa não fez
senão vagar ao longo do baía e sobre os rochedos, munido
de um óculo. Ríspido, zangado, esbravejando ,o dia todo,
não respondia ao que lhe perguntavam; mas, após algum
tempo, me chamou à parte poro dizer-me que observasse
todos os fregueses e o avisasse da chegada de um mari-
nheiro perneta.


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Nos tardes chuvosas, segurando uma grande garrafa de
rum, contava horríveis histórias de naufrágios, enforcamen-
tos e torturas. Eu, minha mãe, meu pai e uns poucos fre-
gueses o escutávamos apavorados.

Não tardou a tornar-se insuportável. Bebia, embriagava-se
e obrigava-nos a escutá-lo e aplaudi-lo. Só urna vez teve
de calar-se, diante do atitude do Dr. Livesey, nosso amigo,
que resistiu impassível a uma ameaço de agressão por parte
do terrível Capitão.

Pouco tempo depois desta cena com, o médico, aconte-
ceu-me outra coisa estranha. Em certa manhã de janeiro
me vi diante de um homem sem dois dedos da mão es-
querda e com um facão no cinto, que me mandou trazer-
lhe. rum e começou a fazer-me perguntas a respeito de
certo Bill, um marinheiro seu amigo.

As minhas respostas vagos, todas monossilábicas, retru-
cou que seu amigo Bill devia ser o próprio Capitão e, pe-
gando-me de repente por um braço, perguntou-me onde
estava ele nesse momento e a que hora voltaria.

Ficamos a esperá-lo, ele e eu, na sala do estalagem duran-
te cerca de meia hora.

Afinal o Capitão regressou e, quando ouviu aquela estranha
personagem chamá-lo pelo nome, exclamou furiosamen-
te: “Cão Negro!” Os dois homens trocaram algumas pala-
vras em voz alta e mandaram-me embora.

Deixei-os sós, mas pouco depois ouvi um barulho de mó-
veis caindo, um tinir de lâminas metálicas, um grito de dor,
e vi o “0 Negro” fugindo corno um doido, seguido do Capi-
tão. Junto da porta, este desferiu um terrível golpe de fa-



                                                          5
cão, que não alcançou o alvo, e o “Cão Negro” embora
ferido no ombro, ainda teve tempo de escapar.

Terminado o combate, o Capitão mandou-me trazer-lhe
rum, mas não pôde bebê-lo, porque, sem forças, caiu por
terra.

0 Dr. Livesey, chamado incontinenti, examinou
demoradamente o enfermo e, antes de o deixar, recomen-
dou-lhe com grande encarecimento que não tomasse be-
bidas alcoólicas.

As suas ordens não foram cumpridas. 0 Capitão tanto me
suplicou que, compadecido, resolvi levar-lhe uma garrafa
de rum. Esvaziou-a em dois tempos e, em vez de agrade-
cer-me, perguntou-me se tornara a ver o “Cão Negro” e
pediu-me que levasse pessoalmente ao Dr. Livesey o baú
que estava no seu quarto, para que a “mancha negra” não
pudesse reavê-lo.

A minha pergunto sobre o que significava “mancha negra”,
o Capitão respondeu evasivamente e eu fiquei meio confu-
so.

Nos dias que se sucederam, o Capitão andou pela estala-
gem, atemorizado e cambaleante de fraqueza, como uma
cima penada. Não respondia às perguntas que lhe faziam e
de vez em quando olhava em volta, desconfiado.

Assim se passou uma semana. Por volta das três horas de
uma tarde fria e nevoenta, um mendigo, cego, curvado
pelos anos e coberto por um enorme capote, parou diante
da tabuleta da hospedaria. Pediu em voz alta que lhe ser-
vissem de guia.

Ofereci-lhe a mão: o misterioso velho apertou-a com for-



                                                       6
ça e, em voz terrível, ordenou-me que o levasse imediata-
mente à presença do Capitão.

Acompanhei-o. Vendo o cego, o Capitão ficou assombrado
e procurou fugir; mas o mendigo ordenou-lhe que ficasse
quieto; pôs-lhe então na palma do mão qualquer coisa que
não consegui ver o que era e saiu da sola com incrível
agilidade.

Refeito da surpresa, o Capitão me disse que ainda lhe res-
tavam seis horas e meia para conseguir o que queria e
encaminhou-se para a porta. Não, chegou a alcançá-la.
Levando uma dos mãos à garganta, cambaleou e, com um
estertor abafado, caiu ao chão.

0 Capitão morrera de um derrame cerebral.

Logo após a sua morte, contei a minha mãe tudo quanto
sabia. Resolvemos então, de comum acordo, apanhar o
célebre baú e levá-lo sem demora à casa do Dr. Livesey.

Mas, antes disso, passamos pela cosa de uns amigos nos-
sos e muni-me de uma pistola. Voltamos à nossa estala-
gem, onde encontramos o cadáver do pobre Capitão tal
como o deixáramos. Ajoelhei-me junto do morto e, ven-
cendo a minha repugnância, tirei-lhe do pescoço uma pe-
queno e fina chave. Saímos então do quarto e minha mãe
pôde facilmente abrir o baú.

Levantada a tampo, vimos duas bonitos pistolas, tabaco,
uma borra de prata, diversos objetos e, num envoltório,
embranquecido pela água do mar, um embrulhinho enrola-
do em tecido impermeável, que continha documentos, e
um saquinho cheios de moedas.

Abrimos o pacote e pusemo-nos a contar o dinheiro. Mas



                                                        7
daí a pouco tivemos de fugir a toda a pressa, porque ouvi-
mos uma batida no porto e logo depois um assobio; isso
nos fez compreender que os inimigos do pobre Capitão
estavam por ali.

Deixando precipitadamente a estalagem, com o saquinho
de moedas e os documentos, paramos ofegantes nas vizi-
nhanças e, escondidos numas .grandes moitas, preparamo-
nos para ver o que aconteceria.

Os nossos inimigos, em número de sete ou oito, chegaram
logo depois. Entraram no estalagem, avistaram o cadáver
do pobre Capitão e revistaram-no minuciosamente.

Não encontrando a chave nem os documentos que eu trou-
xera comigo, ficaram furiosos e depredaram todo o esta-
belecimento. Quando, no auge da exasperação, se prepa-
ravam para atear-lhe fogo, um assobio cortou os ares.
Ouvindo-o, os bandidos olharam em volta amedrontados,
gritaram que o seu terrível inimigo se aproximava e puse-
ram-se em. fuga um após outro.

Em vão o cego, que os chefiava, procurou detê-los com
ameaças e insultos, aconselhando-lhes calma e coragem.
Em poucos instantes se viu só. Tentou retroceder, mas uma
companhia de guardas aduaneiros, que chegava a galope,
lhe embargou os passos. Saí então do meu esconderijo e
voltei à hospedaria. Encontrei à entrado o inspetor Dance,
que me pediu para contar-lhe tudo quanto vira e, após o
interrogatório, ordenou-me que o levasse ao Dr. Livesey.

Este não se achava em casa. Tornamos montar a cavalo e
em pouco tempo chegamos ao castelo do Sr. Trelowney.
Ali, diante do médico e do cavaleiro - assim queria o Sr.
Trelawney que lhe chamassem - o inspetor Dance contou-
nos a sua história.



                                                        8
Quando terminou, o doutor me perguntou se ainda tinha
em meu poder o embrulho que os bandidos haviam debal-
de procurado, e eu, como resposta, entreguei-lho.

Antes de examiná-lo, porém, o Dr. Livesey quis despedir-se
do bravo inspetor e, com permissão do cavaleiro, mandou
trazer um apetitoso recheado de pombo.

Acabada a refeição, o cavaleiro e o médico puseram-se a
conversar sobre o Capitão, sobre o pirata Flint, velho ami-
go do Capitão, e ainda sobre as maravilhosas façanhas
desse Flint. Em seguido, Pediram-me que lhes permitisse
abrir o embrulho.

0 embrulho estava cosido e o médico teve de cortar-lhe os
fios com a tesoura de cirurgia. Continha um caderno e um
maço de papéis lacrado. 0 caderno estava escrito com le-
tra incerta e irregular e com algumas frases quase incom-
preensíveis.

0 maço estava lacrado em diversos lugares e o seu sinete
fora feito com um dedal. 0 médico quebrou os sinetes com
grande cuidado e descobriu d corta geográfica de uma ilha,
com latitude e longitude e todas as indicações necessárias
para levar um navio até às suas proximidades.

Tinha, essa ilha, cerca de nove milhos de extensão e mais
ou menos a forma de um dragão em pé, dois portos e, na
parte central, uma colina identificada pelo nome de “Longa
Vista”.

Viam-se no carta algumas outras anotações e particular-
mente três cruzes vermelhas, duas na porte norte da ilha,
uma a sudoeste e, junto desta, os dizeres: “Aqui, a maior
porte do tesouro”. No verso, com tinta vermelha, estavam



                                                         9
escritos as seguinte informações suplementares:

Árvore grande, contraforte de “Longa Vista” direção
N-N-E.
Ilha do esqueleto, E-S-E.
Três metros.

A borra de preto está no esconderijo Norte, que se acha no
direção do morro Leste, dez braços ao sul do espigão ne-
gro. As armas encontram-se no duna de areia, na extremi-
dade norte do cabo do baía setentrional, direção leste, quarto
norte.

J. F.

Esse documento, lacônico e para mim incompreensível,
encheu do entusiasmo Os meus dois amigos. 0 cavaleiro
disse ao Dr. Livesey que, em menos de duas semanas,
teria à sua disposição um navio com a respectiva equipagem
e que o médica e eu iríamos com ele .

0 médico aceitou a proposta e eu também.

Muito tempo se passou antes que tudo ficasse pronto para
a viagem. 0 Dr. Livesey foi a Londres para arranjar um
substituto que atendesse à sua clientela, e o cavaleiro ficou
só no castelo.

Algumas semanas depois, escreveu uma corto ao médico
e a mim, Jim Hawkins, chamando-nos com urgência a Bristol
para partirmos. Informava-nos; que já comprara uma
goleta, dando-lhe o nome de “Espanhola”, e que contratara
uma tripulação escolhida, inclusive um cozinheiro-mor cha-
mado Long John Sílver, velho marinheiro, que não tinha
uma dos pernas.




                                                           10
Lida a corta, fui ter imediatamente com minha mãe, despe-
di-me dela comovido e, no dia seguinte de tarde, tomei a
diligência para Bristol. 0 cavaleiro me esperava num hotel
próximo do porto. E no mesmo noite do minha chegado
mandou-me levar um bilhete a John Silver, no taberna do
“óculo”. 0 nosso cozinheiro-mor me recebeu cordialmente
no estabelecimento de sua propriedade. Era alto, forte, sor-
ridente e tinha um rosto feio e sem barba, porém inteligen-
te, tal como o descrevera o cavaleiro. Pouco após a minha
chegado, um dos fregueses no outro lado do saia levan-
tou-se de repente, correu à porto e saiu. Logo reconheci
nele o “Cão Negro” e gritei que o detivessem. ‘ Ouvindo o
meu grito, John Silver veio até junto de mim; contei-lhe a
história do “Cão Negro”, do cego, do pobre Capitão, e ele ,
sem demora, mandou dois homens atrás do fugitivo.

Fiquei no taberna a conversar com os marinheiros até noi-
te avançado. Depois, John Silver acompanhou-me ao hotel
onde o cavaleiro e o Dr. Livesey, que regressara de Lon-
dres, me esperavam. 0 cavaleiro comunicou então aos pre-
sentes que, às quatro horas da manhã do dia seguinte, a
“Espanhola” levantaria âncora em direção à Ilha do Tesou-
ro e que ele mesmo comandaria a expedição.

Fomos todos para bordo cedinho.

Pouco antes de partir, o capitão Smollett, comandante do,
“Espanhola”, conversou longo e animadamente com cava-
leiro. Os dois homens falaram sobre o navio, a equipagem
e a expedição, manifestando opiniões no maioria divergen-
tes. Por fim, o capitão ordenou que levassem as armas e
munições de bordo para a popa, próximo do u camarote.
Os homens do equipagem obedeceram sem discutir. En-
tão, a “Espanhola” fez-se ao largo.

A expedição parecia ter nascido sob boa estrela. 0 avio era



                                                         11
bom, a tripulação e o comandante eram verdadeiros ho-
mens do mar, e o cavaleiro e o médico, sobretudo este
último, se mostravam sempre cordialíssimos amigo.

Os primeiros dias passaram depressa e, excetuando queda
no mar do nosso imediato, um homem sempre embriaga-
do e cambaleante, nada perturbou a viagem. Ao por do
sol, após o meu turno de guarda, ia freqüentemente à co-
zinha ter com ‘o velho John, que falava das venturas do
capitão Flint e me mostrava, encantado, as proezas do
seu papagaio, animal - dizia ele - com cerca de duzentos
anos de idade.

No último dia de viagem, após terminar o meu serviço,
resolvi ir tomar mel no porão. Enfiei-me no barrica que o
continha e encontrei-a quase vazia; cansado, acomodei-
me no fundo e estava para adormecer, quando um homem
se sentou pesadamente em cima dela. Já me dispunha a
sair da barrica, quando ele começou a falar. Era a voz de
Silver.

Falou demoradamente. Contou, pela centésima vez, as
aventuras do terrível capitão Flint, seu antigo comandante,
comunicou aos marinheiros que eles em breve seriam bem
recompensados, lamentou-se de haver dissipado em pou-
co tempo um grande patrimônio e continuou seu tenebro-
so discurso com palavras de lisonja a todos os marinheiros
da “Espanhola”. Depois, em voz baixa, expôs o seu plano.
Ele, John Silver, deixaria o cavaleiro e o capitão atingirem a
ilha e descobrirem o tesouro, e os ajudaria a embarcá-lo.
Mas, na viagem de regresso, o navio e o tesouro passari-
am, pela força, às suas meios e às dos marinheiros seus
amigos. E o capitão e o cavaleiro nunca mais reveriam
Bristol.

Os marinheiros que o rodeavam, e que eu não podia ver,



                                                           12
fizeram-lhe ainda algumas perguntas, depois do que,
exultantes, concordaram com a sinistra proposta. Por fim,
apanharam algumas garrafas de uísque numa barrico e brin-
daram à boa sorte do empreendimento. Nesse momento,
o gajeiro gritou: “Terra à vista!”

Num instante, todos os homens subiram à coberta. 0 capi-
tão perguntou a Silver, que já estivera na ilha noutro navio,
qual era o lugar mais apropriado para deitar âncora, e o
velho John indicou-lhe a parte sul, no lado posterior da ilhota.

Terminada a manobra de ancoragem, o capitão reuniu os
seus homens no tombadilho e dirigiu-Ihes algumas pala-
vras, convidando-os por fim a beberem à saúde do cava-
leiro e à boa sorte da empresa. Logo depois, o Dr. Livesey,
atendendo a um aviso meu, mandou. chamar-me ao ca-
marote do capitão. Contei-lhe minuciosa e rapidamente a
conversação de Silver com os marinheiros.

Diante disso, o capitão começou preparar, de acordo com
o cavaleiro e o médico, um plano de ação. Assim ficou
estabelecido que todos fingiriam ignorar a trama urdida por
John Silver e iniciariam a busca do tesouro conforme esta-
va combinado. Fez-se conta dos marinheiros em que se
podia confiar: eram sete, e entre ele s eu, contra dezenove
robustos homens’ do mar.

Na manhã seguinte, os marinheiro desceram ao mar com
os escaleres para rebocar o navio, enquanto Long John
empunhava a barra do leme. Ancoramos num fundo de
areia fina.. A queda do âncora no mar fez com que bandos
de pássaros levantassem vôo e, piando, partissem em
direção às matas. Logo em seguida, tudo voltou ao silên-
cio.

Deixando os escaleres no mar e voltando arquejantes e



                                                             13
suados para bordo, os marinheiros começaram logo a querer
amotinar-se. Permaneciam no coberto a confabular entre
si, e a menor ordem era mal acolhida e mal executada.

Preocupado com esta situação ameaçadora, o capitão diri-
giu-se ao camarote do cavaleiro e convenceu-o de que o
melhor era deixar os marinheiros darem um passeio em
terra: se todos ele s se achassem no ilha, - concluiu - a
corveta ficaria em nosso poder e tudo terminaria bem.

Assentado isso, o capitão deu logo ordens naquele sentido
e todos os marinheiros, ao ouvi-lo, soltaram vários vivas
que ecoaram longe.

Num instante a expedição. ficou pronta: seis homens per-
maneceram a bordo e os outros treze, incluído Silver, em-
barcaram nos escaleres. Entrementes, Hunter, Joyce e
Redruth, os únicos marinheiros que tinham permanecido
fiéis ao cavaleiro, foram inteirados dos planos combinados
entre nós.

Quando a expedição de Silver estava para deixar o navio,
resolvi apanhá-la: rapidamente saltei num bote, agachei-
me num conto e ele partiu sem novidade.

Ninguém me notou. Desembarcando, deixei os homens de
Silver e corri em frente até não poder mais.

Satisfeito de ter escapado das mãos de Long John, come-
cei a explorar a Ilha do Tesouro. De repente, alguns patos
selvagens levantaram vôo o que me fez compreender que
ali perto havia gente. Amedrontado, escondi-me numas
moitas e aí fiquei deitado à escuta. Não tardei o ouvir duas
vozes. Uma, a mais forte e a mais firme, era de Silver. 0
cozinheiro-mor falava rudemente a um velho marinheiro
de nome Tomás, que não queria acompanhá-lo na sua trai-



                                                         14
ção.

Tomás suplicava-lhe que o deixasse em paz, que não o
obrigasse a roubar e a matar, mas Long Silver, cinicamen-
te, procurava vencer-lhe os escrúpulos. Por fim, vendo que
as suas palavras eram inúteis, o malvado John matou-o a
golpes de muleta.

Pouco adiante, quase no mesmo instante, os seus - ho-
mens davam o mesmo fim a outro marinheiro fiei, chama-
do Alan.

Depois de mandar atirar no mar os cadáveres de Tomás e
de Alan, John Silver tirou do bolso um. apito e deu alguns
silvos, que soaram frouxos no ar cálido. Compreendi que o
velho pirata estava chamando seus companheiros e isso
como que me deu asas: desatei de novo a correr.

Minutos mais tarde, quando dei por mim, chegava junto de
um morro, no alto do qual se viam carvalhos e pinheiros.
Parei para tomar fôlego.

Já pensava estar outra vez livre de perigo, quando notei
que um vulto corria agilmente por entre as árvores. Vi-me
dentro dois fogos. Logo em seguida, o mesmo vulto .tor-
nou a surgir e pareceu querer dar uma longa volta para
atacar-me. Sentindo-me perdido, tirei a pistola do bolso e
avancei com grandes passos para o desconhecido. Ele es-
tava escondido atrás de uma árvore e, mal me viu aproxi-
mar, atirou-se de joelhos no chão e estendeu para mim as
mãos suplicantes.

Perguntei-lhe quem era. Respondeu-me, com voz rouca.,
que ora Ben Gunn. Vi que se tratava de um homem manco
queimado pelo sol, vestido com pedaços de pano de tecido
impermeável, unidos entre si por um curioso sistema de



                                                       15
cordões.

Ganhando coragem, contou-me que fora abandonado na-
quela ilha havia três anos e que, durante esse tempo, e
alimentara de cabras. e mariscos. Falou-me da sua
aventurosa vida de pirata e da sua regeneração. Finalmen-
te, depois de me ter dado a saber que era muito rico e
poderia fazer muita coisa por mim, perguntou-me se o meu
navio não era porventura o do capitão Flint. Respondi-lhe
que não, mas acrescentei que a bordo havia muitos ho-
mens desse capitão.

Ben Gunn começou então a fazer-me perguntas. Quis se
no meu navio não se achava um homem corri ima perna
só. Disse-lhe que sim. Ele então pronunciou ameaçadora-
mente o nome de Long John Silver e pediu-me que lhe
contasse toda a minha história.

Assim fiz, depois do que ele me narrou todas as vicissitu-
des por que passara. Disse-me que o. próprio Flint e Long
John Silver o tinham desembarcado n a ilha, deixando-o
sozinho com uma espingarda, uma enxada e uma picareta.

Acrescentou que punha o seu bote à minha disposição e
manifestou esperanças de que em breve estaria no navio
ao meu lado e do médico.

As suas últimas palavras foram abafadas por um disparo
de canhão, logo seguido de tiros de espingarda. 0 combate
começara.

Verificando o meu repentino desaparecimento assim eu
soube dias mais tarde - o Dr. Livesey e o velho Hunter
resolveram descer a terra. Encaminharam-se poro o lugar
em que no carta geográfico estava assinalado um pequeno
forte, desembarcaram sem ser vistos e internou-se no ilha,



                                                       16
empunhando duas pistolas carregados.

Nem bem tinham caminhado cem metros e já se achavam
junto de uma cabana transformado em fortim. 0 Dr. Livesey
pôs-se a examiná-la atentamente; notou, visivelmente sa-
tisfeito, que aquela construção feito de troncos de árvore
dispunha de seteiras em todos os lados e estava provida
de água. Eis senão que, de súbito, ecoou o grito de um
homem mortalmente ferido.

Sem perda de tempo, Livesey e Hunter voltaram para a
praia, embarcaram nos escoleres e em pouco tempo se
encontravam outra vez no navio, onde reinava grande agi-
tação. Mal chegou a bordo, o médico expôs seu plano ao
capitão.
Pouco depois,. Hunter, o médico e Joyce, restabelecido a
ordem no goleta e carregados os canhões, dirigiram-se de
novo para a costa num escoler. Em seguida transportaram
provisões para o fortim, deixaram aí dois homens de guar-
da e voltaram para bordo.

0 escaler foi novamente carregado com outras provisões,
depois do que cinco homens, o capitão, o cavaleiro, Redruth,
outro marinheiro fiei e livre, tomaram posição diante do
praia. A última viagem foi menos afortunado que as prece-
dentes. Mal o escaler deixou a goleta, os homens de Silver
dispararam, de bordo, um tiro de canhão; não atingiram o
alvo; mas logo soltaram outro tiro mais bem dirigido, que
alcançou a popa do escaler e este , já próximo do praia,
afundou. 0 capitão e o médico permaneceram de pé, mas
os três outros homens caíram no mar, reaparecendo pou-
co depois todos molhados. Boa porte dos provisões se
perdera.

Conseguindo chegar ao fortim, os cinco homens, mais
Hunter e Joyce, se prepararam para fazer frente ao imi-



                                                         17
nente ataque dos piratas de Silver.
0 primeiro assalto, comandado pelo gajeiro Job Anderson,
foi repelido com bem me recordo, estorvo no meio da mato
com Ben Gunn, quando os primeiros tiros do combate fo-
ram disparados quatro certeiras descargas de fuzil.

Mas, no segundo, o velho Redruth foi ferido e, malgrado a
pronta intervenção do médico, morreu pouco depois.
Deixei que o tiroteio acabasse e, despedindo-me de Ben
Gunn, dirigi-me depressa ao fortim.
A morte do velho Tom entristeceu bastante os seis ho-
mens. Então, para levantar-lhes o ânimo, o capitão
Smolllett, tirando do bolso uma bandeira foi içá-la pessoal-
mente no forte.

Avistando a bandeira, os piratas começaram a disparar. E
assim continuaram durante a noite inteira - segundo me
contou o Dr. Livesey - sem nenhum resultado. Contei o
que se passara e todos me ouviram em silêncio. Só o mé-
dico é que me fez algumas perguntas a respeito de Ben
Gunn, e eu lhe respondi da melhor maneira possível.

No dia seguinte, bem cedo, fui despertado por uma voz
que dizia: “Bandeira branca! E logo depois vi, com grande
surpresa, aparecer Silver em pessoa. Ouvindo tais palavra
s, pus-me rapidamente em pé, esfreguei os olhos e corri a
uma das seteiras.

Avistei, no outro lado da paliçada, um homem segurando
um pano branco, e Silver. 0 velho John, que trajava uma
esquisita roupa azul com numerosos botões de couro e
um chapéu ricamente enfeitado, apresentou-se diante do
capitão e, em poucas palavras, fez-lhe saber que estava
resolvido a ficar com o tesouro e queria a carta geográfica
para poder encontrá-lo. Em troca, Long Silver garantia-nos
a vida e se oferecia para levar-nos a todos, inclusive o



                                                         18
capitão, para a Inglaterra.

0 capitão Smollett deixou-o falar e, quando Silver se calou
para acender o cachimbo, respondeu-lhe secamente que a
sua proposta não podia ser aceita, porque os defensores
do fortim estavam mais do que resolvidos a apoderar-se
do tesouro.

0 rosto de Silver era terrível: a raiva fazia-lhe os olhos
saírem dos órbitas. Afastou-se dali coxeando e gritando
que, dentro de ume hora, o fortim seria destruído.

Apenas Silver desapareceu, o capitão Smollett tomou as
disposições para a batalha iminente: Hunter encarregou-se
da defesa do lado leste, Joyce ficou a oeste, o cavaleiro,
Gray e marinheiro fiei prepararam-se para defender flanco
norte. 0 capitão, o médico e eu aprontamo-nos para qual-
quer emergência.

Enquanto aguardavam o ataque, os defensores do fortim
começaram a examinar os seus fuzis e o capitão pôs-se a
andar de um lado para outro, com os lábios contraídos e o
aspecto carregado.

Alguns momentos se passaram, até que, subitamente, Joyce
fez mira e disparou. Era o sinal. Soltando gritos de guerra,
urna vaga de piratas saiu da mata e avançou para o lado
norte, em direção ao fortim. Simultaneamente, detrás dos
árvores recomeçava a fuzilaria. Num instante, sob os
disparos de Gray e do cavaleiro, que era o nosso melhor
atirador, três homens foram atingidos e um caiu nas proxi-
midades do fortim.

Entrementes, apesar das perdas sofridas, quatro atacan-
tes conseguiram penetrar em nossa trincheira armados até
os dentes. Passou-se então a combater a descoberto, o



                                                         19
que para nós significava o fim. Pressentindo o perigo imi-
nente, o capitão ordenou-nos que saíssemos- do fortim e
empunhássemos as facas. Obedecemos. Em pouco tem-
po, os assaltantes mais encarniçados caíram sob os golpes
certeiros de Gray, do capitão e do médico; os outros desa-
taram a fugir. Assim, não tardou que, dos atacantes, só
restassem cinco estendidos no chão.

Voltamos à nossa fortificação. Lá dentro, a fumaça dos
disparos já estava meio dissipada e, assim, pudemos ver,
ao primeiro relance, que Hunter jazia imóvel diante do sua
seteira e que Joyce recebera uma bolo no cabeça. 0 capi-
tão estava igualmente ferido. E, de mais a mais, grave-
mente, segundo me informou o médico.

me pareceu irremediavelmente entregue a si mesmo e ao
sabor dos ondas. Abandonando o meu bote, subi para a
goleta.

Fui, correndo, para a coberto e para o castelo da proa.
Uma garrafa vazia com o gargalo quebrado me chamou a
atenção: pouco adiante, Israel Hands e o marinheiro cha-
mado “Barrete Vermelho” jaziam imóveis, com os rostos
brancos como cera. Passei por ele s, fui até o mastro gran-
de, arriei a bandeira dos piratas e atirei-o no mar.

Entrementes, Israel Hands mexeu-se e, vendo-me, falou-
me com voz débil. Antes de mais nada, agradeceu-me por
ter matado aquele maldito marinheiro.

Durante o resto do dia, os atacantes não deram mais sinal
de vida e o tiroteio que vinha da mata parou completa-
mente.
No fortim, jantamos em silêncio, depois do que o Dr. Livesey
nos deixou para ir ter com Ben Gunn.




                                                         20
Uma vez só, comecei a planejar a minha segunda fuga.
Enchi os bolsos de biscoitos, apoderei-me de um par de
pistolas e, galgando a paliçada, dirigi-me para uma rocha
branca onde sabia que Ben Gunn tinha escondido o seu
tosco bote.

Ocultei-me à espera de que chegasse a noite e lancei-me à
minha provisão de víveres. Por fim, quando a última clari-
dade do dia desapareceu, arrastei para o mar o bote e
comecei a remar.

Impelido pela maré, encontrei-me subitamente diante do
navio e num instante as minhas mãos tocaram a amarra,
retesado como a corda de um arco. Veio-me então uma
idéia luminosa: se cortasse a amarra, a “Espanhola” ficaria
à mercê das ondas. Assim fiz. Enquanto com a faca corta-
va um a um os fios do cabo, ouvi um som confuso de
vozes que vinham do camarote.

Cheio de curiosidade, esperei que o navio virasse de bordo,
segurei-me a uma corda que pendia do castelo do popa e
logo após vi o contramestre Israel Hands e um marinheiro
irlandês lutando ferozmente, agarrados à gola um do ou-
tro. Horrorizado, deixei-me escorregar pelo amarra e vol-
tei, agitadíssimo, a deitar-me no fundo da minha frágil em-
barcação. Adormeci.

Quando acordei, já era dia. Percebi que navegava na extre-
midade sudoeste da ilha do tesouro. Permaneci no fundo
do bote e não empunhei os remos: a velocíssima corrente
me forçou a dar uma grande volta em torno da ilha e de-
pois me levou para junto da “Espanhola”, que me pareceu
irremediavelmente entregue a si mesma e ao sabor dos
ondas. Abandonando o meu bote, subi para a goleta.

Na excitação das últimos manobras, eu havia-me esqueci-



                                                        21
do de vigiar Hands. Quando me virei de repente, vi que o
contramestre tinha o punho erguido e procurava agredir-
me. Gritei, corri para o mastro grande, empunhei uma pis-
tola e, enquanto Hands se precipitava de novo contra mim,
apertei o gatilho. Infelizmente, a arma não detonou, por-
que a água do mar umedecera a carga. Irritado, apoiei for-
temente a palma das mãos contra o mastro grande e fi-
quei no expectativa, com os nervos tensos. Israel veio até
junto de mim; consegui fugir-lhe urna, duas, três vezes;
mas um balanço do “Espanhola” nos fez cambalear e rolar
no chão. Fui o primeiro a levantar-me e, rápido como um.
relâmpago, trepei à barra dos velas, onde pude finalmente
tomar fôlego.

A minha rapidez salvou-me, pois, enquanto eu subia pelo
cabo das velas, o punhal de Hands fendia o ar a poucos
centímetros abaixo de mim; o pirata ficou boquiaberto, com
o rosto voltado para cima, pasmado de assombro e de-
cepção.

Aproveitando aquela trégua, apressei-me em carregar ou-
tra vez as duas pistolas e Hands, que seguia estupefato os
meus menores movimentos, começou a compreender que
a sorte se virara contra ele ; hesitante, pôs-se todavia a
subir lento e penosamente pelos cabos acima, com o pu-
nhal entre os dentes.

Então, com uma pistola em cada mão, intimei-o a deter-
se. Israel Hands parou e disse-me que se rendia.

Escutava eu sorridente as suas palavras, quando, inopina-
damente, urna coisa qualquer cortou os ares: senti uma
dor agudo e vi que estava ferido. A surpresa e a dor fize-
ram com que, involuntária e inconscientemente, eu dispa-
rasse as duas pistolas e as deixasse escapar dos mãos.
Mas não caíram sós, pois, com um grito abafado, o con-



                                                       22
tramestre se precipitou no mar de cabeça para baixo. Livre
de Hands, consegui desencravar de mim o punhal e fui ter
rápido à coberta da goleta. Estava só e a maré começava
a mudar. Debruçando-me da amurada, vi que ali o mar era
pouco profundo. Deixei-me então escorregar vagarosamen-
te até à água, que mal me chegava à cintura, e alcancei a
praia são e salvo.

Caminhando velozmente, cheguei sem demora ao lugar
onde encontrara Ben Gunn. Era quase noite e, quando al-
cancei o morro, divisei o fortim e uma certa claridade. Con-
fiante, fui ao encontro do luz, que me parecia de um ver-
melho vivo e que de vez em quando diminuía de intensida-
de corno o tição de um braseiro prestes a se apagar.

Cheguei à entrada do fortim sem encontrar ninguém e já
me preparava para deitar-me, quando um dos meus pés
esbarrou no perna de alguém que dormia e que se virou,
mas continuou a dormir.

Então de repente, ouvi uma voz na escuridão. Era o papa-
gaio verde do capitão Silver. Não tive nem tempo de pen-
sar. Ao grito agudo do papagaio, os homens que ali esta-
vam acordaram e puseram-se de pé, enquanto Silver ber-
rava: “Quem está aí?” Eu caíra no ratoeira.

Em volta de mim estavam John Long Silver, o papagaio
verde e seis piratas‘. Dos meus amigos, nem sinal.

0 velho John foi o primeiro a falar. Mandou colar os seus
homens, falou-me do cólera do capitão Smollett pela mi-
nha segundo fuga e propôs-me, sem muitos rodeios, que
passasse para o seu lado e ficasse com ele . Antes de lhe
dor uma resposta categórica, pedi-lhe que me contasse o
que acontecera durante a minha ausência. E Long John re-
começou a falar.



                                                         23
Vim então a saber que o Dr. Livesey aparecera no dia ante-
rior e, depois de mostrar a Silver que a nossa goleta sumi-
ra, lhe propusera uma trégua e entregara o fortim aos pira-
tas. Quando acabou de falar, Long John Silver pensava ter-
me nas suas mãos. Mas’ logo o desenganei, dizendo-lhe
que eu descobrira a sua conspiração, escondido numa
barrica, que cortara as amarras da “Espanhola”, fazendo-a
ir para o mar alto, e que matara Israel Hands, único sobre-
vivente do nosso navio.

As minhas palavras enfureceram os piratas. Os marinheiro
Tom Morgan desembainhou a sua faca e quis cravá-lo em
mim. John Silver deteve-o a tempo. Mas outro marinheiro
avançou. Então Silver, agitadíssimo, convidou cada um dos
presentes a dor o sua opinião sobre o caso.
Falou em nome de todos o segundo marinheiro, que, de
olhos baixos, declarou que ninguém queria mais saber do
capitão Silver e das suas idéias extravagantes; ‘que, de
agora em diante, os marinheiros procederiam por sua pró-
pria conto, sem receber ordens de quem quer que fosse. E,
seguido dos seus companheiros, deixou o fortim.

Eu e Silver ficamos sós. Ele então me chamou e disse-me:

“Façamos um trato: eu salvarei você do ira dos meus com-
panheiros e você me salvará da cólera do capitão Smollett.
Combinado?”
Apertei-lhe a mão.

Os homens de Silver voltaram pouco depois, tendo à fren-
te o mais jovem. Autoritário e decidido, este entregou a
Long John um bilhete com o sinal da “mancha negra” e
com a seguinte palavra: “Destituído”. As palavras de Jorge
Merry, que repetiu as queixas contra Silver, reavivaram a
cena de pouco antes.



                                                        24
Long John Silver leu o bilhete e escutou as palavras do
marinheiro. Depois, disse que os seus homens nunca seri-
am capazes de descobrir o tesouro sem ele , que a luto era
dura mas não estava perdida, que o mapa do tesouro do
capitão Flint estava nesse momento em suas mãos e que
a sua vitória era certa.

Tirou então do bolso o mapa da Ilha do Tesouro, exibiu-o
aos marinheiros, que, exultantes, o examinaram avidamen-
te. Mais uma vez Long tivera sorte. No dia seguinte de
manhã; acordei ao grito: “ó do fortim! Sou o médico!”
Silver recebeu cortesmente o Dr. Livesey. Acompanhou-o
no longo e cuidadosa visito aos feridos, disse-lhe que eu
também estava no fortim e perguntou-lhe se queria ver-
me. 0 Dr. Livesey respondeu-lhe que sim.

Então Silver pediu-lhe que ficasse do lado de fora do paliça-
da: eu ficaria do lado de dentro junto com Sílver.

0 médico aguardava-me impaciente: corri ao seu encontro
e o saudei comovido. Apoiado à paliçada, contei-lhe
pormenorizadamente tudo quando vira e combinara du-
rante a minha ausência. Quando terminei, o Dr. Livesey abra-
çou-me enternecido e, chamando Silver, recomendou-lhe
que cuidasse bem de mim, pois isto - acrescentou o médi-
co - salvaria a vida do velho pirata.

Voltamos ao fortim e, após ter comido fartamente, fui com
meus carcereiros à conquista do tesouro. Com as mãos
amarradas a uma corda presa à cintura, segui docilmente
Silver, que levava dois fuzis no bandoleiro, um facão à cinto
e uma pistola em cada bolso do paletó. Em volta de mim,
todos os marinheiros estavam armados até os dentes.

Após uma curta viagem por mar, chegamos à parte es-



                                                          25
querda do ilha.

Os bandidos então se detiveram para descansar e orien-
tar-se: um esqueleto humano, amarrado aos pés de um
pinheiro, indicou o rumo a seguir. Reiniciamos a caminhada
e chegamos ao ponto mais alto do ilha. Os piratas coloca-
ram no chão as enxadas e fuzis e se deitaram à sombra
das árvores. De repente, no meio da mata, uma voz fina,
agudo e trêmulo, entoou um estribilho que os bandidos
conheciam muito bem. Todos empalideceram.

-   Com os diabos, é Flint! - exclamou Merry.

A voz ressoou novamente, mas não como um canto e sim
como um grito longínquo e frouxo, que o eco repetia fraca-
mente. Os piratas tornaram a mostrar-se assustados. Ape-
nas Silver conseguiu manter-se calmo e, tranqüilizando seus
homens, deu outra vez o sinal de partida.

E a voz? Seria capaz de jurar que era de Ben Gunn.

Atingimos finalmente a orla do mata onde o tesouro se
achava escondido.

- Avante, companheiros! - gritou Merry,- e alguns deles
logo se puseram a correr.

De súbito, vimo-los; parar dez metros adiante. Um grito
surdo ressoou. Silver apressou o passo, batendo a muleta
no chão como doido: daí a pouco, ele e eu paramos de
repente. Diante de nós se abria um grande buraco, que não
devia ser recente, a julgar pelas paredes já endurecidas e
pela erva que crescia no fundo.

Viam-se por ali um cabo quebrado de uma enxada e peda-
ços de caixotes espalhados. Não havia dúvida: o esconde-



                                                        26
rijo fora violado e as setecentas mil libras esterlinas de ouro
tinham desaparecido.

Os seis homens ficaram como que paralisados de assom-
bro. Mas Silver reagiu prontamente: entregou-me uma pis-
tola e levou-me para o outro lado do buraco, de modo que
este ficou entre nós e os outros cinco marinheiros. Quando
se viu do lado oposto do grande fosso, Tom Morgan levan-
tou o braço com a clara intenção de disparar. Mas justa-
mente nesse momento, três tiros de espingarda partiram
da mato: Merry girou sobre si mesmo e caiu morto no
fundo do buraco; os seus companheiros trataram logo de
fugir e desapareceram num instante.

Logo em seguida, o médico, Gray e Ben Gunn apareceram
com as espingardas fumegantes e se aproximaram de nós.
Estávamos salvos!

0 Dr. Livesey contou-nos então, resumidamente, o que ti-
nha acontecido: soubera que Ben Gunn havia descoberto
sozinho o tesouro e o desenterrara e transportara paro a
gruta que lhe servia de refúgio. 0 médico, durante aquela
tarde após o ataque dos piratas, fora ter com Ben Gunn e
conseguira que este lhe revelasse o seu segredo. Na ma-
nhã seguinte, tendo notado que a goleta desaparecera, pro-
curara Silver e lhe entregara o mapa, já agora sem valor.

Conversando, chegamos à praia e entramos na gruta de
Ben Gunn. Smollett descansava diante de uma fogueira e lá
no fundo, frouxamente iluminadas pelo fogo, luziam enor-
mes pilhas de moedas e filas de barras de ouro. Era o te-
souro do capitão Flint!

No dia seguinte bem cedo nos pusemos a trabalhar, pois o
transporte de tão grande quantidade de ouro num percur-
so de cerca de uma milha por terra e de três por mar até à



                                                            27
“Espanhola” constituía, para o nosso reduzido grupo, uma
tarefa extenuante. 0 trabalho foi executado normalmente.
Gray e Ben Gunn faziam o transporte no barco e os res-
tantes, durante a sua ausência, amontoavam o ouro no
praia.

Levamos alguns dias a empilhar o tesouro no porão. E,
numa bela manhã, após termos embarcado uma boa pro-
visão de água e tudo quanto havíamos solvo do nosso
abastecimento de carne de cobra, levantamos âncora, não
sem alguma dificuldade, e saímos do baía setentrional.

Em menos de meio dia de viagem vimos, com alegria
indescritível, desaparecer para sempre no horizonte a mais
alta montanha do ilha.

A equipagem do goleta era tão reduzida que todos a bordo
tinham de fazer trabalho dobrado, exceto o capitão, que
dava ordens deitado num colchão; é que, embora conva-
lescente, necessitava de repouso. Como não podíamos ar-
riscar-nos a uma viagem de regresso sem outros mari-
nheiros, dirigimo-nos ao primeiro porto da América espa-
nhola, aonde, chegamos extenuados, após termos nave-
gado contra o vento.

Já o sol se punha, quando ancoramos numa linda baía bem
protegida. Fomos então subitamente rodeados de barcos
de negros, índios e mestiços, que vendiam frutos e legu-
mes.

A vista de todos esse s rostos alegres, especialmente dos
negros, a perfume dos frutos exóticas e, sobretudo, as
luzes que brilhavam, na cidade logo nos fizeram esquecer
a. permanência no ilha de sanguinolento memória.

0 médico e o cavaleiro me levaram consigo a passar a



                                                       28
noite em terra; travamos conhecimento com o coman-
dante de uma unidade de guerra inglesa; conversamos com
ele , acompanhamo-lo ao seu navio e as horas passaram
tão alegremente que já era madrugado quando regressa-
mos à “Espanhola”.

Ben Gunn estava sozinho na coberta. Vindo ao nosso en-
contro, informou-nos que, horas antes, Silver, que embar-
cara conosco na goleta, fugira num escaler com ajuda de
um marinheiro: assim procedera, para poupar-nos as difi-
culdades que indubitavelmente nos acarretaria a perma-
nência a bordo “do homem com uma perna só”; mas não
fugira de mãos vazias: arrombara um tabique e se apode-
rara de um soco de moedas no valor de quatrocentos
guinéus, com as quais contava pôr em segurança a sua
atormentada existência.

Creio que todos ficamos satisfeitíssimos de nos termos li-
vrado dele por um preço tão baixo.

Enfim, para concluir a minha narrativa, direi que engajamos
alguns marinheiros, que fizemos uma tranqüilo viagem de
regresso e que a “Espanhola” chegou a Bristol a tempo de
interromper os preparativos do Sr. Blanclly, amigo do cava-
leiro, para uma eventual expedição de socorro. Da
equipagem primitiva só estavam cinco homens.

0 tesouro foi repartido entre todos e cada qual o gostou
corno quis.

0 capitão Smollett aposentou-se. Gray, não só economi-
zou o dinheiro, mas também, desejoso de melhorar de
situação, fez o curso de imediato, posto que passou a ocu-
par num belo veleiro, de que se tornou também proprietá-
rio. Além disso, casou-se e teve filhos.
Ben Gunn recebeu cerca de mil esterlinos e gastou-os em



                                                        29
dezenove dias; arranjou então um emprego de porteiro e
viveu tranqüilamente, tornando-se grande amigo das cri-
anças do sua aldeia, de cujas brejeirices era freqüente víti-
ma, e também cantor muito apreciado na igreja aos do-
mingos e nos dias de festa.

De Silver nunca mais tivemos notícias. Esse terrível perneta
desapareceu afinal da minha vida. Creio que se reuniu à sua
velha negra e que provavelmente viveu feliz com ela e com
o famoso papagaio verde.

As barras de prata e as armas, pelo que sei, ficaram no
lugar em que o capitão Flint as escondeu, e não serei, por
certo, eu quem as irá procurar. Nenhuma força conseguirá
levar-me de novo àquela ilha maldita.

Ainda hoje tenho horríveis pesadelos em que ouço as on-
das se quebrarem de encontro às suas costas rochosas e
acordo sobressaltado à voz agudo do papagaio verde, que
me grito ao ouvido estranhas e incompreensíveis palavras.




                            FIM



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  • 1. A ILHA DO TESOURO Robert Louis Stevenson 1
  • 3. A ILHA DO TESOURO Robert Louis Stevenson 3
  • 4. A ILHA DO TESOURO Robert Louis Stevenson   EM certo dia do ano de mil setecentos e tantos, um velho marinheiro moreno, com uma cicatriz no rosto, bateu com o seu bordão ferrado à porta da estalagem “Almirante Benbow”. Disse rudemente ao estalajadeiro, meu pai, que lhe trou- xesse um copo de rum, pediu notícias da freguesia, man- dou em seguida o empregado levar-lhe a bagagem e atirou sobre a mesa três ou quatro moedas de ouro. Durante os dias seguintes, o Capitão - assim queria o es- tranho hóspede que lhe chamassem - outra coisa não fez senão vagar ao longo do baía e sobre os rochedos, munido de um óculo. Ríspido, zangado, esbravejando ,o dia todo, não respondia ao que lhe perguntavam; mas, após algum tempo, me chamou à parte poro dizer-me que observasse todos os fregueses e o avisasse da chegada de um mari- nheiro perneta. 4
  • 5. Nos tardes chuvosas, segurando uma grande garrafa de rum, contava horríveis histórias de naufrágios, enforcamen- tos e torturas. Eu, minha mãe, meu pai e uns poucos fre- gueses o escutávamos apavorados. Não tardou a tornar-se insuportável. Bebia, embriagava-se e obrigava-nos a escutá-lo e aplaudi-lo. Só urna vez teve de calar-se, diante do atitude do Dr. Livesey, nosso amigo, que resistiu impassível a uma ameaço de agressão por parte do terrível Capitão. Pouco tempo depois desta cena com, o médico, aconte- ceu-me outra coisa estranha. Em certa manhã de janeiro me vi diante de um homem sem dois dedos da mão es- querda e com um facão no cinto, que me mandou trazer- lhe. rum e começou a fazer-me perguntas a respeito de certo Bill, um marinheiro seu amigo. As minhas respostas vagos, todas monossilábicas, retru- cou que seu amigo Bill devia ser o próprio Capitão e, pe- gando-me de repente por um braço, perguntou-me onde estava ele nesse momento e a que hora voltaria. Ficamos a esperá-lo, ele e eu, na sala do estalagem duran- te cerca de meia hora. Afinal o Capitão regressou e, quando ouviu aquela estranha personagem chamá-lo pelo nome, exclamou furiosamen- te: “Cão Negro!” Os dois homens trocaram algumas pala- vras em voz alta e mandaram-me embora. Deixei-os sós, mas pouco depois ouvi um barulho de mó- veis caindo, um tinir de lâminas metálicas, um grito de dor, e vi o “0 Negro” fugindo corno um doido, seguido do Capi- tão. Junto da porta, este desferiu um terrível golpe de fa- 5
  • 6. cão, que não alcançou o alvo, e o “Cão Negro” embora ferido no ombro, ainda teve tempo de escapar. Terminado o combate, o Capitão mandou-me trazer-lhe rum, mas não pôde bebê-lo, porque, sem forças, caiu por terra. 0 Dr. Livesey, chamado incontinenti, examinou demoradamente o enfermo e, antes de o deixar, recomen- dou-lhe com grande encarecimento que não tomasse be- bidas alcoólicas. As suas ordens não foram cumpridas. 0 Capitão tanto me suplicou que, compadecido, resolvi levar-lhe uma garrafa de rum. Esvaziou-a em dois tempos e, em vez de agrade- cer-me, perguntou-me se tornara a ver o “Cão Negro” e pediu-me que levasse pessoalmente ao Dr. Livesey o baú que estava no seu quarto, para que a “mancha negra” não pudesse reavê-lo. A minha pergunto sobre o que significava “mancha negra”, o Capitão respondeu evasivamente e eu fiquei meio confu- so. Nos dias que se sucederam, o Capitão andou pela estala- gem, atemorizado e cambaleante de fraqueza, como uma cima penada. Não respondia às perguntas que lhe faziam e de vez em quando olhava em volta, desconfiado. Assim se passou uma semana. Por volta das três horas de uma tarde fria e nevoenta, um mendigo, cego, curvado pelos anos e coberto por um enorme capote, parou diante da tabuleta da hospedaria. Pediu em voz alta que lhe ser- vissem de guia. Ofereci-lhe a mão: o misterioso velho apertou-a com for- 6
  • 7. ça e, em voz terrível, ordenou-me que o levasse imediata- mente à presença do Capitão. Acompanhei-o. Vendo o cego, o Capitão ficou assombrado e procurou fugir; mas o mendigo ordenou-lhe que ficasse quieto; pôs-lhe então na palma do mão qualquer coisa que não consegui ver o que era e saiu da sola com incrível agilidade. Refeito da surpresa, o Capitão me disse que ainda lhe res- tavam seis horas e meia para conseguir o que queria e encaminhou-se para a porta. Não, chegou a alcançá-la. Levando uma dos mãos à garganta, cambaleou e, com um estertor abafado, caiu ao chão. 0 Capitão morrera de um derrame cerebral. Logo após a sua morte, contei a minha mãe tudo quanto sabia. Resolvemos então, de comum acordo, apanhar o célebre baú e levá-lo sem demora à casa do Dr. Livesey. Mas, antes disso, passamos pela cosa de uns amigos nos- sos e muni-me de uma pistola. Voltamos à nossa estala- gem, onde encontramos o cadáver do pobre Capitão tal como o deixáramos. Ajoelhei-me junto do morto e, ven- cendo a minha repugnância, tirei-lhe do pescoço uma pe- queno e fina chave. Saímos então do quarto e minha mãe pôde facilmente abrir o baú. Levantada a tampo, vimos duas bonitos pistolas, tabaco, uma borra de prata, diversos objetos e, num envoltório, embranquecido pela água do mar, um embrulhinho enrola- do em tecido impermeável, que continha documentos, e um saquinho cheios de moedas. Abrimos o pacote e pusemo-nos a contar o dinheiro. Mas 7
  • 8. daí a pouco tivemos de fugir a toda a pressa, porque ouvi- mos uma batida no porto e logo depois um assobio; isso nos fez compreender que os inimigos do pobre Capitão estavam por ali. Deixando precipitadamente a estalagem, com o saquinho de moedas e os documentos, paramos ofegantes nas vizi- nhanças e, escondidos numas .grandes moitas, preparamo- nos para ver o que aconteceria. Os nossos inimigos, em número de sete ou oito, chegaram logo depois. Entraram no estalagem, avistaram o cadáver do pobre Capitão e revistaram-no minuciosamente. Não encontrando a chave nem os documentos que eu trou- xera comigo, ficaram furiosos e depredaram todo o esta- belecimento. Quando, no auge da exasperação, se prepa- ravam para atear-lhe fogo, um assobio cortou os ares. Ouvindo-o, os bandidos olharam em volta amedrontados, gritaram que o seu terrível inimigo se aproximava e puse- ram-se em. fuga um após outro. Em vão o cego, que os chefiava, procurou detê-los com ameaças e insultos, aconselhando-lhes calma e coragem. Em poucos instantes se viu só. Tentou retroceder, mas uma companhia de guardas aduaneiros, que chegava a galope, lhe embargou os passos. Saí então do meu esconderijo e voltei à hospedaria. Encontrei à entrado o inspetor Dance, que me pediu para contar-lhe tudo quanto vira e, após o interrogatório, ordenou-me que o levasse ao Dr. Livesey. Este não se achava em casa. Tornamos montar a cavalo e em pouco tempo chegamos ao castelo do Sr. Trelowney. Ali, diante do médico e do cavaleiro - assim queria o Sr. Trelawney que lhe chamassem - o inspetor Dance contou- nos a sua história. 8
  • 9. Quando terminou, o doutor me perguntou se ainda tinha em meu poder o embrulho que os bandidos haviam debal- de procurado, e eu, como resposta, entreguei-lho. Antes de examiná-lo, porém, o Dr. Livesey quis despedir-se do bravo inspetor e, com permissão do cavaleiro, mandou trazer um apetitoso recheado de pombo. Acabada a refeição, o cavaleiro e o médico puseram-se a conversar sobre o Capitão, sobre o pirata Flint, velho ami- go do Capitão, e ainda sobre as maravilhosas façanhas desse Flint. Em seguido, Pediram-me que lhes permitisse abrir o embrulho. 0 embrulho estava cosido e o médico teve de cortar-lhe os fios com a tesoura de cirurgia. Continha um caderno e um maço de papéis lacrado. 0 caderno estava escrito com le- tra incerta e irregular e com algumas frases quase incom- preensíveis. 0 maço estava lacrado em diversos lugares e o seu sinete fora feito com um dedal. 0 médico quebrou os sinetes com grande cuidado e descobriu d corta geográfica de uma ilha, com latitude e longitude e todas as indicações necessárias para levar um navio até às suas proximidades. Tinha, essa ilha, cerca de nove milhos de extensão e mais ou menos a forma de um dragão em pé, dois portos e, na parte central, uma colina identificada pelo nome de “Longa Vista”. Viam-se no carta algumas outras anotações e particular- mente três cruzes vermelhas, duas na porte norte da ilha, uma a sudoeste e, junto desta, os dizeres: “Aqui, a maior porte do tesouro”. No verso, com tinta vermelha, estavam 9
  • 10. escritos as seguinte informações suplementares: Árvore grande, contraforte de “Longa Vista” direção N-N-E. Ilha do esqueleto, E-S-E. Três metros. A borra de preto está no esconderijo Norte, que se acha no direção do morro Leste, dez braços ao sul do espigão ne- gro. As armas encontram-se no duna de areia, na extremi- dade norte do cabo do baía setentrional, direção leste, quarto norte. J. F. Esse documento, lacônico e para mim incompreensível, encheu do entusiasmo Os meus dois amigos. 0 cavaleiro disse ao Dr. Livesey que, em menos de duas semanas, teria à sua disposição um navio com a respectiva equipagem e que o médica e eu iríamos com ele . 0 médico aceitou a proposta e eu também. Muito tempo se passou antes que tudo ficasse pronto para a viagem. 0 Dr. Livesey foi a Londres para arranjar um substituto que atendesse à sua clientela, e o cavaleiro ficou só no castelo. Algumas semanas depois, escreveu uma corto ao médico e a mim, Jim Hawkins, chamando-nos com urgência a Bristol para partirmos. Informava-nos; que já comprara uma goleta, dando-lhe o nome de “Espanhola”, e que contratara uma tripulação escolhida, inclusive um cozinheiro-mor cha- mado Long John Sílver, velho marinheiro, que não tinha uma dos pernas. 10
  • 11. Lida a corta, fui ter imediatamente com minha mãe, despe- di-me dela comovido e, no dia seguinte de tarde, tomei a diligência para Bristol. 0 cavaleiro me esperava num hotel próximo do porto. E no mesmo noite do minha chegado mandou-me levar um bilhete a John Silver, no taberna do “óculo”. 0 nosso cozinheiro-mor me recebeu cordialmente no estabelecimento de sua propriedade. Era alto, forte, sor- ridente e tinha um rosto feio e sem barba, porém inteligen- te, tal como o descrevera o cavaleiro. Pouco após a minha chegado, um dos fregueses no outro lado do saia levan- tou-se de repente, correu à porto e saiu. Logo reconheci nele o “Cão Negro” e gritei que o detivessem. ‘ Ouvindo o meu grito, John Silver veio até junto de mim; contei-lhe a história do “Cão Negro”, do cego, do pobre Capitão, e ele , sem demora, mandou dois homens atrás do fugitivo. Fiquei no taberna a conversar com os marinheiros até noi- te avançado. Depois, John Silver acompanhou-me ao hotel onde o cavaleiro e o Dr. Livesey, que regressara de Lon- dres, me esperavam. 0 cavaleiro comunicou então aos pre- sentes que, às quatro horas da manhã do dia seguinte, a “Espanhola” levantaria âncora em direção à Ilha do Tesou- ro e que ele mesmo comandaria a expedição. Fomos todos para bordo cedinho. Pouco antes de partir, o capitão Smollett, comandante do, “Espanhola”, conversou longo e animadamente com cava- leiro. Os dois homens falaram sobre o navio, a equipagem e a expedição, manifestando opiniões no maioria divergen- tes. Por fim, o capitão ordenou que levassem as armas e munições de bordo para a popa, próximo do u camarote. Os homens do equipagem obedeceram sem discutir. En- tão, a “Espanhola” fez-se ao largo. A expedição parecia ter nascido sob boa estrela. 0 avio era 11
  • 12. bom, a tripulação e o comandante eram verdadeiros ho- mens do mar, e o cavaleiro e o médico, sobretudo este último, se mostravam sempre cordialíssimos amigo. Os primeiros dias passaram depressa e, excetuando queda no mar do nosso imediato, um homem sempre embriaga- do e cambaleante, nada perturbou a viagem. Ao por do sol, após o meu turno de guarda, ia freqüentemente à co- zinha ter com ‘o velho John, que falava das venturas do capitão Flint e me mostrava, encantado, as proezas do seu papagaio, animal - dizia ele - com cerca de duzentos anos de idade. No último dia de viagem, após terminar o meu serviço, resolvi ir tomar mel no porão. Enfiei-me no barrica que o continha e encontrei-a quase vazia; cansado, acomodei- me no fundo e estava para adormecer, quando um homem se sentou pesadamente em cima dela. Já me dispunha a sair da barrica, quando ele começou a falar. Era a voz de Silver. Falou demoradamente. Contou, pela centésima vez, as aventuras do terrível capitão Flint, seu antigo comandante, comunicou aos marinheiros que eles em breve seriam bem recompensados, lamentou-se de haver dissipado em pou- co tempo um grande patrimônio e continuou seu tenebro- so discurso com palavras de lisonja a todos os marinheiros da “Espanhola”. Depois, em voz baixa, expôs o seu plano. Ele, John Silver, deixaria o cavaleiro e o capitão atingirem a ilha e descobrirem o tesouro, e os ajudaria a embarcá-lo. Mas, na viagem de regresso, o navio e o tesouro passari- am, pela força, às suas meios e às dos marinheiros seus amigos. E o capitão e o cavaleiro nunca mais reveriam Bristol. Os marinheiros que o rodeavam, e que eu não podia ver, 12
  • 13. fizeram-lhe ainda algumas perguntas, depois do que, exultantes, concordaram com a sinistra proposta. Por fim, apanharam algumas garrafas de uísque numa barrico e brin- daram à boa sorte do empreendimento. Nesse momento, o gajeiro gritou: “Terra à vista!” Num instante, todos os homens subiram à coberta. 0 capi- tão perguntou a Silver, que já estivera na ilha noutro navio, qual era o lugar mais apropriado para deitar âncora, e o velho John indicou-lhe a parte sul, no lado posterior da ilhota. Terminada a manobra de ancoragem, o capitão reuniu os seus homens no tombadilho e dirigiu-Ihes algumas pala- vras, convidando-os por fim a beberem à saúde do cava- leiro e à boa sorte da empresa. Logo depois, o Dr. Livesey, atendendo a um aviso meu, mandou. chamar-me ao ca- marote do capitão. Contei-lhe minuciosa e rapidamente a conversação de Silver com os marinheiros. Diante disso, o capitão começou preparar, de acordo com o cavaleiro e o médico, um plano de ação. Assim ficou estabelecido que todos fingiriam ignorar a trama urdida por John Silver e iniciariam a busca do tesouro conforme esta- va combinado. Fez-se conta dos marinheiros em que se podia confiar: eram sete, e entre ele s eu, contra dezenove robustos homens’ do mar. Na manhã seguinte, os marinheiro desceram ao mar com os escaleres para rebocar o navio, enquanto Long John empunhava a barra do leme. Ancoramos num fundo de areia fina.. A queda do âncora no mar fez com que bandos de pássaros levantassem vôo e, piando, partissem em direção às matas. Logo em seguida, tudo voltou ao silên- cio. Deixando os escaleres no mar e voltando arquejantes e 13
  • 14. suados para bordo, os marinheiros começaram logo a querer amotinar-se. Permaneciam no coberto a confabular entre si, e a menor ordem era mal acolhida e mal executada. Preocupado com esta situação ameaçadora, o capitão diri- giu-se ao camarote do cavaleiro e convenceu-o de que o melhor era deixar os marinheiros darem um passeio em terra: se todos ele s se achassem no ilha, - concluiu - a corveta ficaria em nosso poder e tudo terminaria bem. Assentado isso, o capitão deu logo ordens naquele sentido e todos os marinheiros, ao ouvi-lo, soltaram vários vivas que ecoaram longe. Num instante a expedição. ficou pronta: seis homens per- maneceram a bordo e os outros treze, incluído Silver, em- barcaram nos escaleres. Entrementes, Hunter, Joyce e Redruth, os únicos marinheiros que tinham permanecido fiéis ao cavaleiro, foram inteirados dos planos combinados entre nós. Quando a expedição de Silver estava para deixar o navio, resolvi apanhá-la: rapidamente saltei num bote, agachei- me num conto e ele partiu sem novidade. Ninguém me notou. Desembarcando, deixei os homens de Silver e corri em frente até não poder mais. Satisfeito de ter escapado das mãos de Long John, come- cei a explorar a Ilha do Tesouro. De repente, alguns patos selvagens levantaram vôo o que me fez compreender que ali perto havia gente. Amedrontado, escondi-me numas moitas e aí fiquei deitado à escuta. Não tardei o ouvir duas vozes. Uma, a mais forte e a mais firme, era de Silver. 0 cozinheiro-mor falava rudemente a um velho marinheiro de nome Tomás, que não queria acompanhá-lo na sua trai- 14
  • 15. ção. Tomás suplicava-lhe que o deixasse em paz, que não o obrigasse a roubar e a matar, mas Long Silver, cinicamen- te, procurava vencer-lhe os escrúpulos. Por fim, vendo que as suas palavras eram inúteis, o malvado John matou-o a golpes de muleta. Pouco adiante, quase no mesmo instante, os seus - ho- mens davam o mesmo fim a outro marinheiro fiei, chama- do Alan. Depois de mandar atirar no mar os cadáveres de Tomás e de Alan, John Silver tirou do bolso um. apito e deu alguns silvos, que soaram frouxos no ar cálido. Compreendi que o velho pirata estava chamando seus companheiros e isso como que me deu asas: desatei de novo a correr. Minutos mais tarde, quando dei por mim, chegava junto de um morro, no alto do qual se viam carvalhos e pinheiros. Parei para tomar fôlego. Já pensava estar outra vez livre de perigo, quando notei que um vulto corria agilmente por entre as árvores. Vi-me dentro dois fogos. Logo em seguida, o mesmo vulto .tor- nou a surgir e pareceu querer dar uma longa volta para atacar-me. Sentindo-me perdido, tirei a pistola do bolso e avancei com grandes passos para o desconhecido. Ele es- tava escondido atrás de uma árvore e, mal me viu aproxi- mar, atirou-se de joelhos no chão e estendeu para mim as mãos suplicantes. Perguntei-lhe quem era. Respondeu-me, com voz rouca., que ora Ben Gunn. Vi que se tratava de um homem manco queimado pelo sol, vestido com pedaços de pano de tecido impermeável, unidos entre si por um curioso sistema de 15
  • 16. cordões. Ganhando coragem, contou-me que fora abandonado na- quela ilha havia três anos e que, durante esse tempo, e alimentara de cabras. e mariscos. Falou-me da sua aventurosa vida de pirata e da sua regeneração. Finalmen- te, depois de me ter dado a saber que era muito rico e poderia fazer muita coisa por mim, perguntou-me se o meu navio não era porventura o do capitão Flint. Respondi-lhe que não, mas acrescentei que a bordo havia muitos ho- mens desse capitão. Ben Gunn começou então a fazer-me perguntas. Quis se no meu navio não se achava um homem corri ima perna só. Disse-lhe que sim. Ele então pronunciou ameaçadora- mente o nome de Long John Silver e pediu-me que lhe contasse toda a minha história. Assim fiz, depois do que ele me narrou todas as vicissitu- des por que passara. Disse-me que o. próprio Flint e Long John Silver o tinham desembarcado n a ilha, deixando-o sozinho com uma espingarda, uma enxada e uma picareta. Acrescentou que punha o seu bote à minha disposição e manifestou esperanças de que em breve estaria no navio ao meu lado e do médico. As suas últimas palavras foram abafadas por um disparo de canhão, logo seguido de tiros de espingarda. 0 combate começara. Verificando o meu repentino desaparecimento assim eu soube dias mais tarde - o Dr. Livesey e o velho Hunter resolveram descer a terra. Encaminharam-se poro o lugar em que no carta geográfico estava assinalado um pequeno forte, desembarcaram sem ser vistos e internou-se no ilha, 16
  • 17. empunhando duas pistolas carregados. Nem bem tinham caminhado cem metros e já se achavam junto de uma cabana transformado em fortim. 0 Dr. Livesey pôs-se a examiná-la atentamente; notou, visivelmente sa- tisfeito, que aquela construção feito de troncos de árvore dispunha de seteiras em todos os lados e estava provida de água. Eis senão que, de súbito, ecoou o grito de um homem mortalmente ferido. Sem perda de tempo, Livesey e Hunter voltaram para a praia, embarcaram nos escoleres e em pouco tempo se encontravam outra vez no navio, onde reinava grande agi- tação. Mal chegou a bordo, o médico expôs seu plano ao capitão. Pouco depois,. Hunter, o médico e Joyce, restabelecido a ordem no goleta e carregados os canhões, dirigiram-se de novo para a costa num escoler. Em seguida transportaram provisões para o fortim, deixaram aí dois homens de guar- da e voltaram para bordo. 0 escaler foi novamente carregado com outras provisões, depois do que cinco homens, o capitão, o cavaleiro, Redruth, outro marinheiro fiei e livre, tomaram posição diante do praia. A última viagem foi menos afortunado que as prece- dentes. Mal o escaler deixou a goleta, os homens de Silver dispararam, de bordo, um tiro de canhão; não atingiram o alvo; mas logo soltaram outro tiro mais bem dirigido, que alcançou a popa do escaler e este , já próximo do praia, afundou. 0 capitão e o médico permaneceram de pé, mas os três outros homens caíram no mar, reaparecendo pou- co depois todos molhados. Boa porte dos provisões se perdera. Conseguindo chegar ao fortim, os cinco homens, mais Hunter e Joyce, se prepararam para fazer frente ao imi- 17
  • 18. nente ataque dos piratas de Silver. 0 primeiro assalto, comandado pelo gajeiro Job Anderson, foi repelido com bem me recordo, estorvo no meio da mato com Ben Gunn, quando os primeiros tiros do combate fo- ram disparados quatro certeiras descargas de fuzil. Mas, no segundo, o velho Redruth foi ferido e, malgrado a pronta intervenção do médico, morreu pouco depois. Deixei que o tiroteio acabasse e, despedindo-me de Ben Gunn, dirigi-me depressa ao fortim. A morte do velho Tom entristeceu bastante os seis ho- mens. Então, para levantar-lhes o ânimo, o capitão Smolllett, tirando do bolso uma bandeira foi içá-la pessoal- mente no forte. Avistando a bandeira, os piratas começaram a disparar. E assim continuaram durante a noite inteira - segundo me contou o Dr. Livesey - sem nenhum resultado. Contei o que se passara e todos me ouviram em silêncio. Só o mé- dico é que me fez algumas perguntas a respeito de Ben Gunn, e eu lhe respondi da melhor maneira possível. No dia seguinte, bem cedo, fui despertado por uma voz que dizia: “Bandeira branca! E logo depois vi, com grande surpresa, aparecer Silver em pessoa. Ouvindo tais palavra s, pus-me rapidamente em pé, esfreguei os olhos e corri a uma das seteiras. Avistei, no outro lado da paliçada, um homem segurando um pano branco, e Silver. 0 velho John, que trajava uma esquisita roupa azul com numerosos botões de couro e um chapéu ricamente enfeitado, apresentou-se diante do capitão e, em poucas palavras, fez-lhe saber que estava resolvido a ficar com o tesouro e queria a carta geográfica para poder encontrá-lo. Em troca, Long Silver garantia-nos a vida e se oferecia para levar-nos a todos, inclusive o 18
  • 19. capitão, para a Inglaterra. 0 capitão Smollett deixou-o falar e, quando Silver se calou para acender o cachimbo, respondeu-lhe secamente que a sua proposta não podia ser aceita, porque os defensores do fortim estavam mais do que resolvidos a apoderar-se do tesouro. 0 rosto de Silver era terrível: a raiva fazia-lhe os olhos saírem dos órbitas. Afastou-se dali coxeando e gritando que, dentro de ume hora, o fortim seria destruído. Apenas Silver desapareceu, o capitão Smollett tomou as disposições para a batalha iminente: Hunter encarregou-se da defesa do lado leste, Joyce ficou a oeste, o cavaleiro, Gray e marinheiro fiei prepararam-se para defender flanco norte. 0 capitão, o médico e eu aprontamo-nos para qual- quer emergência. Enquanto aguardavam o ataque, os defensores do fortim começaram a examinar os seus fuzis e o capitão pôs-se a andar de um lado para outro, com os lábios contraídos e o aspecto carregado. Alguns momentos se passaram, até que, subitamente, Joyce fez mira e disparou. Era o sinal. Soltando gritos de guerra, urna vaga de piratas saiu da mata e avançou para o lado norte, em direção ao fortim. Simultaneamente, detrás dos árvores recomeçava a fuzilaria. Num instante, sob os disparos de Gray e do cavaleiro, que era o nosso melhor atirador, três homens foram atingidos e um caiu nas proxi- midades do fortim. Entrementes, apesar das perdas sofridas, quatro atacan- tes conseguiram penetrar em nossa trincheira armados até os dentes. Passou-se então a combater a descoberto, o 19
  • 20. que para nós significava o fim. Pressentindo o perigo imi- nente, o capitão ordenou-nos que saíssemos- do fortim e empunhássemos as facas. Obedecemos. Em pouco tem- po, os assaltantes mais encarniçados caíram sob os golpes certeiros de Gray, do capitão e do médico; os outros desa- taram a fugir. Assim, não tardou que, dos atacantes, só restassem cinco estendidos no chão. Voltamos à nossa fortificação. Lá dentro, a fumaça dos disparos já estava meio dissipada e, assim, pudemos ver, ao primeiro relance, que Hunter jazia imóvel diante do sua seteira e que Joyce recebera uma bolo no cabeça. 0 capi- tão estava igualmente ferido. E, de mais a mais, grave- mente, segundo me informou o médico. me pareceu irremediavelmente entregue a si mesmo e ao sabor dos ondas. Abandonando o meu bote, subi para a goleta. Fui, correndo, para a coberto e para o castelo da proa. Uma garrafa vazia com o gargalo quebrado me chamou a atenção: pouco adiante, Israel Hands e o marinheiro cha- mado “Barrete Vermelho” jaziam imóveis, com os rostos brancos como cera. Passei por ele s, fui até o mastro gran- de, arriei a bandeira dos piratas e atirei-o no mar. Entrementes, Israel Hands mexeu-se e, vendo-me, falou- me com voz débil. Antes de mais nada, agradeceu-me por ter matado aquele maldito marinheiro. Durante o resto do dia, os atacantes não deram mais sinal de vida e o tiroteio que vinha da mata parou completa- mente. No fortim, jantamos em silêncio, depois do que o Dr. Livesey nos deixou para ir ter com Ben Gunn. 20
  • 21. Uma vez só, comecei a planejar a minha segunda fuga. Enchi os bolsos de biscoitos, apoderei-me de um par de pistolas e, galgando a paliçada, dirigi-me para uma rocha branca onde sabia que Ben Gunn tinha escondido o seu tosco bote. Ocultei-me à espera de que chegasse a noite e lancei-me à minha provisão de víveres. Por fim, quando a última clari- dade do dia desapareceu, arrastei para o mar o bote e comecei a remar. Impelido pela maré, encontrei-me subitamente diante do navio e num instante as minhas mãos tocaram a amarra, retesado como a corda de um arco. Veio-me então uma idéia luminosa: se cortasse a amarra, a “Espanhola” ficaria à mercê das ondas. Assim fiz. Enquanto com a faca corta- va um a um os fios do cabo, ouvi um som confuso de vozes que vinham do camarote. Cheio de curiosidade, esperei que o navio virasse de bordo, segurei-me a uma corda que pendia do castelo do popa e logo após vi o contramestre Israel Hands e um marinheiro irlandês lutando ferozmente, agarrados à gola um do ou- tro. Horrorizado, deixei-me escorregar pelo amarra e vol- tei, agitadíssimo, a deitar-me no fundo da minha frágil em- barcação. Adormeci. Quando acordei, já era dia. Percebi que navegava na extre- midade sudoeste da ilha do tesouro. Permaneci no fundo do bote e não empunhei os remos: a velocíssima corrente me forçou a dar uma grande volta em torno da ilha e de- pois me levou para junto da “Espanhola”, que me pareceu irremediavelmente entregue a si mesma e ao sabor dos ondas. Abandonando o meu bote, subi para a goleta. Na excitação das últimos manobras, eu havia-me esqueci- 21
  • 22. do de vigiar Hands. Quando me virei de repente, vi que o contramestre tinha o punho erguido e procurava agredir- me. Gritei, corri para o mastro grande, empunhei uma pis- tola e, enquanto Hands se precipitava de novo contra mim, apertei o gatilho. Infelizmente, a arma não detonou, por- que a água do mar umedecera a carga. Irritado, apoiei for- temente a palma das mãos contra o mastro grande e fi- quei no expectativa, com os nervos tensos. Israel veio até junto de mim; consegui fugir-lhe urna, duas, três vezes; mas um balanço do “Espanhola” nos fez cambalear e rolar no chão. Fui o primeiro a levantar-me e, rápido como um. relâmpago, trepei à barra dos velas, onde pude finalmente tomar fôlego. A minha rapidez salvou-me, pois, enquanto eu subia pelo cabo das velas, o punhal de Hands fendia o ar a poucos centímetros abaixo de mim; o pirata ficou boquiaberto, com o rosto voltado para cima, pasmado de assombro e de- cepção. Aproveitando aquela trégua, apressei-me em carregar ou- tra vez as duas pistolas e Hands, que seguia estupefato os meus menores movimentos, começou a compreender que a sorte se virara contra ele ; hesitante, pôs-se todavia a subir lento e penosamente pelos cabos acima, com o pu- nhal entre os dentes. Então, com uma pistola em cada mão, intimei-o a deter- se. Israel Hands parou e disse-me que se rendia. Escutava eu sorridente as suas palavras, quando, inopina- damente, urna coisa qualquer cortou os ares: senti uma dor agudo e vi que estava ferido. A surpresa e a dor fize- ram com que, involuntária e inconscientemente, eu dispa- rasse as duas pistolas e as deixasse escapar dos mãos. Mas não caíram sós, pois, com um grito abafado, o con- 22
  • 23. tramestre se precipitou no mar de cabeça para baixo. Livre de Hands, consegui desencravar de mim o punhal e fui ter rápido à coberta da goleta. Estava só e a maré começava a mudar. Debruçando-me da amurada, vi que ali o mar era pouco profundo. Deixei-me então escorregar vagarosamen- te até à água, que mal me chegava à cintura, e alcancei a praia são e salvo. Caminhando velozmente, cheguei sem demora ao lugar onde encontrara Ben Gunn. Era quase noite e, quando al- cancei o morro, divisei o fortim e uma certa claridade. Con- fiante, fui ao encontro do luz, que me parecia de um ver- melho vivo e que de vez em quando diminuía de intensida- de corno o tição de um braseiro prestes a se apagar. Cheguei à entrada do fortim sem encontrar ninguém e já me preparava para deitar-me, quando um dos meus pés esbarrou no perna de alguém que dormia e que se virou, mas continuou a dormir. Então de repente, ouvi uma voz na escuridão. Era o papa- gaio verde do capitão Silver. Não tive nem tempo de pen- sar. Ao grito agudo do papagaio, os homens que ali esta- vam acordaram e puseram-se de pé, enquanto Silver ber- rava: “Quem está aí?” Eu caíra no ratoeira. Em volta de mim estavam John Long Silver, o papagaio verde e seis piratas‘. Dos meus amigos, nem sinal. 0 velho John foi o primeiro a falar. Mandou colar os seus homens, falou-me do cólera do capitão Smollett pela mi- nha segundo fuga e propôs-me, sem muitos rodeios, que passasse para o seu lado e ficasse com ele . Antes de lhe dor uma resposta categórica, pedi-lhe que me contasse o que acontecera durante a minha ausência. E Long John re- começou a falar. 23
  • 24. Vim então a saber que o Dr. Livesey aparecera no dia ante- rior e, depois de mostrar a Silver que a nossa goleta sumi- ra, lhe propusera uma trégua e entregara o fortim aos pira- tas. Quando acabou de falar, Long John Silver pensava ter- me nas suas mãos. Mas’ logo o desenganei, dizendo-lhe que eu descobrira a sua conspiração, escondido numa barrica, que cortara as amarras da “Espanhola”, fazendo-a ir para o mar alto, e que matara Israel Hands, único sobre- vivente do nosso navio. As minhas palavras enfureceram os piratas. Os marinheiro Tom Morgan desembainhou a sua faca e quis cravá-lo em mim. John Silver deteve-o a tempo. Mas outro marinheiro avançou. Então Silver, agitadíssimo, convidou cada um dos presentes a dor o sua opinião sobre o caso. Falou em nome de todos o segundo marinheiro, que, de olhos baixos, declarou que ninguém queria mais saber do capitão Silver e das suas idéias extravagantes; ‘que, de agora em diante, os marinheiros procederiam por sua pró- pria conto, sem receber ordens de quem quer que fosse. E, seguido dos seus companheiros, deixou o fortim. Eu e Silver ficamos sós. Ele então me chamou e disse-me: “Façamos um trato: eu salvarei você do ira dos meus com- panheiros e você me salvará da cólera do capitão Smollett. Combinado?” Apertei-lhe a mão. Os homens de Silver voltaram pouco depois, tendo à fren- te o mais jovem. Autoritário e decidido, este entregou a Long John um bilhete com o sinal da “mancha negra” e com a seguinte palavra: “Destituído”. As palavras de Jorge Merry, que repetiu as queixas contra Silver, reavivaram a cena de pouco antes. 24
  • 25. Long John Silver leu o bilhete e escutou as palavras do marinheiro. Depois, disse que os seus homens nunca seri- am capazes de descobrir o tesouro sem ele , que a luto era dura mas não estava perdida, que o mapa do tesouro do capitão Flint estava nesse momento em suas mãos e que a sua vitória era certa. Tirou então do bolso o mapa da Ilha do Tesouro, exibiu-o aos marinheiros, que, exultantes, o examinaram avidamen- te. Mais uma vez Long tivera sorte. No dia seguinte de manhã; acordei ao grito: “ó do fortim! Sou o médico!” Silver recebeu cortesmente o Dr. Livesey. Acompanhou-o no longo e cuidadosa visito aos feridos, disse-lhe que eu também estava no fortim e perguntou-lhe se queria ver- me. 0 Dr. Livesey respondeu-lhe que sim. Então Silver pediu-lhe que ficasse do lado de fora do paliça- da: eu ficaria do lado de dentro junto com Sílver. 0 médico aguardava-me impaciente: corri ao seu encontro e o saudei comovido. Apoiado à paliçada, contei-lhe pormenorizadamente tudo quando vira e combinara du- rante a minha ausência. Quando terminei, o Dr. Livesey abra- çou-me enternecido e, chamando Silver, recomendou-lhe que cuidasse bem de mim, pois isto - acrescentou o médi- co - salvaria a vida do velho pirata. Voltamos ao fortim e, após ter comido fartamente, fui com meus carcereiros à conquista do tesouro. Com as mãos amarradas a uma corda presa à cintura, segui docilmente Silver, que levava dois fuzis no bandoleiro, um facão à cinto e uma pistola em cada bolso do paletó. Em volta de mim, todos os marinheiros estavam armados até os dentes. Após uma curta viagem por mar, chegamos à parte es- 25
  • 26. querda do ilha. Os bandidos então se detiveram para descansar e orien- tar-se: um esqueleto humano, amarrado aos pés de um pinheiro, indicou o rumo a seguir. Reiniciamos a caminhada e chegamos ao ponto mais alto do ilha. Os piratas coloca- ram no chão as enxadas e fuzis e se deitaram à sombra das árvores. De repente, no meio da mata, uma voz fina, agudo e trêmulo, entoou um estribilho que os bandidos conheciam muito bem. Todos empalideceram. - Com os diabos, é Flint! - exclamou Merry. A voz ressoou novamente, mas não como um canto e sim como um grito longínquo e frouxo, que o eco repetia fraca- mente. Os piratas tornaram a mostrar-se assustados. Ape- nas Silver conseguiu manter-se calmo e, tranqüilizando seus homens, deu outra vez o sinal de partida. E a voz? Seria capaz de jurar que era de Ben Gunn. Atingimos finalmente a orla do mata onde o tesouro se achava escondido. - Avante, companheiros! - gritou Merry,- e alguns deles logo se puseram a correr. De súbito, vimo-los; parar dez metros adiante. Um grito surdo ressoou. Silver apressou o passo, batendo a muleta no chão como doido: daí a pouco, ele e eu paramos de repente. Diante de nós se abria um grande buraco, que não devia ser recente, a julgar pelas paredes já endurecidas e pela erva que crescia no fundo. Viam-se por ali um cabo quebrado de uma enxada e peda- ços de caixotes espalhados. Não havia dúvida: o esconde- 26
  • 27. rijo fora violado e as setecentas mil libras esterlinas de ouro tinham desaparecido. Os seis homens ficaram como que paralisados de assom- bro. Mas Silver reagiu prontamente: entregou-me uma pis- tola e levou-me para o outro lado do buraco, de modo que este ficou entre nós e os outros cinco marinheiros. Quando se viu do lado oposto do grande fosso, Tom Morgan levan- tou o braço com a clara intenção de disparar. Mas justa- mente nesse momento, três tiros de espingarda partiram da mato: Merry girou sobre si mesmo e caiu morto no fundo do buraco; os seus companheiros trataram logo de fugir e desapareceram num instante. Logo em seguida, o médico, Gray e Ben Gunn apareceram com as espingardas fumegantes e se aproximaram de nós. Estávamos salvos! 0 Dr. Livesey contou-nos então, resumidamente, o que ti- nha acontecido: soubera que Ben Gunn havia descoberto sozinho o tesouro e o desenterrara e transportara paro a gruta que lhe servia de refúgio. 0 médico, durante aquela tarde após o ataque dos piratas, fora ter com Ben Gunn e conseguira que este lhe revelasse o seu segredo. Na ma- nhã seguinte, tendo notado que a goleta desaparecera, pro- curara Silver e lhe entregara o mapa, já agora sem valor. Conversando, chegamos à praia e entramos na gruta de Ben Gunn. Smollett descansava diante de uma fogueira e lá no fundo, frouxamente iluminadas pelo fogo, luziam enor- mes pilhas de moedas e filas de barras de ouro. Era o te- souro do capitão Flint! No dia seguinte bem cedo nos pusemos a trabalhar, pois o transporte de tão grande quantidade de ouro num percur- so de cerca de uma milha por terra e de três por mar até à 27
  • 28. “Espanhola” constituía, para o nosso reduzido grupo, uma tarefa extenuante. 0 trabalho foi executado normalmente. Gray e Ben Gunn faziam o transporte no barco e os res- tantes, durante a sua ausência, amontoavam o ouro no praia. Levamos alguns dias a empilhar o tesouro no porão. E, numa bela manhã, após termos embarcado uma boa pro- visão de água e tudo quanto havíamos solvo do nosso abastecimento de carne de cobra, levantamos âncora, não sem alguma dificuldade, e saímos do baía setentrional. Em menos de meio dia de viagem vimos, com alegria indescritível, desaparecer para sempre no horizonte a mais alta montanha do ilha. A equipagem do goleta era tão reduzida que todos a bordo tinham de fazer trabalho dobrado, exceto o capitão, que dava ordens deitado num colchão; é que, embora conva- lescente, necessitava de repouso. Como não podíamos ar- riscar-nos a uma viagem de regresso sem outros mari- nheiros, dirigimo-nos ao primeiro porto da América espa- nhola, aonde, chegamos extenuados, após termos nave- gado contra o vento. Já o sol se punha, quando ancoramos numa linda baía bem protegida. Fomos então subitamente rodeados de barcos de negros, índios e mestiços, que vendiam frutos e legu- mes. A vista de todos esse s rostos alegres, especialmente dos negros, a perfume dos frutos exóticas e, sobretudo, as luzes que brilhavam, na cidade logo nos fizeram esquecer a. permanência no ilha de sanguinolento memória. 0 médico e o cavaleiro me levaram consigo a passar a 28
  • 29. noite em terra; travamos conhecimento com o coman- dante de uma unidade de guerra inglesa; conversamos com ele , acompanhamo-lo ao seu navio e as horas passaram tão alegremente que já era madrugado quando regressa- mos à “Espanhola”. Ben Gunn estava sozinho na coberta. Vindo ao nosso en- contro, informou-nos que, horas antes, Silver, que embar- cara conosco na goleta, fugira num escaler com ajuda de um marinheiro: assim procedera, para poupar-nos as difi- culdades que indubitavelmente nos acarretaria a perma- nência a bordo “do homem com uma perna só”; mas não fugira de mãos vazias: arrombara um tabique e se apode- rara de um soco de moedas no valor de quatrocentos guinéus, com as quais contava pôr em segurança a sua atormentada existência. Creio que todos ficamos satisfeitíssimos de nos termos li- vrado dele por um preço tão baixo. Enfim, para concluir a minha narrativa, direi que engajamos alguns marinheiros, que fizemos uma tranqüilo viagem de regresso e que a “Espanhola” chegou a Bristol a tempo de interromper os preparativos do Sr. Blanclly, amigo do cava- leiro, para uma eventual expedição de socorro. Da equipagem primitiva só estavam cinco homens. 0 tesouro foi repartido entre todos e cada qual o gostou corno quis. 0 capitão Smollett aposentou-se. Gray, não só economi- zou o dinheiro, mas também, desejoso de melhorar de situação, fez o curso de imediato, posto que passou a ocu- par num belo veleiro, de que se tornou também proprietá- rio. Além disso, casou-se e teve filhos. Ben Gunn recebeu cerca de mil esterlinos e gastou-os em 29
  • 30. dezenove dias; arranjou então um emprego de porteiro e viveu tranqüilamente, tornando-se grande amigo das cri- anças do sua aldeia, de cujas brejeirices era freqüente víti- ma, e também cantor muito apreciado na igreja aos do- mingos e nos dias de festa. De Silver nunca mais tivemos notícias. Esse terrível perneta desapareceu afinal da minha vida. Creio que se reuniu à sua velha negra e que provavelmente viveu feliz com ela e com o famoso papagaio verde. As barras de prata e as armas, pelo que sei, ficaram no lugar em que o capitão Flint as escondeu, e não serei, por certo, eu quem as irá procurar. Nenhuma força conseguirá levar-me de novo àquela ilha maldita. Ainda hoje tenho horríveis pesadelos em que ouço as on- das se quebrarem de encontro às suas costas rochosas e acordo sobressaltado à voz agudo do papagaio verde, que me grito ao ouvido estranhas e incompreensíveis palavras. FIM Copyright © 2000, virtualbooks.com.br Todos os direitos reservados a Editora Virtual Books Online M&M Editores Ltda. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Editora. 30