Esta matéria, Arte na Indústria, foi publicada na revista Tempo Cerâmico, na edição de maio/junho.
Nesta edição "veremos o diferente, com a oportunidade de poder se surpreender positivamente, e presenciar ambientes únicos e criativos... (Kennia Cristina S. de Andrade, Editora de Redação)
Google translation:
This article, Art in Industry, was published in Tempo Cerâmico magazine, in the May / June.
In this issue, "we'll look for different, with the opportunity to surprise positively, and witness unique and creative environments ... (Kenna S. Cristina de Andrade, Editor Editorial)
1. Foto: Matheus da Costa
Arte na indústria
Por Nadia Saad, artista plástica e ceramista
Sou ceramista há mais de trinta anos, fruto de um comen- oportunidade sensorial maior. Elas tinham que crescer. Era
tário nos corredores da faculdade, “Você fala muito com as veemente o chamado. Para prosseguir com meu sonho fui em
mãos”. O meu trabalho é bastante diverso e multifacetado, busca de um forno maior para fazer crescer as esferas.
várias são as vertentes. Em meu ateliê sou mais introspectiva, Apesar de paulistana, razões pessoais e afetivas me leva-
lá ele é impregnado de mistérios provocativos. Adoro criar ram ao estado de Minas Gerais. Bati às portas da Cerâmica
situações onde o resultado instiga a imaginação do obser- Parapuan, situada em Pará de Minas. Imediatamente fui
vador. Muitas vezes, ele, o observador, não se contenta em arrebatada por aquela visão das manilhas e logo mudei meu
apenas olhar, toca furtivamente, às vezes até cheira o trabalho projeto. Interrompi a ideia das esferas enormes para eu
na ânsia de descobrir o que é aquilo. mesma “mergulhar” nas manilhas. A circularidade, o dentro e
Em uma das vertentes de meu trabalho faço esferas onde o o fora, o escuro... Foram os conceitos que as aproximaram das
dentro e o fora se revelam, criando meu próprio universo de esferas, naquela visão estonteante. Iludida assim, dei início a
planetas. Na evolução de meu processo criativo era premente uma nova empreitada. Durante meu processo criativo sempre
que a provocação fosse ampliada. Eu queria que o Observa- estabeleço vários diálogos com a matéria, com o visível e o
dor, literalmente, mergulhasse dentro das esferas; tivesse uma invisível.
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3. No entanto, lá na indústria, no afã de produzir, nem dei
atenção a alguns fatos. As manilhas remetem a um simbolismo
próprio que traduzem combinações subjetivas de sentimentos
e pensamentos de outra instância ao mesmo tempo em que
podem ser associadas a formas existentes na natureza. Se vistas
como colunas, já foram amplamente usadas no decorrer da
história do homem. Sua verticalidade é pungente, a simetria
é absoluta! Também, desconsiderei alguns quesitos técnicos
como o tipo e o ciclo da queima, a qualidade da argila e a forma
como são fabricadas. As manilhas “nascem” para serem tratadas
como manilhas. Eu queria dar a elas o mesmo tratamento que
dava às minhas esferas, queria trilhar os mesmos caminhos.
Diante disso, retrocedi alguns passos e me abri, novamente, ao
desconhecido.
A atração que as manilhas me provocavam era cada vez mais
forte. Perguntei-me: Então, o que fazer? Diante do conflito,
nasceu uma inspiração. A dica era a luz. Iniciei a construção de
luminárias escultóricas, totens. E assim surgiu outra vertente de
meu trabalho, mais recente. Design em cerâmica, voltada para a
arquitetura e também decoração. Aos poucos, os funcionários
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4. Foto: Matheus da Costa
da empresa Cerâmica Parapuan foram se interessando e se apro-
ximando, com muita curiosidade sobre meu trabalho. E nesse
mesmo tempo, ao andar pela fábrica, percebia que aqui e ali
havia alguns trabalhos dos funcionários. Eram bichos realizados
em formas ou modelagem, alguns utilitários como tijelas para
animais, casinhas feitas a partir de tijolos cerâmicos, pequenos
oratórios e cofrinhos para moeda. Tudo muito timidamente
realizado.
O momento crucial foi a notícia do 3º Salão e Congresso
Nacional de Cerâmica de Curitiba-PR. Consultados os donos
da empresa e os funcionários sobre sua participação no Salão,
não houve hesitação. Formou-se o Grupo Parapuan. Desde
então, já foram enviados trabalhos dos funcionários para alguns
salões, como 3º Salão de Curitiba, Bienal Naif de Piracicaba-SP
e Grande Exposição de Arte Bunkyo na Sociedade Brasileira
de Cultura Japonesa em São Paulo. Todo o processo foi uma
surpresa. Não imaginava que seu desdobramento tocaria em
algo para além do meu trabalho e da vida dos funcionários da
fábrica: O Projeto Parapuan – Arte na Indústria. Um projeto de
inclusão social.
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5. Foto: Matheus da Costa
Ouvi depoimentos espontâneos de funcionários da empresa e esculturas belíssimas em manilhas e tijolos. O que mais me
Parapuan ao se depararem com o resultado do processo criativo fascina é como o olhar efervescente de um imaginário estimu-
no qual eles se engajaram, por conta do projeto: “- Puxa, quanta lado é capaz de transformar um objeto projetado para ficar na
coisa! Tantos anos aqui e nunca pensei que isso fosse possível!” “- Se horizontal, enterrado, no escuro, úmido, esquecido, revelar sua
não fosse por você, tudo isso ficaria escondido aqui dentro.” Nesse nobreza e dignidade, antes invisíveis; e tudo por causa de um
período chegou-me às mãos a frase de Yoko Ono e que Raul sonho, a busca de um forno maior, as manilhas foram trazidas
Seixas também cantou: “Um sonho sonhado por um é só um sonho à tona e iluminadas. Como diz Manoel de Barros: “... que a
que se sonha só; um sonho sonhado por muitos é REALIDADE.” importância de uma coisa não se mede com fita métrica, nem com
Caiu como uma luva. Passou-se o tempo e atualmente os alunos balanças nem barômetros, etc… Que a importância de uma coisa
e instrutores da Escola de Artes da Secretaria de Cultura de Pará há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós.”
de Minas, também se juntaram ao Grupo Parapuan. São recebi- Gramática expositiva do chão: poesia quase toda.
dos pelos funcionários, que além de orientá-los, conjuntamente Esse envolvimento da “Arte na Indústria” está produzindo
desenvolvem trabalhos criativos e que surpreendem o observa- uma leva muito interessante de produtos que podem receber
dor. Assim nasceu o Projeto Parapuan Arte na Indústria e, agora água, ficar ao ar livre, receber luz, como os protótipos que de-
que transpuseram os muros da empresa e os limites da cidade, senvolvi. Eu e os outros participantes do Projeto Parapuan nos
o projeto ampliou suas fronteiras. Projeto Parapuan, Arte na dispomos a desenvolver projetos de criação de outros artistas,
Indústria: Para Além do Trabalho. designers e profissionais da área de criação, tendo como suporte
Recentemente fomos convidados a participar da 23ª Feira as manilhas e os tijolos produzidos pela Cerâmica Parapuan.
de Cerâmica de Belo Horizonte, realizada nos dias 29 e 30 de Esperando que, em breve, possamos trocar algumas ideias,
abril e 1º de maio. Os trabalhos de todos, alunos, funcionários e gostaria de finalizar com palavras de meu Mestre Megumi
os meus, fizeram sucesso. O Projeto ganhou visibilidade e todos Yuasa “O artista é um agente da fé, pois ele faz o que não vê porque
estão mais motivados a criar e desenvolver objetos de design acredita que está lá.”
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