1. Matéria Swing | Pós-Graduação em Produção e Gestão Jornalística | Senac Lapa Scipião
A regra é clara no swing paulistano
Depoimentos de quem conhece o universo da troca de casais comprovam que tudo tem
limite
Na definição do dicionário britânico Cambridge, swinger pode ser uma pessoa que age e se
veste elegantemente ou alguém que deseja fazer sexo com várias pessoas
constantemente. No cenário paulistano atual, o swing significa sexo grupal com elegância e
discrição, porém é uma prática liberal permeada por regras e, por mais que soe
contraditório, alguns tabus.
“Há muito respeito, mas, no fim das contas, é uma p... organizada”, afirma Elvis*, 34 anos,
frequentador assíduo de uma das casas swingueiras de São Paulo. No conforto de seu
roupão, ele diz que já visitou casas do Brasil inteiro e que, hoje em dia, com a internet, o
swing está mais acessível àqueles que temem ser reconhecidos num clube ou festa
swinger.
Apesar da maior facilidade, os encontros marcados virtualmente podem se transformar
numa farsa. Segundo Ramón, 31 anos, “pode-se passar dias conhecendo um casal na
internet, combinar um encontro, chegar na hora e descobrir que é um homem, sem
mulher, sem casal. Sem contar ainda que você pode sofrer um assalto ou algo pior”.
Dentro da maioria das casas, as regras são claras: toda e qualquer ação só é permitida com
o consentimento do casal ou das pessoas envolvidas. “Se tem um casal se pegando e você
quer interagir, tocar, tem que ir com as costas da mão, nunca a palma”, explica Elvis.
Mesmo que o casal se mostre receptivo, jamais é permitido que o espectador, e possível
participante do ato, pule etapas de aproximação.
Homens VS Mulheres Apesar de homens desacompanhados pagarem caro para entrar nas
casas, eles são em maior número em grande parte dos clubes. Já mulheres sozinhas, muitas
vezes, chegam a ter entrada gratuita e, ainda assim, são minoria. “Elas (mulheres sozinhas)
também vão, mas são pessoas bem específicas em relação ao seu gosto sexual. Muitas
mulheres vão para satisfazer a fantasia do parceiro”, afirma o médico sexólogo Theo
Lerner.
Ainda segundo Lerner “A mulher depende de contexto. Ela deve ter uns 400 óvulos pra
vida inteira. Cada óvulo é precioso e gera preocupação se for fecundado. São, pelo menos,
cinco anos de compromisso. Então, a mulher avalia muito mais as condições para se excitar
por todo o resto. Já o homem tem 300 milhões de gametas a cada três dias. Tem material
genético pra jogar fora. A cada oportunidade visual, ele já tem uma resposta mais rápida.
Ele olha, ele pode.”
Além do fator biológico, o homem tem mais permissão da sociedade para expor suas
fantasias e praticá-las. “Estamos inseridos numa sociedade em que prevalece o amor
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romântico, fidelidade, vinculação do sexo ao amor e ao compromisso. Todas essas
fundações estão presentes na nossa sociedade e, de uma maneira muito mais forte, no
universo feminino, ainda que a liberação feminina venha acontecendo”, diz o sexólogo.
Mesmo levando em conta as regras, contratos e tabus de um universo, supostamente,
libertário e libertino, “o questionamento das formas de poder e organização social por
meio da relação sexual sempre pega, sempre funciona”, conclui Lerner.
*Os nomes foram trocados para preservar a identidade dos entrevistados
ENTREVISTA
Reinaldo, proprietário de uma das casas de swing de São Paulo, explicou melhor pra gente
como funciona esse mundo. Confira:
O maior movimento é no fim de semana mesmo?
É. Na quinta-feira, hoje, por exemplo, é a segunda vez que tô abrindo de tarde. A primeira vez que
abri numa quarta-feira à tarde, veio um homem sozinho e ficou escutando Queen. Eu queria mudar
o Queen e ele “Não!” e me pediu uma dose de whisky. Eu pensei “Esse cara vai dar um tiro na
cabeça”. Aí, eu fiquei preocupadíssimo. Ele punha o roupão, ia pra sauna, voltava e escutava o
Queen. “Posso mudar?”, aí “Não, não, eu to adorando”.
A mesma música?
É. Daí, eu pensei “Acho que não vou abrir mais...”. Na semana seguinte, já chegou gente. Na outra,
melhorou. Aí, foi melhorando, eu falei “Graças a Deus!”. Então, agora, já tá um movimento normal
de quarta-feira à tarde.
Anteriormente, você tinha dito que é um público diferente. Como é diferente?
O pessoal que vem à noite, já são casais e conseguem em casa resolver esse problema. Falam que
vão em algum lugar, que vão sair. E tem o outro tipo de gente que, de repente, é um rapaz que tá
saindo com alguma moça e tão vindo os dois juntos aqui pra interagir com o povo. A grande
maioria são casais casados que querem conhecer outros casados. O pessoal que vem à tarde,
normalmente, é quem tá dando um “perdido”. O cara sai do trabalho, às vezes vem com a
secretária dele aqui. Ou, às vezes, ele é casado, vem sozinho porque não pode sair à noite. Então
ele fica até umas 20h, 21h e depois vai embora. Tem mulher sozinha também que fica até umas
20h. É um negócio muito sério, a gente não pode comentar nada. Por exemplo, tem pessoas aqui
do bairro que já me conhecem. Eu só cumprimento a pessoa se ele me cumprimentar porque, às
vezes, ele veio pra cá mas ninguém sabia que ele tava aqui. É como, mais ou menos, um Alcoólicos
Anônimos. O que acontece aqui fica entre nós e acabou. Uma vez, eu cumprimentei um cara e ele
ficou bravo comigo. Aqui na região, tiveram muitos problemas pra abrir a casa, o pessoal não sabia
o que era aqui. Ainda é difícil...
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Existe um certo preconceito?
É, mas, a maior atitude que eu tive aqui foi não tomar atitude com ninguém. Eles tiveram atitude
comigo: uns fecharam corrente, estacionava na frente pra sacanear, risco em carro de cliente... Foi
uma série de coisas que aconteceu e hoje acontece menos, tem um ou outro que ainda combate a
nossa casa. Mas já tenho uma amizade boa com o pessoal do bar ali, da lanchonete. Agora me
procuram pra fazer uma parceria com eles. É interessante o mundo. Muda tudo.
E as pessoas que vêm à tarde, é como se fizesse parte do expediente o tempo que estão aqui...
Exatamente. Por isso que eu tenho que ter muito profissionalismo e não comunicar nada. No
público tem vários tipos de pessoas. Ontem, por exemplo, tinha executivo aqui. Você já vê pelo
carro que o cara chega. Chega de terno, todo arrumado e, de repente, o que ele quer mais é tirar a
roupa e ficar pelado. Então, a pessoa se transforma aqui. Tudo que ele queria fazer, ele faz aqui e
não tem problema.
Tipo uma libertação?
É, mas tem os estatutos aqui. Existem várias normas e eu até parei de ter segurança aqui dentro
por causa disso.
Como que são essas normas?
Ninguém pode encostar em ninguém. A pessoa tem que sentir que pode. Ninguém é obrigado a
fazer nada aqui na casa. Tem gente que vem aqui pra só pra se encontrar porque a tribo deles é
essa. Gente mais velha que vem se encontrar pra ficar batendo papo e tomar uma cerveja. Vem
aqui e não faz nada. De repente, ele sobe lá pra dar uma olhada no que tá acontecendo e tal, daí
quer ver o show erótico de sábado, dançar... É como se estivesse num clube mesmo, é interessante.
É o clube deles.
É o lazer deles.
É o lazer deles e aqui eles acham que o ambiente é familiar. Se sentem em casa porque muitos
deles querem fazer isso mas são mais velhos. E, como eles são mais velhos, a maior parte das
outras casas por aí é balada liberal, é um pessoal mais jovem que não tem a ver com eles.
Balada liberal e swing dá na mesma?
Não. Balada liberal tem pouca interação e tem mais bebida, drogas, dançar, fazer estripulias, mas o
que falam “brincar”, eles não “brincam” tanto quanto o pessoal que vem aqui. Aqui o pessoal vem
pra se tocar mesmo, não tem esse negócio de ficar se exibindo muito. Tem um ou outro que se
exibe, mas não é tanto assim. Balada liberal é muita exibição. Eu acho que é o que acontece hoje no
mundo: fala-se tanto de sexo e nunca vi praticar tão pouco. E todo mundo tem problema sexual,
impressionante. Não que antigamente não tivesse...
Você tinha dito que não tem mais segurança dentro da casa. Por quê?
Um segurança fazendo a segurança de um lugar em que todo mundo tá lá “se pegando”, tá indo
toda hora lá, corre o risco de tá incomodando.
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Atravessando limites?
Atravessa o limite. E o cara fica meio excitado. Então, por duas vezes deu problema, então eu
prefiro evitar. Todo mundo já sabe como são as leis aqui, tá tudo explicado no site. Se quiser saber
como funciona, é só falar comigo. Se tiver alguma pessoa incomodando, é só avisar que eu tenho
um segurança aqui na rua. Isso raramente acontece. Se aconteceu por duas vezes ou três, foi
muito. Normalmente, eu vou lá em cima, converso com as pessoas pra não ter problema nenhum.
O que não é permitido de jeito nenhum?
Não é permitido, por exemplo, se eu estiver com a minha mulher e você entrar aqui no meio e
achar que ela vai ficar com você. Sempre tem um sinal que dão antes, então não é que o cara tá lá
com a mulher e o outro acha que pode entrar no meio, sem mais nem menos. Tem uns avisos, eles
conversam bastante. É uma coisa interessante, apesar de nem eu e nem minha mulher sermos
swingers.
É, eu ia perguntar isso. Não?
Não.
Mas já foi alguma vez? Nunca participou?
Não e acho que é até bom para o negócio. Porque não fico querendo interagir com as pessoas. É a
mesma coisa que o dono do bar ser alcoólatra. Ele ia beber o bar. Então se, por exemplo, eu fosse
uma pessoa viciada em sexo, eu ia, de repente, querer começar a entrar no meio. De repente, meus
funcionários também iam achar que deveriam entrar no meio e aí vira uma bagunça. Só entro nas
salas pra ver se tem copo no chão, alguma droga rolando. Não sei se você já reparou, mas eu fico
pra lá e pra cá. Então, tô sempre muito atento e muito preocupado com isso. À partir do momento
que você começa a ter movimento, sempre existe uma concorrência e gente querendo atrapalhar
você.
Como vocês tiveram a ideia? Já tinham uma casa antes dessa?
O irmão da minha esposa tinha uma sauna gay há 17 anos. Na época fez muito sucesso. Depois teve
aquela campanha contra AIDS e começou a ter alguns problemas. Aí, criaram o swing mas não
acabaram com o gay. À tarde era gay e à noite era swing. Quando ele faleceu, deixou a casa pras
duas irmãs. Eu não queria me envolver, acompanhava de longe, tinha minha ocupação, meu
trabalho. No começo do ano passado que mudamos pra cá, reformamos a casa e tentamos o gay,
mas não funcionou. Aí, ela (esposa) resolveu botar o swing. Até acertar a equipe, demorou uns oito
meses. Agora tem uma equipe formada, cada dia tem o pessoal certo no seu trabalho. Caiu no meu
colo e caiu no colo dela. Nós tocamos a casa e parece que o povo tá gostando.
Essa equipe é formada por quem?
No momento, tenho dois barmen, uma faxineira, um manobrista, um segurança na rua, uma
menina no caixa, um DJ e eu. No sábado, que é dia de casais, tem um casal também que faz show.
É com sexo explícito ou não?
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Não, não tem sexo explícito porque o pessoal não gosta. É um show erótico. Um casal, homem e
uma mulher, pra agradar homens e mulheres. Eles interagem com o pessoal que tá na mesa. Então,
é tudo sem chegar diretamente ao assunto.
E, por exemplo, um casal ou pessoas vão fazer sexo em algum cômodo. Aí tem alguma regra
sobre usar preservativo?
Todo mundo usa preservativo.
Nem precisa pôr na parede escrito?
Nem precisa, é regra da casa. Eu tenho uma caixa, um saco de preservativo. Todo mundo usa e tem
um monte de preservativo espalhado pela casa.