Este documento resume um estudo sobre a produção de tijolos reforçados com fibras naturais para reduzir custos. O estudo desenvolveu tijolos misturando argila, fibras de curauá e tronco de coqueiro, e cimento, prensados manualmente. Os tijolos apresentaram resistência mecânica compatível com normas e maior deformação do que a argila pura. A adição de cimento e fibras melhorou a resistência à água, tornando o material uma alternativa viável para construção habitacional de baixa renda.
Art rc cs na composição de tijolos de solo-cimento. ferraz (2004)
17cbecimat 114-011
1. 17º CBECIMat - Congresso Brasileiro de Engenharia e Ciência dos Materiais, 15 a 19 de Novembro de 2006, Foz do Iguaçu, PR, Brasil.
PRODUÇÃO DE TIJOLOS REFORÇADOS COM FIBRAS NATURAIS
W. Acchar1,2 and Jorge Bouth2
1
Departamento de Física-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 59072-
970, Natal-RN, e-mail:acchar@dfte.ufrn.br
2
Programa de Pós-Graduação em Engenharia Mecânica -UFRN
RESUMO
O objetivo desse trabalho é desenvolver tijolos de baixo custo. As
construções, hoje em dia, utilizam na sua estrutura básica, tijolos argilosos
queimados em temperaturas da ordem de 800 – 900 °C. Esse componente
essencial na construção residencial onera o custo da obra e inviabiliza o seu uso
para camadas da população de mais baixa renda. Vários estudos estão sendo
realizados com o objetivo de encontrar e desenvolver materiais alternativos e de
baixo custo. Esse trabalho apresenta resultados do desenvolvimento de um tijolo
de baixo custo e reforçados com fibras naturais e que tem como grande
aplicação à recuperação de moradias, especialmente destinadas ao segmento
de baixa renda, os quais usam papelão e outros materiais como elementos
estruturais. Os tijolos obtidos apresentaram valores de resistência mecânica
compatíveis com o processo e tem como grande destaque à não necessidade
de queima, que é o processo mais dispendioso na produção de tijolos.
Palavras-chave: tijolos alternativos, cerâmica vermelha, fibras naturais
INTRODUÇÃO
A fabricação de tijolos de cerâmica vermelha é uma técnica bastante
tradicional. Embora esse seja um processo bastante difundido, a etapa de
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queima desse tipo de material encarece o produto e tornando-o inacessível para
as camadas menos favorecidas da população. As vezes são utilizadas folhas de
laminados de madeira e papelão na construção de barracos que servem de
abrigo a famílias inteiras, sem nenhuma condição de higiene e nem de
segurança. Além disso, a utilização de vegetação nativa para a produção de
lenha e posterior queima nas indústrias se constitui num grande problema
ambiental, principalmente na região nordeste. Uma técnica de produção de um
novo tipo de tijolo simples (adobe), obtido sem a necessidade da etapa da
queima, é caracterizado por possuir baixo custo e não produzir danos
ambientais pode ser uma nova viável alternativa para diminuir o custo desse
componente na construção civil e conseqüentemente na construção de casas
populares. A terra crua, por ser um material de grande disponibilidade e baixo
custo, vem se mostrando como uma excelente alternativa técnica e econômica
para uso em construções rurais, principalmente sob a forma de tijolos prensados
e não queimados. Sua utilização em conjunto com aditivos químicos e outros
materiais tais como cimento, cal, silicato de sódio, cinzas volantes, etc vem
(1-7)
sendo objeto de estudo de inúmeras pesquisas . Várias técnicas foram
utilizadas para conferir um melhor comportamento do solo ao intemperismo,
podendo-se citar o uso de asfalto, cal, palha e diversas outras fibras vegetais,
excremento de gado, melaço, goma rábica e resinas diversas(8).
Estudo realizado na UNICAMP mostra o uso da fibra de curauá, material
proveniente da região amazônica e pertencente à família das bromeliáceas,
como elemento de reforço em compósitos poliméricos(9). Trabalho recente
publicado na literatura mostra o uso benéfico da fibra de coco na engenharia civil
na fabricação de compósitos reforçados e também a utilização do pó de fibra da
casca do coco como agregado na composição de tijolos de solo-cimento(10).
Tijolos solo-cimento prensados com alta pressão, sem queima, tem sido também
objetivo de estudo de alguns trabalhos, mostrando um bom potencial de
utilização(11-15). Essa técnica tem a vantagem de utilizar as matérias-primas
locais, eliminando assim o custo do transporte, e diminuindo o custo final da
fabricação dos tijolos.
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Nesse trabalho são discutidos os resultados de resistência mecânica
obtidos para tijolos do tipo adobe processados com argila, fibras vegetais
naturais e cimento, produzidas através de um processo eminentemente
artesanal.
PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL
As matérias-primas utilizadas neste trabalho foi uma argila coletada
diretamente de uma indústria cerâmica do município de parelhas, da região do
Seridó, Rio Grande do Norte e passada em peneira de 60 mesh, fibras naturais
de curauá e de tronco do coqueiro e cimento (Portland composto CO II-Z). Os
corpos de prova foram conformados numa matriz de madeira através de
prensagem manual de maneira bem simples e artesanal, visando representar a
realidade de uma comunidade carente. A argila utilizada foi caracterizada
através de difração de raios X no difratômetro de raios X (XRD-600 Shimadzu) e
fluorescência de raios X (Philips, modelo PW-2400-00). A introdução de fibras foi
realizada de forma bastante aleatória, procurando-se sempre adicionar
quantidades idênticas de material, que foi função principalmente da geometria
da amostra prensada. Os corpos de prova foram secos ao ar durante várias
horas após a prensagem, e submetidos aos ensaios de resistência mecânica de
flexão em três pontos (Zwick/Roell Z 2.5) segundo a norma NBR 6462 da ABNT.
Foram realizados também testes de resistência mecânica após a imersão por 24
horas em água e tinham como finalidade verificar a resistência das amostras
quando submetidas em água. Análises nas superfícies de fratura foram
realizadas em microscópio eletrônico de varredura (Shimadzu SSX-550
Superscan).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A tabela I mostra a composição da argila utilizada no trabalho. Pode-se
notar que a argila apresenta uma composição típica de materiais argilosos, ou
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seja, é composta basicamente por sílica e alumina e contém alto teor de ferro e
metais alcalinos (MgO,Na2O e K2O), com teores minoritários de outros
componentes. A tabela II sintetiza os valores encontrados de resistência
mecânica e de deformação para todos os materiais investigados nesse estudo.
Pode-se notar que a introdução do cimento e das fibras de curauá e de tronco
de coqueiro proporcionou uma melhoria significativa da resistência mecânica em
comparação a argila pura. Os materiais com adições de fibras vegetais e de
cimento apresentam valores de resistência mecânica compatíveis com a norma
(16)
para o uso em tijolos de alvenaria (tabela II) . Com relação à deformação, os
resultados mostram que a adição de fibras vegetais (curauá e do tronco de
coqueiro) proporcionou um aumento bastante expressivo da deformação destes
materiais. Análises de fratura mostram que o material com adição de fibras
vegetais, contrariamente ao de argila pura, não se rompe após o ensaio de
fratura. Os corpos de prova se mantêm unidos, mantendo sua integridade física,
conforme mostrado na figura 1.
Tabela I – Composição em porcentagem em peso da argila utilizada.
SiO2 TiO2 Al2O3 Fe2O3 MnO MgO CaO Na2O K2O P2O5 Cr2O3 Total
47,56 1 19,4 8,58 0,11 2,77 1,26 1,29 2,87 0,12 0,04 99,33
Tabela II – Comparação dos valores de resistência mecânica
e deformação dos materiais investigados neste trabalho.
Materiais Tensão de fratura Deformação
[MPa] [%]
Argila pura 1.57 – 1.67 0.52 – 0.89
Argila com cimento 2.17 – 2.29 0.56 – 1.33
Argila com fibra de curauá e do 1.95 – 2.57 5.67 – 11.4
tronco do coqueiro
Argila com cimento e fibras de curauá 1.44 – 2.15 3.28 – 6.82
e do tronco de coqueiro
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Os resultados obtidos evidenciam que tijolos de adobe misturados com
fibra de curauá e de tronco com cimento podem ser uma alternativa viável para a
população de baixa renda, visto que os valores obtidos são compatíveis aos
exigidos pela norma para tijolos de alvenaria (2 MPa), conforme mostrado na
tabela III.
Tabela III – Valores normalizados de tensão de fratura em flexão(16).
Especificação Tensão de
fratura [MPa]
Tijolos de alvenaria 2.0
Tijolos furados 5.5
a)
b)
Figura 1 – Superfície de fratura dos corpos de prova:
a) argila pura b) argila com cimento e fibras vegetais.
A tabela IV mostra os valores de resistência mecânica obtidos para os
materiais com cimento e com cimento e fibras vegetais após a imersão em a
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água. Pode-se destacar que os materiais sem adição de cimento se dissolveram
em água, o que é natural em materiais argilosos sem queima. Pode-se concluir,
portanto, que a adição do cimento desempenha aqui um papel fundamental na
integridade física dos corpos de prova. Esse comportamento nos permite
concluir que materiais sem cimento não poderiam, portanto, serem utilizados em
regiões onde ocorram chuvas intensas, pois estes perderiam sua forma a função
mecânica.
Tabela IV – Valores de resistência após imersão em água.
Material Tensão de fratura Deformação
[MPa] [%]
Argila com cimento e 0.56 – 0.63 0.7 – 2.82
fibras
Argila com cimento 1.35 – 1.75 0.56 – 1.30
Os materiais com cimento e fibras vegetais apesar de apresentarem
perdas em sua resistência e deformação, mantém ainda valores de resistência
adequados e também a característica de não se separarem fisicamente,
mantendo-se as partes unidas após o ensaio de resistência mecânica (figura 2).
Cabe-se notar que a imersão dos corpos de prova durante 24 horas em água
não reflete uma realidade da região nordeste, onde os períodos intensos de
chuva intermitentes não são constantes, como em outras regiões (Sudeste e
Sul).
Figura 2 – Amostras de argila com cimento e
fibras vegetais após imersão em água.
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As figuras 3 e 4 mostram as superfícies de fratura dos corpos de argila
pura e argila com cimento, respectivamente. Pode-se notar claramente que a
adição de cimento proporcionou o preenchimento dos poros, apresentando o
material co cimento uma maior densificação em comparação ao material de
argila pura.
Figure 3 - Superfície de fratura da argila.
Figura 4 – Superfície de fratura da argila com cimento.
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CONCLUSÕES
Com base nos resultados obtidos e apresentados neste trabalho, pode-se
concluir que:
a) A introdução de fibras naturais de curauá e do tronco de coqueiro produziu
um aumento de resistência mecânica da argila pura.
b) A presença do cimento mostrou ser benéfica para a resistência mecânica dos
corpos de prova.
c) A integridade do material é evidenciada nos materiais com adição de cimento.
d) Os resultados obtidos mostraram a viabilidade tecnológica da obtenção de
tijolos de adobe misturados com outros materiais (fibras vegetais e cimento) com
resistência adequada para a construção civil de moradias popular.
REFERÊNCIAS
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9. 17º CBECIMat - Congresso Brasileiro de Engenharia e Ciência dos Materiais, 15 a 19 de Novembro de 2006, Foz do Iguaçu, PR, Brasil.
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[16] SOUZA, P.S. Ciência e Tecnologia de Argilas. 2ª edição revisada e
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