Este poema celebra as mulheres da geração do autor, nascidas entre as décadas de 1960 e 1970. Ele as descreve como belas, maduras, independentes e sedutoras, fruto da revolução sexual e do feminismo. Também destaca seu estilo, paixão por política e música, e capacidade de serem companheiras amorosas e acolhedoras.
1. AS MULHERES DA MINHA
GERAÇÃO
(Santiago Gâmboa - escritor colombiano)
Hoje têm cinquenta e muitos anos, inclusive sessenta e tal,
e são belas, muito belas,
porém também serenas, compreensivas, sensatas e sobretudo
diabòlicamente sedutoras,
isto, apesar dos seus incipientes pés-de-galinha ou desta afetuosa
celulite que capitaneiam as suas coxas, mas que as fazem tão humanas,
tão reais.
2. Formosamente reais.
Quase todas, hoje, estão
casadas ou divorciadas, ou
divorciadas e casadas, com a
intenção de não se equivocar
no segundo intento,
que às vezes é um modo de se
acercar do terceiro e do quarto
intento.
Que importa?
Outras, ainda que poucas,
mantêm um pertinaz
celibatarismo, protegendo-o
como uma fortaleza sitiada
que, de qualquer modo,
de vez em quando abre as suas
portas a algum visitante.
3. Que belas são, por Deus, as
mulheres da minha geração!
Nascidas sob a era de Aquário,
com influência da música dos
Beatles, de Bob Dylan, de Lou
Reed,
do melhor cinema de Kubrick e
do início do boom latino-
americano, são seres
excepcionais.
Herdeiras da revolução sexual
da década de 60 e das
correntes feministas,
elas souberam combinar
liberdade com coqueteria,
emancipação com paixão,
reivindicação com sedução.
4. Jamais viram no homem um inimigo,
apesar de lhe cantarem algumas verdades, pois compreenderam
que a sua emancipação era algo mais do que pôr o homem a
lavar a louça .
São maravilhosas e têm estilo,
mesmo quando nos fazem sofrer, quando nos enganam ou nos
deixam.
5. Usaram saias indianas aos 18 anos, se enfeitaram com colares
andinos,
se cobriram com suéteres de lã e perderam a sua parecença com
Maria, a Virgem, numa noite de sexta-feira ou de sábado,
depois de dançar El Raton com algum amigo que lhes falou de
Kafka, de Neruda e do cinema de Bergman.
6. Falaram com paixão de política e
quiseram mudar o mundo,
beberam rum cubano
e aprenderam de cor as canções
de Sílvio Rodriguez e de Pablo
Milanez,
conhecerem os sítios
arqueológicos, foram com seus
namorados às praias,
dormindo em barracas e se
deixando picar pelos mosquitos,
porque adoravam a liberdade
e, sobretudo, juraram nos amar
por toda a vida, algo que sem
dúvida fizeram
e que hoje continuam
a fazer na sua formosa e sedutora
madureza.
7. No fundo das suas mochilas
traziam pacotes de rouge,
livros de Simone de
Beauvoir e fitas de Victor
Jara, e, ao nos deixar,
quando não havia mais
remédio senão nos deixar,
nos dedicavam aquela
canção, que é ao mesmo
tempo um clássico do
jornalismo e do despeito,
que se chama
“Seu amor é um jornal de
ontem".
8. Souberam ser, apesar de sua beleza, rainhas bem
educadas, pouco caprichosas ou egoístas.
Deusas com sangue humano.
O tipo de mulher que, quando lhe abrem a porta do carro para
que suba,
se inclina sobre o assento e, por sua vez, abre a do seu
companheiro por
dentro.
9. A que recebe um amigo que
sofre às quatro da manhã, ainda
que seja seu ex-noivo,
porque são maravilhosas e
têm estilo,
ainda que nos façam sofrer,
quando nos enganam, ou nos
deixam,
pois o seu sangue não é
suficientemente gelado para
não nos escutar nessa
salvadora e última noite,
na qual estão dispostas a
nos servir o oitavo uísque e a
colocar,
pela sexta
vez, aquela melodia de Santana.
10. Por isso, para nós que nascemos entre as décadas de 40 e 60,
o dia da mulher é, na verdade, todos os dias do ano,
cada um dos dias com suas noites e seus amanheceres,
que são mais belos, como diz o bolero, quando está você.
Que belas são, por Deus, as mulheres da minha geração!
Música:
Woodstock - California Dreamers
Montagem:
maricarusocunha@pranos.com.br Abraços
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