Saúde Mental (3). a historia do doente mental no mundo
Arte, loucura e literatura na história da psiquiatria
1. Poesia, arte e loucura
Profa. Dra. Renata Moreira
Semana de Letras - FACISABH
2. O que é loucura?
Um estado alterado
da mente humana
– perene ou
transitório – que
leva a delírios e
pensamentos
alheios ao que a
sociedade entende
por “normal”.
3. Na história...
• Sócrates enumera quatro tipos de
loucura:
- A loucura profética, emblematizada pelos
oráculos;
- A loucura ritual, a qual se chega por meio
de danças e ritos;
- A loucura amorosa, causada por Afrodite;
- A loucura poética, conduzida pelas
musas.
4. • Importa dizer que o discurso do louco
sempre foi visto como proscrito ou
cheio de verdade. Oscilava-se em
atribuir-lhe total desrazão e perceber
nele ditos proféticos. Dessa maneira, o
louco ou é não-lúcido e, por isso, tem
sua fala desvalorizada OU é visto como
aquele que vê o que ninguém mais vê,
sendo também isolado, visto que é
diferente do restante dos homens.
5. • Foi Philippe Pinel, na
passagem do século XVIII
para o XIX, o médico
responsável por dissociar
a loucura do caráter. É
considerado o pai da
Psiquiatria.
• Até então os loucos eram
tratados com
agressividade. Passaram,
então, a serem
considerados doentes e
começou-se a administrar
tratamentos diversos na
tentativa de minorar os
males mentais.
6. • Já no século XX, Michel Foucault
debruçou-se sobre o estudo da loucura.
Preocupado com a crítica às instituições
sociais, volta, costumeiramente, seus
argumentos contra a Psiquiatria, a
Medicina e as Prisões – temas facilmente
relacionáveis ao universo da loucura.
• São dele os livros: Doença mental e
Psicologia; História da Loucura na Idade
Clássica; Nascimento da clínica; O poder
psiquiátrico, entre outros.
7. • Segundo Foucault, os loucos
possuem um “discurso que não
pode circular como o dos
outros: pode ocorrer que sua
palavra seja considerada nula e
não seja acolhida, não tendo
verdade, nem importância, não
podendo testemunhar na
justiça, não podendo autenticar
um ato ou um contrato, não
podendo, nem mesmo, no
sacrifício da missa, permitir a
transubstanciação e fazer do
pão um corpo; pode ocorrer
também, em contrapartida, que
se lhe atribua, por oposição a
todas as outras, estranhos
poderes, o de dizer uma
verdade escondida, o de
pronunciar o futuro, o de
enxergar com toda ingenuidade
aquilo que a sabedoria dos
outros não pode perceber” (A
ordem do discurso, 1970).
8. Loucos na literatura
• O Parvo (Gil Vicente)
• Ismália (A. de
Guimarães)
• Quincas Borba
(Machado de Assis)
• O louco do Cati
(Dyonelio Machado)
• Simão Bacamarte d’O
Alienista (Machado
de Assis), entre
outros.
9. Doido (de Carlos Drummond de
Andrade)
O doido passeia
pela cidade sua loucura mansa.
É reconhecido seu direito
à loucura. Sua profissão.
Entra e come onde quer. Há níqueis
reservados para ele em toda casa.
Torna-se o doido municipal,
respeitável como o juiz, o coletor,
os negociantes, o vigário.
O doido é sagrado. Mas se endoida
de jogar pedra, vai preso no cubículo
mais tétrico e lodoso da cadeia.
10. Alguns diagnósticos de
personagens reais...
• Van Gogh (transtorno
bipolar);
• John Nash (Uma
mente brilhante –
esquizofrenia
paranoide);
• Edgar Allan Poe
(maníaco-depressivo)
• Newton (tendências
psicóticas)
11. • Uma importante mudança na forma de
encarar a loucura é que, se antes ela era
vista como questão pessoal e familiar, no
século XX, ela passa a ser uma questão
pública de saúde, exigindo do governo
atitudes para diminuir o impacto dos
considerados loucos na própria vida e na
sociedade. A resposta governamental,
boa parte das vezes, dá-se pela
segregação – o louco ocupando um lugar
na instituição manicomial.
12. Hospitais psiquiátricos
(manicômios, hospícios...)
• Para onde se enviavam
os loucos, esses
hospitais ofereciam os
tratamentos à época
considerados adequados:
lobotomia, eletrochoque,
insulinoterapia, camisas-
de-força, quartos-fortes...
13. A antipsiquiatria e a humanização
terapêutica
• O movimento antimanicomial e a
antipsiquiatria agiram no sentido de rever
os tratamentos destinados aos doentes.
• Em 1944, Nise da Silveira, psiquiatra em
luta contra os tratamentos oferecidos
pelos hospícios e que fora aluna de Jung,
começa um trabalho de terapia
ocupacional e de humanização do contato
com os pacientes.
14. Museu das Imagens do
Inconsciente
• Do trabalho originado
nos ateliês de pintura
e modelagem
alocados no “Centro
Psiquiátrico Nacional
Pedro II” nasce, em
1952, o Museu das
Imagens do
Inconsciente.
15. Estudos de caso
• Bispo do Rosário
• Stela do Patrocínio
• Maura Lopes
Cançado
17. • Vítima de um delírio em que falava com
Deus e este o escolhia para reconstruir
o mundo e apresentar no dia do Juízo
Final, Bispo do Rosário usa elementos
diversos do cotidiano de interno da
Colônia Juliano Moreira e constrói sua
obra, transitiva e empenhada em
atender um objetivo sagrado.
23. • Sob o diagnóstico de personalidade
psicopática mais esquizofrenia, evoluindo
sob reações psicóticas, Stela do
Patrocínio passou toda a vida adulta
(desde os 21 anos) internada em centros
psiquiátricos (do Centro Pedro II para a
Colônia Juliano Moreira). Foi descoberta
pela artista plástica Neli Gutmacher que
montava um ateliê na Colônia. Morreu aos
51 anos, por complicações decorrentes de
uma amputação.
24. Reino dos bichos e dos animais é
meu nome
É dito: pelo chão você não pode ficar
Porque lugar da cabeça é na cabeça
Lugar de corpo é no corpo
Pelas paredes você também não pode
Pelas camas também você não vai poder ficar
Pelo espaço vazio você também não vai poder
ficar
Porque lugar da cabeça é na cabeça
Lugar de corpo é no corpo
25. Não sou eu que gosto de
nascer
Eles é que me botam para
nascer todo dia
E sempre que eu morro me
ressuscitam
Me encarnam me
desencarnam me
reencarnam
Me formam em menos de um
segundo
Se eu sumir desaparecer eles
me procuram onde eu
estiver
Pra estar olhando pro gás pras
paredes pro teto
Ou pra cabeça deles e pro
corpo deles
27. • “Estou de novo aqui, e isto é ---- Por que não
dizer? Dói. Será por isto que venho? – Estou no
hospício, deus. E hospício é esse branco sem
fim, onde nos arrancam o coração a cada
instante, trazem-no de volta, e o recebemos:
trêmulo, exangue – e sempre outro. Hospício
são as flores frias que se colam em nossas
cabeças perdidas em escadarias de mármore
antigo, subitamente futuro – como o que não se
pode ainda compreender. São mãos longas
levando-nos para não sei onde – paradas
bruscas, corpos sacudidos se elevando
incomensuráveis: Hospício é não se sabe o quê,
porque Hospício é deus”.
28. • A primeira internação foi aos 18 anos.
Hospício é deus, entretanto, foi escrito
aos 29. As histórias sobre si são
numerosas: provocou a queda de um
avião, matou – não se sabe se uma
colega de sanatório ou uma enfermeira,
além de um namorado e, em meio a uma
crise de esquizofrenia, entregou à
ditadura seu filho sob acusação de
subversão, filho este que jamais se
envolvera com política. Foi preso e
torturado.
29. Sobre Nise da Silveira e a terapia
ocupacional, declara:
• “(...) Lá tem música, muito material para
trabalho, pintura, museu, mas as funcionárias
não possuem nenhum preparo para lidar com as
pacientes. Tratam todos como se tivessem os
mesmos problemas, não indagam o grau de
instrução de nenhum, tentam obrigar-nos a
fazer trabalhos chatíssimos (...) Doutora Nise da
Silveira é fundadora e diretora da Ocupação. O
que se sabe dela é francamente positivo, dizem
ser uma mulher excepcional. Não creio que ela
tenha conhecimento de como se portam suas
auxiliares”.