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  1. A HUMANIZAÇÃO DA MEDICINA Por Luiz Gonzaga Francisco Pinto Introdução Considerando o paciente, que procura um médico obviamente, como uma pessoa que está passando por sofrimento físico decorrente de alguma doença, já se pode imaginar também a aflição emocional que o acompanha. Quando o organismo está enfermo, a mente cria expectativas mágicas de salvação, lança mão de defesas psicológicas predeterminadas e expande sem limites a fantasia para atribuir um poder divino ao médico com quem vai se consultar. Ao mesmo tempo, a mente confusa diante da realidade gera uma angústia inexplicável, pois a força do instinto de sobrevivência entra em ebulição e recorre aos mecanismos biológicos de adaptação geral para eliminar a ameaça iminente de morte – que é a maior angústia existencial do homem. Esse conflito mental é necessário, e a esperança que surge é o único meio para a mente exausta abrir espaço de trégua e se recompor e, depois, continuar a luta pela sobrevivência. Ao médico cabe cuidar do paciente e reforçar a esperança que lhe é concedida, mesmo que a doença seja condenatória e de prognóstico desfavorável. Para isso, é importante um extenso envolvimento com o paciente e focalizar maior atenção na pessoa que sofre numa dimensão mente-corpo integrada, sem dicotomização. Está comprovado que o relacionamento entre médico e paciente é o melhor complemento terapêutico para efetivar a cura, pois o órgão afetado não deve maior importância que a pessoa que sofre. É a pessoa o agente ativo mais eficaz quando a motivação para viver e apreciar a vida é fortalecida. O funcionamento do organismo humano depende da funcionalidade cerebral e, é lá que residem os centros emocionais que
  2. emitem reações através de ações comportamentais a todos os estímulos provindos do ambiente exterior. De acordo com a qualidade dos estímulos, as emoções podem ser emitidas de forma positiva ou negativa e os comportamentos serem adequados ou inadequados. Os estímulos e as reações do organismo sempre são compatíveis. Se uma pessoa é agredida por outra a reação dela é de raiva, mesmo que a ação correspondente não seja de contra-agressão. Ela pode ficar triste, aborrecida, chorar, ficar calada, ter insônia, perder o apetite ou qualquer outro comportamento que não seja aparente, mas nunca será impassível quando ocorrer uma emoção. A emoção é uma reação autonômica, ou seja, não depende da vontade consciente. Gritar de alegria, bater em alguém quando se está com raiva, correr quando se tem medo são comportamentos que se pode emitir por motivação voluntária. É importante ressaltar que os comportamentos autonômicos ou involuntários são inatos (não aprendidos), e os que dependem de ações voluntárias são aprendidos, como por exemplo, gritar, pular ou rir de alegria, xingar e bater quando se está com raiva, fechar os olhos e suspirar quando se sente amor por alguém, etc. A emoção humana sempre está presente em qualquer momento na vida do indivíduo, até quando se está dormindo e sonhando. Podem-se observar reações comportamentais de choro, de riso, de movimentos bruscos de uma pessoa quando ela está sonhando e, estas são motivadas pelas emoções que surgem durante o sonho. O organismo não funciona isoladamente apenas em nível de reflexos quando é acionado por meros comandos neurológicos fortuitos. O organismo e a mente se conciliam numa unidade e, só assim é capaz de adaptar aos mais variados estímulos externos e internos. O comportamento, por fim, pode ser o resultado de reações medulares sem necessidade de conexão cerebral (comportamento respondente), - o estímulo elicia um comportamento reflexo involuntário - enquanto que pode também ser emitido através de elaborações fisiológicas e cognitivas mais complexas (comportamentos cerebrais ou operantes).
  3. A relação terapêutica é um vínculo humano na qual as pessoas interagem para chegar a algum objetivo em comum. A relação médico-paciente tem finalidades que interessam a ambos – a prevenção, o tratamento e a estagnação da doença. Mas para isso, o médico deve ter noções básicas de relacionamento humano, pois a relação entre duas pessoas ou mais há de ser humana (no sentido de bem-estar humano) acima de tudo. A Medicina não deve estudar o comportamento humano simplesmente de acordo com a estrutura anatômica e suas funções fisiológicas, mas deve expandir o conhecimento para as relações psicossociais. Muitas doenças são características de alguns fatores ambientais (hábitos culturais, crenças, mitos, etc.). Num aspecto mais profundo, há de se aceitar que a doença para alguns pacientes não é o seu principal mal, mas o meio de sobrevivência aos fatores sociais desfavoráveis, ou seja, a doença lhe traz ganhos secundários, como por exemplo, através do sofrimento se consegue a segurança através de benefícios sociais. Por isso muitos pacientes abandonam o tratamento quando a cura é iminente.
  4. A EMPATIA: O catalisador terapêutico Se uma pessoa estabelece contato com outra num certo plano de proximidade, inevitavelmente haverá interação e influência recíproca que resultará na apreensão de afeto, assimilação de algo cognoscível e alguma identificação subjetiva, mas indefinida. Algumas pessoas, ao se conhecerem momentaneamente, são tomadas de uma sensação intuitiva de que já se encontraram em outra situação, em algum tempo desconhecido. Para alguns, a esse fenômeno é conferido a interpretação mística da possibilidade de ter havido alguma relação num passado existencial dúbio. Não obstante, o que interessa aqui é o que se pode perceber, mesmo sem compreender objetivamente a verdade absoluta e não aduzir hipóteses retorquíveis. Empatia, para Rollo May, “significa um estado de identificação mais profundo de personalidades em que uma pessoa se sente tão dentro da outra que chega a perder temporariamente a sua própria identidade”. Continuando, May refere à empatia como um processo misterioso através do qual podem fluir a compreensão e o poder de reações espontâneas recíprocas. A empatia é um sentimento que transpõe o limite do Eu para poder encontrar com o Outro e entendê-lo sem ser preciso interpretá-lo, seguramente uma forma de participar do mundo dele sem perder a própria identidade. Ao assistir um filme, participamos das ações e vivenciamos cada situação como se fôssemos os próprios personagens. Naquele momento a realidade do ego se transforma naquela realidade artificial, e a consciência de nós mesmos é transformada sem nenhuma alteração verdadeira em nossa personalidade. Ao findar o filme, sentimos confusos por algum momento, mas logo resgatamos a realidade de fato. Essa capacidade de transposição psicológica é também um processo
  5. empático típico, onde o Ego consegue ir e vir sem se alienar de sua essência verdadeira. Quando o médico ouve o paciente, ele não deve identificar apenas suas palavras através do processo fisiológico da audição, mas compreender o significado das mesmas enquanto vivencia empaticamente a emoção que provém delas. Deste modo, pode-se compreender o outro e, assim ajudá-lo a identificar a relação entre as variáveis que confluem para o sofrimento. Jung refere à empatia como um processo de fusão entre o paciente e o médico. Ele afirma que: “O encontro entre duas personalidades é como o contato entre duas substâncias químicas. Se houver qualquer reação, ambas se transformam. Esperamos que o médico tenha uma influência no paciente em todo o tratamento psíquico eficiente, mas esta influência só poderá ocorrer, se ele também for afetado pelo paciente”. Até na aplicação de algum procedimento terapêutico, é preciso ser empático, pois a vontade do outro não pode ser infringida pela determinação rígida do poder profissional e do procedimento diagnóstico aplicado. Ao propor um método terapêutico que possa causar padecimento ao paciente, o terapeuta deverá obter a anuência do paciente e certificar de que não esteja subjugando seu alvedrio, mas convocando-a a compartilhar ativamente do processo de tratamento. Qualquer procedimento sugerido deverá ser comunicado ao paciente e sua metodologia deverá ser explicada de forma inteligível, ressaltando a importância de sua colaboração, sobretudo de interesse consciente e atuante. O paciente não deve ser submetido à submissão, tampouco entregar-se inteiramente à dependência clínica. A destituição de si mesmo é a pior de todas as enfermidades.
  6. Aliança Terapêutica Em toda relação humana, implícita ou explicitamente surge algum pacto, ora por força da necessidade de criar e seguir regras sociais momentâneas, ora, intuitivamente, por condição essencial para se conseguir o tratamento. Muitas vezes faz-se útil estabelecer contratos formais para garantir o sucesso da meta proposta e motivar o cumprimento das responsabilidades atribuídas a cada parte. Em algumas condições não é necessário formalidade rígida ou documental, mas apenas um acordo honesto para seguir as regras de praxe para o atendimento satisfatório. A aliança terapêutica é muito utilizada em tratamentos psicológicos, sendo considerada a condição inicial para se estabelecer um relacionamento eficaz para aderir o paciente ao tratamento e ao médico como pessoa antes de tudo. A aliança terapêutica não é simplesmente um relacionamento de adesão e de submissão aos procedimentos administrados para o tratamento. Essa relação não é social, mas interpessoal e, muito mais, quase sempre num plano subjetivo ininteligível e repleto de túneis enigmáticos. A doença é tradicionalmente considerada sob duas perspectivas isoladas, a julgar pela tendência antiga de dicotomizar o ser humano em mente e corpo como se fossem unidades independentes e competitivas entre si. O dualismo psicofísico proposto por Anaxágoras, por volta de 500-428 a.C. foi mantido por Platão (427-347 a.C.), reelaborado por Aristóteles (384-322 a.C.) e, mais tarde, intensificado por Descartes. A competição ávida na busca de verdades plenas traz muito mais confusão que orientações para um fim consensual que possa integrar o conhecimento da natureza e da sobrevivência humana. Nesse impulso voraz para desvendar os mistérios que limitam sua imaginação, o homem
  7. inventa, força, incita, corrompe e até mente para se fazer valer e convencer a todos. Talvez essa propensão tenha alguma coisa a ver com a nossa condição de inferioridade inata, que nos impede de compreender como um fato vital natural, não obstante pudesse ser orientada de forma mais sublime. É aí que está, quiçá, o núcleo de todas as dificuldades adaptativas de sobrevivência, pois deixamos de ver o que as vistas alcançam para idealizar, longínquo, o angustiante inexistente. A partir do momento em que o homem refletiu sobre o corpo e o espírito, começou a sua aflição existencial que, lá nos recônditos de seu ser, deve buscar um significado que transpõe o desejo de desvendar algum segredo indecifrável. A ciência desenvolveu assustadoramente a partir das reflexões e indagações sobre os eventos naturais e, com isso, o homem aprendeu a associar e montar fenômenos, pois tudo o que existe está à disposição da inteligência humana. À medida que o homem consegue desvendar os mistérios naturais dos fenômenos existentes objetivamente, surge uma pulsão para a transcendência – uma forma evasiva para negar a existência da verdade simples. A tendência de transcender é a motivação para desvendar e perscrutar a intimidade de todos os fenômenos captados pela percepção consciente, mas a angústia decorre da necessidade de fragmentar o todo, classificando-o em categorias variadas.
  8. Origem da Medicina Psicossomática O que deu origem à Medicina Psicossomática foi a fusão consensual das reflexões filosóficas com a objetividade científica a respeito da unidade psicofísica (mente-corpo). Nem por isso os fatos psíquicos e físicos puderam suscitar alguma metodologia convincente para perceber os fatos de forma objetiva a ponto de ser convincente a todos. Isso é praticamente impossível, não obstante pode ser consensual e ser útil de fato. Talvez ainda falte conhecimento suficiente para poder explicar os resultados de acordo com a exigência científica. Contudo, algumas verdades transparecem implicitamente nos fatos fazendo válidas as ilações que decorrem do silogismo entre eles. O que decresce o valor da Medicina Psicossomática e da Psicologia como instrumentos terapêuticos relevantes, na maioria das vezes, é o ceticismo insolente e tendencioso da vaidade pessoal, como se as coisas simples não possuíssem validade científica. A imparcialidade científica nunca é absoluta, pois como podem deduzir, as emoções são ímpetos pulsionais involuntários que interferem no processo cognitivo sem que a percepção consciente permita. Nem por isso, entretanto, somos impedidos de desenvolver o senso de imparcialidade, de humildade, de observação e de abstração para compreender os fenômenos além de seu aspecto físico aparente. O vento não deixa de existir simplesmente porque não o enxergamos. Podemos ver o efeito dele nas copas das árvores, percebê-lo através da sensação agradável quando ele toca em nossa pele. Isso é uma verdade, mas é preciso consciência intelectual para compreendê-la. A Medicina Psicossomática não possui precisamente uma metodologia própria que possa torná-la compreensível num nível tão verossímil de objetividade como se deseja, mas é verdade que seus métodos provêm da Psicologia Científica, Psicanálise e Medicina Somática. A variedade de métodos, portanto, gera uma abundância de
  9. hipóteses que confunde e predispõe a incertezas para aqueles que não desenvolveram a capacidade abstrativa para combinar variáveis e relacioná-la a um evento final interessante. O poeta consegue dar forma ao amor e, mesmo sem conseguir tocá-lo, cheirá-lo e vê-lo, pode senti-lo e diferenciá-lo conscientemente de qualquer outro sentimento. A ambigüidade não está no fenômeno, mas na cabeça de cada um, algumas vezes por disposição neurótica para negar a subjetividade dos fatos, não raro por simples limitação intelectual. O psicótico não consegue perceber a realidade comum, por isso é incapaz de se adaptar a ela, e os considerados “normais”, acham o mundo esquizofrênico um absurdo existencial. Se o médico conseguir entrar empaticamente no mundo deliróide daquele paciente, poderá compreender que é somente através do delírio que ele poderá encontrar o valhacouto para a sua sobrevivência. O medo de vasculhar o recôndito inconsciente cria racionalizações fugazes através da boçalidade e da falsa autoridade arrogante – dissimulação da incapacidade de abnegação à vaidade. Não entendendo toda a dinâmica dos comportamentos que circunscrevem a doença, o profissional prescreve e procede ações para combater as manifestações superficiais que encobrem o núcleo verdadeiro da enfermidade – que são os sintomas. O sintoma, na verdade, é o sinal que alerta que denuncia o desarranjo alhures, a luz que alumia o caminho para se chegar a um diagnóstico seguro e tratar a pessoa da melhor forma possível. Na histeria os sintomas se manifestam no físico sem nenhuma alteração na estrutura somática, mas a conversão que a mente produz tem uma função relevante: mascara a verdadeira origem do problema. Se se faz um diagnóstico preciso, depois ter feita a avaliação orgânica fundamentada na queixa somática, o paciente deve ser encaminhado para um tratamento psicológico, pois seus sintomas são apenas a defesa contra o sofrimento verdadeiro. Pode-se perceber aqui que a mente e o corpo se
  10. interagem para a sobrevivência do indivíduo, porém de forma neurótica e perniciosa para a personalidade. Na hipocondria, as queixas do paciente são direcionadas para focos específicos do corpo para camuflar a depressão severa e permanente que acompanha o paciente. É um comportamento psicológico de fuga constante, o que reforça a condição de cronicidade do distúrbio. Os diferentes sintomas físicos percebidos na hipocondria equivalem aos delírios psicóticos, talvez com uma margem de recursos maior, pois os sintomas caminham por todo o corpo à medida que os disfarces somáticos são revelados. Em psicopatologia estuda-se o comportamento “anormal”, descreve-o de acordo com a combinação de sintomas e classifica-os, confere um nome para identificá-lo e, por fim, conceitua-o de forma compreensível para se obter o consenso que o efetivará na comunidade médica geral. A partir daí, cria-se meios para dissolver os sintomas tratando a enfermidade combatendo suas causas. A psicologia científica estuda o comportamento tentando identificar os estímulos que os mantêm, principalmente pelas variáveis que o gratificam. Para simplificar, todo comportamento é mantido por uma recompensa. Se a mãe compra um chocolate para o filho toda vez que ela chora para obtê-lo, a mãe está, sem intenção, reforçando o comportamento de chorar. É o mesmo que gratificá-la pelo choro. Ela aprende a fazer uma associação entre o choro e ganhar o chocolate. Enquanto não houver uma alteração no paradigma entre o choro e o chocolate a criança continuará a emitir o choro para obter a satisfação de seu desejo. A psicanálise, por sua vez, estuda o comportamento neurótico através das interpretações de elementos psicológicos inconscientes relacionados aos sintomas apresentados à superfície. O paciente deve tomar consciência da relação entre os fatores subjacentes existentes em seu inconsciente e os sintomas revelados. Acredita-se que, se os
  11. conteúdos inconscientes emergirem para o plano consciente, a vida emocional do paciente poderá ser reestruturada e seus sintomas neuróticos serão definitivamente extintos. Apesar da Psicologia e a Psicanálise serem oriundas da Medicina, nem todos os médicos estudam ou revelam interesse pelas profundezas do ser humano, pois é evidente que a formação acadêmica direciona-se para a compreensão da estrutura e funcionamento do corpo, em especial para as suas irregularidades. Apesar de alguns médicos não negarem o valor da psicologia, nem todos conseguem intuir e correlacionar os sintomas físicos com os determinantes psicológicos e vice-versa. É difícil mesmo entender a “condescendência corporal” para apaziguar o sofrimento psíquico. Soa paradoxal quando Freud refere o sintoma neurótico como um mecanismo psicológico benevolente para proteger a integridade do ego. Para entender melhor a dinâmica psicológica envolvida nas doenças é importante aludir sobre os mecanismos adaptativos do ego, enfatizando a visão psicanalítica.
  12. Mecanismos Adaptativos da Personalidade Entende-se que a doença biológica é o resultado da mobilização de mecanismos fisiológicos para defender o organismo de qualquer situação que possa colocar a vida em risco. Quando o organismo é atacado por algum agente pernicioso desenvolve-se subitamente uma reação de prontidão defensiva chamada alarme. Todo o organismo é conclamado de imediato para a missão de defesa. O hipotálamo é a estrutura cerebral principal para acionar instantaneamente todo o processo de defesa do organismo através da ativação do Sistema Nervoso Autonômico que, por sua vez, estimula reações físicas e psicológicas para a campanha de contra-ataque. O Sistema Nervoso Central tem por função primordial integrar todos os sistemas orgânicos, captar informações e responder aos estímulos do ambiente e favorecer o ajustamento necessário para a preservação da vida. Qualquer transtorno nessa conexão cérebro-ambiente poderá inibir as reações de adaptação do organismo e predispô-lo a perturbações da saúde e ameaçar a própria vida. Não devemos circunscrever o conceito de ambiente apenas de acordo com a configuração física de eventos externos tangíveis, mas entendê-lo além da realidade sensorial incontestável, levando-se em conta outros elementos de importância psicológica, social e cultural que compõem a personalidade e nos quais o homem está inserido. O grande mérito da evolução de todas as espécies vivas foi o desenvolvimento de recursos de adaptação às imprevisíveis adversidades da natureza. Quanto ao homem, - espécie diferenciada entre todos os organismos vivos – além dos ajustes anatômicos e fisiológicos para conciliar com o ambiente, desenvolveu mecanismos psicológicos para atender todas as necessidades vitais e controlar as tensões emocionais decorrentes da exigência da vida.
  13. Além da linguagem e do raciocínio como processos aprendidos conscientemente para solucionar problemas e nos adaptar bem ao ambiente, o psiquismo humano criou meios para selecionar, controlar e compatibilizar impulsos e necessidades provindas dos instintos. O controle e seleção das pulsões primitivas, sob o ponto de vista psicanalítico, são feitos pelo Ego em seu esforço para satisfazer à satisfação de necessidades essenciais, sem levar em conta muitas vezes, as conseqüências deletérias da luta que ele trava para isso. Quando o Ego é intransigente na busca de gratificação e obtenção de prazer incondicional, surgem conflitos entre os impulsos biológicos e as coibições morais desenvolvidas na personalidade por força do Superego que, por sua vez, deve executar as regras sociais estabelecidas, incluindo os preceitos morais e a ética. A culpa e a punição sobre o Ego são os principais elementos psicológicos controladores. Os mecanismos de defesa evoluem concomitantemente ao desenvolvimento da personalidade, servindo especialmente como sustentação e proteção contra possíveis ameaças à sua integridade. Se os mecanismos de adaptação falham, o indivíduo entra em colapso e se predispõe a transtornos psicológicos, pois o esforço exaure com todas as reservas de sustentação da personalidade. Quando a ruína das defesas acontece, a ansiedade se eleva e intensifica devido ao conflito implícito constante, podendo ocasionar neuroses ou psicoses. Ainda assim, o próprio distúrbio estimula o psiquismo a criar recursos para preservar a personalidade da ruína total. Resumindo, os mecanismos adaptativos da personalidade estão sempre presentes na vida do indivíduo, tanto em condições normais de saúde quanto nos estados patológicos. A patologia surge quando os mecanismos de defesa não conseguem adquirir força suficiente para sustentar o equilíbrio. Para compreendê-los melhor, descreveremos os mais relevantes.
  14. Angústia A angústia é uma reação psicológica equivalente ao que se chama de estado de aflição como se existisse um perigo iminente, porém sem nenhum estímulo externo deflagrador, muito menos um pensamento específico determinante. A sensação de angústia equivale ao medo, mas diferente porque os “agentes de perigo” são subjetivos e estão ocultos na personalidade, enquanto que o medo é uma reação de prontidão contra uma ameaça de fato que prepara o indivíduo para fugir, enfrentar ou, em casos extremos, paralisar. Ainda que a angústia seja conseqüência do esforço emocional exaustivo para controlar o equilíbrio vital, ela gera sofrimento secundário constante devido ao conflito entre a ameaça iminente e a ausência de um perigo passível de eliminar objetivamente. Se não se percebe o “inimigo” não há como criar defesas racionais para superá-lo e poder sobreviver. As defesas racionais só podem ser construídas através de tratamento adequado, quando então se coloca a pessoa em confronto com a verdadeira origem do distúrbio. Caso contrário, a angústia estaria retroalimentando a neurose. O sofrimento ocasionado pela angústia motivam a pessoa a procurar amparo, e para isso, podem buscar várias situações para atenuar o sofrimento, como nas consultas médicas freqüentes, mesmo que para isso precise simular queixas. Nesse caso, além da cura não acontecer, por ser a enfermidade a dissimulação de seus conflitos intrapsíquicos, o paciente é recompensado pela atenção do médico e isso alimenta o seu ego fragilizado desenvolvendo-se a neurose. Ansiedade Adrede, introduzi a ansiedade para facilitar a distinção de alguns dos fatores psicológicos que, às vezes, tornam-se confusos para a
  15. compreensão de detalhes que os individualizam. Ansiedade, angústia e medo possuem características em comum, e é isso o que dificulta reconhecer a soberania e a função adaptativa de cada elemento desses. A ansiedade, da mesma maneira que o medo e a angústia causam inquietação, prontidão defensiva, aflição, estresse, sentimentos de incerteza e, até de impotência em face de algumas circunstâncias especiais. São elementos em comum, indiferenciáveis num primeiro momento. Ainda assim, qualquer um deles pode suscitar pensamentos incoerentes com a realidade, predispondo o indivíduo a desenvolver fantasias com características deliróides, passando a agir de forma equivalente. A ansiedade e a angústia, distintas do medo, são persistentes e podem ter repercussões em todo o organismo em forma de dores, tensões musculares, aperto no peito, dar origem a neuroses e deflagrar crises psicóticas dependendo de fatores predisposionais e da intensidade dos fatores estressantes. O medo, no entanto, é uma reação momentânea que, num nível superficial, não desestrutura obrigatoriamente a integridade da personalidade, a não ser que a situação de perigo seja extremamente traumática, como numa guerra, por exemplo, ou algo de equivalência emocional. Com todo o sofrimento físico e psicológico que possam provocar a ansiedade e a angústia, e tantos outros efeitos emocionais, é coerente acreditar que esses fatores são apenas sinais de alerta que denunciam algo de errado, lá nas profundezas do psiquismo, não propriamente no físico, a despeito de ter repercussões no corpo. É imprescindível, considerar a relação de causa-e-efeito como o único caminho que possa levar à compreensão legítima do processo que leva o indivíduo a perder o equilíbrio essencial para a preservação da integridade total. A doença não é mais que a perda do equilíbrio das forças instintivas para a sobrevivência do organismo. Há tantos séculos, Hipócrates – considerado o Pai da Medicina – afirmava a seus discípulos que “a doença não é apenas sofrimento (pathos), mas também
  16. instrumento (pónos), isto é, a luta do corpo para restabelecer a normalidade”. Segundo Hans Selye, a doença é “um elemento terapêutico da natureza, que cura de dentro para fora”. Sem intenção de considerar o organismo uma unidade inseparável (em mente e corpo), às vezes, é oportuno fazer analogias e determinar classificações de algum evento. Quando se investiga algum fenômeno, é imprescindível decidir por algum caminho que possa conduzir à compreensão lógica da realidade apreendida pelos sentidos, e para isso, tende-se a criar padronizações, pois todos os acontecimentos do universo são interligados e interdependentes para integrar o cosmos. A ressalva teórica é para comparar os fenômenos “mentais” dos “físicos” e poder chegar a conclusões plausíveis para compreender o homem como um todo, aceitando sem vaidade, que toda a luta do organismo tem apenas uma finalidade – a preservação e continuação da vida. O senso comum entre os profissionais de saúde é considerar a ansiedade como um fator pernicioso para a integridade física, principalmente no que refere à suscetibilidade psicossomática a que está sujeito o paciente. Alguns estudiosos admitem existir dois tipos de ansiedade: a normal e a neurótica. Para Rollo May, a ansiedade normal “é uma expressão da capacidade do organismo para reagir a ameaças; essa capacidade é inata e possui seu sistema neurofisiológico herdado”. De forma equivalente, Freud afirmou que a criança tem “tendência para a ansiedade objetiva” e que essa disposição é um fator biológico fundamental para o instinto de conservação. Baseado nestas duas posições e outras mais, pode-se aceitar que a ansiedade é, a priori, uma das pulsões instintivas significativa para a supervivência, independente da intensidade e da condição que se cria para classificá-la. Atribuir “etiquetas diagnósticas”, que caracterize a ansiedade como patologia e tentar eliminá-la através de paliativos imediatos, não fortalece as defesas
  17. egóicas contra os fatores internos que as impelem a irromper. O médico é um atenuador do sofrimento humano, e não mede esforços para afastá-lo, sabe-se disso. O alívio instantâneo através de paliativos farmacológicos, não obstante, pode mascarar a verdadeira causa da doença, fortalecer as defesas de negação do Ego e comprometer seriamente a qualidade de vida de muitos pacientes. Fortalecendo-se a defesa de negação à doença, substabelece-se a dependência farmacológica e o Ego passa a se satisfazer apenas com o alívio momentâneo do sofrimento. Isso pode ser observado naqueles pacientes que buscam tratamento sem intenção de cura, ministram medicação a si própria e utilizam de todos os recursos terapêuticos sugeridos, sem levar em conta qualquer critério terapêutico eficaz. Nesses casos, existem duas posições relevantes no tratamento: a posição de resistência do paciente por opção aos ganhos secundários com a doença e a posição pedagógica da medicina que é falha e que deveria fazer parte do tratamento e prevenção futura. A segunda posição pode ser retomada através de campanhas e programas permanentes dentro da própria instituição de saúde pública por intermédio de equipes morte e interdisciplinares. Alguns estudiosos defendiam a idéia de que a ansiedade é um comportamento emocional aprendido sem, entretanto, considerar os fatores intrínsecos originários. O que se aprende, na verdade, são atitudes especiais para manifestá-la. Algumas pessoas fogem da situação que a deflagra, outros enfrentam e, há aqueles que tendem à imobilização, como em alguns casos de depressão ou situações de ameaças de perigo extremo. Rollo May sugere que “a capacidade para ansiedade não é aprendida, mas sua quantidade e formas, num dado indivíduo, são aprendidas”. Isso quer dizer que a ansiedade é a mobilização natural do organismo, e todo ser humano estará sujeito a experimentá-la, em maior ou menor grau, de forma tolerável ou incapacitante. Sob a perspectiva behaviorista, na presença de algum sinal de ameaça o organismo reage desenvolvendo tensão e sofrimento – essa
  18. reação é chamada ansiedade. A ansiedade, por gerar sofrimento, motiva o organismo para criar comportamentos que possam reduzi-la. A redução da ansiedade traz alívio e, este, prazer, por conseguinte, é gratificante. O jogador de futebol é tomado de elevada ansiedade antes de cobrar um pênalti. A sensação desagradável pela possibilidade de fracassar provoca sofrimento, que só pode ser aliviado se marcar o gol. O prazer do sucesso é conseqüência imediata da ansiedade. Devido ao prazer resultante, o jogador quererá sempre cobrar o pênalti, sabendo do sofrimento que a ansiedade pode causar. O obsessivo-compulsivo alivia a ansiedade através de seus rituais neuróticos de repetição comportamental. O sofrimento, no entanto, não tem origem no cerimonial obsessivo, mas no conflito imediato gerado pela força oposta que empreende. Uma das técnicas bastante eficiente para tratar das pessoas que se fazem refém de seus comportamentos ritualísticos é a saci ação para quebrar o elo entre a repetição e a resistência. Concomitantemente, porém, o processo psicoterapêutico deve ir além do comportamento inadequado explícito, pois esses rituais não são um mero condicionamento de eventos superficiais. Repressão A repressão é o mecanismo de defesa central para adaptar o indivíduo aos padrões de vida comum na sociedade. É a partir dela que o homem pode evoluir para a convivência saudável com os outros, conseguir obedecer regras, adiar prazeres quando necessário, viver em conformidade com os critérios estabelecidos essenciais para o bem comum para, enfim, o homem evoluir e prosperar. De acordo com a amplitude teórica psicanalítica quando sonda os subterrâneos mais longínquos da mente humana, propõe razões plausíveis para se acreditar consensualmente que a repressão assume a função de afugentar o conflito e assegurar a sobrevivência do ego, nem que para isso custe uma neurose.
  19. Desejos, impulsos, pensamentos e pulsões incompatíveis com os valores assimilados pelo indivíduo que fazem parte de seu contexto moral conveniente são banidos da consciência por força da repressão, impingindo-os para o recôndito inconsciente. Todas as pulsões instintivas existentes, mesmo que não sendo conveniente a manifestação social, são livres e possuem função primitiva de manter a sobrevivência legítima do indivíduo. A vida arcaica que carregamos pela eternidade da vida, nunca será extinta, nem evoluirá, apenas será coibida através das forças que a civilização impõe. É um preço alto que a humanidade terá que pagar, se quiser sobreviver às adversidades congregadas no sentido de organizar os homens entre si - através do seguimento de normais e acordos sociais impreteríveis. Através da objetividade da psicologia behaviorista a repressão se torna também imprescindível, haja vista, muitas vezes ser preciso conter desejos, sentimentos e comportamentos que operam no meio para prevenir conseqüências sociais e intrapessoais que possam levar a castigos, recriminações, indesejabilidade, ou seja, a qualquer situação que possa trazer sofrimento a si próprio. A repressão para a psicologia behaviorista é um comportamento de fuga diante de um estímulo aversivo. A conseqüência da fuga de alguma pulsão irreconciliável é o desenvolvimento da ansiedade, que o indivíduo procura aliviar através de outro comportamento gratificante. Nesse caso, um comportamento conciliável substitui aquele que trás conseqüência aversiva. A versão teórica não invalida a existência da repressão como um mecanismo de defesa potente para proteger o psiquismo de sofrimento quando as pulsões obrigam-no à satisfação original. O mais interessante é a capacidade psicológica para aliar e criar outros meios favoráveis para atender ao princípio do prazer. O senso comum, por influências religiosas diversas, louvam o sofrimento como forma de expiação de incorreções morais, mas o psiquismo desconhece esse absurdo, pois a busca do prazer pleno seria o verdadeiro sentido da vida, segundo o princípio do hedonismo. É claro que, quando se consegue estabelecer o equilíbrio entre o princípio do prazer com a realidade (sofrimento), a vida passa a ter significados transcendentes e a angústia deixa de ser um transtorno tão oportuno. Quando a repressão é severa, como nos casos de controle rígido sobre os impulsos sexuais, haverá uma sobrecarga insuportável sobre o ego em forma
  20. de ansiedade. Ansiedade seria a única força capaz de romper as obstruções e abrir passagens para o alívio das tensões acumuladas no organismo. Os caminhos de alívio determinados pela ansiedade não são efetivamente salutares para o psiquismo, pois a desopressão é apenas momentânea. O alívio da ansiedade para ser saudável há de ser construtivo, através da diluição de ações que possam trazer prazer consistente. Com todas as conseqüência deletérias que a repressão possa causar, não se deve condenar a atuação deste mecanismo de defesa como meramente pernicioso. Há de se entender que, se é um mecanismo de defesa, a função dele é defender a integridade do indivíduo, custe o que custar, pois ele se faz presente pelo vigor da determinação instintiva. Não obstante, o organismo sofre as conseqüência, assim como o campo de batalha em uma guerra. Nem por isso, deve-se entender que existam forças opositoras ao instinto de autopreservação. O poder das adversidades externas é que desorganiza a ordem interna do indivíduo, destruindo-o ou obrigando-o a viver constantemente em estado de alerta, como nas neuroses e psicoses. O sofrimento não é uma condição se ne qua non para o ser humano viver, segundo algumas ideologias, mas a felicidade, sim, é inerente e imprescindível como fator motivador para o desenvolvimento e crescimento pessoal. O que há de errado, que se pode observar claramente, é o elevado nível de expectativa que se cria, tornando impossível vivenciar conscientemente a sensação de prazer obtido. O nível de aspiração não pode exceder os limites de assimilação da consciência. De acordo com o que já foi considerado sobre as pulsões instintivas, é admissível entender que a energia desenvolvida constantemente tende a romper com qualquer obstáculo que possa obturar sua livre expressão. Como já vimos também, nem todos os impulsos podem ser expressos, principalmente os que contrariam os interesses da ordem social. O instinto, porém, é implacável e não se
  21. submete a nenhuma determinação superior inconciliável, é soberano absoluto, intransigente e se move por motivos genuínos de sobrevivência, mas por bem (ou por mal?) é rude e manipulável. É como um animal faminto que a ele não importa a qualidade nutritiva da comida, mas saciar exclusivamente a fome. É sabendo disso que a mente manipula o instinto através da criação de diversos mecanismos, pois o conflito gerado pode causar sérios danos ao indivíduo. Para que aconteça uma conciliação saudável entre os impulsos e a mente faz-se necessário fortalecer o ego cada vez mais através do desenvolvimento da consciência. Um dos meios edificantes para se adquirir esse poder é a psicoterapia. O resultado mais satisfatório da psicoterapia seria o desenvolvimento do “ego racional” que disciplina o “ego irracional” que, segundo a psicanálise, serve às necessidades primitivas do id. Como todos os mecanismos de defesa do ego, a repressão quando bem sucedida em sua função de facilitar a estabilidade psíquica e, se isso é realizado sem a necessidade de causar outros transtornos psicológicos, haver-se-á de aceitar que o equilíbrio será efetivamente amparado. Simbolização Considerando os processos mentais como ações dinâmicas do psiquismo, pode-se deduzir que tudo o que é elaborado na consciência gera tensão e esta força deve buscar saídas de qualquer maneira para não reter conflitos e causar danos. É uma forma de interação fundamental entre o mundo interno do indivíduo e o ambiente externo, e isso há de ser feito através de uma comunicação real ou simbólica. O simbolismo é o significado que se atribui aos desejos, objetos, idéias e necessidades, quer seja por meio de rótulos, imagens oníricas, delírios, alucinações, linguagem, conceitos, etc., quer seja pelo próprio silêncio, imobilidade, comportamentos estereotipados ou bizarros. O símbolo pode não revelar algum significado compreensível para terceiros, mas possui um valor existencial para quem o utiliza, pois a consciência não consegue delimitar
  22. um espaço entre a realidade e o símbolo. A semelhança do símbolo com o objeto simbolizado é tão ínfima que não se pode identificar as particularidades que as separam. O símbolo passa a ser a própria realidade, embora disfarçada. Sem negar que a doença exista pode, além de ser constituída por alguma afecção orgânica de fato, estar servindo secundariamente como oportunidade para atribuir-lhe algum significado para disfarçar idéias conflitantes associadas a emoções prejudiciais ao psiquismo. É isso que nos faz intuir convencendo-nos de que muitos pacientes resistem e não seguem seriamente as prescrições terapêuticas por optarem pelo ganho secundário que a doença lhes traz. A doença passa a assumir a função de símbolo para disfarçar o verdadeiro mal. Regressão É um mecanismo de fuga em que o indivíduo emite comportamentos inconciliáveis com seu status psicológico atual retornando a um nível anterior de ajustamento e de integração. A fuga regressiva acontece em situações aversivas causadoras de ansiedade ou quando se pretende obter algum benefício. O comportamento de fuga acontece como resultado da retirada do evento aversivo. Um comportamento simples de retirar o sapato porque está machucando o pé é uma ação comportamental de fuga. A criança que volta a fazer xixi na roupa, depois de ter aprendido a controlar os esfíncteres, estaria recorrendo a uma estratégia comportamental para retirar algum empecilho que lhe cause algum transtorno, normalmente nestes casos, é pelo nascimento de outro irmãozinho ou por doenças. O comportamento regressivo normalmente é mantido por reforçadores subjetivos pelo alívio da estimulação aversiva temporária e pela obtenção de vantagens sociais secundárias, como atenção, cuidados especiais, visitas (no caso de doentes), comiseração, presentes, etc.
  23. Muitos comportamentos são convocados à ação quando o indivíduo sofre alguma doença. Suas atitudes se revelam pueris, inconscientemente procurando, na oportunidade, resgatar vantagens já perdidas pelas exigências da maturidade essencial. Muitas vezes, porém, a regressão é imposta pela autoridade médica quando o paciente é referido de forma infantil. É muito comum o paciente ser advertido com atitude carinhosa do tipo: “se você não tomar o remédio direitinho, vou puxar sua orelha”. Essa forma de comunicação submete o paciente à vontade de outra pessoa impedindo-lhe de assumir com maturidade a parte do tratamento que lhe cabe, além é claro, de reforçar aspectos infantis de sua personalidade que pode dificultar a recuperação da saúde. A regressão na doença pode eclodir elementos antigos da personalidade que não se desenvolveram na infância durante a estruturação da personalidade. A doença representa para o psiquismo humano a perda da capacidade para se autogovernar. A tendência imediata é sentir-se arruinado e impotente, motivo que leva a um pedido de socorro para o restabelecimento incontinenti. Pessoas mimadas e superprotegidas na infância recorrem com maior freqüência aos comportamentos regressivos quando têm que enfrentar situações de decisão pessoal e que lhes exigem responsabilidade e determinação. Estes indivíduos normalmente são imaturos, voluntariosos e dependentes, pois o desenvolvimento de alguns aspectos de sua personalidade ficaram detidos em fases anteriores da infância devido aos benefícios da sujeição familiar. O paciente com tendências permanentes de regressão tende a criar dependências com todas as pessoas que representam alguma autoridade e poder, inclusive sendo sectários de doutrinas que lhes “podem conduzir e abrir caminhos na vida”. Muitos adeptos de ideologias religiosas, políticas e até fanáticos por futebol demonstram comportamentos regressivos eventualmente por não terem aprendido a lidar adequadamente com a realidade e não conseguirem agir de forma
  24. construtiva quando experimentam frustrações. Aspectos infantis podem ficar latentes eventualmente e serem despertados ocasionalmente devido a imaturidade cognitiva e emocional. Através da regressão infantil a pessoa pode dissimular seus temores, sentir uma “falta segurança” no outro, deixar de assumir responsabilidades exigidas pela independência e autonomia. As fixações anteriores durante o desenvolvimento da personalidade são os principais responsáveis pela propensão regressiva. Por vezes, a fixação é considerada como um mecanismo de defesa, mas não devemos aceitar essa idéia, pois ela é simplesmente um impasse ocorrido no desenvolvimento e que a regressão a utiliza para fugir da realidade. A fixação, apesar de não ocorrer a todo instante, é permanente, e a regressão é circunstancial. Adultos que chupam o dedo momentos imediatos que antecedem o sono apresentam uma fixação infantil que é utilizada sempre que vai dormir. É um comportamento considerado incompatível com atitudes adultas e ocorre todos os dias. Chupar o dedo não é um mecanismo regressivo, mas uma atitude própria e aceitável de uma criança durante a fase oral. Sob o ponto de vista comportamental, chupar o dedo está condicionado pelo reforço positivo de dormir, mas que pode ser extinto sem maiores dificuldades ou substituição de sintomas se a aplicação da técnica for associada a outros reforçadores substitutos de maior relevância. Não é obrigatoriamente um comportamento neurótico. Identificação A identificação é um mecanismo essencialmente importante para o desenvolvimento da capacidade de ajuste social do homem e consigo mesmo, não deixando de ressaltar sua importância para a formação da personalidade. A formação da personalidade humana basicamente acontece sob a influência de todos os aspectos naturais que diz respeito ao homem como
  25. um organismo biológico. O poder das influências ambientais, somadas à capacidade idiossincrática de responder aos estímulos ambientais ou de adaptação moldam a pessoa para que ela possa viver em harmonia com todos os eventos a que se sujeitar. Durante o desenvolvimento da personalidade, considerando o nascimento como referência inicial, as pessoas adquirem inúmeros comportamentos através de condicionamentos respondentes e operantes. Comportamentos respondentes são inatos, involuntários e eliciados automaticamente quando o organismo é exposto a algum tipo especial de estímulo. Comportamentos operantes são aqueles que atuam no ambiente modificando-o, - são voluntários. Acender uma lâmpada é um comportamento operante, enquanto a dilatação da pupila pela exposição à luz é um comportamento respondente. No transcorrer da convivência com os pais e outras pessoas significativas a criança adquire comportamentos primigênios através da imitação e da identificação com eles. A imitação é a reprodução de comportamentos para a qual utiliza outras pessoas como modelo. Através da imitação forma-se a base para muitos comportamentos sociais. A criança imita a mãe passando batom nos lábios, mas pode ser que ela não se identifica com a vaidade materna, que seria um traço comportamental mais complexo. No processo de identificação, a criança introjeta em sua personalidade esboços de comportamentos que formam traços de personalidade permanentes. A identificação é uma forma de satisfazer os desejos que surgem na infância e, é através desse processo que assimilamos características adequadas e inadequadas de nossos modelos significativos. Através da identificação o filho segue padrões, decide escolhas profissionais e define critérios éticos para viver na sociedade. Traços de identificação podem ser facilmente observados, principalmente quando algumas características comportamentais de alguns pessoas são comuns entre os
  26. membros da mesma família. Essas características formam a identidade familiar e, num sentido mais amplo, identificam aspectos culturais da sociedade. O mecanismo de identificação deve ser cuidadosamente investigado com relação a determinadas características de um grupo familiar, sobretudo no que diz respeito a doenças comuns entre seus membros. Pode-se observar, por exemplo, que habitualmente a depressão é considerada uma “doença” de origem genética”, quando existem vários casos na família. A relação de causa-e-efeito é referida a partir da freqüência com que ocorre o distúrbio a despeito do processo de identificação e dos fatores ambientais predisponentes. O critério biológico nem sempre é mais determinante que outros fatores psicossociais que fazem parte do indivíduo, por isso, é preciso ter cuidado quando se faz uma avaliação diagnóstica superestimando o sintoma. O aprimoramento da personalidade humana depende muito da necessidade de identificação das pessoas com outras, acima de tudo com aquelas que julgam dignas e modelos de realização. A identificação com alguma ideologia humanitária que nos possam fazer reconhecidos como benfeitores, permitindo-nos a expressão de anseios altruísticos satisfaz a necessidade existencial de sermos benevolentes, assim como apregoam as doutrinas do bem humano. A identificação é, pois, a única forma de compartilharmos uns com os outros, a condição fundamental para desenvolver o “ego coletivo” tão necessário à convivência e harmonia social. A identificação pode ser patológica a partir do momento em que o indivíduo tenta “apropriar” da identidade de outrem, a ponto de reproduzir seus mínimos gestos, forma de pensar e de agir. Esse tipo de identificação é característico de pessoas imaturas e que se relacionam
  27. com muita voracidade afetiva, tentando fechar a relação de forma simbiótica com o modelo escolhido. Essa forma de identificação não é autêntica, pois a pessoa não desenvolve uma identidade própria e se recusa a si mesma para “ser a outra pessoa”, o que muitas vezes leva a subtender uma propensão homossexual e/ou um narcisismo incoercível. Na busca de identificação através das relações amorosas, grande parte das pessoas procuram indivíduos que possuam as mesmas características que as suas e que venham a suplementar as qualidades que idealizam. O modelo idealizado excede a possibilidade de ser apenas humano com suas características idiossincráticas. O perfil do modelo é perfeito, e se não condiz à precisão absoluta da fantasia, rompe-se o relacionamento e busca-se outros, num ritual obsessivo de desencontros incessantes. A identificação, assim de forma infantil, serve apenas para satisfazer desejos transitórios e inconsistentes e, quando frustram em sua tentativa, o indivíduo, sente-se rejeitado e vítima de uma solidão crônica. Em casos de luto persistente a situação de perda de uma pessoa passa a ter um significado emocional independente da privação afetiva ocasionada. Qualquer situação de perda pode ser solucionada, mas quando não ocorre deve-se pensar no valor de significado que ela passa a ter. A depressão duradoura deflagrada após a morte de um ente querido, quando o sentimento de culpa é proeminente sobre outros sintomas, deve-se pensar numa necessidade de autopunição decorrente de ressentimentos e hostilidade anteriores. Pela freqüência com que ocorre, não deve ser mera coincidência ou influência hereditária de alguns casos de doentes que passam a sofrer a doença equivalente do ente querido que faleceu, pois ao ser elaborado o conflito psicológico subjacente os sintomas da doença são abolidos. Essa observação não deve ser generalizada, nem é aconselhável subestimar as possibilidades de algum fator hereditário a favor de idéias que sustentam a influência do psiquismo sobre o corpo de forma intransigente.
  28. Transferência É o processo psicológico através do qual desejos, valores morais, ressentimentos, afetos e impulsos especiais do paciente são emersos durante a interação clínica e transpostos para o terapeuta. A pessoa do médico, para a qual os conteúdos são transferidos, é apenas uma figura representativa que substitui inconscientemente outros personagens, quer sejam fictícios ou reais. A aclamação universal do médico como um ente deificado, confere poderes que transcende a capacidade de conhecimento clínico e poder natural de curar a dor física. Assim como se sente raiva e revolta com Deus quando as súplicas não são atendidas, o paciente passa a agir de forma hostil, abandona o tratamento e tenta, muitas vezes, ferir a honradez profissional e pessoal do médico, se suas expectativas irreais não foram prontamente concedidas. Pode-se entender esse tipo de reação como um deslocamento da raiva, motivada pela frustração do desejo imediato de cura da doença, sem entretanto ocorrer erros factíveis. Esse tipo transferência é considerada negativa. A figura do terapeuta pode ser a oportunidade indispensável, quiçá única, para materializar o desejo anelante de ser protegido, acalentado e paternalmente amparado. Aqui a transferência é positiva, mesmo não sendo tão saudável a satisfação dessas necessidades. De forma contrária, o médico pode representar um personagem ameaçador no processo transferencial se suas atitudes contra-transferenciais forem negativas e não corresponderem às experiências vivenciadas pelo paciente. O médico é “visto inconscientemente” pelo paciente como uma entidade que faz, já fez ou poderá fazer parte de sua vida devido a alguma equivalência na circunstância atual, por exemplo, o médico assume uma posição de autoridade, de condescendência, de protetor, etc., que corresponde ao pai do paciente, quer seja real ou imaginário.
  29. Assim como a transferência pode ser uma ótima oportunidade de aliança para a eficácia do tratamento, ela poderá ser um obstáculo sério, haja vista, não ser incomum o paciente e/ou o médico desviarem os rumos da conveniência terapêutica. Em alguns casos de transferência, o tratamento passa a ser um pretexto para outros fins de gratificação, mais comumente, estabelecendo-se relacionamentos sexuais efêmeros e sem envolvimento afetivo por parte do terapeuta. A transferência erótica que se efetua durante o tratamento é uma relação tipicamente infantil, meramente impulsiva e incoadunável com relação às privações afetivas do paciente. O comportamento sexual do paciente, nessa circunstância, é apenas um meio compensatório para atingir outras necessidades e não um fim para a obtenção de prazer sexual fugaz, como pode ser para o terapeuta. A posição de autoridade e de prestígio do terapeuta e, por conseguinte a oportunidade de ser assediado, não lhe exime de responsabilidade ética que possa consentir um envolvimento dessa natureza. É simplesmente desastroso para o paciente quando descobre que seus propósitos estavam simplesmente desviados de seu núcleo de necessidades verdadeiras e, que por mal, não fora compreendido por figura que se atribui tanta reputação e poder sobre-humano. As manifestações transferências do paciente pode irromper reações inapropriadas, deslocando experiências primitivas arraigadas no inconsciente do terapeuta. Racionalização Há uma inclinação geral entre as pessoas para alegar motivos quando se falha em algum intento, principalmente para aqueles que tanto almejavam. Propende-se a dissimular o fato verdadeiro encobrindo com alegações que possam abrandar o desconforto causado e torná-lo suportável ou menos desagradável. Se um candidato, por exemplo, não consegue aprovação no concurso que mais almejava, dificilmente admitirá para si e para os outros a verdadeira razão de seu fracasso. Com certeza irá construir pretextos para atenuar sua frustração. Os motivos
  30. para a racionalização não são deliberadas como nas mentiras. Na mentira há uma decisão consciente para disfarçar alguma falha, lograr vantagens ou aplacar algum constrangimento social. É importante distinguir a racionalização sobre algum acontecimento no qual o indivíduo é o protagonista da adulteração do mesmo, pois há uma tendência para acreditar que existe intenção nesse processo de defesa do ego como se houvesse propósito consciente para fraudar. Quando a raposa comentou com a companheira que as “uvas estavam verdes”, porque não conseguiu colhê-las, ela não mentiu, mas usou um argumento intelectual que pudesse mitigar o sentimento de fracasso no objetivo de se deliciar das mesmas. Assim, o paciente pode superestimar os efeitos colaterais da medicação prescrita em detrimento da eficácia terapêutica sobre sua doença, a ponto de abandonar o tratamento ou convencer o médico para substituí-lo. Neste caso, os benefícios secundários que resultam da doença, como a atenção, o carinho, dependência e a sensação de segurança permanente que o tratamento traz, são mais preponderantes que a cura. Os motivos principais para tentarmos justificar nossas condutas com explicações “racionalizadas” derivam de desejos interditados pela consciência moral, de expectativas inacessíveis e formas compensatórias para ocultar sentimentos de incapacidade e de impotência para determinadas realizações. Em algumas situações a racionalização pode encerrar algo verdadeiro, apesar de não ser valorizado, pois servirá para encobrir o efeito psicológico secundário. O aluno, ao sentir incapaz de ser aprovado, deixa de comparecer à prova final admitindo-se “estar passando mal”. Sentir incapaz e ficar ansioso em qualquer situação de avaliação é inevitável, mas esquivar estaria encobrindo o motivo essencial. A reprovação poderia levar a conseqüências sociais muito mais indesejáveis que a reprovação justificável. É muito comum a apresentação de atestados médicos para justificar o comportamento de esquiva para
  31. enfrentar alguma prova que a pessoa não se sente preparado para ela. Asseverar uma “doença” como um pretexto de esquiva frente a uma situação ansiogênica é um estímulo reforçador condicionante que não ajudará o indivíduo a enfrentar os obstáculos que o limitam. A racionalização, por fim, é um mecanismo que opera na maior parte da vida, tendo como propósito fundamental a auto-proteção e o ajustamento psicológico constante. Não obstante, a racionalização pode ou não ser edificante a partir do momento em que seus conteúdos não passam a funcionar para enganar a mente, e isso vai depender da estrutura emocional de cada um. A racionalização neurótica aliena e cria caminhos de ilusões para a sobrevivência do indivíduo – é típico daquelas pessoas que está sempre construindo algum desculpa para seus fracassos perpétuos. Compensação Para Adler, o sentimento de inferioridade é inerente ao ser humano, devido aos anseios ilusórios à procura da perfeição e às limitações naturais que circunscrevem sua capacidade real de concretizar sonhos concebíveis. Afirma que a evolução filogenética do homem é a dinâmica propulsora que o impele para a excelência em todos seus atos, apesar de tomar caminhos contraditórios, quase sempre. Acredita que o impulso existencial do homem em direção ao aprimoramento é indissolúvel, e para que isso persista há uma mobilização psíquica na direção de algo elevado, superior, transcendental. O ponto de partida para seguir o caminho do desenvolvimento progressivo é a condição de inferioridade com a qual nascemos e que a todo o momento somos lembrados. As estratificações sociais, as comparações, o sortilégio pela competição e a ânsia pelo poder, talvez sejam as atitudes mais evidentes
  32. para superar e tentar manter a tendência que temos para caminhar sempre para frente e superar sentimentos de inferioridade, mesmo que seja enganando a nós mesmos por meio de devaneios deliróides. Tudo isso vale como a busca de um percurso para conciliar a inferioridade do homem com relação às exigências da natureza – que é perfeita. Para essa ação impulsiva cria-se objetivos, busca-se alternativas diversas e joga o tempo todo com a vida, tendo como sustentação a ânsia pelo poder. Quando se tem alguma deficiência na imagem de si mesmo com relação a aspectos intelectuais, físico e de caráter, o indivíduo tende a buscar compensações para abrandar ou superar o sentimento desconfortante de auto-subestimação, muitas vezes desenvolvendo atividades destacáveis e socialmente admiráveis. Segundo Adler, “a inferioridade dum órgão influi sobre a constituição psíquica, afetando a atividade e o pensamento, manifestando-se nos sonhos, exprimindo-se na escolha da profissão, nos pendores e nas aptidões artísticas”. O desejo de um paciente gago era ser locutor de rádio. Alguns portadores de focomelia nos membros superiores desenvolvem habilidades artísticas (pintura, música) utilizando os pés. Da mesma forma que as inferioridades orgânicas, privações afetivas dos pais, superproteção, mimos excessivos com supervalorização pessoal inadequada, aviltamento moral, etc., podem estabelecer sentimentos de inferioridade incapacitantes que bloqueiam ou dificultam o desenvolvimento natural do indivíduo em todos os aspectos essenciais. Muitos indivíduos com malformações, depressão, doenças crônicas ou deficiência mental moderada podem tentar compensar seus sentimentos de inferioridade através de controle social, utilizando sua condição para obter benefícios, conseguir aquiescência e indulgência pelas falhas cometidas. A busca de vantagens motivada por essas inferioridades é um investimento negativo, pois seus ganhos são mínimos e insustentáveis para a personalidade, impedindo o dinamismo natural de superação que pudesse sobrepujar a inferioridade de fato.
  33. Algumas formas de compensação a sentimentos de inferioridade são desmedidas e se transformam em neurose, trazendo sérias dificuldades de ajustes para a pessoa em seus relacionamentos sociais e interpessoais. O autoritarismo e a hostilidade do chefe podem revelar medo de perder o cargo, sentimentos de incompetência, dificuldade para estabelecer relacionamentos interpessoais, ameaças paranóides de conspiração, represália inconsciente por opressões remotas sofridas, entre outras atitudes equivalentes. A atitude de controle desse chefe pode gerar medo (quase sempre confundida com respeito) e interferir na qualidade do trabalho, pois quem trabalha ameaçado o rendimento, por melhor que seja, deixa a desejar em qualidade. Ao referir a compensação como mecanismo adaptativo para contrabalançar ou superar os sentimentos de inferioridade inatos da pessoa, não devemos deixar de enfatizar também o outro lado que é o poder de ser, também inato. Se não nascemos com sentimentos de poder, é indubitável que trazemos toda a potencialidade possível para aprender a vencer as barreiras que inevitavelmente serão encontradas, como também emitir determinados comportamentos para obter algo essencial para a sobrevivência. O choro emitido pelo recém-nascido é uma forma inata de revelar que alguma coisa não está bem, o que é entendido pela mãe como fome; o poder de gritar é o primeiro exemplar de suas potencialidades, a origem da complexa comunicação de linguagem que será desenvolvida durante o processo de adaptação ambiental, mais precisamente com relação às necessidades de agregação e participação social. As potencialidades da criança, à medida que são permitidas e exercitadas cada vez mais, são permutadas em poderes inumeráveis, passando a incorporar a sensação de segurança, confiança e percepção consciente de aptidão, dando-lhe prazer à medida que sente que é capaz de explorar o ambiente, ter vantagens e operar nele modificando-o. Ao mesmo tempo em que sente exultante por suas conquistas de poder, o indivíduo sofre a angústia pelos limites impostos e pelas responsabilidades que deverá
  34. assumir no ambiente, pois esse só funciona se houver ética e ordem para que todos compartilhem das vantagens em comum. Negação Quando aspectos da realidade não são suportáveis para o indivíduo, o ego para evitar o sofrimento, não reconhece os fatos originários como verdadeiros, às vezes, criando distorções. Esse mecanismo de negação da realidade é muito comum entre as pessoas portadores de psicose. O esquizofrênico para negar os sentimentos incapacitantes de inferioridade cria delírios megalomaníacos para assegurar sua sobrevivência psicológica, identificando-se com personagens de magnitude incomum, divinal. Para que os fatos desagradáveis sejam aceitáveis a realidade é banida da consciência e adulterada, só assim o sofrimento será controlado e suportado pelo ego. Não raro, o diabético recusa fazer uso regular de insulina e não abandona o hábito de comer doces para não admitir conscientemente que é portador de doença crônica. Prefere negar e se predispor à morte. Conversão Vários mecanismos mentais estão envolvidos na conversão, destacando-se entre eles, os seguintes: a repressão, a identificação, a negação, a simbolização e o deslocamento. Na conversão, o sintoma físico é a manifestação de conflitos de origem psíquica, sem entretanto causar danos ao órgão “elegido”. O conflito é resultado da força repressiva sobre desejos inconcebíveis. Esse mecanismo não surge de forma deliberada, conscientemente refletida e calculada, mas emerge da própria força do conflito, fazendo irromper seus conteúdos através de simbolização. O aparente comprometimento físico é apenas funcional,
  35. não sendo identificada qualquer lesão orgânica. Normalmente, o conflito que gera o desconforto psíquico é transmudado para a supressão de determinadas atividades motoras (paralisias) ou pela inibição sensorial. É uma forma de reter o conflito para evitar sua evacuação para o exterior. Formação Reativa É o mecanismo que se caracteriza por comportamentos opostos aos desejos, tendências e sentimentos reais que foram reprimidos. O comportamento explícito é uma forma de impedir a realização do desejo interditado. A vergonha, moralidade rígida e a repugnância com relação ao sexo, são barreiras contra a satisfação do desejo sexual. O medo de ser rejeitado e a necessidade de conter sentimentos hostis podem ser disfarçados através de comportamentos de cortesia, generosidade e de gratidão. A agressividade de uma pessoa pode estar encobrindo sentimentos de insegurança. O ciúme exagerado do cônjuge pode mascarar o desejo incoercível de trair o parceiro, como se a vigilância sobre o outro fosse o próprio controle. Substituição Quando algo é muito valorizado ou desejado, mas existe alguma razão impeditiva para obtê-lo, há uma tendência natural para compensar a frustração através da substituição por uma situação afim. É uma forma compensatória para amenizar o desconforto e evitar conseqüências negativas decorrentes de sentimentos de insatisfação por não ter realizado as expectativa criada. Quando não se cria meios compensatórios de substituição para suavizar a sensação de mal-estar emocional, a reação imediata habitualmente é a de agressão. A criança que não consegue obter o
  36. bombom que a mãe prometera, tende a reagir deferindo algum comportamento agressivo, para depois sentir abatida, isolada ou culpada. Em condições favoráveis, e se a expectativa é compatível com a capacidade de realização do intento, o indivíduo pode criar alternativas apropriadas para conseguir o sucesso de seu plano de ação. Assim, ele continua lutando e se determinando obstinadamente para alcançar o objetivo, aprende a superar obstáculos, adia, reinventa métodos e estratégias visando atingir as metas propostas. A substituição surge, porém, quando o plano de ação falha para o sucesso do intento e todos os recursos para alcançar o objetivo foram insuficientes. Se o mecanismo de substituição falha, o ego cria outras possibilidades para ludibriar o mal-estar psíquico produzido, mas estas alternativas não são necessariamente benéficas, podendo assumir forma neurótica. Projeção O mecanismo de projeção é análogo ao de deslocamento, sendo muito comum a sua utilização moderada como meio de evitar dissabores e se proteger das conseqüências sociais. Em níveis psicopatológicos a projeção é um mecanismo que se faz presente a todo o tempo na psicose paranóica e outras formas de psicoses paranóides. A projeção é uma defesa muito utilizada contra qualquer eventualidade que possa causar angústia. É uma propulsão de defesa lançada para fora como meio de negar algum traço de caráter, desejos e atitudes que não são aceitáveis. Ao utilizar a projeção como defesa contra a realidade, o mundo exterior passa a ser percebido de forma deformada. Ao transferir as próprias imperfeições morais e de caráter para outra pessoa, o eu fica inocentado de qualquer responsabilidade. Censurando e abominando
  37. alguém por cometer atos reprováveis pode-se mitigar os sentimentos de auto-recriminação pelo desejo de perpetrar os mesmos atos, sobretudo se a outra pessoa, a quem se projetou, sentir culpada. É importante perceber que a projeção contém outro mecanismo de defesa – a negação. Se uma pessoa odeia outra e não quer se sentir culpada por esse sentimento, ela inverte a situação e diz para todos, ou admite para si, que a pessoa odiada é que a odeia. Negando-se a si como protagonista do ódio e se transformando em vítima o indivíduo furta-se da angústia e da culpa por ser hostil ao outro. Na psicose, as falhas do ego no intuito de se organizar para adaptar à realidade, fazem surgir idéias de referência, alucinações e delírios que podem se associar com o mecanismo de projeção. A projeção nesses casos pode assumir a forma de delírios quando o material projetado é em nível de pensamento. Se a projeção é revelada por meio da percepção, as distorções da realidade vem em forma de alucinações. Referindo o delírio como o produto de projeções mentais não há de se surpreender que todo ser humano tende a criar ficção com bases em fatos reais e irreais, distorcer, criar mitos, subterfúgios, levitar solto na imaginação e colorir a realidade com a fantasia. Estas deflagrações mentais são úteis e necessárias para a sustentação da personalidade humana. A vida seria muito difícil se não conseguíssemos desenvolver condições intelectuais para confrontar com a realidade tosca – é essencial aprimorá-la colorindo-a com a nossa capacidade de abstração para manter distantes seus elementos perniciosos à sobrevivência psicológica. Desde os primórdios, o homem sempre criou e adotou crenças elaboradas para satisfazer exigências profundas em seu íntimo. A necessidade de apaziguamento intrapsíquico sempre nos leva a construir “outros mundos” ou deformar o que fazemos parte, e é através da criatividade que se consegue abrandar a ansiedade constante provocada pelos estímulos adversos inevitáveis. A criança que está com medo, no escuro,
  38. transforma a fresta que deixa passar um fio de luz em algum objeto ameaçador. A mente da criança deve criar a ilusão de perigo para concretizar algo que possa ser controlado por sua vontade, correr, ir para o quarto dos pais ou cobrir a cabeça para se proteger. Quando não se consegue abstrair a realidade mental o temor pode chegar num nível de desespero, assim como acontece na síndrome do pânico. Nesta síndrome, a ansiedade não pode ser aliviada, pois a mente não consegue construir um objeto para que ela possa determinar defesas contra ele, assim como acontece na fobia. Na fobia, o objeto do medo nem sempre oferece perigo real que não possa ser controlado. O temor fóbico da barata é sempre controlado quando aparece alguém para matá-la e, as “idéias de perigo” são dissolvidas momentaneamente. As idéias delirantes surgem quando as privações não podem ser supridas suficientemente para atender necessidades especiais e extremamente essenciais que sirvam como arrimo da personalidade. Se o indivíduo se sente impotente para encarar a realidade, o seu instinto de sobrevivência obriga inexoravelmente que a mente construa algo para evitar a catástrofe iminente. É assim, pois, que o homem tende a desvirtuar o pensamento para se adequar da melhor forma à realidade e poder sobreviver, independente da qualidade do mecanismo usado, pois eles não sustentam por muito tempo e, muitas vezes quando persistem levam o indivíduo ao suicídio ou à desintegração crônica da personalidade. O delírio é considerado por alguns como uma falsa crença, conquanto ela não seja uma construção voluntária e consciente para quem é portador de sério distúrbio de personalidade. O delírio não é uma mentira ou dissimulação da realidade, mas uma transformação psicológica motivada por pulsões extremamente fortes que anula aspectos da consciência cognitiva. É tanto que o delírio é um distúrbio do pensamento, sendo consistente e permanentemente presente, fazendo parte da vida do indivíduo. Admitir o delírio como uma crença falsa é
  39. comparar o pensamento doentio do paciente com o sistema de crenças que convencionamos como normal e desejável. Isso sim, é uma crença falsa com intenções presunçosas. Considerando ainda alguns sintomas psicóticos como manifestações projetivas de necessidades urgentes, satisfação de desejos reprimidos, busca de uma realidade indulgente, entre outros, havemos de enfatizar a alucinação como um distúrbio da percepção sem causa orgânica conhecida. O processo da percepção se dá através de vários receptores que captam a energia do ambiente (estímulos) e geram impulso nervoso. Estes impulsos atingem áreas especiais do cérebro formando imagens (quando o estímulo é visual), transformando em sensações auditivas, táteis ou outras de natureza sensorial, dependendo do tipo de estimulação. A interpretação destas sensações depende das experiências prévias do indivíduo e de seu estado psicológico. Conforme o estado psicológico da pessoa a interpretação perceptiva dos estímulos pode ser deformada e, a esse processo, dá-se o nome de ilusão. A desfiguração da realidade na ilusão é menor que na alucinação e não significa que seja obrigatoriamente um sintoma psicótico, podendo ser passageiro e circunstancial. A imagem original formada pelo estímulo é percebida de maneira errada, de acordo com aspectos psicológicos especiais. O medo de fantasma pode levar a pessoa a formar imagens equivalentes ao ver um facho de luz à sua frente. Em estados tóxicos as percepções podem ser distorcidas devido à confusão cerebral na capacidade de interpretar os objetos reais. Na alucinação não há interpretação errônea de nenhum estímulo externo, sendo na verdade uma criação da mente do indivíduo sem nenhuma interferência sensorial. Não existe estímulos sensoriais que possam criar algum impulso para ser levado e ser codificado pelo cérebro. Diferente da ilusão que é um engano momentâneo e
  40. circunstancial da realidade, a alucinação passa a fazer parte efetiva da vida psicológica do paciente como uma forma de projeção de temores, desejos, impulsos incoercíveis, etc. Ao desejar ardentemente obter prazer sexual com alguém, o paciente pode “alucinar” vendo o parceiro entrar pela janela do quarto. O medo, sentimentos de culpa, desejo de resgate ou a negação da morte de uma pessoa querida, pode irromper uma alucinação visual do falecido. Neste caso, a irrupção alucinatória é súbita e não psicótica, mas motivada por uma intensa propulsão projetiva dos fatores psicológicos relacionados. É importante salientar que a alucinação não se concretiza aleatoriamente, o tema percebido apresenta um significado alegórico de conteúdos mentais profundos que escapam à consciência. Ouvir uma “voz interna” que decreta insistentemente que a pessoa “se mate!”, por mais perturbadora que seja a determinação subjetiva pode estar revelando o desejo de se sucumbir, quer seja através do desejo de suicídio, quer seja por simples desejo de fugir da situação atormentadora. A alucinação psicótica difere da “confusão mental” porque há convicção do indivíduo que ter experienciado sensorialmente aquela “situação irreal”, enquanto que na confusão o indivíduo não tem certeza da experiência vivenciada, apesar de se certificar futuramente que houve apenas um transtorno perceptual subitâneo. A confusão é distúrbio da consciência que se manifesta por desorientação espacial, perplexidade, vacilação, dificuldade para integrar e associar fatos e dificuldade para raciocinar. No estado confusional pode-se identificar o estímulo, mas é impossível situá-lo com relação a outras eventualidades ambientais. A memória fica desorganizada no estado de confusão, enquanto que na alucinação não há nenhum comprometimento mnemônico. Há quem afirme que a confusão verdadeira só acontece como reação sintomática de estados tóxico-orgânicos.
  41. Sublimação Como se pode deduzir, a energia psíquica é uma força crescente que deve ser deslocada para algum fim. Sua ação dinâmica pode ser transferida para fora ou para dentro. A repressão, como se viu, é energia deslocada para dentro e, em seu dinamismo crescente, atua no psiquismo para estabilizá-lo o tempo todo. Para que isso aconteça, todavia, é preciso que essa energia reprimida seja convertida em algo produtivo, pois ela não pode ficar retida, estagnando a movimentação psicológica que deve ser constante. É aí que entra a sublimação, que é o processo de saída da repressão para realizações positivas e socialmente úteis. Impulsos sexuais e agressivos, quando não podem ser satisfeitos, por exemplo, devem ser aproveitados para fins que sejam socialmente aceitáveis. Se as pulsões geradas pelas necessidades instintivas, não conseguem encontrar saída, se transformam em ansiedade, ou seja, numa força mais poderosa para encontrar válvulas de escape. A ansiedade, como uma energia também, não se contém e busca saída de qualquer maneira, nem que seja por meio de sintomas diversos – o que seria, paradoxalmente, destrutivo. No caso da sublimação, essa energia não é demolidora, pois busca saídas edificadoras, mesmo sendo compelida pela ansiedade. A agressividade de um médico, por exemplo, pode ser sublimada através da escolha da especialidade de cirurgia. A cirurgia sendo um ato agressivo em si mesmo pode servir de canal aos impulsos agressivos do cirurgião. A prática de esportes agressivos pode ser uma forma de escoamento da agressividade. A aversão que se tem por pessoas oprimidas pode ser convertida em atos de generosidade humana. A sublimação do impulso sexual pode ser acionada e a energia libidinal investida em inúmeras atividades louváveis, mas este mecanismo nunca será compensado definitivamente, pois o impulso sexual não aceita “dissimulações”, pois os mesmos apresentam propósitos únicos e exclusivos de reprodução como garantia da preservação vital. Agora, o desejo sexual que incita o impulso libidinal para a sua satisfação pode ser temporariamente reprimido e sublimado,
  42. mas não pode ser por longo período, pois do contrário, será convertido em perversão, angústia ou distúrbios psicossomáticos severos. Hipocondria É um distúrbio de natureza psicológica cujo elemento mais importante é o quadro depressivo que se oculta sob a forma de preocupação obsessiva com a saúde. A depressão está muito bem protegida sob o pretexto das queixas constantes e variadas, aos mínimos sinais de desconforto físico. Uma insignificante erupção na pele, por exemplo, recebe importância superestimável, sem entretanto, apresentar diagnóstico grave; uma dor tensional no músculo pode ser interpretada como um câncer incurável. Na hipocondria a vigilância constante sobre o corpo desvia o verdadeiro “problema” para os órgãos. A mente não consegue isolar os elementos emocionais encobertos e, com isso, tende a criar idéias deliróides relacionadas às mínimas manifestações corporais. A ansiedade gerada nos recônditos inconscientes encontra saída por meio das queixas, sendo mais comum em pessoas carentes de atenção, inseguras e incapazes de assumir responsabilidades. Pode-se observar uma freqüência muito elevada de hipocondria nas pessoas que tiveram que enfrentar responsabilidades desde cedo na vida, muitas vezes por separação, morte ou doença incapacitante dos pais. Atitudes hipocondríacos circunstanciais são comuns quando a pessoa apresenta dificuldade no trabalho, passando a se consultar com médicos ou psicólogos para fugir e/ou esquivar da situação conflitiva. É muito freqüente o uso de atestados médicos entre os estudantes com o pretexto de estarem doentes para não esquivar de provas ou apresentações de trabalhos quando não estão preparados. Esses
  43. comportamentos não apresentam consistência característica de uma hipocondria genuína, apenas assumem a forma de atitude hipocondríaca, sendo portanto situacional. O interesse do hipocondríaco quando procura o médico não está relacionado à busca de recursos terapêuticos de fato, pois sua descrença e falta de perseverança para seguir as prescrições revelam a resistência para tratar da saúde física efetivamente. A busca obsessiva de “tratamento” é apenas um pretexto para disfarçar a verdadeira causa do problema intrapsíquico. Enquanto o terapeuta se envolve com o paciente para averiguações clínicas, ele obtém o mínimo de suas necessidades de atenção, de importância e de amparo psicológico. Szasz relaciona a perda significativa de alguém ao interesse do Ego pelas sensações corporais, pois é uma forma de transferência dos sentimentos para o corpo. A Dor A dor é uma manifestação de sofrimento, um sinal de alerta que serve para revelar que alguma coisa está desordenada no organismo ou no psiquismo. A dor tanto pode revelar um transtorno físico como um sofrimento psicológico. O corpo é a sede da dor. Não existe dor que não seja localizada em alguma parte do corpo, mesmo que essa dor não revele alterações anatômicas e funcionais. De qualquer maneira, a dor é a condição mais segura para um pedido de socorro e a forma mais imediata para a consecução de ajuda. A dor pode ser localizada, difusa e repercutir alhures como se caminhasse à deriva pelo corpo sem encontrar um local para atracar. Pode ser física em resposta a uma lesão ou revelar uma disfunção orgânica focalizada, ainda assim servir de oportunidade para canalizar sofrimentos emocionais submergidos no desvão da alma.
  44. Levando em conta a dor como um meio de comunicação para conseguir ajuda, obter alívio e construir meios para lutar contra o perigo alertado por ela, é fundamental que a situação perigosa seja confiada a um profissional competente com quem se possa estabelecer uma interação coesa. A qualidade da interação é o prenúncio do sucesso ou fracasso terapêutico, haja vista, ser a condição determinante para um diagnóstico seguro e tratamento apropriado. Se a interação médico-paciente se estabelece de forma abrangente e detalhada, voltando maior atenção à pessoa que sofre e tendo a dor apenas como um indicativo, a própria indicação acertada a outro profissional especializado já garantiria um prognóstico favorável. Szasz para conceituar a dor divide-a simbolicamente em três níveis de hierarquia. No primeiro nível, a dor é conceituada como um anúncio de ameaça estrutural indefinida no organismo, através de sensação de sofrimento – é o significado biológico da dor sem nenhum colorido psicológico especial, sendo personagem apenas uma pessoa. Como um sinal de sobreaviso, o ego é informado do processo doloroso para que tome a iniciativa devida para resolver o problema. O ego aciona o corpo para tomar medidas urgentes para terminar com o sofrimento e protegê-lo da situação que o coloca em perigo de desintegração, e assim, recobrar o equilíbrio vital. No segundo nível, a dor serve como mensagem para comunicar com outras pessoas presentes na intenção de conseguir ajuda. A dor no terceiro nível releva-se por seu aspecto comunicativo não havendo nenhuma referência biológica. Nesse nível a dor denota pedido de ajuda e denúncia de descontentamento ou ofensa. A dor assumirá a forma de afeto servindo ao ego para prevenção do perigo iminente de perda de algo.
  45. A MEDICINA E A DOENÇA A medicina é o melhor meio a que se recorre para cuidar da vida no sentido de preservá-la, e os esforços científicos empreendidos para torná-la inextinguível são inexoráveis. Ter vida consciente perpétua é a aspiração angustiante do homem, pois nunca atingiremos um grau supremo de resignação para aceitar a mortalidade, e é justamente por isso que recorremos também aos mitos para suportar a impiedosa finidade biológica da vida. A medicina e todos os recursos inerentes que se busca para garantir a vida não dão relevância à saúde, mas à ausência de fatores que podem ameaçá-la. A doença, então, ocupa o ponto de destaque que deve ser aniquilado, como se ainda representasse símbolos ou imagens de espíritos maléficos que ressoam no inconsciente coletivo e que precisam ser exorcizados. Jean Clavreul pretende mostrar que o “saber médico é um saber sobre a doença, não sobre o homem, o qual só interessa ao médico enquanto terreno onde a doença evolui”. O homem passa a ser um mero objeto onde a doença se instala; ele é importante como um ponto de referência para a subsistência da doença. Não obstante, o perigo iminente ao aniquilamento do homem enquanto um organismo vivo deve ocupar mesmo o alvo relevante. O organismo é o campo de batalha entre os recursos médicos e a doença e, esta, é a protagonista da cena que deve ser vencida, o obstáculo que deve ser ultrapassado de qualquer maneira. Logo, urge combater a doença em detrimento da pessoa que sofre, por mais que isso pareça desumano, mas no final, pode ser o homem o maior beneficiado. No imaginário humano, tudo deve ser perfeito e, para isso, não deve existir o contrário de que tanto se teme – é a regra do princípio do prazer que nos obriga a refutar fatos da realidade que impede entender que uma coisa não existe sem a outra.
  46. O tratamento médico desenvolve de acordo com o princípio da realidade, mas visando o prazer, que é o alívio do sofrimento. Uma injeção é dolorosa, mas visa livrar a pessoa do sofrimento e, muitas vezes, sua aplicação há de ser imediata. Para esclarecer melhor sobre essa dinâmica psicológica que chamamos hedonismo (busca do prazer pela evitação do sofrimento), acho oportuno fazer uma relação entre o princípio do prazer e o princípio da realidade para comunicar melhor as razões que fazem com que o médico enfatiza a doença a despeito do homem que sofre. Entre tantas investigações relacionadas aos fenômenos do psiquismo humano, Freud considerou duas forças determinantes de grande relevância: o princípio do prazer e o princípio da realidade. Para enfrentar a realidade, o organismo deverá adquirir habilidades para desenvolver a tolerância relacionada à dor ou qualquer situação que possa resultar em sofrimento. Antes de prosseguir, devemos compreender o que realmente chamamos de realidade. Realidade, a meu ver, é tudo aquilo que pode ser captado pelos sentidos, processado pelo cérebro e interpretado pela consciência até mesmo de forma distorcida, como nas alucinações e ilusões. Os estímulos ao serem captados pelos sentidos provocam reações sensoriais e a consciência os interpreta através do processamento cerebral, formando-se assim a realidade. Se se aprende que o trabalho é castigo ou algo penoso, a ordem é para que se evite o mesmo. Evitar o mesmo resulta em prazer. Prazer, neste caso, é a ausência do sofrimento e, a isto, chamamos princípio do prazer. Seria doloroso viver apenas em função da realidade, assim como seria enfadonho viver exclusivamente do prazer. Assim sendo, é preciso haver equilíbrio entre os dois processos, pois não se pode viver sem prazer e, para este existir, é preciso o outro. Por outro lado, a realidade seria insuportável para o organismo se não houvesse a descarga das tensões que ela causa. É esta descarga de tensões internas que chamamos de prazer – a intensidade deste é proporcional à magnitude daquela. Se um indivíduo está privado de alimentos por alguns dias, o prazer relacionado ao ato de alimentar é bem maior se a privação estivesse dentro de um intervalo regular de tolerância máxima.
  47. Freud considerou o sofrimento (desprazer ou dor) como um aumento da intensidade de excitação do organismo e o prazer à diminuição da mesma. Alexander Lowen reafirma a posição de Freud, mas acha mais apropriado referir excitação como tensão e, esta, surge em conseqüência de necessidades. A necessidade por sua vez, quando presente, motiva o organismo através do desejo e, este, mobiliza o indivíduo para a sua satisfação. Em sua obra Mas Alla del Principio del Pracer, Freud expõe a hipótese de que “uma das tendências do aparelho anímico é a de conservar, o mais baixo possível, ou pelo menos, constante a quantidade de excitação e, tudo o que exceder tem que ser sentido como antifuncional, isto é, como desprazer”. O princípio do prazer, portanto, é oriundo do princípio da constância, não sendo portanto, considerado como dominante. Se assim o fosse, não haveria sofrimento. Contudo, existe uma tendência psíquica muito forte para que o princípio do prazer passe a dominar, mas outras forças opõem a essa inclinação. Esse raciocínio nos conduz a admitir que o “paraíso” é a finalidade humana acima de tudo, ou seja, viver sempre fugindo e esquivando de toda situação que possa levar ao sofrimento (princípio da realidade), por mínimo que seja. À intolerância ao sofrimento, o ego desenvolve mecanismos diversos para livrar-se dele – os mecanismos de defesa, já mencionados. A não compreensão do princípio do prazer e dos mecanismos compensatórios oriundos dele pode dificultar o tratamento do doente. O ego pode mascarar a doença através do mecanismo de repressão. Algo desagradável e ameaçador para a integridade do organismo é rechaçado para longe da consciência, e com isso os sintomas são disfarçados, mas nem por isso, o sofrimento deixa de existir. O sofrimento é dissimulado, mas não encoberto. Os sintomas psicossomáticos mascaram o verdadeiro mal. A hiperemese gravídica mascara a rejeição da gravidez. O desconforto causado pelos vômitos incoercíveis durante a gestação é mais tolerável que a culpa originária da rejeição ao filho. O ego furta-se da responsabilidade de assumir a gestação e transfere o “sofrimento” para o corpo. Trocar um sofrimento por outro, entrementes é criar um pretexto inútil; só mesmo um ego primitivo, refém do princípio do prazer, pode fazer.
  48. A pessoa que procura os préstimos da medicina, muitas vezes o faz com o intuito de ser identificado como doente para desobrigar-se das responsabilidades laborativas, obter benefícios da previdência social, aposentadoria, etc. Inúmeros funcionários desenvolvem depressão por dificuldade de adaptação no trabalho, e quando buscam tratamento, o motivo não é tratar, mas apoiar num álibi para fugir da situação perturbadora. O afastamento do trabalho por meio do respaldo médico é um reforçamento negativo que o livra do sofrimento de ter que enfrentar a situação aversiva. O Dinamismo Orgânico Há muito se procurou conhecer a estrutura anatômica e o funcionamento integrado de todos os órgãos e sistemas que compõem a totalidade do organismo humano, mas pouca importância se deu para compreender os estudos relacionados ao processo resultante do dinamismo que assegura a vida. Isso se deve à indolência intelectual para integrar a objetividade com a percepção subjetiva dos fatos observáveis, sendo mais fácil, nas ciências relacionadas ao homem, fragmentá-lo em setores isolados. A própria psicologia behaviorista nega o comportamento abstrato, optando pelo comportamento concreto que pode ser observável, medido e previsto. A dinâmica subjacente, por não ser captada pelos sentidos, não desperta interesse científico à psicologia comportamental e à medicina – seria uma fantasia e fugiria do modelo pragmático que exige os princípios científicos. Tudo começa, porém, pela observação de fatos concretos que irrompem a imaginação e, daí, cria-se teorias para serem ou não refutadas pela íntima relação do fato com o imaginário. Não há como escapar, melhor mesmo é desenvolver e arriscar nas divagações lógicas que os acontecimentos observáveis provocam. De qualquer maneira, a verdade dos fatos merece um pouco de estética intelectual. Nem toda beleza e acréscimo ao fato observável adulteram sua realidade, afinal a verdade absoluta só existe em nossos
  49. anseios de perfeição para desvendar o mistério contido no âmago de tudo – isso é impossível. Para Kurt Goldstein, a dinâmica do organismo obedece a três princípios fundamentais: a equalização, a auto-realização e a concordância com o meio ambiente. De acordo com o princípio da equalização é necessário um provimento constante de energia para ser distribuído uniformemente por todo o organismo para manter um nível adequado de tensão. Equalização, portanto, é o estado de tensão necessário para o equilíbrio do organismo. O processo de equalização controla para que a tensão não seja descarregada por total como assim o determina o princípio do prazer. A equalização serve ao princípio da realidade para manter em equilíbrio o nível de tensão do organismo. Em equilíbrio o organismo funciona de forma eficiente para conciliar com as eventualidades do ambiente. A dinâmica do princípio da equalização é constante no intuito de manter o equilíbrio perene, mas isso é impossível, pois sempre haverá desgastes nessa competição. O que mais importa para manter o equilíbrio é a conciliação do ambiente interno com o externo para que o organismo seja preservado o máximo possível de qualquer avaria, pois a equalização não é um processo que estabiliza o organismo de forma permanente. Todos os processos envolvidos para responder à infinidade de variáveis ambientais (ambiente interno e externo) dependem muito da integridade básica do organismo, de sua capacidade de adaptação, das experiência vivenciadas e da forma como foram assimiladas e elaboradas. Se a assimilação e a elaboração das experiências forem bem ajustadas o indivíduo desenvolverá cada vez mais a capacidade de neutralizar os estímulos adversos provindos do ambiente. É o que tende a acontecer à medida que as pessoas envelhecem – ficam menos vulneráveis com a maturidade. Um outro princípio apresentado por Goldstein é chamado auto-realização, sendo este considerado o principal motivo para a sobrevivência do organismo. A auto-realização decorre das inúmeras
  50. necessidades do homem, a começar pelas necessidades biológicas essenciais, como a fome e o sexo que, se não supridas, o organismo seria sucumbido. A auto-realização é uma exigência pulsional bastante complexa que transparece através da satisfação urgente das necessidades biológicas primárias, mas que está ligada a outras necessidades sublimes como a ânsia de poder, utilidade, reconhecimento, explorar, dominar para transcender à consciência confusa da limitação original. Saciar a fome é a condição necessária para satisfazer todas as outras necessidades, pois é através do alimento que se obtém os nutrientes imprescindíveis para manter a vida e, desse modo, capacitar o organismo para a auto-realização integral. Se fosse possível satisfazer todas as necessidades, ou melhor, se a auto-realização fosse completa, o homem deixaria de sonhar, não sentiria prazer em nada, não teria saudade de momentos aprazíveis, tampouco continuaria mantendo ligações afetivas desenvolvidas no passado. O homem atingiria um nível sobre-humano idealizado, mas seria engolfado por um estado de insensibilidade emocional para qualquer eventualidade. Só de imaginar e transcrever esse delírio absurdo tive uma profunda sensação de melancolia e apatia, quase não consegui terminar a idéia. Com isso chego a uma conclusão pessoal: a transcendência só pode existir na imaginação esquivante, a felicidade plena é a melhor distração para superar os sofrimentos que fazem parte imprescindível do processo que chamamos VIDA. A aspiração humana e a esperança é uma forma de fuga da “consciência”, já que nunca conseguiremos a auto-realização absoluta, assim como exige as incessantes necessidades de superação. Enquanto houver a perseverante obstinação ideal e a tenacidade voluntária para a auto-realização, o homem será sempre criativo e andará em direção ao horizonte misterioso que se predeterminou – melhor que ser levado ao léu pela idéia infecunda de que somos determinados pelo destino ou pela casualidade. Em sua capciosa abstração poética, Antonio Machado, assim reafirma a idéia:
  51. “Caminhante, são teus rastros o caminho, e nada mais; caminhante, não há caminho, faz-se caminho ao andar. Ao andar faz-se o caminho, e ao olhar-se para trás vê-se a senda que jamais se há de voltar a pisar. Caminhante, não há caminho, somente sulcos no mar”. Seguindo as observações teóricas de Goldstein, ele infere que, embora exista um senso de auto-realização intrínseco na natureza do homem, “...os fins específicos pelos quais as pessoas lutam variam de pessoa a pessoa”. A individualidade das pessoas as diferencia nas potencialidades inatas que as predispõem a se movimentar com maior ou menor tenacidade para seguir objetivos, assim como estão sujeitas às influências do meio, da cultura em que vivem e da disponibilidade dos recursos necessários para se desenvolver. As qualidades naturais do indivíduo, para Goldstein, podem ser identificadas pelas preferências que manifestam espontaneamente em suas atividades, principalmente naquelas que dedicam e esmeram mais. Quando se faz orientação vocacional, os psicólogos enfatizam as aptidões e habilidades através da investigação de suas inclinações, freqüência e da capacidade para realizá-las. A potencialidade é desenvolvida a partir do momento em que exercita, caso contrário, ele não se realiza apenas por ter o requisito inato, inativo. Os recursos disponíveis na cultura e o estímulo do ambiente imediato (família, oportunidades sociais, educação, etc.) podem ser definitivos a muitas pessoas, enquanto que para outras, a motivação pessoal consciente é a principal força geradora da auto-realização, independente do talento ou da capacidade de engenhosidade intelectual para criar e desenvolver. O último princípio que sustenta sua teoria organísmica é chamado “concordância com o meio ambiente”. Apesar de enfatizar os determinantes relacionados à capacidade de controle de equilíbrio das tensões do organismo
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