Este documento descreve um estudo de caso sobre um empreendedor que criou o próprio emprego após ficar desempregado. O estudo analisa como o empreendedorismo pode ser uma forma de resistir à exclusão social causada pelo desemprego. O documento apresenta o objeto de estudo, o método de investigação qualitativa utilizado e as conclusões gerais do estudo.
PROJETO DE EXTENÇÃO - GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS.pdf
O desemprego - Um caso de sucesso
1. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
Universidade do Algarve
Escola Superior de Educação e Comunicação
Mestrado em Educação Social - 1º Ano
Unidade Curricular de Pobreza e Exclusões Sociais
2013/2014
O OUTRO LADO DO
DESEMPREGO
Um caso de sucesso
Docente:
Vanessa Sousa
Discentes:
Cecília Pires, nº 40046; Rita Gonçalves, nº 41807 e Ricardo da Palma, nº
43043
Faro, novembro de 2013
2. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
“Há uma força motriz mais poderosa que o vapor, a
eletricidade e a energia atómica: a vontade.”.
Albert Einstein
3. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
Índice
Introdução.............................................................................................................................. 3
1. O Objeto de estudo ........................................................................................................... 4
1.1. Exclusão Social e Desemprego .............................................................................. 4
1.2. A resiliência no desemprego .................................................................................. 5
1.3. Empreendedorismo VS Emprego ..........................................................................5
2. O Estudo: que caminhos? ................................................................................................. 6
2.1. Fases estruturantes da investigação .......................................................................8
2.2. O desenho da investigação: primeiros passos ........................................................ 9
2.3. Análise de conteúdo ............................................................................................. 11
2. Análise e interpretação de resultados ............................................................................. 12
2.1. Teóricas VS Empíricas ........................................................................................ 13
2.2. Exclusão Social e Desemprego ............................................................................ 13
2.3. A resiliência no desemprego ................................................................................ 14
2.4. Empreendedorismo VS Emprego ........................................................................14
3. Conclusões ...................................................................................................................... 15
Bibliografia.......................................................................................................................... 17
ANEXOS ............................................................................................................................. 19
Grelha de análise de conteúdo da entrevista .................................................................20
4. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
Introdução
Enquadrado na avaliação da unidade curricular (UC) Pobreza e Exclusões Sociais do
Mestrado em Educação Social, da ESEC-UAlg, a presente abordagem resulta da proposta da
docente da UC, Vanessa Sousa, a qual, dada a sua atualidade e importância, bem como a
constante presença no nosso País, motivou a que a escolha do tema incidisse no desemprego
enquanto fator de exclusão social. Emerge também de um caso concreto de desemprego e das
perceções cotidianas que tendem a manter-se bem vincadas na vida dos portugueses, bem
como dos fundamentos teóricos de alguns autores, mormente de Bruto da Costa (1998), que
define o desemprego como um propulsor de exclusão social.
Nesta senda, pretende-se efetuar uma abordagem à criação do próprio emprego como
fator de resiliência ao desemprego, e, do geral para o particular iremos tratar o conceito de
exclusão social, partindo dos seus princípios norteadores, e, inevitavelmente, chegar ao
desemprego, encarando-o como um fenómeno que afeta cada vez mais indivíduos e cada vez
mais de diferentes estratos sociais. Nesta abordagem ir-nos-emos focar com maior incidência
no domínio económico (parcos rendimentos ou inexistentes, impossibilidade de obtenção de
bens e serviços indispensáveis ao pleno funcionamento do indivíduo em sociedade), onde a
situação de desemprego assume um papel preponderante na fragilização da estrutura social do
indivíduo e das suas condições psicológicas, comportamentais e das relações familiares.
Apoiados nos dados mais recentes do Eurostat relativos à taxa de desemprego (média
EU: 11%; média Portugal: 16,3%)1, que levam a crer que as atuais orientações políticas de
promoção de crescimento económico, tanto nacionais como europeias, sugerem resultados
pouco positivos quanto à empregabilidade, propomo-nos, recorrendo a um exemplo de
sucesso de criação do próprio emprego (negócio), refletir sobre se uma aposta em paradigmas
de promoção de capacitação das pessoas para uma autoeducação empreendedora permite por
si só impulsionar alternativas de vida de forma autónoma e promover um volte face à atual
crise económica e social. Acreditamos que atitudes ativas, dinâmicas e por vezes arrojadas de
abordar o mercado de trabalho e com estímulos que levem as pessoas ao (re) aproveitamento
de recursos e oportunidades promoverão a desejada transformação social.
Enquanto Educadores Sociais, promotores da mudança social, pretendemos provocar a
sociedade com esta ilustração positiva de criação do próprio emprego como alternativa
resiliente ao desemprego. Reconhecemos que esta resiliência, ao ser encarada como uma
1
Dados do Eurostat referentes ao mês de setembro de 2013 – consulta em novembro de 2013
3
5. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
estratégia a seguir, tende a servir de alavanca ao aumento da autoestima, capacitação e
valorização pessoal e coletiva.
1. O Objeto de estudo
1.1.
Exclusão Social e Desemprego
Na linha de pensamento de Bruto da Costa (1998), as pessoas são consideradas
socialmente excluídas quando se combinam a falta de meios económicos, o isolamento social
o acesso limitado aos direitos sociais e civis, bem como o acesso insuficiente aos recursos
pessoais, familiares, económicos e culturais, e pode, portanto, ser definida como a fase
extrema do processo de desenvolvimento da marginalização (Castel, 19902, citado em Costa,
1998).
Quando falamos de exclusão social significa a exclusão n(d)a sociedade, aqui vista
como a rutura do conjunto de sistemas sociais básicos (sociabilidade, económico,
institucional, espacial e simbólico). Assim, a sua definição tende a ser mais complexa do que
a do conceito de pobreza, na medida em que não se depende apenas de determinantes
económicos mas em termos mais amplos de integração ou participação na sociedade em um
ou vários domínios desses sistemas sociais. É, pois, um processo dinâmico dentro de qualquer
sociedade e que representa uma acumulação contínua de fatores sociais e económicos ao
longo do tempo (problemas laborais, formas de educação e estilos de vida, saúde,
nacionalidade, alcoolismo, toxicodependência, violência…) (Costa, 1998).
A exclusão social e a pobreza são sem dúvida dos maiores desafios do nosso século, na
medida em que colidem com o exercício dos direitos fundamentais dos seres humanos.
Tomando como ponto de partida estes direitos fundamentais, abordaremos a partir da posição
de Bruto da Costa, a exclusão social do tipo económico, quando este a refere como “falta de
acesso a fontes de recursos, que incluem o mercado de trabalho, em função ao salário que se
aufere; o sistema da segurança social, pelas pensões, abonos, subsídios, etc.” (1998, p.15).
No que toca ao conceito de desemprego, e baseando a abordagem no pensamento
teórico de Maruani (2002), onde esta autora, recorrendo a conceitos históricos, refere que
foram as políticas sociais que contribuíram para a invenção do desemprego enquanto
construção social em constante movimento e transformação, levou a que refletíssemos sobre a
forma de olhar este conceito.
2
Castel, R., (1990). Extreme Cases of Marginalization, from Vulnerability to Desaffiliation, comunicação
apresentada no European Seminar on Social Exclusion, realizado em Alghero (Itália) em Abril de 1990.
4
6. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
Entendemos, portanto, que estar/ser desempregado não significa estar apenas privado de
um trabalho remunerado, voluntária ou involuntariamente, mas também reconhecer como
legítimo a procura ativa de emprego. As próprias condições de inscrição e de direito ao
subsídio de desemprego, e que se estende numa enorme franja da nossa sociedade, não fazem
mais do que limitar as fronteiras desta mesma legitimidade. Estas condições sinalizam e
oficializam os limites do direito ao desemprego que só pode existir se houver direito ao
trabalho.
1.2.
A resiliência no desemprego
Como referem Louçã e Caldas (2009, citados em Santos, 2011), ironizando sobre o
pensamento neoliberal que aponta como evidente que os despedimentos de hoje serão, talvez,
o emprego de amanhã, recorremos a este ponto de vista para, numa inversão ideológica, o
propor como fator impulsionador da abordagem ao tema da criação do próprio emprego
enquanto resiliência ao desemprego.
Numa perspetiva norteada pelos pensamentos de autonomia, capacitação, mudança e
empowerment, pretendemos, recorrendo ao pensamento de Paulo Freire, mostrar que o
desemprego por si só não poderá continuar a ser entendido pela sociedade como um veículo
propulsor de pobreza e de endividamento das famílias e, logo, de exclusão social. Boaventura
de Sousa Santos entende o desemprego como um dos principais “detonadores da insolvência
pessoal e familiar“ (2011, p.69). Neste sentido, entendemos, que esta atitude empreendedora,
de criação do próprio emprego e encarada como capacidade pessoal para resistir, lidar e reagir
de modo positivo em situações adversas, será a forma de apresentar indícios de viragem para
novas formas de encarar a vida e o mercado de trabalho e, logo, de abordar o desemprego
enquanto fator propulsor de exclusão social.
1.3.
Empreendedorismo VS Emprego
Para abordar o tema do empreendedorismo, num sentido ativo, arrojado e diligente e
que se pretende apontar como um dos pontos marcantes deste trabalho, aprofundamos o
conhecimento através das várias pesquisas e leituras documentais e que nos levaram não só à
objetiva definição do conceito como à clareza das suas caraterísticas, munindo-nos de
pensamentos teóricos contemporâneos e que compreendem o empreendedorismo como
orientação para o desempenho e está relacionado com a exploração de oportunidades
rentáveis (Shane & Venkataraman, 2000).
Nesta linha de pensamento, Baptista, Teixeira e Portela (2008) acrescentam ao conceito
de empreendedorismo as componentes oportunidade e necessidade. Estas componentes
5
7. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
apontam que o facto de o indivíduo criar o seu próprio emprego depende de estímulos de cariz
económico e que distinguem estes dois tipos de empreendedorismo. Estamos perante um
processo de empreendedorismo de oportunidade quando os indivíduos que têm maior capital
social conseguem alcançar uma determinada oportunidade de negócio que se prevê lucrativa e
acreditam alcançar com maior facilidade os seus objetivos pessoais e económicos. Já o
empreendedorismo por necessidade ocorre quando os indivíduos se deparam sem alternativas
favoráveis (falta de rendimentos por se encontrarem desempregados ou em empregos
inadequados) para subsistir e optam por criar estratégias para ultrapassar essas situações,
nomeadamente a criação do próprio emprego. É no tipo de empreendedorismo por
necessidade que baseamos o nosso trabalho
2. O Estudo: que caminhos?
Tal como defendem Albarello, Digneffe, Maroy, Ruquoy, Saint-Georges (1995), como
qualquer trabalho realizado em ciências sociais é necessário recorrer a métodos, técnicas, e
estratégias específicas consoante o assunto em questão. Abordar o tema da criação do próprio
emprego, numa perspetiva empreendedora e de resiliência ao desemprego, quer pela forma
como nos propomos abordá-lo, quer pelo fenómeno negativo do desemprego que teima em
vincar-se na nossa sociedade, mostrou-se um desafio deveras relevante. Assim, iniciou-se a
investigação deste trabalho, intitulado: «O Outro Lado do Desemprego: Um Caso de
Sucesso»; e partindo da questão geral de investigação: «Que atitudes de resiliência perante o
desemprego podem evitar a exclusão social?».
Tendo em conta que esta investigação implica o estudo de relações sociais e a
compreensão de problemas, a presente abordagem aponta para uma investigação de carácter
qualitativo, tal como define Guerra (2006), em que investigação implica uma reflexão do
estudo por parte do investigador, sendo este o principal instrumento de recolha de dados e
adota uma postura objetiva durante a recolha desses mesmos dados (observa, participa e
conversa …). Dentro da investigação qualitativa, o método do estudo de caso foi o que mais
se adequou à investigação que pretendíamos realizar. Este método aprofunda a investigação
de um indivíduo, de uma família, de um grupo ou de uma organização, que implica que a
unidade social não seja demasiado extensa, centra-se na recolha intensiva de informação
acerca de enumeras práticas e representações sociais e serve para aumentar o conhecimento
relativamente a um determinado indivíduo e gerar novas hipóteses (Gauthier, 2003).
A abordagem indutiva permitiu-nos fazer a correspondência entre a observação e a
realidade e parte da questão particular «Que atitudes de resiliência perante o desemprego
6
8. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
podem evitar a exclusão social?» para chegar a conclusões generalizadas (Flick, 2005).
Pretende-se que esta abordagem seja objetiva e, assumindo um papel crítico e reflexivo face à
situação do desemprego em Portugal, recorrer aos princípios norteadores da Educação Social
de intervir positivamente na vida das pessoas, para que possamos apontar estratégias que as
conduzam ao bem-estar social.
Atendendo que o estudo trata de um caso específico, entendemos que a entrevista seria a
técnica de investigação qualitativa por excelência e que melhor se ajustava ao trabalho
(Guerra, 2006). A recolha de dados foi feita através da pesquisa documental (documentos de
caráter não científico) e bibliográfica (do tema em estudo e reconhecidas cientificamente), tal
como defende Oliveira (2007), a qual favorece a observação do processo de desenvolvimento,
ou não, do indivíduo, grupos, conceitos, saberes, comportamentos, crenças, valores, práticas,
etc. (Cellard, 2008). Outra das formas de recolha de dados foi através da entrevista
semiestruturada, tipologia que mais enquadrava ao nosso trabalho pela abertura e flexibilidade
das questões do guião e que levaram o participante a fazer uma leitura da fase concreta da sua
vida (Quivy e Campehoudt, 2008), que neste caso particular se baseou na criação do próprio
emprego como forma de resiliência à situação de desemprego em que se encontrava, e ainda
pela observação do investigador durante a entrevista.
Neste estudo, a amostragem, caraterística da investigação qualitativa, incidiu na
modalidade (por caso único) por acontecimento e a sua estratégia tratou-se de uma
amostragem estatística, uma vez que eram conhecidas as caraterísticas e dimensões do caso
em concreto a estudar, existindo sempre a noção do número de participantes a entrevistar
(um), sem que houvesse a preocupação da quantidade de entrevistas mas sim com a qualidade
daquela a realizar (Flick, 2005). Para além disso a qualidade da informação recolhida através
da pesquisa documental, entrevista e respetiva análise foi bastante fundamentada, apesar de, e
segundo Duarte (2002), os dados resultantes desta investigação qualitativa, geralmente
abundantes, serem muitas vezes difíceis de tratar. Neste sentido, foi usada a análise de
conteúdo teorizada por Bardin (2008) e Silva e Pinto (1986) no sentido de facilitar o
tratamento dos dados e suas triangulações bem como da melhor interpretação.
7
9. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
2.1.
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
Fases estruturantes da investigação
CONCETUAL
Escolha do desemprego
enquanto propulsor de
exclusão social como
objeto de investigação;
Elaboração do quadro de
referência que conduzirá
às questões e orientará o
guião;
Seleção, revisão e análise
de literatura
fundamental.
Perceção da resiliência
no desemprego.
METODOLÓGICA
Elaboração do desenho
da investigação.
Seleção de um caso
(único) de sucesso de
criação do próprio
emprego - amostra.
Variáveis do estudo:
Exclusão; Desemprego;
Emprego; Atitude;
Conscientização;
Empowerment;
Empreendedorismo.
Investigação qualitativa
– estudo de caso.
EMPÍRICA
Recolha de dados através
de pesquisa documental,
entrevista
semiestruturada,
gravação, transcrição e
observação resultante da
mesma.
Análise de conteúdo e
triangulação de dados.
Interpretação,
apresentação e
comunicação dos
resultados.
Com base na figura acima apresentada, e fundamentada pelo pensamento de Fortin
(2000), foi desta forma que delineámos as etapas desta investigação. A fase concetual, onde
foram delineadas as ideias que orientaram a investigação, tendo em conta a necessidade da
delimitação do domínio para que fosse viável a sua realização, foi também a fase em que se
procedeu a toda a revisão da bibliografia e documentação indispensável para se conhecer e
compreender os conteúdos e, assim, situar o objeto de estudo no contexto dos atuais
conhecimentos. Esta fase compreendeu ainda a escolha do tema: «O Outro Lado do
Desemprego: Um Caso de Sucesso» enquanto problema de investigação, onde a pertinência, o
valor teórico e prático e as dimensões metodológicas aplicadas, que, levaram à questão de
investigação: «As atitudes de resiliência perante o desemprego podem evitar a exclusão
social?» traçando-se um quadro de referência apropriado, que permitiu definir o paradigma de
investigação e que conduziu às questões de abordagem do problema.
Na fase metodológica elegeu-se um desenho de investigação que delineou o paradigma e
os métodos de recolha e de análise dos dados, projetou o plano de obtenção de respostas às
questões, definiu-se variáveis (Exclusão; Desemprego; Emprego; Práticas de resiliência;
Conscientização; Empowerment; Empreendedorismo) que operacionalizaram o estudo e
definiu-se a amostra (um caso de sucesso de uma pessoa desempregada que criou o próprio
emprego).
Por fim, na fase empírica, que consistiu na operacionalização/execução das fases
anteriores, recolheram-se, organizaram-se e trataram-se os dados em função do objeto de
8
10. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
estudo, sendo utilizadas todas as técnicas e subsequente triangulação de todos os dados,
procedendo-se às suas interpretações e à comunicação dos resultados ao participante.
Contudo, e como em qualquer abordagem qualitativa, raramente se segue uma linha
sequencial rígida e fixa. Algumas etapas aconteceram em simultâneo e de forma interativa
(por ex. a formulação do problema de investigação; identificação das questões para elaborar o
conceito e a descrição do fenómeno; escolha dos métodos de recolha de dados; a escolha do
contexto social e da amostra; a recolha e análise de dados; elaboração das hipóteses
interpretativas que dão significado à situação; reformulação interativa do problema e das
questões, e/ou modificações conforme dados novos que foram surgindo).
2.2.
O desenho da investigação: primeiros passos
O quadro abaixo ilustra, em concreto, o desenho que balizou a investigação e que
permitiu uma maior aproximação ao tema. Neste sentido, e segundo Fortin (2000), este
desenho além de permitir ao leitor uma perceção mais clara quanto ao objeto de estudo,
permitiu-nos também aplicar as estratégias mais adequadas quer na consistência da
investigação quer na fundamentação teórica utilizada na abordagem ao tema e de todas as
variáveis identificadas.
9
11. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
TEMA DE
INVESTIGAÇÃO
O OUTRO LADO
DO
DESEMPREGO:
UM CASO DE
SUCESSO
SELEÇÃO DOS
SUJEITOS DE
INVESTIGAÇÃO
(QUEM?)
Um caso de
sucesso de criação
do próprio
emprego como
substituição da
situação de
desemprego –
resiliência.
FORMULAÇÃO DA
QUESTÃO GERAL
DE
INVESTIGAÇÃO
As
atitudes
de
resiliência perante o
desemprego podem
evitar a exclusão
social?
ESCOLHA DOS
MÉTODOS E
TÉCNICAS
ADEQUADAS
(COMO?)
Investigação
qualitativa;
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
FORMULAÇÃO DAS QUESTÕES
ESPECÍFICAS
(O QUÊ)
1Caraterização social do
entrevistado
i. Idade;
ii. Naturalidade e nacionalidade;
iii. Área de residência;
iv. Habilitações literárias;
2Experiência profissional
i. Profissão
ii. Que outras atividades profissionais
exerceu?
iii. Qual a atividade profissional que mais
se identifica? E porquê?
iv. Qual foi a sua última atividade
profissional? Quanto tempo durou?
3Situação de desemprego
i. Porque ficou desempregado?
ii. Já tinha estado desempregado
anteriormente?
Técnicas:
- Pesquisa documental; iii. Como se sentiu enquanto
desempregado (psicologicamente e
- Entrevista
socialmente)?
semiestruturada;
iv. Enquanto esteve desmpregado sentiu- Análise de conteúdo
se excluído do seu gupo de amigos ou
família? Porquê?
v. Quanto tempo esteve desempregado até
decidir iniciar o seu próprio negócio?
4Atitude perante o
desemprego/criação do próprio
negócio
i. Que tentativas fez para regressar ao
mercado de trabalho?
ii. Como encarou a situação?
iii. O que o motivou para criar o seu
próprio emprego?
iv. Inspirou-se em alguém para avançar
com o seu próprio negócio?
v. Sentiu alguns
constrangimentos/dificuldades? Se sim,
quais? E como os ultrapassou?
vi. Já tinha trabalhado anteriormente na
área profissional em que iniciou o seu
negócio?
vii. Que tipo de conhecimentos tinha na
área? (optou por criar o seu próprio
emprego)
viii. Porque é que escolheu abrir um
negócio em vez de trabalhar por conta
de outrem?
ix. Era algo que queria fazer antes de ter
ficado desempregado, ou foi a uma
opção de recurso?
x. Que carateristicas pessoais considera
ter que o ajudaram na criação do
próprio emprego?
xi. Sentiu que corria alguns riscos ao criar
o próprio negócio? Quais?
xii. Como acha que seria a sua situação
económica e social hoje se não tivesse
optado por criar o seu próprio negócio?
Método estudo de
caso
FORMULAÇÃO DOS CONCEITOS
SENSIBILIZADORES (A REVISÃO DE LEITURA:
PRINCIPAIS REFERÊNCIAS TEÓRICAS E
CONCEITOS CHAVE)
1. Conceitos de construção do objeto de estudo
O desemprego como um propulsor de exclusão social Costa, B. (1998).
Os excluídos (…) devem ser educados para terem domínio
sobre a sua vida e poderem ter os meios para fazer uma
reflexão constante sobre a sua vida e decidir
conscientemente sobre ela - Freire, P. (1983).
O desemprego por si só não poderá continuar a ser
entendido pela sociedade como um veículo propulsor de
pobreza e exclusão social - Santos, B.S. (2011).
O empreendedorismo - Shane, S. & Venkataraman, S.
(2000)
Baptista, A; Teixeira, M; Portela, J. (2008). Motivações e
obstáculos ao empreendedorismo em Portugal e propostas
facilitadoras.
2. Conceitos Metodológicos
Métodos, técnicas, metodologias e estratégias específicas
esta abordagem - Albarello, L.; Digneffe, J.; Maroy, C.;
Ruquoy, D. & Saint-Georges, P. (1995).
Os dados recolhidos através da investigação qualitativa são
geralmente abundantes, mas muitas vezes difíceis de tratar
- Duarte, R. (2002).
Investigação qualitativa e análise de conteúdo, a fim de
conhecer os sentidos e razões que contribuem para a ação
dos indivíduos na sociedade - Guerra, I. (2006).
O estudo de caso serve para aumentar o conhecimento
relativamente a um determinado individuo e gerar novas
hipóteses - Gauthier, B. (2003).
Haguette, T. (1997). Metodologias qualitativas na
Sociologia. 5ª edição. Petrópolis: Vozes.
Lakatos, E. & Marconi, M. (2003). Fundamentos de
metodologia científica. 5ª edição. São Paulo: Atlas.
Ludke, M. & André, M. (1986). Pesquisa em educação:
abordagens qualitativas. São Paulo: E.P.U.
Identificação das fases e etapas de investigação – Fortin,
M. (2000).
Tipos, características e dimensões da amostragem - Flick,
U. (2005).
Histórias de Vida - Poirier,J., Chapier-Valadon, S. (1995).
Análise de conteúdo (definição) - Krippendorf, K. (1980).
Entrevista semiestruturada - Quivy, R. & Campenhoudt,
L.V. (2008)
Transcrição de dados linguísticos - Paiva, M. (2004).
Fases da análise de conteúdo - Bardin, L. (2008).
3. Conceitos de Educação Social
É ao responder aos desafios que as pessoas exigem de si
próprias reflexão, crítica, criatividade, eleição, decisão,
organização e ação que fazem dela um ser adaptado à
realidade e mais integrado - Freire, P. (1980).
A Educação Social emerge para dar resposta a uma
diversidade de problemas sociais - Samagaio, F. (2006).
Um dos grandes desafios do ES é preparar os indivíduos
para questões como as da solidariedade e da tolerância para
que possa combater problemáticas, tais como, por exemplo,
a exclusão social - Serapicos, A. (2003).
10
12. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
2.3.
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
Análise de conteúdo
A análise de conteúdo, tal como definida por Krippendorf (1980), é “uma técnica de
investigação que permite fazer inferências, válidas e replicáveis, dos dados para o seu
contexto”. No mesmo raciocínio, Bardin (2008) diz que a análise de conteúdo não serve
apenas para se proceder à descrição dos dados apurados, atendendo que não se pretende
apenas reproduzir os conteúdos das mensagens através da técnica utilizada, mas sim
apresentar algumas significações dessas mesmas mensagens e que se traduzam em
conhecimento.
Deste modo, após realizarmos a entrevista, foi importante que a transcrição dos dados
recolhidos reproduzissem o discurso narrado de uma forma fiel, apontando que a
(…) fidelidade aos dados orais deve ser o objectivo de toda a transcrição.
Queremos registar o que foi dito por um falante da forma como foi dito.
Uma transcrição não é e não pode ser uma edição da fala do entrevistado.
(Paiva, 2004, p.136)
A análise de conteúdo da entrevista foi conduzida indo ao encontro das etapas
fundamentais desenhadas por Bardin (2008). Numa primeira fase, denominada por préanálise, foi realizada uma leitura exaustiva das informações recolhidas (leitura flutuante), as
quais nos orientaram para as questões norteadoras, que, por seu lado, nos sugeriram a
explicação do fenómeno observado (criação do próprio emprego). A escolha de índices que
apontaram para o objetivo geral da investigação (criação do próprio emprego como
determinante da inclusão social), de acordo com o seu quadro teórico, fundamentou toda a
abordagem.
Quanto à constituição do corpus, defendido por Bardin (2008), foi definida toda a
panóplia de fundamentos teóricos que entendemos realçar e selecionar para serem submetidos
à respetiva análise e que definiram a organização da informação e deram respostas de forma:
exaustiva, em que se esgotou a comunicação na sua totalidade e não se omitiu qualquer dado;
representativa, cuja amostra representou o universo; homogénea, em que os dados expuseram
o tema e em que a técnica e a recolha dos dados foram uniformes; pertinente, cujos
documentos adequaram-se quer ao conteúdo quer ao objetivo da entrevista; e exclusiva, cuja
classificação da categoria correspondeu apenas a um único elemento.
Com estes critérios, e seguindo a linha de Silva e Pinto (1986), procurou-se a existência
de padrões e regularidades existentes nos discursos de modo a preparar uma lista prévia de
categorias de codificação, sendo que uma “categoria é habitualmente composta por um termo
11
13. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
chave que indica a significação central do conceito que se quer aprender, e de outros
indicadores que descrevem o campo semântico do conceito” (pp.110-111).
A segunda fase, definida por Bardin (2008) como a etapa da exploração do material,
compreendida pelo processo de transformação sistemática dos dados e agrupados em
unidades, permitiu uma descrição correta das caraterísticas importantes do conteúdo e
implicou a já referida categorização (que apesar de não ser uma etapa obrigatória de toda a
análise de conteúdo, a maioria dos procedimentos de análise de conteúdo organizam-se em
redor deste processo). Com o objetivo de alcançar o n central do texto em função das regras
estabelecidas, partimos da análise de unidades de registo, que surgem como o momento da
aplicação do que foi trabalhado na pré-análise, e que, segundo Carmo e Ferreira (1998),
(…) é o segmento mínimo de conteúdo que se considera necessário para poder
proceder à análise, colocando-o numa dada categoria e de unidade de contexto
que constitui o segmento mais longo de conteúdo que o investigador considera
quando caracteriza uma unidade de registo, sendo a unidade de registo o mais
curto. (pp.257)
E, por último, o tratamento dos resultados e a devida interpretação e, já na posse de um
corpus de informação trabalhado e organizado de acordo com os objetivos da investigação e
das questões levantadas, foi possível propor inferências e realizar interpretações de acordo
com o quadro teórico definido.
2. Análise e interpretação de resultados
Antes de realizar qualquer interpretação dos dados obtidos, pretendemos também
interpretar a influência da entrevista enquanto técnica de excelência, que além da mesma
permitir inferências sobre as dimensões identificadas, permitiu também melhorar a sua
aplicabilidade e operacionalização e aferir com maior relevo sobre os constrangimentos e
potencialidades. Neste campo metodológico, pretendemos salientar a flexibilidade estrutural
da entrevista como um dos aspetos que consideramos positivo, visto permitir qualquer
alteração ao referencial temático do decurso da entrevista. O facto de se ter verificado algum
constrangimento por parte do entrevistado pela utilização do equipamento de gravação áudio,
entendemos ser um aspeto menos positivo e que pode ter condicionado a entrevista. Foi
observável que a presença deste instrumento, e tal como defende Wenger (2002) não deixou o
participante muito à vontade. É também de sinalizar que, por vezes, a proximidade entre o
participante e o investigador pode ser um dos fatores menos positivos, onde o participante
pode entender que a informação que se pretende pode ser já do conhecimento do investigador
12
14. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
e, logo, seja uma perda de tempo e/ou que o mesmo crie dúvidas quanto à utilização do dados,
contrariando desta forma, e resumindo-nos apenas a esta caso concreto, ao que defende
(Bourdieu, 1999). Desta forma, achamos que a opção da entrevista ser conduzida por um
investigador e participante desconhecido, desde que seja dado o seu consentimento e devida
elucidação do motivo do estudo, tende a recolher-se dados mais profundos, sem subterfúgios
e com maior objetividade.
Neste ponto do presente trabalho importa referir que a existência de um quadro teórico
de referência consistente, que permita abordar os aspectos e temas relevantes da investigação,
e a experiência empírica dos investigadores são fatores determinantes do produto final
(Bogdan & Biklen, 1994, p.206).
Entendemos ainda que a interpretação dos dados deva seguir uma estrutura e de acordo
com as dimensões/variáveis consideradas relevantes, que permita contribuir para a facilidade
da sua leitura.
2.1.
Teóricas VS Empíricas
É na relação entre o quadro teórico e o trabalho de campo que pretendemos equacionar
os dados recolhidos. Neste sentido, e sendo certo que o panorama socioeconómico português
atual não é dos mais favoráveis, seria, supostamente, fácil abordar o tema do desemprego e da
exclusão social tal como os defende teoricamente Bruto de Costa (1998). Contudo, encarando
o objeto de estudo como um forte desafio e pretendendo ir mais além entendemos, pela leitura
dos dados obtidos, que o estar/ser desempregado não significa estar apenas privado de um
trabalho remunerado, voluntária ou involuntariamente, mas também reconhecer como
legítimo a procura ativa de emprego. As próprias condições de acesso e direito ao subsídio de
desemprego, e que se estende a uma enorme franja da nossa sociedade, não fazem mais do
que limitar as fronteiras desta mesma legitimidade. Estas condições sinalizam e oficializam os
limites do direito ao desemprego que só pode existir se houver direito ao trabalho (Maruani,
2002). É nesta linha que a exclusão social tende a ganhar forma ao considerar que as pessoas
são socialmente excluídas quando se combinam a falta de meios económicos, o isolamento
social o acesso limitado aos direitos sociais e civis, bem como o acesso insuficiente aos
recursos pessoais, familiares, económicos e culturais (Costa, 1998).
2.2.
Exclusão Social e Desemprego
A partir dos dados obtidos e tendo por referência o quadro teórico definido
previamente para a pesquisa, constatou-se que o participante único da amostra conseguiu
travar o processo de exclusão social (de tipo económico) ao decidir criar o seu posto de
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15. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
trabalho. O entrevistado optou por criar o seu próprio emprego, como alternativa a não
conseguir encontrar trabalho, sendo que essa opção já tinha sido ponderada anteriormente
quando se encontrava a trabalhar por conta de outrem. A mera situação de se encontrar
desempregado acarretava um conjunto de sentimentos e representações que o próprio
participante rejeitava e é observável quando, questionado acerca do seu estado de espírito
aquando da situação de desemprego, o mesmo refere que foi uma situação constrangedora
porque em primeiro lugar estava desocupado e em segundo lugar a situação financeira era
bastante desfavorável e que o levava a algumas inquietações quanto ao fato de não saber
como pagar as suas contas mensais.
Ainda que de uma forma algo subtil, foi possível perceber que o participante sentiu
algum grau de exclusão social quando refere que se sentiu «desamparado porque não tinha
nada para fazer» e algum isolamento social dada a distância física entre a família e entre os
amigos, uma vez que não é natural do Algarve e cujas distâncias não permitiram um apoio
mais próximo.
2.3.
A resiliência no desemprego
O facto de o participante ter insistentemente procurado emprego e, paralelamente, ter
procurado aconselhamento junto de terceiros próximos, quanto à possibilidade de se lançar
por conta própria, confirma a existência de uma atitude de resiliência do participante. Esta
atitude comprova-se quando o mesmo indica que enquanto esteve desempregado procurou
ativamente emprego através do envio de currículos para diversas entidades. Como, não
conseguia voltar ao mundo do trabalho, optou por se aconselhar com familiares que o
ajudaram financeiramente e a planear como iria criar o próprio negócio. Consideramos que o
entrevistado, apesar de ter tido o apoio de familiares, mesmo sem esse apoio, embora o
processo de sair da situação de desemprego fosse mais moroso, possivelmente, arriscava na
mesma criar o seu próprio negócio e no limite ponderava procurar emprego fora de Portugal.
Achamos que é desta forma, dada a aparente persistência, «teimosia» e atitude lutadora com
que encarou esta fase da sua vida, que fundamenta a sua personalidade resiliente.
2.4.
Empreendedorismo VS Emprego
Nesta vertente, e pela análise dos dados podemos constatar que existiu uma atitude
empreendedora do participante, quer pelo facto de ter decidido arriscar no seu próprio negócio
quer, inclusive, por arriscar num negócio cuja área não tinha quaisquer conhecimentos. No
entanto é importante ressalvar que também tomou esta decisão porque tinha o apoio da sua
companheira, a qual já tinha experiência na área da pastelaria. Esta atitude permitiu-lhe
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16. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
resolver as dificuldades que sentia em voltar ao mercado de trabalho enquanto trabalhador por
conta de outrem, que era a realidade vivida até ficar no desemprego.
Entendemos que, neste caso concreto, trata-se de um caso de empreendedorismo por
necessidade, atendendo ao facto do participante ter tido a iniciativa de criar o seu próprio
emprego por se encontrar na situação de desempregado, sem perspetivas de conseguir
encontrar qualquer emprego, levando-o a numa situação económica desfavorável e que de
alguma forma pôs em causa a sua subsistência. Esta estratégia de contornar a situação,
criando a alternativa favorável para a ultrapassar com a aposta da criação do próprio emprego
demonstra uma clara atitude empreendedora.
3. Conclusões
Apoiando-nos do pensamento de Louçã e Caldas (2009, citados em Santos, 2011),
que, ironizando sobre o pensamento neoliberal que aponta como evidente que os
despedimentos de hoje serão, talvez, o emprego de amanhã, recorremos a este ponto de vista
para, numa inversão ideológica, propor o tema da criação do próprio emprego enquanto fator
de resiliência ao desemprego, resiliência essa bem patente nesta abordagem.
É, com atitudes empreendedoras, como a registada no nosso entrevistado, enquanto
respostas a necessidades específicas e conjunturais que devemos basear a nossa reflexão. O
empreendedorismo depende parcelarmente de estímulos de cariz económico (Baptista,
Teixeira, Portela, 2008), mas também é certo que a vontade, o crer, a criatividade e a
capacidade de iniciativa determinam a sua aplicação. Numa perspetiva norteada pelos
pensamentos de autonomia, capacitação, mudança e empowerment de Paulo Freire,
pretendemos inferir que o desemprego, visto por Boaventura de Sousa Santos (2011) como
um dos principais “detonadores da insolvência pessoal e familiar“ (p.69), por si só não poderá
continuar a ser entendido pela sociedade como um veículo propulsor de pobreza e de
endividamento das famílias e, logo, de exclusão social. Uma atitude empreendedora, de
criação do próprio emprego, exemplificada na presente abordagem, deverá ser encarada como
capacidade pessoal para resistir, lidar e reagir de modo positivo em situações adversas e, deste
modo, que rompa com a forma do desemprego, que apesar de ser um tipo de exclusão social,
apresente indícios de viragem para novas formas de encarar a vida e o mercado de trabalho.
Enquanto Educadores Sociais, um dos grandes desafios é preparar os indivíduos para
questões como as da solidariedade e da tolerância para que possa combater problemáticas, tais
como, por exemplo, a exclusão social (Serapicos, 2003). E nas perspetivas freireanas de
educar para intervir (que se referem a mudanças reais nas relações das pessoas e na sua
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17. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
autonomia, no trabalho, na educação e na saúde), e que durante toda a sua vida procuram dar
voz aos grupos mais oprimidos e excluídos da sociedade para que pudessem ter domínio sobre
a sua vida, entendemos que a situação de vulnerabilidade criada pelo desemprego é um dos
campos férteis da atuação da Educação Social e pode ser um dos caminhos de mudança e que
mostre às pessoas que podem criar os meios para fazer uma reflexão constante sobre a sua
vida e decidir conscientemente sobre ela.
É assim que
(…) no ato mesmo de responder aos desafios que lhe apresenta seu contexto de
vida, o homem se cria, se realiza como sujeito, porque esta resposta exige dele
reflexão, crítica, invenção, eleição, decisão, organização, acção. Todas essas
coisas pelas quais se cria a pessoa e que fazem dela um ser não somente adaptado
à realidade e aos outros, mas integrado. (Freire, 1980, p.15).
Como pista de uma futura investigação, e tendo em conta as características deste
trabalho, que serviu apenas como ilustração de uma das formas de encarar o desemprego, não
nos permitiram aferir que parcela da sociedade encara o risco calculado da criação do próprio
emprego como ponto de viragem à situação adversa do desemprego, e que parcela “cai na
subsidiodependência” que a leva ao débil modo de vida condigna, com apontamentos de
sobrevivência social, de forma a evitar qualquer tipo de exclusão e até mesmo de pobreza.
Seria, assim, de todo interessante estudar esta temática numa perspetiva mais macro
(por exemplo: com vários casos de sucesso/insucesso de uma comunidade), enquadrando no
estudo a perspetiva de educadores sociais e provocar a sociedade com registos e estratégias de
empowerment, autonomia, valorização, estímulo ao (re)aproveitamento de recursos, etc., que
despertem as comunidades e promovam o bem estar social.
16
18. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
Bibliografia
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19. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
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20. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
ANEXOS
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21. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
Grelha de análise de conteúdo da entrevista
Problemática
Experiência profissional
Situação de desemprego
Análise
Atualmente o entrevistado
exerce a profissão de
empresário na área da
pastelaria. Tendo já
trabalhado como técnico de
análise de águas, vendedor
de produtos químicos. A
anterior profissão que
exerceu foi de distribuidor
durante 4 anos.
Foi dispensando do seu
trabalho como distribuidor,
porque a empresa
encontrava-se com poucos
clientes e sentiram
necessidade de reduzir o
pessoal.
Tendo o mesmo vivido a
situação de desemprego
durante um ano e dois meses.
Esta situação foi muito
constrangedora para ele,
porque viu-se com falta de
dinheiro para pagar contas e
sentiu-se desocupado.
Diariamente sentia-se
desamparado porque não
tinha nada para fazer, os
amigos encontravam-se a
trabalhar e a família
encontrava-se distante não o
conseguindo sempre o apoio
que necessitava.
Mesmo perante a situação de
desemprego, não se sentiu
deprimido e não se isolou. O
mesmo procurou sempre que
possível estar com os amigos
e a namorada.
Enquanto estava
desempregado e como não
encontrava trabalho pensou
na possibilidade de criar o
seu próprio negócio.
Excerto
«empresário de pastelaria»
«[…] técnico de análise de
águas […] vendedor::: de
produtos químicos […]
distribuidor.»
«Análise de águas […]»
« Fui distribuidor
[…]Trabalhei lá
aproximadamente 4
anos […]»
« […] Só saí por falta de
trabalho ::: a empresa tinha
pouco movimento e tiveram
necessidade de reduzir o
pessoal […]»
« Tive cerca de um ano e
dois meses »
« Foi algo que pesou um
pouco em mim::: … é difícil
… falta de dinheiro para
pagar as contas … e não ter
aquela rotina::: andar sempre
desocupado::»
« Por vezes::: os amigos
estavam a trabalhar e eu
sentia-me desamparado […]
sentia me desamparado ::: a
minha família está em Beja
e:::: estou aqui sozinho …
Por mais que queiram apoiar,
não é aquele apoio
constante::: devido à
distância.»
« não. Sempre quis estar com
os amigos e com a namorada.
Não me sentia
deprimido(…)»
« Nesse tempo fui pensando
nessa possibilidade (criar o
próprio negócio)como
alternativa ao facto de não
encontrar trabalho e também
porque era algo que eu já
queria fazer … e esta
situação veio também como
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22. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
O entrevistado enquanto
esteve desempregado
procurava ativamente
emprego enviando
currículos. Essa foi a forma
que arranjou para não passar
os dias desocupado.
Teve alguém com quem se
aconselhou e que o ajudou
em todo o processo para
conseguir criar o seu próprio
negócio.
Essa pessoa já tinha
experiência como empresário
na área da hotelaria e
restauração.
Atitude perante o
desemprego/criação do
próprio negócio
O entrevistado sentiu
algumas dificuldades durante
esse processo devido a todas
as burocracias (Finanças,
Segurança Social…) que
estão inerentes à criação do
próprio negócio. Por esse
motivo é que demorou cerca
de um mês para conseguir
abrir o negócio.
Neste processo contou com
apoio financeiro de
familiares o que permitiu
com que não tivesse que
recorrer a créditos. Porque se
tivesse recorrido a créditos
poderia vir a ter problemas.
Abriu o negócio numa área
em que nunca tinha
trabalhado mas contou com a
ajuda da companheira que já
tinha experiência,
Obtou por abrir o seu
negócio porque consegue
assim ter independência e
cria as suas próprias regras,
não ter que estar sobre sobre
uma escapatória do facto de
estar desempregado»
« […] procurava ativamente,
entregava currículos e não
me chamavam::: E essa foi a
forma que encontrei também
para não estar parado […]
« […] Falei com alguém que
me ajudou a pensar::: a tomar
a decisão::: colaborou
comigo no sentido de
avançar. E essa pessoa foi
também uma das pessoas que
me inspirou para abrir este
negócio»
« […] essa pessoa::: … que
já tinha experiência como
empresário: uma pessoa de
negócios. Porque os negócios
dele também eram nesta
área»
« […] Acho que as
dificuldades que toda a gente
sofre::: existem muitos
entraves, muita burocracia
por parte da segurança social,
finanças, câmaras::: licenças
[…] Só em burocracias
demorei quase um mês até
conseguir abrir.
« […] o apoio de familiares,
não tive que me (endividar)
graças a Deus… é uma
vantagem::: […]»
« […] Não::: e não em queria
meter nisso porque iriam ser
mais problemas e preferi
assumir a dívida com os
familiares.»
« […] tinha poucos ou
nenhuns (0.1) mas a pessoa
que está comigo já tinha
experiência, já tinha trabalho
nisto e isso foi uma maisvalia, já não começamos
necessariamente do zero.»
« […] Porque abrir o meu
negócio para já é uma
independência::: temos a
nossa independência ::: e
21
23. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
o controle de terceiros.
Mesmo antes de estar
desempregado já tinha
pensando em abrir negócio
próprio mas não sabia era em
que área.
O entrevistado considera-se
teimoso e persistente e isso
foram duas das
características que o
ajudaram na criação do
próprio emprego. O mesmo
quando não está contente
com um resultado obtido
começa logo a pensar em
arranjar soluções para obter o
resultado esperado, o que
mostra que o mesmo também
é determinado.
Sentiu que corria alguns
riscos ao criar um negócio
próprio devido a todas as
burocracias que acarretam
estas situações. E, por outro
lado o negócio também podia
não correr como esperado e
não ter lucro nem para si,
nem para pagar a quem o
financiou neste projeto.
O mesmo considera que se
não tivesse tipo o apoio que
teve para conseguir criar o
seu próprio negócio,
provavelmente teria optado
por emigrar ou persistia na
procura de emprego.
Se não tivesse criado o seu
negócio provavelmente ainda
estava desempregado e a
trabalhar por fora para
ganhar algum dinheiro.
fazemos o nossos serviço à
nossa maneira::: criamos as
nossas próprias regras para
que tudo corra bem … Não
temos que estar sujeitos a
regras de outras pessoas:::
[…]»
« […] Sempre me passou
pela cabeça ((apontando o
dedo)), o ter um negócio meu
(hhhhhhh). Não tinha
pensado era em que área:::
mas surgiu esta oportunidade
e foi nesta que fiquei ::: (…)»
« A teimosia::: É preciso ser
teimoso e persistir no que se
quer::: Eu quando não estou
contente com o resultado:::
começo logo a pensar em
maneiras diferentes::: para
dar a volta e::: no fundo
chegar onde quero.»
« Sim::: sem dúvida. Porque
parar abrir negócio é preciso
muitas burocracias… e para
abrir um estabelecimento tem
que estar tudo nos conformes
… caso contrário pudesse
receber fiscalização e podia o
fechar:::: Também podia o
negócio correr mal e não
ganhar dinheiro sequer para
pagar a quem me ajudou.
«:::::: talvez não. Se calhar
escolhia sair de Portugal ou
:::procurava um emprego
durante mais algum tempo.»
« […] Continuava no
desemprego::: se calhar teria
a fazer uns PESCATOS para
ganhar mais algum […]»
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24. Pobreza e Exclusões Sociais
Mestrado em Educação Social
Trabalho (visão do
entrevistado)
O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso
« […] É uma forma de estar
bem na vida e de se fazer o
que se gosta:::não é aquela
O entrevistado prefere
forma de irmos para o
trabalhar porque é uma forma
trabalho já contrariados e
de se sentir bem e de se
mais um dia:::: é uma coisa
manter ocupado.
importante para mim::: estar
ocupado ::: Não me imagino
já sem trabalhar.»
23