Este documento descreve uma ação penal movida por uma médica contra uma paciente. A médica alega que a paciente a difamou ao afirmar que ela estava "matando" um paciente e publicar comentários negativos sobre o atendimento em redes sociais. Após analisar os depoimentos e provas, a juíza entende que não houve calúnia, mas sim difamação, condenando a ré pelo crime de difamação.
1. PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA
Vilhena
Avenida Luiz Mazziero, Nº 4.432, Jardim América, 76.980-000
e-mail: vha1criminal@tjro.jus.br
Fl.______
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CONCLUSÃO
Aos 12 dias do mês de maio de 2017, faço estes autos conclusos a Juíza de Direito Liliane Pegoraro Bilharva.
Eu, _________ Emerson Batista Salvador - Escrivã(o) Judicial, escrevi conclusos.
Vara: 1ª Vara Criminal
Processo: 0003122-34.2016.8.22.0014
Classe: Ação Penal - Procedimento Sumário (Réu Solto)
Querelante: Ana Cleide Silva Souza do Amaral
Querelado: Ellen Donadon Lucena
Vistos.
ANA CLEIDE SILVA SOUZA DO AMARAL, já qualificada nos
autos, ofereceu queixa-crime em face de ELLEN DONADON LUCENA, também já
qualificada nos autos, imputando-lhe os delitos previstos nos artigos 138, 139 e art.
140, ambos do Código Penal.
Sustenta a querelante, que exerce suas atribuições no Pronto
Socorro do Hospital Regional Adamastor Teixeira de Oliveira, neste município, como
médica plantonista.
Que no dia 10/04/2016, às 10h43min o paciente Rafael Euclides
Bristotti Silva deu entrada na unidade de saúde relatando mialgia, cefaleia e febre
de 37,9º.
Aduz que examinou o paciente, e como os sintomas relatados
não apresentavam gravidade, solicitou um hemograma completo e prescreveu
dipirona e voltarem, sendo liberado na sequência.
Descreve que posteriormente, o paciente retornou ao Hospital
Regional em dois dias consecutivos e somente foi atendido pela querelante em uma
oportunidade. Afirma que ao ser relatado os sintomas apresentados foi devidamente
atendido, ministrado diversos medicamentos e solicitado exames.
Relata que após a tentativa de estabilização do paciente do
quadro de saúde apresentado, a querelada adentrou na unidade de saúde portando
uma máquina fotográfica e passou a tirar fotos dos documentos ali presentes. Que
ao ser informada quanto a proibição de tal ato, afirmou na presença da equipe
médica que a querelante estaria “matando” o paciente, motivo pelo qual a Polícia
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Militar foi acionada.
Que após o término de seu plantão, deixou o paciente sob os
cuidados de outra equipe médica, sendo que, todavia, o paciente não resistiu ao
tratamento e veio a óbito no dia 13/04/2016.
Sustenta que após o ocorrido, a querelada passou a noticiar o
fato na imprensa local e em sua página pessoal da rede social Facebook,
mensagens de cunho difamatório de que a querelante teria sido negligente no
atendimento do paciente acima descrito, e como tratamento médico, havia apenas
ministrado dipirona, o que teria causado sua morte.
Juntou documentos (fls.16/124) e postulou a condenação da
querelada pelo crime de calúnia, difamação e injúria.
A audiência de conciliação restou infrutífera, sendo recebida a
queixa-crime nesta oportunidade (fl. 158).
A querelada foi citada (fl. 159) e apresentou resposta à acusação
por advogado constituído (fls. 163/171), sem apresentar nada que obstasse o
prosseguimento do feito foi designada audiência de instrução e julgamento (fl. 172).
Em audiência de instrução ouviu-se quatro testemunhas e a
querelada foi interrogada. Foi homologado a dispensa na oitiva das de duas
testemunhas (fls. 178/182).
Em memoriais escritos, a querelante pugnou pela condenação da
querelada pelos delitos de calúnia, difamação e injúria(fls. 185/187). A querelada por
sua vez, afirmou que não restou caracterizado nenhum dos delitos, requerendo sua
absolvição (fls. 188/201).
O Ministério Público manifestou-se pela condenação da
querelada pelo delito de difamação e sua absolvição pelos delitos de calúnia e
injúria.
É o relatório. Decido.
A materialidade delitiva restou comprovada pelos documentos
juntados (fls. 45/125).
No tocante a autoria e aos delitos imputados a querelada, passo
a realizar uma análise dos elementos probatórios constante nos autos e as
alegações das partes.
A testemunha Suelen Miranda de Jesus ao ser inquirida em
Juízo, disse que estava de plantão no dia dos fatos. Que Rafael Euclides Bristotti
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deu entrada no Hospital Regional. Afirmou que a querelada compareceu no local e
disse que a querelante “acabaria matando” Rafael. Disse que a querelada estava
tirando foto dos documentos e estava muito alterada. Relatou que querelada passou
a proferir palavras de cunho depreciativo contra a querelante. Que em razão do
entrevero, a Polícia Militar foi acionada.
A informante Irani Abreu Teixeira ao ser ouvida disse que soube
dos fatos por terceiros. Que somente ouviu a discussão.
O informante Nilton Venâncio da Silva, pai de Rafael Euclides
Bristotti. Disse que querelante tirava a máscara de oxigênio de Rafael para saber o
nome da querelada.
A informante Eden Marta Donadon Lucena, mãe da querelada,
disse que levou Rafael ao Hospital Regional e foi atendido pela querelante. Que
Ellen de fato fotografou o prontuário de Rafael o que foi objetado pela querelante
que informou que chamaria a Polícia Militar. Disse que Ellen em nenhum momento
disse que a querelante “estaria matando” Rafael. Afirmou que de fato chamou a
querelante de “filha da puta”.
A acusada Ellen Donadon Lucena ao ser interrogada, disse que
estava no Hospital Regional visitando Rafael. Que observou que no prontuário de
Rafael havia a prescrição de dipirona e outro remédio, azo em que resolveu
fotografar o aludido prontuário. Aduziu que na sequência a querelante chegou no
quarto e informou que não era permitido fotografar o prontuário. Afirmou que apenas
disse que Rafael “iria morrer”, visto que apenas estava sendo tratado com dipirona.
Declarou que a querelante acionou a Polícia Militar, sendo que foi conduzida a
Delegacia de Polícia. Que não xingou a querelante. Descreveu que apenas acusou
a acusada de negligência. Esclareceu que o que foi dito, foi no “calor do momento”.
Embora não tenha a ofendido, disse que se arrepende do ocorrido.
Quanto as perguntas formuladas pelo Promotor de Justiça disse
que as postagens eram direcionadas a querelante.
Do que consta dos autos, a queixa é procedente em parte.
Nesse ponto, razão assiste ao Ministério Público quando afirma
que não se trata de crime de calúnia e sim do delito de difamação, visto que a
querelada no contexto dos fatos, afirmou que a querelante “estaria matando” o
paciente, denotando que disse utilizando-se de metonímia, espécie de figura de
linguagem que emprega o sentido figurado da palavra, numa espécie de
substituição lógica de uma palavra por outra similar, mas guarda uma relação de
familiaridade entre o sentido de um termo e o sentido do termo que o substitui.
Em verdade, acredito que a querelada disse as descritas palavras
como força de expressão, se tratando de referência exagerada, estereotipada ou
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forçada para qualificar o suposto ato de negligência médica.
Portanto, para caracterização do crime de calúnia, deve haver
imputação de fato determinado ou específico e não de fato vago ou indeterminado.
A propósito: "a respeito da tipicidade própria à calúnia, decidiu
necessária a imputação de fato determinado, revelador de prática criminosa, não a
caracterizando palavras genéricas, muito embora alcancem a honra do destinatário"
(STF, AP 428, Tribunal Pleno, j. 12/06/2008).
Como bem observado pelo Ministério Público, a querelada
publicou em sua página pessoal na rede social Facebook fato desabonador à honra
objetiva da querelante, visto que fez críticas contundentes ao atendimento realizado
a Rafael Euclides Bristotti, namorado de sua irmã, publicando a seguinte
mensagem: “DOUTORA MÉDICA, O SEU PACIENTE TRATADO A DIPIRONA
MORREU!” (fl. 58).
Com efeito, o delito de difamação, consiste em atribuir a alguém
fato ofensivo à sua reputação, não sendo necessário que o fato ofensivo seja falso.
A despeito disso, a querelada tinha ciência do que o fato
imputado era falso, visto que admitiu que fotografou o prontuário do paciente e
constatou que havia a prescrição de outro medicamento, e ainda assim, divulgou em
sua rede social, fato que sabia ser inverídico.
Nesse passo, ao contrário do que sustentado pela Defesa da
querelada, das publicações em sua página pessoal se extrai que esta possuía a
intenção de difamar a querelante.
O dolo da acusada (animus diffamandi), restou demonstrado nos
autos, visto que além do fato de afirmar que a querelante “estaria matando” o
paciente, publicou em sua página pessoal do Facebook frase de cunho
desabonador da imagem da querelante, porquanto, deu várias declarações a jornais
locais difundindo ofensas a reputações da querelante, consoante se extrai dos
documentos de fls. 45/53, revelando o firme propósito de ofender a honra desta.
A despeito da querelada afirmar que não mencionou o nome da
querelante, um de seus amigos, usuários da mesma rede social, mencionou o nome
da médica (fl. 67), azo em que diante de tal circunstância, vários usuários
permaneceram execrando a reputação da querelante.
De se notar que os comentários da querelada tinha o nítido
propósito de desqualificar a querelante, imputando a pecha de médica
despreparada e negligente.
Ressalto que não está se apurando a suposta negligência
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médica, o que de forma contundente tem sido sustentado pela Defesa, visto que o
que se apura nestes autos, são as ofensas a honra objetiva da querelante.
Vale destacar ainda, que a própria querelada confessou que as
afirmações constantes de sua página na rede social Facebook era dirigida a
querelante, o que revela que possuía a intenção de ofender a honra da querelante.
Quanto ao delito de injúria, entendo que este não restou
caracterizado. Não há nos autos elemento que denotem a ofensa a dignidade ou
decorro da querelante, visto que há tão somente a imputação de fato ofensivo,
consistente nas publicação em sua rede social de fato desabonador da imagem da
querelante, visando fazê-la cair em descrédito perante a comunidade local.
O tipo objetivo do crime de injúria, prescreve que se trata de
ofensa a dignidade ou decoro. Em outras palavras, o agente emite qualidades
negativas sobre a vítima, ofendendo a sua dignidade (sentimento atinente a valores
morais) ou decoro (sentimento de respeitabilidade pessoal, referente a atributos
físicos e intelectuais), cuidando de lesão à honra subjetiva da vítima, revelado no
sentimento da pessoa em relação aos seus próprios atributos morais (dignidade),
físicos e intelectuais (decoro).
Desta forma, dos depoimentos das testemunhas e elementos dos
autos não vislumbro que houve ofensa a honra subjetiva da querelante.
Ademais, em regra, na injúria o agente não imputa nenhum fato
específico, mas sim uma qualidade negativa. Se houver imputação de fato
específico, poderá configurar calúnia (se for um fato falso considerado crime) ou
difamação (se for um fato ofensivo à reputação), o que é o caso dos autos, visto que
há imputação de fato específico.
Assim, não há atribuição de qualquer qualidade negativa a
querelante, mas sim, a imputação de fato ofensivo, consistente nas afirmações de
que a querelante teria sido negligente no atendimento médico, o que configura
apenas crime de difamação, devendo ser afastada a imputação de injuria.
A prova colhida deixa evidente a autoria e o dolo de ofender.
Também está caracterizada as causas de aumento dos incisos II
e III do art. 141 do CP, uma vez que a querelada proferiu as ofensas contra
funcionária pública no exercício das funções, assim como, optou por veicular estas
através de sua página pessoal de do Facebook o que amplifica os efeitos
devastadores dos fatos ofensivos à reputação da querelante, sendo certo que é
impossível de controlar depois que ela é posta na rede mundial de computadores,
no entanto, utilizarei somente um das causas de aumento, visto que a outra será
considerada nas circunstâncias judiciais.
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Não há agravantes ou atenuantes a serem reconhecidas.
Diante o exposto JULGO PROCEDENTE EM PARTE o pedido
inicial para CONDENAR ELLEN DONADON LUCENA como incursa nas penas
do art. 139, c/c art. 141, II e III, ambos do Código Penal, e JULGO
IMPROCEDENTE o pedido com relação aos crimes do art. 138 e art. 140 do
Código Penal, com base no art. 386, VII, do CPP.
Passo a dosar a pena, de acordo com os artigos 59 e 68 do
Código Penal.
A culpabilidade normal a espécie. A acusada não registra
antecedentes criminais. Registra personalidade normal. Não existem, nos autos,
elementos que possam detalhar sua conduta social. O motivo do crime não
influenciará na pena. As circunstâncias são normais ao tipo penal. Foram
constatadas consequências extrapenais, visto que algumas das ofensas foram
proferidas na rede mundial de computadores, o que provoca disseminação em larga
escala, além do fato de ter ensejado vários comentários de outros usuários, o que
denota necessidade de maior reprimenda em razão desta circunstância. Conduta da
vítima não contribuiu para eclosão do delito.
Assim, fixo-lhe a pena base acima do mínimo legal, em 06 (seis)
meses de detenção e 20 dias-multa;
Na segunda
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corresponde à R$ 801,58 (oitocentos e um reais e cinquenta e oito centavos),
ficando a ré intimado ao receber cópia desta sentença que o valor será quitado no
prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de inscrição em dívida ativa.
Concedo a querelada o direito de apelar em liberdade, pois assim
respondeu ao processo e com a fixação do regime aberto e a substituição da pena,
se torna desarrazoado o encarceramento.
Condeno-a ao pagamento das custas, na forma da Lei.
Cumpra-se, após o trânsito em julgado, procedam-se as
comunicações de estilo; lancem o nome da ré no rol dos culpados; expeça-se o
necessário para a execução da pena imposta. Feito isto, arquivem-se os autos.
P.R.I.
Vilhena-RO, quinta-feira, 18 de maio de 2017.
Liliane Pegoraro Bilharva
Juíza de Direito
RECEBIMENTO
Aos ____ dias do mês de maio de 2017. Eu, _________ Emerson Batista Salvador - Escrivã(o) Judicial, recebi
estes autos.
REGISTRO NO LIVRO DIGITAL
Certifico e dou fé que a sentença retro, mediante lançamento automático, foi registrada no livro eletrônico sob o número
202/2017.