Este documento é um despacho de um relator do Tribunal de Justiça de Rondônia sobre um agravo de instrumento interposto pelo Estado de Rondônia contra uma decisão que aplicou multa pessoal e bloqueio de vencimentos ao Secretário de Educação. O relator defere liminarmente o pedido para suspender a decisão, entendendo que o bloqueio integral dos vencimentos é desproporcional e que a multa pessoal só pode ser aplicada se o agente for parte no processo.
TJ concede liminar e libera vencimentos de secretário de Educação de Rondônia
1. Documento assinado digitalmente em 21/05/2015 16:08:19 conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/06/2001.
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DESPACHO DO RELATOR
Agravo de Instrumento
Número do Processo : 0004472-36.2015.8.22.0000
Processo de Origem : 0002949-75.2014.8.22.0015
Agravante: Estado de Rondônia
Procurador: Igor Almeida da Silva Marinho(OAB/RO 6153)
Procuradora: Lívia Renata de Oliveira Silva(OAB/RO 1637)
Agravado: Ministério Público do Estado de Rondônia
Relator: Des. Roosevelt Queiroz Costa
Vistos.
Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo Estado de
Rondônia contra decisão proferida pelo juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de
Guajará-Mirim, nos autos do cumprimento provisório de sentença, que fixou
multa pessoal em desfavor do Secretário de Educação no valor diário de 1/30
avos do vencimento do cargo e determinou o bloqueio integral de seus
vencimentos, até o efetivo cumprimento da ordem juducial.
Insurge-se o Agravante contra a decisão alegando
impossibilidade de execução provisória contra a Fazenda Pública nos casos
em que haja liberação de recursos financeiros, restrições legais e de cunho
fático para cumprimento da decisão, impossibilidade de aplicação da multa
prevista no art. 461, §§ 4º e 5º ao agente que não é parte no processo. Aduz
ainda a ausência de intimação/notificação pessoal do agente público multado,
exorbitância do valor da multa e não configuração de crime de desobediência e
ato de improbidade administrativa. Por fim, pugna pelo provimento do recurso,
para que seja suspensa, de pronto, a decisão agravada até deliberação liminar
no agravo de instrumento n. 0010413-98.2014.8.22.0000, que trata sobre a
impossibilidade de execução provisória contra a Fazenda Pública.
É o breve relatório.
O agravo de instrumento é a via recursal adequada para
impugnação de decisão interlocutória de juiz de primeiro grau. Tendo o
magistrado adotado medidas que possam lesionar qualquer das partes, nasce
para o interessado o direito de insurgir-se contra a decisão por si considerada
injusta ou eivada de nulidade.
É prevista, ainda, para uma análise mais rápida e eficaz da
matéria pelo órgão ad quem, a possibilidade de concessão de efeito
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suspensivo quando do recebimento do recurso, para ver paralisada a decisão
adotada pelo juízo de primeiro grau até o julgamento final do recurso, ao
menos.
Todavia, para a concessão desse efeito, o art. 558 do CPC
prevê como requisitos a relevância da fundamentação e o perigo de grave
lesão. Assim:
Art. 558. O relator poderá, a requerimento do agravante, nos
casos de prisão civil, adjudicação, remição de bens,
levantamento de dinheiro sem caução idônea e em outros
casos dos quais possa resultar lesão grave e de difícil
reparação, sendo relevante a fundamentação, suspender o
cumprimento da decisão até o pronunciamento definitivo da
turma ou câmara.
A questão dos autos cinge-se na controvérsia acerca da
possibilidade de aplicação de multa pessoal ao Secretário de Educação no
valor diário de 1/30 avos do vencimento do cargo e bloqueio integral de seus
vencimentos, até o cumprimento da ordem judicial.
O art. 461 do CPC dispõe a respeito da tutela específica de
obrigação de fazer ou de não fazer. Conforme preleciona Daniel Amorim
Assumpção Neves: “Trata-se de uma cláusula geral processual, que permite o
juiz, conforme as necessidades de cada caso, adaptar a técnica processual ao
perfil do direito material, para que haja a máxima coincidência entre a
jurisdição e o direito material, em consonância com o direito fundamental à
jurisdição efetiva, inserto no inciso XXXV do art.5º do CPC”.
Art. 461 - Na ação que tenha por objeto o cumprimento de
obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela
específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará
providências que assegurem o resultado prático equivalente ao
do adimplemento
(...)
§ 3º - Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo
justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz
conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia,
citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou
modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada.
§ 4º - O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na
sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de
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pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação,
fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.
O magistrado está autorizado a aplicar quaisquer medidas de
efetivação da tutela específica ou do resultado prático equivalente, ainda que
não previstas expressamente nos §§ 4º e 5º do art. 461 do CPC, utilizando-se
do poder geral de cautela. Todavia, tais medidas devem ser aplicadas de
forma razoável e proporcional, respeitando-se os preceitos constitucionais.
Com relação ao bloqueio integral dos vencimentos do Secretário
de Educação, entendo que tal medida é desarrazoada e desproporcional, uma
vez que os vencimentos possuem caráter alimentar, não podendo ser
bloqueado sem critérios, de forma indiscriminada. O não recebimento de seus
vencimentos poderá causar ao agente público danos irreparáveis, atingindo
até mesmo seus dependentes, que não possuírem meios próprios de
subsistência.
Somente nos casos de improbidade administrativa é possível a
aplicação da medida de indisponibildiade de bens e bloqueio de contas
bancárias, a fim de que o ressarcimento do dano causado ao erário seja
assegurado, nos casos de procedência da ação, o que não é o caso do autos.
Com efeito, a Fazenda Pública rege-se através de princípios e
normas diferenciadas das disposições de direito privado, em razão de sua
própria natureza jurídica e, principalmente, da supremacia do interesse público
sobre o interesse privado.
Trata-se de verdadeiro axioma reconhecível no moderno Direito
Público. Proclama a superioridade da coletividade, firmando a
prevalência dele sobre a do particular, como condição, até mesmo, da
sobrevivência e asseguramento deste último (MELLO, Celso Antonio
Bandeira de.. 14 ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p.41).
Busca-se então encontrar um equilíbrio entre a necessidade de
manter a coerção dos comandos judiciais destinados às entidades federativas,
e a preservação do interesse publico. Assim, aquele que aplica o direito deve
utilizar-se de princípios constitucionais norteadores, de forma a harmonizar as
medidas coercitivas autorizadas pela lei, preservando-se, contudo, o interesse
social, quando se tratar de entes federativos. Dessa forma, aquele que
interpreta o direito deve observar os princípios gerais do direito, sem deixar de
atuar de forma razoável.
Outrossim, não é razoável que o Secretário de Educação seja
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pessoalmente responsabilizado em decorrência de ação de obrigação de fazer
ajuizada somente em face do Estado. Este relator tem se manifestado
favorável acerca da multa pessoal ao Secretário, entretanto, deve ser aplicada
somente nos casos em que este for parte na demanda, conforme
entendimento prevalente no eg. STJ, in verbis:
“PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE FAZER.
DESCUMPRIMENTO. ASTREINTES. APLICAÇÃO CONTRA A
FAZENDA PÚBLICA. CABIMENTO. EXTENSÃO DA MULTA
DIÁRIA AOS REPRESENTANTES DA PESSOA JURÍDICA DE
DIREITO PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Conforme
jurisprudência firmada no âmbito desta Corte, a previsão de
multa cominatória ao devedor na execução imediata destina-se,
de igual modo, à Fazenda Pública. Precedentes. 2. A extensão
ao agente político de sanção coercitiva aplicada à Fazenda
Pública, ainda que revestida do motivado escopo de dar efetivo
cumprimento à ordem mandamental, está despida de
juridicidade. 3. As autoridades coatoras que atuaram no
mandado de segurança como substitutos processuais não são
parte na execução, a qual dirige-se à pessoa jurídica de direito
publico interno. 4. A norma que prevê a adoção da multa como
medida necessária à efetividade do título judicial restringe-se ao
réu, como se observa do § 4º do art. 461 do Códex Instrumental.
5. Recurso especial provido. (REsp 747371/DF, Rel. Ministro
JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 06/04/2010, DJe
26/04/2010).”
“PROCESSO CIVIL. OBRIGAÇÕES DE FAZER E ENTREGAR
COISA. COMINAÇÃO DE MULTA DIÁRIA. CABIMENTO,
INCLUSIVE CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. 1. É cabível,
mesmo contra a Fazenda Pública, a cominação de multa diária
(astreintes) como meio executivo para cumprimento de
obrigação de fazer (fungível ou infungível) ou entregar coisa.
Precedente da 1ª Seção: EREsp 770969/RS (1ª Seção. Min.
José Delgado, DJ 21.08.2006). 2. Recursos especiais a que se
dá provimento (REsp 893.041/RS, Rel. Ministro TEORI ALBINO
ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 5/12/2006, DJ
14/12/2006 p. 329).”
“ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. ALEGADA
ILEGITIMIDADE PASSIVA. AFASTADA. CONTRARIEDADE AO
ART. 461, § 2.º DO CODEX PROCESSUAL. MULTA
COMINATÓRIA NA PESSOA DO REPRESENTANTE DA
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ENTIDADE PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE. [...] 2. O
entendimento deste Superior Tribunal de Justiça é no sentido de
que as pessoas do representante e da entidade pública não se
confundem e, portanto, não é possível aplicar multa cominatória
a quem não participou efetivamente do processo. Precedentes.
3. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 847907/DF, Rel.
Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em
05/05/2011, DJe 16/11/2011).”
Importa enfatizar, também que a pessoa do representante e a
respectiva entidade política não se confundem, de maneira que se torna
impossível aplicar sanção pessoal a quem deixou de participar efetivamente do
processo, ainda que revestida do louvável escopo de dar efetivo cumprimento
a ordem judicial. Presente, portanto, a fumaça do bom direito.
De outro norte, existem outras alternativas também eficazes ao
cumprimento de decisões judiciais, como o bloqueio de verbas públicas, muito
utilizado em casos de descumprimento deliberado de comandos judiciais por
parte do ente público.
No que se refere ao periculum in mora, este restou configurado,
uma vez que o bloqueio integral das verbas do agente público poderá trazer-
lhes prejuízos de ordem financeira e econômica.
Em face do exposto, uma vez que restou caracterizados o fumus
boni iuris e o periculum in mora, defiro a liminar, para que seja suspensa a decisão
que fixou multa pessoal em desfavor do Secretário de Educação no valor diário
de 1/30 avos e determinou o bloqueio integral de seus vencimentos.
Oficie-se ao juízo de primeiro grau para apresentar as informações
no prazo legal. Ao mesmo tempo, ao agravado para contraminuta.
Após, ao Ministério Público para emissão de parecer.
Intime-se. Cumpra-se. Após, retornem-me conclusos.
Porto Velho, 21 de maio de 2015.
Desembargador Roosevelt Queiroz Costa
Relator