O documento descreve os conceitos de direito natural e positivo segundo diferentes pensadores. O direito natural é imutável, universal e baseado na razão, enquanto o direito positivo é variável, particular a cada localidade e baseado na vontade do legislador. O positivismo jurídico defende uma abordagem objetiva e avalorativa do direito, focando em sua validade como fato social, separada de considerações sobre seu valor ou justiça.
2. Direito Positivo x Direito Natural.
O positivismo jurídico deriva da locução direito positivo
contraposta ao direito natural.
Aristóteles já apontava tal distinção:
“Da justiça civil uma parte é de origem natural, outra se funda em lei.
Natural é aquela justiça que mantém em toda parte o mesmo efeito,
e não depende do fato que pareça boa a alguém ou não; fundada na
lei é aquela, ao contrário, de que não importa se suas origens são
estas ou aquelas, mas sim como é, uma vez sancionada.”
(Aristóteles, Ética a Nicômaco, capítulo VII, livro V)
3. Para Aristóteles o direito natural, seria aquele que tem em
toda parte a mesma eficácia, e que prescreve ações cujo valor
não depende do juízo que sobre elas tenha o sujeito, mas
existe independentemente de parecerem boas a alguns e más
a outros.
Já em referência ao direito positivo, sua eficácia se restringe
às comunidades políticas singulares onde estabelece ações
que antes de serem reguladas, poderiam ser cumpridas
indiferentemente, de um modo ou de outro, mas, uma vez
reguladas pela lei, importa que sejam desempenhadas na
forma prescrita:
“Antes da existência de uma lei ritual, é indiferente sacrificar a uma
divindade, uma ovelha ou duas cabras; mas, uma vez existente uma
lei que ordena sacrificar uma ovelha, isto se torna obrigatório; é
correto sacrificar uma ovelha e não duas cabras não porque esta
ação seja boa por sua natureza, mas porque é conforme a uma lei
que dispõe desta maneira.” (Aristóteles, Ética a Nicômaco, capítulo
VII, livro V)
4. Para São Tomás de Aquino, a diferença entre o direito natural e
o direito positivo se materializa na figura da lex naturalis e lex
humana.
A lex naturali é a participação racional do homem na lex aeternae.
A lex humana deriva da natural por obra do legislador que a põe e a faz
valer. Por exemplo, a norma impeditiva do falso testemunho deduz da lei
natural segundo a qual é preciso dizer a verdade; a lei natural estabelece
que os delitos devem ser punidos, e o modo de punição é feita pela lei
humana.
Nos século s XVII e XVIII também já existiam tais diferenças,
Gluck cita em sua obra Commentario alle Pandette (Milão,
1888):
“O direito se distingue segundo o modo pelo qual advém à nossa
consciência, em natural e positivo. Chama-se direito natural o conjunto
de todas as leis, que por meio da razão fizeram-se conhecer tanto pela
natureza, quanto por aquelas coisas que a natureza humana requer
como condições e meios de consecução dos próprios objetivos...
Chama-se direito positivo, ao contrário, o conjunto daquelas leis que se
fundam apenas na vontade declarada de um legislador e que, por aquela
declaração, vêm a ser conhecida.”
5. Direito Natural
Vale em toda parte (universalidade).
É imutável no tempo (imutabilidade).
É conhecido através da razão
Os comportamentos regulados são bons ou maus por si
mesmos.
O direito natural estabelece aquilo que é bom.
6. Direito Positivo.
Vale apenas para alguns lugares (particularidade).
As regras positivistas mudam (mutabilidade).
É conhecido através de uma declaração de vontade alheia
(promulgação).
Os comportamentos regulados pelo direito positivo são por
si mesmos indiferentes e assumem uma certa qualificação
apenas porque foram disciplinados de um certo modo pelo
direito positivo (é justo aquilo que é ordenado, injusto o que
é vetado).
O direito positivo estabelece aquilo que é útil.
7. Abordagem avalorativa do Direito.
Juízo de fato – Tomada de conhecimento da realidade, com
a finalidade exclusiva de informar a outro a constatação de
determinado fato.
Juízo de valor – Tomada de posição frente à realidade, com
a finalidade influenciar o outro, ou seja, fazer com que o
outro realiza um escolha igual ao do interlocutor.
“Diante do céu rubro do pôr-do-sol, se eu digo: “o céu é rubro”,
formulo um juízo de fato; se digo “este céu rubro é belo”, formulo
juízo de valor.”(O positivismo jurídico, Noberto Bobbio, São
Paulo, Ícone, 2006)
8. O positivismo nasce com a intenção de tratar o direito como
ciência, e, para tanto, na sua investigação, se deve afastar
os juízos de valor, na busca, justamente, de conhecimentos
puramente objetivos da realidade.
O positivista jurídico estuda o direito como ele é, e não como
deveria ser, o que justifica sua acepção objetiva. (o direito é
estudado como fato e não como valor).
Se estuda o direito real e não o ideal.
Se manifesta na realidade histórico-social.
9. Validade do Direito
x
Valor do Direito
Validade de uma norma jurídica significa dizer que ela existe
na esfera do direito, ou seja, faz parte de um ordenamento
jurídico real.
Valor de uma norma jurídica é uma qualificação de
determinada norma, é a valoração.
No direito natural a norma válida deve ser justa (valor).
Ao contrário, no direito positivo, há uma separação completa da
validade e do valor, podendo existir um direito válido que é
injusto, e um direito justo que é invalido (direito natural)
10. Categorias de definição do Direito.
Deontológicas, ideológicas ou valorativas – Define o direito tal
como deve ser para satisfazer um certo valor.
Possui uma estrutura teleológica, considerando o direito como
um ordenamento que serve para conseguir um certo valor.
(caráter finalístico).
Um exemplo claro está no sentido que Aristóteles dava ao
direito, sendo este instrumento para se chegar à justiça.
A visão tomista também contribui para esta categoria, ao
afirmar que a lei é definida em relação a um fim particular, o
bem comum. A lei utilizada pelo tirano para albergar vantagem
pessoal não pode ser considerada como lei verdadeira.
11. Ontológica, fatuais ou avalorativas – Define o direito tal como
ele é.
Kelsen retrata esta categoria, ao conceituar direito como:
“(...) é a lei social que consiste em obter a desejada conduta social
dos homens mediante a ameaça de uma medida de coerção a ser
aplicada em caso de conduta contrária”. (Teoria geral do direito e do
Estado, 1952, p.19).
- Como se observa, não há qualquer elemento valorativo,
sendo o direito definido como uma simples técnica, onde,
como tal, pode servir à realização de qualquer propósito ou
valor, porém é em si independente de todo propósito e todo
valor.
12. Teoria das Fontes do Direito.
Noberto Bobbio assim define fontes do direito:
“São fontes do direito aqueles fatos ou aqueles atos os quais um
determinado ordenamento jurídico atribui a competência ou a
capacidade de produzir normas jurídicas” (Noberto Bobbio, O
positivismo jurídico, 2006).
As normas vão pertencer ou não a um determinado
ordenamento jurídico, conforme derivem ou não dos atos ou
fatos dos quais faz depender a produção de suas normas.
Assim, uma norma é válida (isto é, existente juridicamente),
se for produzida por uma fonte autorizada, ou, em outros
termos, pode remontar a um dos fatos ou atos competentes
ou capazes, segundo o ordenamento, de produzir normas
jurídicas.
13. Lei como Fonte Predominante do
Direito.
Em ordenamentos jurídicos mais complexos, é estabelecido
quais as fontes do direito, ou seja, determinam os critérios
de validade das próprias normas. Nesse sentido, além das
normas que regulam o comportamentos dos membros da
sociedade, existem aquelas que regulam a produção de tais
normas (seria a regulamentação da regulamentação).
O primeiro tipo é nomeado como regras de comportamento,
enquanto que que no segundo é denominado regras de
estrutura ou de organização.
A doutrina juspositivista determina que a lei, como fonte do
direito, seja superior às demais fontes, uma vez que ela é a
manifestação direta do poder soberano do Estado, e que os
outros fatos ou atos produtores de normas são apenas
fontes subordinadas
14. A subordinação das fontes do direito se dá de duas formas:
Pelo processo do reconhecimento ou recepção – Existe
um fato social precedente e completamente independente do
Estado, onde este o reconhece no próprio ordenamento
jurídico sem ter contribuído para a formação de seu
conteúdo.
Ex: os costumes, considerados como regras construídas pela
vida social externamente ao ordenamento jurídico, mas que foi
acolhida pelo Estado num segundo momento.
Pelo processo de delegação – O Estado atribui a um órgão
diverso daquele portador da soberania o poder de
estabelecer normas jurídicas para certas matérias e dentro
de certos limites.
Ex: os regulamentos.
15. Os Costumes como Fonte do
Direito.
O positivismo jurídico prevalece a lei aos costumes (direito
consuetudinário):
“Do século x ao XII o nosso direito foi puramente consuetudinário; em
seguida, apareciam as primeiras ordenações. O período monárquico
havia representado uma fase transitória durante o qual o costume não
havia cessado de decair. Enfim chega a codificação e, no dia seguinte
à promulgação dos Códigos, o nosso direito se tornou exclusivamente
legislativo. A rivalidade entre lei e costume terminava com a derrota
deste último. A codificação consagrava sua ruína e o triunfo da lei
(Lebrun, La coutume, Paris, 1932).
16. A Equidade como Fonte do Direito.
Na formação do Estado moderno, o juiz tem limitado o seu
poder como fonte principal do direito, passando a ser
subordinado ao poder legislativo, tendo que aplicar as normas
apresentadas por este.
Para os positivista o poder judiciário não é uma fonte de
qualificação (ou principal) do direito.
No entanto ele pode pronunciar um juízo de equidade,
significando dizer que não se aplica as normas positivas
preexistentes, utilizando-se da própria consciência e sentimento
de justiça.
O juízo de equidade ganha espaço quando o legislador se
encontra em situações em que ele reputa como impossíveis ou
inoportunas disciplinar, solicitando a regulamentação do
judiciário. Exemplo prático é disponibilizado no art. 113 do CPC
italiano:
Ao se pronunciar sobre a causa, o juiz deve seguir as normas do direito, a menos
que a lei lhe atribua o poder de decidir por equidade. O conciliador decide por
equidade as causas cujo o valor não exceda duas mil liras
17. A Teoria do Ordenamento Jurídico
Hans Kelsen foi uma das mais coerentes manifestação da
teoria do ordenamento jurídico, surgida entre o fim do século
XVIII e início do século XIX, sob o fundamento de se dar
unidade ao conjunto de normas a um conjunto de normas
jurídicas fragmentárias, que constituíam um risco
permanente de incerteza e de arbítrio.
São três os fundamento básicos da teoria:
Unidade.
Coerência.
Completude.
18. Unidade do Ordenamento Jurídico.
A unidade não é exclusiva do direito positivo, caracterizando
também o direito natural. Nesse sentido segue a
conceituação do jurista francês Cambacerés:
“Existe uma lei superior a todas as outras, uma lei eterna, inalterável,
própria a todos os povos, conveniente a todos os climas: a lei da
natureza. Eis aqui o código das nações, que os séculos não puderam
alterar, nem os comentadores desfigurar. É a ele apenas que é
necessário consultar.”
- Na esfera do direito positivo, no entanto, a unidade, a qual é
tratada no direito natural sob a égide substancial ou material,
passa ter um cunho meramente formal, ou seja, relativa ao modo
pelas quais são postas as normas.
- A unidade do ordenamento jurídico positivo, chamado por
Kelsen de ordenamento dinâmico, é constituído ante o fato de
todas elas serem postas direta ou indiretamente pela mesma
autoridade, podendo todas serem reconduzidas à mesma fonte
originária constituída pelo poder legitimado a criar o direito.
19. “Se pergunto a um juspositivista porque não devo roubar, ele me
responde que não devo porque assim estabeleceu o juiz ou o
costume ou o legislador (segundo se trate de um ordenamento
judiciário, consuetudinário ou legislativo); e se insisto e pergunto
porque devo obedecer ao que estabelece o juiz ou o costume etc.,
ele me responderá que devo, porque assim estabeleceu o poder
supremo.”
“ Suponhamos que o pai ordene ao filho: “Hoje a tarde permaneça
em casa para estudar” e que o filho pergunte: “Por que devo
estudar?”. Se o pai responder apelando para um bem (bem-estar,
felicidade, liberdade...) que o estudo serve para obter, estará dando
uma resposta do tipo moralista ou jusnaturalista, visto que procura
deduzir o conteúdo de seu comando de um sistema de normas
morais; se ao contrário responde : “Deve estudar por que estou
mandando”, estará dando uma resposta juspositivista, visto que
reconduz a norma ao sujeito que na família é a autoridade, a fonte
que põe as normas.” (Noberto Bobbio, O positivismo jurídico, 2006).
20. Na questão da unidade, se observa uma hierarquia das
normas, sendo que, de forma escalonada, uma da
legitimidade a mais inferior, tendo como norma máxima a
Constituição. Segue o questionamento de Kelsen: qual
norma dá validade às normas constitucionais? Bittar
esclarece:
“Assim, o conjunto das normas forma a ordem jurídica, que é um
sistema hierárquico de normas legais. Toda ordem jurídica requer um
regresso ad infinitum por meio das normas, até que a norma
fundamental (esta é a pressuposição do pensamento jurídico, e não
um dado histórico). Caso contrário, inexistente a norma fundamental,
devem se aceitar pressupostos metafísicos para fundamentação da
ordem jurídica (Deus, ordem universal, contrato social, direito natural,
etc.) O que se pode reconhecer é que existe um consentimento de
todas as pessoas em aceitar a Constituição, e é a partir desse simples
dado que deve raciocinar o jurista; esse é princípio da eficácia
Kelseniano.” (Eduardo Bittar, Curso de filosofia do direito. 2012)
21. Coerência e Completude do
Ordenamento Jurídico.
Coerência seria o fato de em um ordenamento não existir
normas contraditórias, onde apenas uma deveria ser
registrado no sistema jurídico.
Completude corresponde a se evitar a produção de lacunas
no direito, ou seja, a existência de uma norma a menos.
Nesse sentido segue Savigny:
“O complexo das fontes do direito (...) forma um todo, que é destinado
à solução de todas as questões que se apresentam no campo do
direito. Para responder a tal propósito, ele deve apresentar estes dois
caracteres: unidade e completude(...) O procedimento ordinário
consiste em trazer do conjunto das fontes um sistema de direito (...)
Falta a unidade, e agora se trata de remover uma contradição; falta a
completude, e agora se trata de colmatar uma lacuna.” (Sistema do
direito romano atual, vol. I)
22. O que seria a validade de uma norma no ordenamento
jurídico em termos positivistas?
Defina coerência e completude no ordenamento jurídico a o
partir do pensamento Kelseniano.